AQUELE QUE TEM TUDO



- Boa noite, Granger – disse educadamente Draco Malfoy – Espero não ter demorado muito.

- Chegou exatamente na hora – respondeu a jovem de maneira formal – Eu é que tenho o hábito de chegar adiantada.

Hermione Granger guardou o livro que lia, marcando cuidadosamente a página. Depois tirou os óculos de leitura e olhou longamente para o jovem loiro que se sentava à sua frente. Vestia um terno trouxa impecável, escuro e discreto. Nada daquelas cores extravagantes que os bruxos, principalmente os jovens, usavam atualmente. Os cabelos eram curtos como os de um militar ou um desses executivos trouxas bem sucedidos. Parecia exatamente isso. Um executivo bem sucedido. O tipo de bruxo que sempre a irritava. Copiando a empáfia e a arrogância dos trouxas, que pessoas como ele sempre desprezou. Do tipo que explorava elfos domésticos e que culpava os pobres por serem pobres. Do tipo que aparentava estar do lado certo, mas que ficaria muito contente se o Lorde das Trevas houvese triunfado e mestiços e nascidos trouxas (os famosos “sangues ruins”) fossem relegados à condição de escória da sociedade.

Dessa vez, pelo menos, Hermione estava errada. Draco Malfoy realmente queria apagar o passado vinculado aos Comensais da Morte e a Voldemort. Mas era difícil para a jovem medibruxa esquecer anos de ofensas preconceituosas que o rapaz lhe dirigiu em Hogwarts. Draco Malfoy era a personificação de tudo aquilo que ela desprezava. Não pretendia realmente prolongar em demasia o encontro.

Draco avaliou o vinho que a jovem tomava e, tentando ser simpático, sentenciou:

- Muito boa pedida, Granger.

- Para uma sangue ruim, você quer dizer – rebateu a jovem de maneira sarcástica.

Draco suspirou longamente. Aquela seria uma loooooooooonga noite, pensou. Malditos grifinórios! Assim como dizem dos hipogrifos, esses desgraçados não esqueciam nada. Sufocando a vontade de mandar a moça para aquele lugar distante, o loiro acenou para o garçom e pediu um drinque cuja base era o bom e velho uísque de fogo. Iria precisar.

- Vou dizer o mesmo que disse para os seus amigos, Granger: não quero reavivar aquela ridícula rivalidade de adolescentes. Pensei que você pudesse entender, já que sempre foi a parte pensante do “Trio Maravilha”. Gostaria que pudéssemos conversar de maneira civilizada. E gostaria também de jantar, uma vez que estou faminto. Eu recomendo o filé à moda. Combina perfeitamente bem com o vinho que você está tomando – disse, estendendo o cardápio à jovem – Há também um ótimo cardápio vegetariano, se você for daqueles que não comem carne – disse a última frase com um certo desprezo, certamente desaprovando mais um modismo trouxa que se inseriu no mundo dos bruxos nos últimos tempos.

Hermione ficou surpresa com a maneira franca de Draco. Realmente ele estava bem diferente. Ainda tinha aquele jeito arrastado de falar, mas certamente parecia menos prepotente do que era nos tempos de escola.

- E, Granger, me desculpe por ter agido como um idiota nos tempos de Hogwarts. Você e os Weasleys têm realmente motivos para me achar uma figura desprezível.

A última sentença realmente surpreendeu Hermione mais do que se Rony manifestasse um súbito interesse em ler “Hogwarts, uma história” ou se a Professora Minerva MaCgonagall se revelasse uma entusiasta de “Você-sabe-quem”.

- Deixa ver se eu entendi bem – disse a jovem, perplexa – Você, Draco Malfoy, está se desculpando?

- Sim – respondeu o outro, como se um Malfoy se desculpar perante uma antiga desafeto fosse um fato tão comum quanto Mergulho Potter apanhar o pomo de ouro – A sopa de escargots também é boa – acrescentou com naturalidade.
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O último ano em Hogwarts havia sido extremamente tenso. Assassinatos e desaparecimentos eram noticiados todos os dias. A guerra era um fato consumado. Grifinórios já se preparavam para ela, assim como os sonserinos, casa onde se concentrava o maior número de adeptos do lado das trevas. As brigas entre os dois grupos explodiram ao longo do ano e os professores tinham muito trabalho para evitá-las.

A dois dias da realização da cerimônia de encerramento do ano letivo houve “o” conflito. Hermione foi escolhida para ser a oradora dos formandos daquele ano, fato que desagradou profundamente aos membros da casa da serpente, que não queriam que uma reles “sangue-ruim” os representasse. Insinuações de que a garota poderia sofrer um “acidente lamentável” eram despejados a todo o momento. Saindo de um dos exames finais, dias antes da cerimônia, Harry Potter, ladeado por Rony e Neville, ameaçou um sorridente Draco Malfoy, que com seus amigos, lançava ofensas aos grifinórios em geral e a Hermione em particular.

- Se algo acontecer a Hermione ou qualquer grifinório, eu vou achatar essa sua cara comprida e nem Voldemort vai protegê-lo, Malfoy!

- Ah, o herói dos leões, não é mesmo? – caçoou Draco, arrancando risadas debochadas de Pansy, Crabe e Goyle – Eu suponho que deveria ficar com medo...

- Sim, suponho que deveria – respondeu Harry, encarando os sonserinos um a um. Talvez tivesse sido a maneira fria pela qual Harry respondeu às provocações. Talvez houvesse soprado uma brisa fria naquele momento, apesar de ser um belo dia de sol. Mas Draco sentiu um ligeiro arrepio e teve a impressão de que os olhos verdes de Harry tornaram-se mais escuros naquele momento. E ele não estava imaginando coisas. A brisa fria também arrepiou os demais, que perderam subitamente a vontade de rir do grifinório. Nesse momento, Hermione, a monitora-chefe também saía da sala de exames e afastava os amigos de perto dos sonserinos, que puderam ir embora com dignidade, ainda rindo, mas seguramente assustados.

Infelizmente eram necessárias mais do que brisas frias e ameaças para intimidar algumas pessoas naqueles dias. No dia seguinte, Hermione e o lufa-lufa Ernesto Macmillan, monitores-chefes, foram emboscados pelos sonserinos quando faziam a ronda noturna Ambos foram enviados para a ala hospitalar com vários ferimentos. Embora o estado deles não fosse grave, aquilo tornou a situação insustentável.

Harry, Rony e uma infinidade de grifinórios de todos os anos reuniram-se no salão comunal da casa num verdadeiro conselho de guerra. Gina queria na mesma hora invadir sozinha as masmorras e azarar quantos sonserinos ela encontrasse, sendo impedida por Harry, com quem namorava na época.

- Não quero nenhum aluno que não for do último ano conosco – gritou Rony no meio do tumulto, desencadeando protestos, principalmente da irmã.

- Escutem – disse Harry muito tenso – Vocês podem ser expulsos. Nós estamos com um pé fora da escola. No máximo, eles podem colocar algumas menções negativas no nosso certificado. Eu prometo para vocês que vamos fazer aquelas víboras pagarem caro.

- Hermione é minha amiga também... – ia dizendo Gina, mas o namorado a interrompeu.

- Por favor, Gi – falou bem baixo, perto da garota – Se você for, ninguém vai querer ficar. Pense nos alunos dos primeiros anos.

Gina refletiu por alguns momentos. Não queria ser responsável pela expulsão dos colegas. Ela havia se tornado monitora no ano anterior e muitos grifinórios a tinham como liderança, principalmente as garotas.

- OK, Harry – concordou a garota – Mas me prometa que vai dar uma lição naqueles crápulas – disse maldosa, depois puxando o namorado para um grande beijo que arrancou assobios dos meninos mais novos e suspiros das garotas, sussurrou: - Tome cuidado.

Enquanto Gina e Colin, usando a sua autoridade de monitores, punham os alunos para dormir sob protestos dos menores, os setimoanistas, liderados por Harry e Rony marchavam decididos para as masmorras, estuporando todos os sonserinos que encontravam pelo caminho. Á frente dos aposentos de Snape, que deveria estar acordado, pois a luz poderia ser vista debaixo da porta, Harry estacou, surpreendendo os demais.

- Colaportus Extremus! – berrou o feitiço e um estranho barulho de algo se fundindo foi ouvido. Snape só conseguiria sair dos aposentos dois dias depois. Muito satisfeito, Harry continuou liderando a comitiva que invadiu as masmorras sonserinas.

Surpresos com a algazarra, vários sonserinos desceram até a sua sala comunal, apenas para serem atingidos por vários feitiços. Lufa-lufas e alguns corvinais engrossavam a comitiva grifinória. A maioria deles havia sido treinada por Harry dois anos antes na AD e a essa altura sabiam muitos feitiços que os membros da casa da serpente mal imaginavam existir. Finalmente Draco, monitor da sua casa, apareceu ao lado dos capangas Crabe e Goyle. Parecia ligeiramente amedrontado, embora continuasse mostrando a calma arrogante de sempre.

- Não adiantaria dizer que não aprovei o que fizeram com a Granger e com o Macmillan, não é mesmo? – perguntou com a sua voz arrastada.

- Eu avisei você, Malfoy – ignorou-o Harry e de novo um estranho vento frio se fez seguir às suas palavras. “O miserável daria um grande bruxo das trevas”, pensou o loiro, sabendo que estava ferrado, mas mesmo assim mantendo a tranqüilidade – Eu disse também que você deveria ter medo.

Praticamente ninguém viu a varinha de Harry se mover. Crabe, que avançava de maneira ameaçadora, fechando os punhos, foi atirado a vários metros de distância, enquanto Goyle era estuporado por Rony. “Ácio!”, disse calmamente Harry e a varinha de Malfoy deslizou suavemente até a sua mão.

- Eu poderia fazer você em pedaços, Malfoy. Ou transformá-lo numa doninha a atirar você da Torre de Astronomia. Mas não, eu vou dar uma oportunidade a você que seus amigos não deram a Hermione e Ernesto. E você tem sorte. Porque se eu te deixasse nas mãos de Rony, você estaria morto. Eu só não quero meu amigo em Azkaban por causa de um verme como você.

Surpreso, Draco viu Harry atirar as duas varinhas para Rony, enquanto foi feito um círculo. O grifinório invocou uma estranha proteção que isolou os dois do restante dos alunos.E o feitiço havia sido feito sem varinha. Ambos tiraram as capas e Harry arregaçou as mangas da camisa. O sonserino sorriu confiante. Certamente Harry imaginava que ele, como a maioria dos bruxos, não soubesse usar os punhos e só soubesse lutar com varinhas. Por um momento imaginou que daria uma surra no grifinório.

Draco era um pouco mais alto do que Harry, mas muito mais encorpado. E sabia usar os punhos. Malfoys aprendiam isso desde pequenos. Pena que não tenha adiantado muito.

A princípio a luta foi dura. Draco era forte, sabia socar e era maldoso e traiçoeiro. Por isso a luta durou cerca de dez minutos. No final Harry estava em pé, recebendo uma ovação dos grifinórios, corvinais e lufa-lufas e Draco estava de joelhos, ofegante. Seus lábios estavam inchados, seu nariz provavelmente quebrado e seu peito doía horrivelmente. E o grifinório praticamente só havia usado as mãos. Era incrível. Ele parecia ser feito de borracha. Socava e saltava. Draco no início o atingira duas vezes no rosto. Depois, encontrando a distância certa, Harry o havia trucidado. E sem recorrer a golpes baixos. Foi Draco quem tentou atingir as partes baixas do outro, apenas para tomar uma violenta joelhada e um pontapé no peito, na única vez que Harry não havia usado só os punhos.

Lentamente o grifinório aproximou-se do loiro, que ofegava e gemia de dor. Draco imaginou que ele lhe chutaria a cara e pisaria em cima dele. Ele, Draco, teria feito isso se tivesse um oponente à sua mercê. O vento frio não era decididamente uma ilusão e as íris de Harry realmente escureceram quando ele se aproximou do oponente caído. Falou tão perto do seu rosto que Draco pôde sentir o seu hálito com cheiro de sangue, pois tinha um corte nos lábios. Decididamente ali estava um grande bruxo das trevas em potencial.

- Há uma coisa que vocês sangue-puros não sabem sobre si mesmos, mas ficou claro hoje. Sabe o que é?

Draco não respondeu. Não iria dar o gosto de responder a aquela humilhação. Surrados nas próprias masmorras! Isso superava a humilhação de 1643, quando Grifinória goleou Sonserina por 560 a zero no quadribol.

- Vocês são uns bundões! BUNDÕES! – berrou Harry, que recebia uma ovação ensurdecedora.

Estranhamente o episódio não gerou detenções ou menções depreciatórias nos diplomas recebidos. Certamente, envergonhados demais com a humilhação, os sonserinos não registraram queixa da invasão da sua casa e a maioria deles não compareceu à cerimônia no dia seguinte. Hermione, amparada pelos amigos, fez o discurso como previsto e Snape, que também, não pudera comparecer, acusou formalmente Harry de tê-lo prendido em sua sala, mas a denúncia caiu no vazio, pois não havia provas.

Draco teve dois dentes e o nariz quebrado. Duas costelas foram lesionadas com gravidade. Disse à enfermeira que havia caído da vassoura num vôo noturno, o que lhe valeu ainda uma advertência. Mas naquele dia, nas masmorras sonserinas, teve a certeza de que aquela guerra estava perdida para Voldemort. O “garoto que sobreviveu” sabia ser frio e maldoso quando necessário, e sem recorrer a golpes baixos e manobras traiçoeiras.
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- Então aquela surra mudou a sua percepção da guerra? – perguntou Hermione surpresa.

- Pode ter certeza, Granger – respondeu calmamente Draco.

Ambos estavam apreciando a sobremesa deliciosa preparada com vários sorvetes e frutas exóticas. Hermione estava bastante surpresa pelo fato da noite ter sido agradável. Surpreendentemente Malfoy havia se revelado uma boa companhia e havia lhe revelado uma face humana que ela não poderia imaginar que existisse. Inclusive revelou que tinha dúvidas sobre servir Voldemort.

- Eu só não entendo uma coisa – disse a jovem – Se você tinha dúvidas sobre a lealdade a Voldemort (“Não fale o nome dele, Granger!”), por que tinha que agir de maneira tão insuportável com Harry e conosco?

- Em primeiro lugar eu era fiel à minha casa. E havia crescido odiando os grifinórios antes de conhecê-los. Você imagina o que eu ouvia deles em casa. Depois, eu tinha inveja de seu amigo Potter.

- Inveja? – disse Hermione, engasgando-se com a sobremesa. Uns esnobes na mesa ao lado olharam-na com ar de desprezo, mas um comentário cortante de Draco (“Perderam alguma coisa aqui?”) os fez desviar a atenção para a sua famosa sopa de escargots.

- Mas o que Harry tinha que você poderia invejar, Malfoy? O coitado não tinha pais, era maltratado durante as férias por aqueles seus tios trouxas horríveis – retomou Hermione, depois de tomar um copo de água.

- Ele tinha amigos. Amigos de verdade.

- E você? Todos aqueles sonserinos que andavam a sua volta...

- Eu tinha servos, Granger. Tinha lacaios. Apenas por que meu pai era considerado o braço direito do Lorde das Trevas. Quando seu amigo me deu aquela surra histórica as coisas já não estavam boas para o meu lado. Meu pai havia se desentendido com o Lorde, até hoje não sei porque. Poucos sonserinos se mantiveram leais a mim, exatamente aqueles que não eram muito fanáticos por Voldemort.

- Eu não sabia...

- Claro que não. A propósito: A emboscada que fizeram para você e Macamillan foi idéia do Nott e de outros adeptos de “Você-sabe-quem”. Eu não aprovei.

- E o Harry não te deu nenhuma chance de explicar.

- Mas, pense bem, por que ele daria? Todos diziam que eu era o “Príncipe da Sonserina”. Todos sabiam quem era o meu pai. Seu amigo fez o que se esperava que ele fizesse. E ele havia avisado, lembra?

- Essa história de inveja do Harry me parece tão...

- Absurda? – cortou Malfoy.

- Não consigo entender exatamente o que Harry tinha que você não pudesse ter.

- Ele tinha você e o Weasley –sentenciou o loiro, deixando Hermione, que felizmente já tinha terminado a sua sobremesa, realmente perplexa.





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