Já não eram apenas batatas

Já não eram apenas batatas




  1. Já não eram apenas batatas


Alice riu. Regulus estava de costas para ela, novamente na cozinha descascando batatas, três elfos olhando-o inconformados enquanto os outros cuidavam do jantar.


- Acho que você está atrasado. O jantar já está sendo servido. – ela olhou ao redor as quatro mesas, além da mesa dos professores, fartamente servidas - A não ser que as batatas sejam para o almoço de amanhã...


Regulus largou a faca sobre a mesa, arrastou o banco em que se sentava para trás e correu ao encontro dela, abraçando-a com força.


- Reg, pode me largar agora. – disse Alice, um minuto depois, rindo. - O que aconteceu com você? Você está péssimo!


- Eu é que pergunto o que aconteceu! Você sumiu, não deu notícias, não voltou às aulas... eu pensei, que pensei... – ele não conseguiu terminar a frase, seus olhos se encheram de lágrimas.


- Eu estava com uma doença extremamente contagiosa, varíola de dragão. Passei as férias inteiras acamada, toda verde, um horror! – ela riu, depois mostrou a dobra do cotovelo e seu pescoço – na verdade ainda estou um pouco verde...


Regulus pegou no braço da amiga e olhou sua pele. Era estranho, ela realmente estava esverdeada.


- Mas agora você está bem, não está?


- Estou sim... Fique tranquilo, não é mais contagioso.


- Não é isso que me preocupa, ora! – o garoto ficou ligeiramente ofendido com a insinuação de que ele pudesse estar com medo de ficar doente – você está realmente bem? tipo, fora de perigo?


- Sim. – Alice sorriu novamente. Ela gostava de perceber o quanto ele era atencioso, ela sentia as palavras do menino como se fossem um afago.


- Então você passou o verão inteiro presa dentro de casa?


- Mais ou menos isso... Os primeiros dias fiquei no Saint Mungus, depois pude voltar para casa, o único problema é que não podia fazer nada, já que ler, escrever ou qualquer coisa relacionada a papel ou pano era potencialmente perigoso devido aos espirros...


- Como assim? – ele perguntou, aliviado por ela estar ali, olhando o contorno de seu rosto redondo ainda marcado com pequenas cicatrizes redondas provocadas pelas pústulas.


- Você não sabe porque se chama de varíola de dragão? Quando a gente espirra saem faíscas do nariz. Minha mãe não deixou eu escrever nem receber cartas, depois da primeira que Liz mandou para mim e pegou fogo enquanto eu lia... Pegou fogo no meu cabelo, olha. – Alice apontou para uma pequena falha em sua franja. - No começo eu achei engraçado ficar soltando fogo, mas depois me cansei. E tinha muita febre e dores no corpo, passei dias dormindo... E você, o que fez nas férias? – Alice inclinou a cabeça de lado e observou o amigo da cabeça aos pés - Você está diferente mais magro e bronzeado...


- Fiquei preso também... Passei as férias inteiras em uma ilha na Grécia com meus pais, meu irmão e meus avós.


- Uau! Uma ilha? Ouvi dizer que tem lugares lindos lá!


- Era bonito mesmo, o mar muito azul... – ele lembrou da associação com os olhos de Rachel e isso o aborreceu um pouco. - Tava muito chato lá, meus pais fingindo que estavam em lua de mel, meu irmão trancado no quarto dele estudando o tempo todo... e só tinha gente velha na ilha! Acho que eu preferia ter pego varíola de dragão também... – ele riu.


- Não fale bobagem, Reg...  É uma doença horrível! Agora o que você acha da gente voltar ao salão principal? Estou morrendo de fome.


Regulus abaixou os olhos, tristonho. Voltar ao salão principal significava que eles sentariam separados e não iriam mais conversar.


- A-ham. – pigarreou um elfo baixinho e gordinho. – Toffe serviu uma mesa para os senhores aqui mesmo na cozinha. Podem ficar se quiserem.


Regulus sorriu ao ver uma mesinha fartamente servida mais a diante.


- O que você acha, Alice?


- Hum, está bem. Mas vou comer rapidinho, depois quero ir conversar com as meninas, saber das novidades, você sabe... eu mal tinha chegado ao Salão Principal quando sua coruja chegou...


Ele sorriu tristonho. Alice não queria ficar.


- Se quiser pode ir já, eu janto por aqui.


- Tem certeza? – ela perguntou, quando ela mesma não sabia se queria ir ou queria ficar.


- Claro! – ele fingiu um sorriso para a encorajar a ir - Amanhã nós conversamos. Hum, depois do almoço, no jardim, pode ser?


- Está certo. Amanhã, então. Leve o tabuleiro de xadrez. – ela abraçou-o e se despediu. Depois saiu apressada da cozinha, esperançosa de que as amigas não houvessem terminado o jantar.


Regulus se sentou na mesa de canto com o jantar posto para ele, com os elfos ao seu redor. Sentia-se estranho, ao mesmo tempo que aliviado por saber que Alice estava bem, estava extremamente triste por ela não ter ficado e jantado com ele e também um pouco irritado com ela. Ela poderia muito bem ter ficado ali, já que iria para o dormitório e poderia conversar com as meninas a noite inteira. Regulus comeu calado.


À sua volta, os elfos iam e vinham sem parar enquanto reabasteciam as mesas. Ele achou muito interessante ver como trabalhavam fazendo flutuar grandes quantidades de comida pelo ar, que se distribuíam igualmente entre as quatro mesas. A comida parecia dançar enquanto flutuava e, impressionantemente, não derrubavam grão sequer no chão. Muitas travessas por vezes se esbarravam, produzindo sons furtivos aqui e ali, parecendo música. Regulus sentiu uma súbita vontade de imitar um maestro como se ele estivesse conduzindo o espetáculo. Tudo ali funcionava em sincronia. Assim que as travessas eram colocadas sobre a mesa, o mais velho dos elfos estalava os dedos e a comida sumia – e Regulus supôs que deveria ter aparecido na mesa correspondente logo acima deles, no salão principal. Era um espetáculo muito bonito de se ver, tanto que, assim que enviaram a última travessa de pudim para o salão principal e a cozinha ficou silenciosa, Regulus não aguentou, levantou-se e aplaudiu fervorosamente.


-Bravo! Bravo!


Os elfos o olharam, estarrecidos. Não era a primeira vez que o bruxo fazia coisas que eles não conseguiam compreender.


- Erm. Desculpe. Acho que me empolguei. – ele olhou para os elfos sem graça – acho que está na hora de ir deitar. – Regulus se levantou, começou a andar em direção da saída quando lembrou-se da xícara de chá da outra noite e acrescentou -  Obrigado pelo jantar, muito saboroso, como sempre. – ele sabia que essas palavras valiam mais do que mil feitiços e iam lhe render ainda muitas xícaras de chá. Olhou para trás e havia uma porção de elfos olhando para ele com admiração, sorrindo, os enormes olhos redondos faiscavam na penumbra, provavelmente por estarem úmidos de gratidão por sua gentileza. Regulus sorriu para eles e acenou. Os elfos acenaram para ele, todos juntos. Então ele saiu da cozinha apressado.


Ria-se da cena que provocara, lembrando do olhar dos elfos, encostado em uma pilha de barris, quando percebeu que havia tomado o caminho errado, estava no corredor à direita da cozinha – que indicava que em algum lugar ali estava escondida a entrada para a sala comunal da Lufa-lufa. Sentiu um frio na barriga, depois seu coração murchou, queria que Alice estivesse ali. Virou-se e tomou o caminho de volta, andando o mais lentamente que podia na esperança de que no caminho para as escadas ele a encontrasse novamente. Alguns alunos passaram por ele, mas Alice não apareceu. Derrotado, ele virou à esquerda no final do corredor e tomou a escada estreita escondida atrás de um grande alambique de carvalho. Era um dos muitos atalhos de Hogwarts e desembocava próximo da entrada da sala comunal da Sonserina. Ele caminhou até a entrada da sala comunal, olhou para a parede lisa por alguns segundos sem se lembrar da senha. Era um ingrediente de poção, mas não lembrava qual. Tentou, desesperado, pensar no quadro de avisos, visualizar os últimos recados. Parecia impossível se lembrar! Regulus sorriu, lembrou dos ingredientes da poção do esquecimento:


- Ramos de Valeriana!


A grande porta dupla apareceu em sua frente e se abriu. Regulus entrou rindo de si mesmo, pensando que ele havia esquecido e teve que lembrar do esquecimento para lembrar-se da senha. Pareceu-lhe divertido. Amifidel estava lá, sentado próximo da lareira apagada, para onde olhava como se esperasse que o fogo aparecesse ali de uma hora para outra.


- Oi, Ami. O que está acontecendo?


Theodor Amifidel saltou na cadeira, de susto. Levantou a cabeça loira e olhou para Regulus. Regulus se aproximou e olhou intensamente para a lareira e pela primeira vez se perguntou como é que havia uma lareira lá se estavam embaixo do Lago Negro e não havia nenhuma chaminé. Ele se aproximou e olhou dentro da lareira, para o alto. A escuridão era tanta que não se poderia inferir a profundidade ou altura da coluna da chaminé. Isso poderia ser a meio metro como a 100 metros de altura. Amifidel parou do seu lado, olhou para dentro de onde deveria ser a chaminé.


- Você não soube? – perguntou, sussurrando – hoje foi o primeiro encontro com Rosier. Avery, Snape, Rockwood, Gibbon, Jugson e Crouch foram. Nenhuma menina.


- Crouch foi? – Regulus perguntou aborrecido, aquilo chegava a ser ofensivo


-Shhhhhh... Fala baixo... – respondeu Amifidel, olhando para os lados.


 - E Mulciber? – Regulus sussurrou.


- Não conseguiu... Foi deitar aborrecido. Bateu a porta tão forte que Emma o ameaçou deixar fora do time – caso não aprendesse controlar os nervos.


- Como assim? Então, Mulciber não conseguiu pensar em nada, mas o miolo-mole do Crouch conseguiu? O que será que ele fez?


- Não podemos saber – comentou Jack, se incluindo na conversa – lembra, "quem comentar o que fez vai ser expulso".


- E cadê o John? – Regulus olhou em volta e não avistou o companheiro de quarto.


- Está lá fora, foi ver se conseguia descobrir como sair do castelo. Ele queria falar com Rosier, pedir que reconsiderasse o seu esforço...


- Como assim? O que ele fez? – perguntou Regulus.


- Se você não vivesse no mundo da lua teria notado quando ele disse ter lançado a maldição cruciatus em um testrálio no final da aula de Trato das Criaturas Mágicas....


- Ah, então foi isso que aconteceu? Por isso que o guarda-caça saiu correndo da casa dele, mandando todos de volta ao castelo? - Perguntou Regulus, mostrando-se interessado.


- O que aconteceu a gente não sabe, ninguém viu. – disse Amifidel - O que vimos foi ele apontar a varinha para o alto de uma árvore e fazer cair uma porção de folhas e gravetos, nada mais. Não tinha animal algum lá. Ele inventou tudo, sabia que Rockwood estava observando para depois contar para Rosier e apelou. Inventou a história do testrálio, porque é um bicho que ninguém consegue ver, para tentar conseguir alguma coisa...


Nesse momento John entrou na sala comunal batendo os pés no chão, o rosto vermelho de raiva.


- E aí, John? – perguntou Jack.


- Ora, cale a boca, Jack. – ele disse, depois sumiu na porta que levava aos dormitórios.


Os outros três se entreolharam.


- Ele não conseguiu... Bem, quando os outros chegarem, podemos perguntar como foi... de repente um deles aceita ensinar o que aprender no clube para a gente... – disse Amifidel, esperançoso.


- Como você é ingênuo, Ami, – disse Regulus - nenhum deles vai querer falar nada.


- Não custa tentar... – disse Amifidel, o olhar perdido novamente na lareira. Estranho, não? – ele franziu as sobrancelhas.


Regulus pegou a varinha e apontou para o alto, dentro da lareira.


- Lumos!


A luz pareceu ser consumida pela escuridão e iluminou menos que um palito de fósforo. Continuavam sem conseguir enxergar nada lá dentro.


- Será que está ligada à rede de flu? – perguntou Jack.


- Talvez... como saberíamos... Não tem pó de flu aqui. – respondeu Regulus.


Os três garotos saíram da lareira e se sentaram nas poltronas. Esperaram por horas e não houve nenhum sinal de Snape e os outros até às 1h30 da madrugada, quando Regulus desistiu de esperar e foi deitar. Pouco tempo depois Jack e Amifidel entraram no quarto.


- E aí?


Regulus perguntou, apoiando-se nos cotovelos, quando os outros entraram.


- Ainda não voltaram. – respondeu Jack, mal-humorado.


- A gente fala com eles amanhã. – completou Amifidel.


John continuou dormindo ou fingindo que dormia, não era possível saber, pois tinha a cabeça coberta pelos lençóis.


Regulus deitou-se de novo. Duvidava que os outros fossem comentar algo sobre o novo clube com eles, mas como Amifidel havia dito, não custava tentar. Ele suspirou. O fato de estar fora do clube não o incomodava naquele momento. Nada o incomodava. Ele estava feliz, Alice havia voltado e no dia seguinte iriam jogar xadrez. Regulus adormeceu com um sorriso no rosto.


Naquela noite sonhou que entrava na lareira da sala comunal, era sugado pela escuridão e levado para a baía mágica de seu pai na ilha grega. Alice chegou logo em seguida, carregando o tabuleiro de xadrez, ela se sentou na areia e colocou o tabuleiro em sua frente. Regulus sentou-se na frente dela. A luz do luar revelava o brilho verde da pele da garota. Regulus, em sonho, comentou: “Você está linda, toda verde!” Ela respondeu: “me pintei de verde para você, Reg! Agora sou da Sonserina!” ele sorriu e a abraçou. Seu mundo estava perfeito. Regulus virou-se na cama.


Toffe, o elfo, entrou no dormitório carregando os uniformes lavados e os deixou sobre os respectivos malões. No quarto escuro os olhos do elfo brilhavam. Ele observou os quatro meninos que dormiam respirando fundo. Ele adorava observar os alunos. Todos pareciam em paz, mas apenas um sorria dormindo.

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Comentários (1)

  • Luhna

    Regulus está, de fato, apaixonadinho pela Alice. Só não entendi por que ela não fez questão alguma de jantar com ele. Pensei que ela fosse apaixonada pelo Reg. E agora, o Reg não vai mais participar do clube de duelos? Como ele se aproximará mais dos futuros Comensais? E Crouch? Eu juro que não entendo bem o que acontece com essa criatura, mas enfim. E o Reg é tão fofo com os elfos. *_________* Dá para entender por que o Kreacher gostava tanto dele. E é nessas horas que a gente vê que, apesar de estar meio deslumbrado com Voldemort e cia. ltda., Regulus tem, sim, um bom coração. 

    2013-12-07
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