Sangue e Amuleto



 O mês de novembro acabara de chegar, e junto com ele a maior montanha de deveres de casa que Harry já vira na vida. Nesse tempo, o time da Grifinória treinou Quadribol em todos os climas, na chuva, no calor escaldante. Porém, Harry tinha uma preocupação incomum. Não tinha tempo para descobrir o que fosse sobre Rey Colapogge, estava totalmente por fora do assunto, sem falar que os Níveis Incrivelmente Exaustivos em Magia estavam se aproximando cada vez mais.
 Após a aula de duelos, Rony ficara realmente abalado. Pela segunda vez, Lestrange não deixara de irritá-lo. Harry não gostava nem um pouco disso, pois acabava com a auto-estima do amigo.
 -Nem liga – dizia Hermione, toda vez que Glanmore fazia uma tentativa de abaixar a moral de Rony.

 A sala comunal da Grifinória estava quase vazia à luz fraca que vinha do crepúsculo afora, Harry, Rony e Hermione estudavam loucamente na preparação para os testes. O prof. Flitwick deixara claro que na próxima aula de aprenderiam os feitiços avançados que eram sempre cobrados nos NIEM’s.
 Enquanto preparavam vinte centímetros de pergaminho sobre Transfiguração humana elementar, Harry coçou a cabeça, lembrando-se dos últimos dias. Não estava sendo fácil para ele, não estava sendo fácil para ninguém. Algo ali precisava de mudanças drásticas.
 A cada segundo que se passava Harry achava mais difícil se concentrar. Olhou para a coruja que voava lá fora, escondida pelas nuvens à altura do castelo. Ela tinha liberdade. E ela tinha um objetivo bem definido de viver, entregar cartas e cumprir as vontades dos bruxos. E ele, tinha algum objetivo agora? Seu único objetivo sempre fora deter Voldemort, mas agora que ele se fora, ele ficou sem ter o que fazer. Estava no seu último ano na escola e ainda não tinha uma vida esquematizada para quando saísse. O que ele faria? Moraria de favor com os Weasley? Não, definitivamente não poderia. Morar sozinho no Grimmauld Place? Ele não conseguiria... Harry viu a chuva fraca, de repente, batendo nas janelas, e se sentiu levemente inspirado. Poderia fugir com Gina? Ir morar sozinhos em uma vila calma e tranqüila, passar todos os anos por lá? Duvidava que os pais de Gina deixassem, e ele não os culpava. Aliás, ele e Gina ainda eram muito novos para irem morar juntos.

 -A Profª. Sprout não demorará a chegar – disse Hermione, quando Rony já se impacientava. Estavam esperando ali à apenas cinco minutos, e nem os alunos da Sonserina tinham chegando ainda.
 -Ora, ora, ora, quem diria. Weasley está estressado com a professora de Herbologia.
 Harry virou a cabeça e uma pontada de desgosto o atingiu: Estava ali Glanmore Lestrange, e ao seu lado um rapaz louro e baixinho, que Harry se lembrou com remorso do seu primo Duda. Enfim, Lestrange era a pessoa que ele menos queria ver no mundo, naquele momento. Rony olhou, também. Harry notou as orelhas do amigo ficarem vermelhas.
 -Vá embora – disse Hermione, puxando Rony pelo braço.
 -Ir embora? – disse Glanmore, com cara de nojo. - Creio que você – disse sublinhando a última palavra – irá me obrigar, não?
 Harry viu as mãos de Lestrange irem até o bolso da frente e tirarem uma varinha, fina e negra.
 -Espero que se lembre – disse Harry, dando um passo à frente e encarando Glanmore nos olhos. – do que aconteceu da última vez, Lestrange. Da última vez que você se atreveu à mecher com meus amigos.
 Glanmore continuou sério, mas seu rosto ficou instantaneamente púrpura.
 -Como ousa...? – Glanmore ergueu a varinha.
 Como resposta, Harry, Rony e Hermione, junto do amigo de Lestrange que não sabiam o nome, todos ergueram as varinhas.
 Lestrange estremeceu, seu rosto inexpressivo foi tomado pelo ódio. Era óbvio que Harry não duelaria ali com ele, à não ser que ele enfeitiçasse um dos amigos ou ele próprio.
 Glanmore abaixou a varinha, se virou e saiu, a capa negra esvoaçante às suas costas. Harry trocou um olhar com os amigos, e percebeu Rony ligeiramente abalado.
 -Pelo amor de Deus, Rony – disse Hermione. – Quantas vezes vou ter que repetir? Ignore-o. É Draco Malfoy novamente, não percebe?
 Hermione tinha razão. Harry pensara que estava livre de pessoas como Draco, mas pelo visto se enganara. Por um momento, também, pensou que Draco, assim como Duda, havia mudado de caráter, mas após a guerra passada não tiveram maior contato, e Harry não fazia a menor questão de que o tivessem.
 Neste exato momento, a Professora Sprout chegou às estufas. Seu cabelo estava amarrado em um coque na nuca, grandes luvas de couro de dragão e um avental, com vestes alaranjadas e o símbolo da Lufa-Lufa no peito.
 -Professora – disse Hermione. – Hogwarts cultiva plantas assassinas?
 -Sim cultivam. – respondeu a professora Sprout. – Aliás, devo ressaltar que Hogwarts é uma grande cultivadora dessas plantas. Existem cerca de duzentas plantas vivendo no lago aquecido, que fica ao lado do lago negro. Esse lago aquecido foi feito somente para a cultivação.
 -Professora – perguntou Hermione, novamente. – Se Hogwarts cultiva as plantas assassinas, por que não pode trazê-las...?
 -Trazê-las para as estufas? – admirou-se a professora Sprout. – Certamente, planejava fazer isso, Srta. Granger. Aliás, garanto que se algum de vocês resolver ser Herbólogo mais pra frente, precisarão saber tudo sobre essas plantas.
 -Essas plantas servem para alguma coisa além de atacar pessoas? – perguntou uma aluna da Sonserina.
 -Certamente – respondeu a professora. – Essas plantas podem ser muito úteis para se curar doenças causadas por outras plantas. Uma curiosidade: O antídoto para o veneno da planta assassina é obtido através do próprio veneno da planta assassina. É claro, após uma grande transformação, é transformada em uma poção, mas isso é com o Prof. Slughorn.
 ’’Aliás, ’’ continuou a professora ‘‘As propriedades da planta assassina não se limitam apenas para o bem medicinal. Da raiz dela é feita a Poção do Morto-Vivo. Vocês já devem ter ouvido falar da raiz de cuia, não?’’
 -Sim – disse Dino Thomas. – O professor Snape citou na nossa primeira aula de Poções, lá no primeiro ano.
 -Certamente – disse a professora. – Creio que gostariam de saber que ‘’Cuia’’ é um nome adverso da planta assassina. Sabem, chama-la pelo nome sempre não é muito agradável. Então, não me pergunte quem, pois foi a algum tempo, criaram essa alcunha para a planta.
 Durante o resto da aula eles continuaram a estudar as propriedades das plantas. Hermione sozinha arrecadara trinta pontos para a Grifinória respondendo corretamente às perguntas da professora.
 -Estou tão ansiosa – disse Hermione, enquanto subiam das estufas em direção ao castelo. – Sempre quis ver uma planta assassina.
 -Por que alguém iria querer ver uma planta que quer te matar? – perguntou Rony, incrédulo.
 Hermione lançou-o um olhar severo, mas divertido, apesar de não responder.
 Foi aí que aconteceu uma coisa engraçada, que atiçou a mente de Harry para seis anos atrás: Pela escada do Saguão de entrada, escorria água, que aparentemente vinha do banheiro da Murta.
 -Olhe – disse Harry apontando, e os dois viraram.
 Hermione franziu a testa e encarou-o.
 -Será que Murta inundou o banheiro de novo?
 -Só saberemos se formos até lá, não é?
 Os três subiram as escadas e chegaram ao banheiro, e confirmaram: Por baixo da água escorria a água gelada, e o barulho de torneiras abertas soavam fracamente através da porta. Juntos, os três entraram.
 Estava difícil se locomover por ali: A água vinha até o meio da canela deles. Harry foi até a pia, que se lembrou com arrepio que era ali a entrada da Câmara Secreta. Harry desligou as torneiras e o efeito foi instantâneo: Um choro baixo e soluços vinham pelo segundo Box de madeira.
 Os três se uniram e foram até a porta. Hermione foi quem a abriu.
 -M... Murta? – disse Hermione.
 E ali estava ela. O fantasma de uma menina morta a dezenas de anos pelos poderes de Riddle levantou temerosa, a cabeça e os encarou através dos óculos cinzentos.
 -O que vocês querem? – disse murta, com a voz constringida.
 -Nós vimos a água escorrendo pelo corredor, então viemos investigar. – disse Rony.
 -E o que é que vocês têm a ver com isso? – disse murta, virando as costas para eles.
 Hermione trocou um olhar com Harry.
 -Bom... Nós somos seus... Hm... Amigos, não? – disse Harry. - Achamos que deveríamos vir ver o que é que você tem.
 -Você mente, Harry Potter – disse murta, e novamente caiu no choro.
 Harry se sentiu de mãos atadas. No fundo sabia que Murta chorava por qualquer coisa, mas algo no silêncio sussurrava para ele que tinha algo errado nessa história.
 -Não é mentira – disse Rony. – Nós gostamos muito de você. É verdade.
 O choro de Murta enfraqueceu devagar. Ela se virou de frente para eles de novo.
 -Por que é que se preocupariam comigo? – disse Murta. – Vocês são bruxos! Vocês têm uma vida! – ela sublinhou a última palavra.
 -Por que nos preocuparíamos? – disse Rony. - Por que os bruxos geralmente se preocupam com seus amigos.
 Murta olhou para Rony.
 -Vou... Vou dizer o que aconteceu.
 Harry se sentiu aliviado. Enfim Murta iria desabafar.
 -Eu... Eu estava... Eu estava sentada perto da janela, quando um homem entrou pela porta.
 -Um homem? –disse Hermione. – Que homem?
 -Como é que eu vou saber? – disse Murta, irritada. – Ele não se apresentou, não é? Mas eu gritei para ele sair, que ali era um banheiro de meninas... E então... Ele usou bruxaria em mim!
 Rony franziu a testa.
 -Ele tentou enfeitiçar você?
 -Isso mesmo. Mas ele não conseguiu, e acertou a janela – disse Murta apontando.
 Harry olhou na direção em que a fantasma mostrava e viu a janela quebrada.
 -Mas por que alguém usaria magia em um fantasma? – disse Rony.
 Na hora Harry sentiu a mudança no clima do banheiro. A expressão triste de Murta foi substituída por um olhar Mortal em Rony.
 -Por que, não é, Weasley? Esse homem riu da minha cara.
 -O que ele veio fazer aqui? – perguntou Harry, desconfiado.
 -Não sei, Harry. Acontece que depois que ele tentou me enfeitiçar eu gritei por Pirraça, e sim, ele apareceu.
 Murta parou um pouco, soluçando, engolindo as lágrimas.
 -E ele atacou Pirraça também? – perguntou Hermione.
 -Não, talvez tenha considerado Pirraça simpático e eu não. Ele olhou para Pirraça e tentou fugir, mas Pirraça jogou nele balde de água. Esse homem escorregou na água e bateu a cabeça na parede, e quando Pirraça começou a gritar ‘’homem no banheiro da Murta’’, ele fugiu. Mas no momento em que bateu a cabeça, algo se desprendeu dele... Acho que talvez seja um medalhão, um colar, não sei. Não me aproximei. Mas ele não percebeu que esse objeto caiu, só fugiu, desapareceu porta afora.
 Harry achou esse fato estranho.
 -E onde está esse objeto? – perguntou.
 Murta olhou perto da porta e apontou.
 Harry, Rony e Hermione olharam também. E estava ali: Algo que eles não perceberam antes refletia um brilho dourado. Harry andou até lá e recolheu.
 -Harry – disse Hermione. – Tem as iniciais... Dele!
 Harry confirmou. Não conseguia mais pensar, pois ali no medalhão, feito de ouro maciço, tinha duas letras apenas. Um ‘’R’’ e um ‘’C’’.
 Rey Colapogge, disse a si mesmo.
 -Você acha que ele está aqui? – sussurrou Rony.
 -Eu acho que... – disse Hermione. – Só pode ser o homem que Murta viu aqui no banheiro!
 Harry refletiu. Sim, estava certa, como sempre.
 -Mas... – disse Rony. - Se ele realmente está em Hogwarts, já deveria ter agido, não?
 -Talvez – disse Hermione. – Vamos para a sala comunal. Preciso contar lhes contar algo.

 Logo chegaram à sala, e se aconchegaram no canto conhecido próximo à lareira.
 -Então, Hermione? – disse Rony, ansioso.
 Hermione hesitou.
 -Bem... Quando estávamos subindo para o castelo... Eu vi uma coisa... Hm... diferente.
 -E o que era? – perguntou Harry.
 Hermione suspirou.
 -Ah, Harry... Eu vi um unicórnio morto.
 Harry se surpreendeu. Os unicórnios eram muito raros, até mesmo na Floresta Proibida.
 -Aonde quer chegar? – disse Harry.
 -Bem – continuou a amiga. – Depois disso que Murta disse... Acho que, se Colapogge está em Hogwarts, também deve ser ele que atacou o unicórnio.
 -Mas por que acha isso? – perguntou Rony.
 -Por que, Rony, percebi que o sangue do unicórnio estava muito ralo. Alguém o matou e bebeu o sangue!
 -Mas no que isso ajuda a descobrir que foi Colapogge quem matou o unicórnio? Poderia ser qualquer outra pessoa. – questionou Harry.
 -Não, não poderia, Harry – disse Hermione. – Só uma pessoa muito, mas muito má, poderia fazer isso com o unicórnio. Quem em Hogwarts seria tão mal à esse ponto?
 -Voldemort? – arriscou Harry.
 Rony se arrepiou.
 -Você-Sabe-Quem está morto, e nunca irá voltar! – afirmou Rony. – Você, mais do que ninguém, sabe disso!
 -É claro! – disse Hermione. – É claro que é Colapogge!
 -Mas se ele tem Horcruxes, para que precisaria do sangue? – arriscou Rony.
 -Pois é – respondeu Hermione. – Talvez a Horcrux tenha se desintegrado durante os anos que passaram. Talvez alguém a tenha destruído, talvez Rey Colapogge tenha algum motivo especial!
 Harry não confiou muito na hipótese. Viu as chamas pularem na lareira, mas de nada ajudaram a clarear sua mente.

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