Eternidade (Parte 2)



Eternidade – Parte 2





Não foi algo completamente consciente, foi só um desejo, mal e mal expresso num canto da mente. A atenção de Harry estava em Gina e nos passos dela até ele, naquele pedido dividido de que ela corresse para abraçá-lo e que também nunca chegasse até ele. Ainda assim, da mesma forma que se faz duas tarefas ao mesmo tempo, um canto rebelde da sua mente funcionava. Não tinha a menor intenção de facilitar.

Então, o céu se cobriu de grandes e pesadas nuvens e logo as estrelas começaram a desaparecer.

Gina parou bem na frente dele. Tinha entrado sem nenhum problema no círculo de proteção. O rosto sereno, distante. Atrás de Harry, Hermione chorava baixinho.

Ele esticou os braços e tocou as mãos mornas da esposa, depois a fez chegar mais perto e colocou os braços dela em torno do seu pescoço. Alguém reclamou em voz alta e foi silenciado, mas Harry não deu a menor importância. Abraçou Gina com todo o seu coração, afundando o rosto nos longos cabelos dela, respirando-a, sentindo-a real e sólida em suas mãos. Cada noite das últimas duas semanas, e os dias que esperavam aquelas noites, voltando a sua mente como um pesadelo distante.

– ‘Você prometeu que não viria sozinho.’

O abraço afrouxou por um segundo. –‘Gina...’ – e então ficou muito, mas muito mais forte. Ele poderia absorvê-la pela pele para mantê-la segura. – ‘Eu achei que você... Como?’

– ‘Erva moli’ – Gina sussurrou de volta. – ‘Livrou a mim, Hector, Mel e Josh de cairmos em transe’.

– ‘Essa é a minha amiga!’ – Exultou Hermione por entre as lágrimas, que mudaram de tom.

– ‘Mione? Graças a Deus!’ – Gina deu um suspiro discreto. – ‘O que faremos?’

Não temos a noite toda, Potter! – berrou Bellatrix, cheia de tédio.

O céu já era um breu sem fim e o vento de chuva que vinha do alto tornava as tochas cada vez mais obsoletas.

– ‘É você que está mudando o tempo, Harry?’ – perguntou Hermione lucidamente.

– ‘Não sei no que poderá ajudar, talvez confundi-los... Não conseguiremos atacar e proteger as crianças ao mesmo tempo’.

– ‘Hector, Mel e Josh podem nos dar alguns segundos’ – falou Gina, com urgência, mas não explicou como as três crianças fariam isso. – ‘Temos algum plano?’

– ‘ Lutar!’ – disse Harry e Gina, sem poder apertá-lo com os braços apenas retesou o corpo contra o dele. Isso, em geral, queria dizer que ela concordava.

– ‘Ótimo! Por que eu não pretendo entregar nem você, nem Lyan para eles’.

– ‘Mione’ – chamou Harry e sentiu a amiga chegar mais perto – ‘vamos criar uma confusão e você pega o Lyan. Eles não podem vê-la e isso é a nossa vantagem, vão atacar a mim e a Gina’.

– ‘Certo, mas terei de partir o círculo de proteção feito pela espada, já que vamos nos separar’. – Ela fez uma pausa mínima, dando a noção do quanto aquilo era sério. – ‘Pegarei Lyan e correrei para junto das outras crianças’.

Harry concordou, mas só Gina poderia ter percebido.

– ‘Coloque os pequenos sob a capa de invisibilidade. Tentaremos lhe dar o maior tempo possível’.

– ‘Ok! Harry? Precisamos atrasá-los em umas três horas. Assim, não poderão fazer qualquer ritual’.

Harry a sentiu se afastar, certamente indo em direção à Marmodeu. Gina rosnou uma praga que Harry já ouvira muitas vezes na boca dos irmãos dela. Ele se limitou a soltar o ar.

– ‘Vai ser moleza’ – garantiu sem nenhuma confiança. – ‘Está comigo?’

– ‘Para o que der e vier’.

O rapaz de afastou e tomou os braços dela, tirando-os da volta do seu pescoço. De forma visível e dramática, ele retirou a faca das mãos de Gina. Os Comensais se mexeram e Harry sentiu a excitação crescendo entre os beusclainhs. Alguns Comensais deram berros de triunfos e até gritaram incentivos para que Harry fizesse logo. Ele dobrou os braços de Gina colocando os em seu peito, a mão direita dela, exatamente sobre o Graal, que aqueceu intensamente.

– ‘O que é isso?’

Harry voltou a abraçá-la, deixando seu o corpo bem perto do dela. Ele ergueu a faca e, ainda com pausas dramáticas para a assistência, hesitou.

– ‘Você não acreditaria. Mas mandaram te entregar e... confiar. Pode pegá-lo discretamente?’

Resguardada pelos seus braços, Gina moveu a mão pequena, de forma quase imperceptível, e retirou a pedra do seu bolso. Uma luzinha verde sumiu entre os dedos da garota.

– ‘E agora?’ – ela quis saber.

Um raio. Um trovão. E a chuva começou a cair intensamente sobre a ilha. Algumas vozes reclamaram.

– ‘Lhe ocorreu alguma coisa?’ – Harry tinha esperança de que os poderes da sétima se revelassem ao contato com o Graal, porém Gina negou num sopro baixo. Ele ficou decepcionado, embora não tenha chegado a se surpreender. Era melhor tentarem lutar com o que tinham. – ‘Quem está com a sua varinha?’

– ‘Malfoy’.

– ‘Excelente! E as dos garotos?’

– ‘Acho que o Throop.’

Harry respirou o mais fundo que pode e moveu a faca na mão para calar os gritos que reclamavam que lê fizesse de uma vez. Mas a verdade é que um pouco da hesitação era real. Nunca usara os poderes que tinha da maneira que precisava usar naquele momento. Nunca se testara, nunca chegou a compreender totalmente a sua extensão e, naquele instante, ele lamentou não ter contado mais cedo para Hermione. Ela o teria ajudado a entender, equilibrar, conhecer, lhe daria segurança. Gina pareceu acompanhar em parte o rumo dos seus pensamentos.

– ‘É só fingir que tem uma varinha na sua mão. Você tem feito isso nos últimos nove anos. Vai dar certo, estamos juntos!’

Se pudesse, Harry teria sorrido. A chuva apertou, mas Comensais e beusclainhs continuavam firmes no círculo à volta dos dois. Ele viu Mefistófeles consultar o céu parecendo intrigado, mas antes que o demônio pudesse começar a pensar, Harry voltou a erguer a faca, inclinando-a em direção às costas de Gina. O círculo pulsava de tensão.

– ‘Eu te amo’ – disse definitivo.

– ‘Também te amo’ – ela respondeu confiante.

Como uma flecha, a faca saiu da mão de Harry, mas desviou o curso e, cruzando o ar, foi se enfiar com toda a força na coxa de Marmodeu. O demônio soltou um berro gutural e antes que qualquer um pudesse sequer se mexer, as coisas seguiram uma seqüência de caos e confusão. Harry só teve tempo de perceber que Lyan tinha sido arrancado dos braços frouxos da criatura e que tinha sumido no ar. No mesmo instante, um outro grito, de tom completamente diferente, se elevou acima do som da chuva decidido a rasgar os tímpanos de quem estivesse por perto. Os beusclainhs que estavam próximos de Mel taparam os ouvidos instintivamente, mas logo precisaram também se proteger das pedradas. Uma atingiu um deles com tal violência que o olho começou a sangrar, outra bateu na nuca do segundo e o deixou deitado. O terceiro tentou avançar para os meninos, mas foi atingindo por uma azaração no rosto e ficou grogue.

Os Comensais e os demônios ficaram momentaneamente perdidos. Ataques mágicos começaram a sair das mãos nuas de Harry Potter e logo a confusão aumentou. Uma varinha apareceu nas mãos de Gina e ela também passou a distribuir azarações onde quer que acertasse. Lucius Malfoy procurou pela varinha que guardava, mas ela não estava mais ali. Quando Enos Throop fez o mesmo, uma azaração vinda do nada o derrubou e, de dentro de suas vestes, as varinhas de Hector, Mel e Josh saíram correndo para alcançar os seus donos. Segundos depois, incômodas azarações infantis impediam os Comensais de duelarem porque eles precisavam se coçar ou controlar as pernas bambas ou tinham ataques de riso que nada tinha a ver com a situação. Mas as pedras não pararam de voar, os meninos as alternavam com as azarações. Enquanto Harry corria com Gina segura pela mão em direção ao local onde estavam as crianças – o altar de pedra –, várias pedras atingiram os Comensais preferencialmente nas partes baixas, o que era bem eficiente para deixá-los fora de combate. O expediente, é claro, não funcionou nem com Bellatrix Lestrange, nem com Aleto Carrow, que logo passaram a atacar selvagemente e, não fossem as impedimentas que saíam do nada – que era Hermione sob a capa de invisibilidade –, elas teriam acertado um dos meninos.

Os gritos dos Comensais e dos demônios enchiam o ar, carregados de ira e ameaças, e Voldemort, ainda sem condições de fazer magias, urrava frenético para que impedissem Harry. Contudo, um feitiço escudo sobre o casal, que corria saindo do centro do círculo para a borda, impedia os Comensais de atingi-los. Harry viu quando Hermione apareceu ao lado das crianças maiores e percebeu que Chantal e os meninos sumiram rapidamente. Ele presumiu que a amiga os tinha escondido sob a capa de invisibilidade e, talvez, os colocado em maior segurança na parte debaixo do altar de pedra cinzenta, usando-o como um escudo para os pequenos.

Segundos depois, ele e Gina estavam agrupados com ela e os garotos, atacando e defendendo como podiam. Os demônios não eram muito bons em feitiços para duelar e essa falha em seus poderes ativos estava ajudando bastante. Mas eram seis bruxos (três menores) contra uns cinqüenta, somando Comensais e beusclainhs. Mesmo que Harry valesse, em tese, por mais de um, ele se perguntava se seria o suficiente para manter as defesas do seu grupo pelo tempo que precisavam.

Marmodeu havia arrancado a faca da perna e, antes que Harry pudesse fazer algo a respeito, a faca voou e atingiu Hector de raspão no braço esquerdo. Mel e Josh pararam de atacar para socorrê-lo. Em represália, um feitiço rápido de Hermione rasgou o corte na perna do demônio ainda mais e ele caiu berrando de dor. Mefistófeles lançou uma bola de fogo que Harry desviou para o mar, mas que, por azar (ou sorte) levou um Comensal e um demônio junto com ela. O cerco fechava. Um sectumsempra cortou a perna de Gina, que revidou imediatamente com um estupefaça, mas não foi possível ver se ela tinha atingido alguém. Harry desconcentrou com os ataques e não foi atingido por centímetros por um raio roxo que saiu da varinha de Bellatrix Lestrange. McNair conseguiu lançar um feitiço que atingiu Mel no peito e a menina caiu. Uma saraivada de pedras foi a resposta que ele recebeu de Hector e Josh, algumas certeiras nas partes mais dolorosas, deitaram o Comensal. Depois, os dois arrastaram a amiga e a esconderam também sob a capa de invisibilidade.

Um novo trovão rasgou o céu, mas Harry teve certeza de que dessa vez não havia sido obra dele. Seguiram-se outros trovões e então a cabeçorra de um dragão surgiu entre as nuvens e arremessou fogo. Os beusclains berraram. Hermione também.

– RONY!

Mas foi Carlinhos quem apareceu primeiro. Logo depois, dragões montados por cavaleiros passaram a circular o céu em torno da ilha. Harry reconheceu Rony, Neville e Hagrid entre os bruxos que, com alguma dificuldade, controlavam as difíceis montarias. Devia haver uma dúzia de dragões, batendo as asas e rosnando excitados com cheiro de guerra, lama e feitiços que se elevava da ilha. Pelo visto, suas nuvens de chuva tinham servido para mais do que apenas confundir seus inimigos. Elas, provavelmente, tinham mostrado o local aos seus amigos.

Harry nem bem tinha se regozijado com a chegada do pelotão, quando as nuvens se rasgaram novamente dando passagem a um segundo grupo montado em vassouras e que passou a combater com ferocidade os Comensais da Morte e os demônios. Alguns pousaram para poder lutar mais desembaraçados, entre eles os rapazes Weasley, Olho-Tonto, Remus,Tonks e Kingsley. Harry viu a cabeça loura de Luna Lovegood, ainda montada de lado em uma vassoura, derrubar Aleto Carrow, mas viu também quando um feitiço do irmão de Aleto, Amico, fez com que Otuwani Shacklebolt caísse de cara no chão barrento.

A luta se intensificou, só que agora em mais de uma frente de combate. A chuva diminuiu consideravelmente e logo parou. Os números tinham se invertido com desvantagem para os Comensais. Harry viu Snape e Enos Throop travando um duelo feroz e, logo adiante, Remus duelando sem tréguas com Yaxley. A escuridão e a fumaça das tochas apagadas pela chuva não permitiam distinguir muito mais.

Os dragões urravam espalhando pavor, mas Harry notou que seus cavaleiros os controlavam para tentar acuar os demônios e soltar fogo apenas na direção do mar. Um jorro mal calculado e se perderia mais aliados do que inimigos. Assim, a batalha maior era em terra.

A situação, porém, não se manteve por muito tempo. E a esperança de que os ataques a ele, Gina, Hermione e as crianças fossem mais fracos, com a chegada dos reforços, sumiu assim que Harry percebeu que “seu exército” parecia lentamente diminuir em número. Não porque estivessem sendo derrotados, mas porque o caldeirão de Pwyll, sob o comando de Jarbon, passara a vomitar soldados inferi armados com espadas e machados que entraram na luta já de forma desigual. Violentos e sem compaixão, eles superavam rapidamente em números a capacidade dos bruxos de rechaçá-los. Harry viu alguns dos seus, que ainda estavam nas vassouras, serem derrubados por eles, que chegavam a pular em três ou quatro e, quem quer que fosse o atacado, sumia em meio a ossos e carne morta, sem que se pudesse saber se ele conseguiria ou não se livrar.

Um machado grande atingiu a montaria de Rony com enorme força no pescoço e esta se descontrolou, furiosa. O cheiro do sangue fresco fez com que o dragão montado por Neville – e que era de uma raça diferente – atacasse o de Rony. Uma outra guerra começou no céu e Carlinhos se aproximou dos dois berrando ordens e jogando feitiços para tentar conter os dragões briguentos. Alguns dos colegas de Carlinhos fizeram o mesmo. Entretanto, as montarias eram fortes e estavam sedentas de sangue e excitadas demais para serem acalmadas. Sem conseguirem controlar seus animais e correndo risco, Rony e Neville resolveram pular para o solo, sem que Harry pudesse ver onde e como tinham caído. As coisas começaram a degringolar rapidamente, agora. Como Hermione tinha previsto, a superioridade numérica caiu com grande velocidade na medida em que o caldeirão maldito continuava a despejar soldados que, já sendo mortos, caíam apenas para levantar a seguir, resistindo aos feitiços lançados contra eles e atacando impiedosamente.

Mesmo com os clarões dos feitiços e o fogo dos dragões era difícil saber quem estava vencendo ou quem ainda estava em pé. Seria impossível manter a todos em segurança e Harry conseguiu apenas registrar que Gina continuava ao seu lado, lutando. Hermione estava a poucos metros e ele pode ver Rony correndo e brigando para ficar perto dos três. Atrás deles, as crianças e Lyan.

Acontecesse o que acontecesse, em algumas horas, ao menos seu filho estaria salvo. Harry continuou a atacar.





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Toda a preocupação de Draco Malfoy era ficar fora da linha de fogo dos dragões. Mal podia acreditar que o bando de idiotas tivesse trazido animais como aqueles para uma batalha de vida ou morte. O que esperavam? Que eles se comportassem como cachorrinhos treinados? Ao menos o irmão brucutu de Rony Weasley parecia saber o que fazia e tinha conseguido afastar os dragões que estavam se atracando. Mas isso desfalcara o pelotão comandado por ele pela metade. Os outros continuaram circulando a ilha e abocanhando qualquer demônio que tentasse fugir.

Mesmo procurando evitar a linha dos feitiços, Draco precisou se aproximar umas duas vezes para tentar achar o pai. Em sua segunda investida, quase foi derrubado por dois inferi que se jogaram contra sua vassoura. Desviou dos dois mais por sorte que reflexo e, ao olhar para trás, viu Hagrid pulando de seu dragão e achatando os dois e mais um volume que ele não pode identificar. Pensaria em agradecer ao bobão se ele sobrevivesse. Afinal, Hagrid ainda lhe devia aquela do hipogrifo.

Ladeando a vassoura, Draco tomou alguma distância enquanto amaldiçoava as capas e capuzes dos Comensais, não fosse isso já teria localizado o pai. Para seu alívio, não tinha dado uma volta completa na ilha quando viu os longos cabelos prateados de Lucius. O capuz havia escapado enquanto ele se defendia dos ataques furiosos de um outro homem que, ao chegar mais perto, Draco reconheceu como sendo Artur Weasley. O rapaz virou a vassoura na direção dos dois e deu velocidade. Aquela não era realmente a hora de Malfoys e Weasleys resolverem as diferenças. Não quando Draco tinha um acordo com Harry Potter, selado com um Voto Perpétuo, para tirar Lucius de combate. Pousou a uma distância segura deles, atrás de uma grande pedra calcárea, e ficou pensando em como separá-los.

Nunca mais! – vociferava Artur Weasley. – Nunca mais... ouse chegar perto... da minha família!

Para estranhamento de Draco, Lucius não atacava, apenas se defendia. Uma suspeita imediatamente lhe varreu a mente. De algum jeito, Potter tinha avisado ao seu pai do Voto Perpétuo. Não era bem assim que Draco queria que ele soubesse do acordo pela sua vida, mas... Isso também lhe trazia a única alternativa possível na situação.

Petrificus Totalus!

O Malfoy mais velho uniu braços e pernas e caiu duro no chão para o espanto de Artur Weasley. Draco saiu de trás da pedra em que estava escondido, a varinha firmemente presa nas mãos. Artur ergueu os olhos para ele e Draco não gostou nem um pouquinho do que viu ali. Pena.

– Tire-o daqui – rosnou o Weasley. – É melhor ficarem fora do caminho.

E dizendo isso, ele se virou voltando a combater quem lhe aparecesse pela frente. Sem esperar outra admoestação, Draco se pôs a puxar o corpo inerte do pai até conseguir escondê-lo atrás da pedra, que ficou lhes servindo de escudo. Ele ainda olhou pelo lado para ver se alguém os havia percebido, mas a guerra comia solta, sem eles. Apontou a varinha para o pai.

Finite Incantatem!

Lucius piscou firme e, depois de alguns segundos se localizando, fixou os olhos no filho.

– Draco? DRACO! – Na mistura de alívio e exasperação, a segunda emoção ganhou e logo depois de um rápido abraço, veio um safanão. – Por Mérlin, o que deu em você? Tem idéia do que fez, garoto idiota?

O rapaz saiu das mãos do pai.

– Tenho sim! Comprei a nossa passagem de volta para a nossa vida!

– Você enlouqueceu?! Tem idéia do que farão com você se o Lord descobrir?

– “Seu” Lord já perdeu uma vez, pai. E o que foi que conseguimos? Você passou nove anos numa prisão imunda e eu...

– Você me abandonou.

– Ah, você ia se sentir melhor se eu tivesse ido para a cadeia com você? Ou fosse lhe fazer visitas enquanto sofria humilhação pública por ser um desertor do lado que perdeu?

Draco ofegou e o pai baixou os olhos, mas ele prosseguiu.

Ele pode perder de novo, sabe? Caso ganhe, terá de matar Potter e os amigos dele e ninguém vai poder contar o que eu fiz. Mas, se ele perder, eu terei a nossa fortuna de volta e poderei impedir que te deixem apodrecendo em Azkaban!

O som da batalha se ergueu acima da discussão dos dois e talvez um feitiço tenha atingido a pedra que os escondia porque ela estremeceu. Draco e Lucius protegeram as cabeças dos pedregulhos que rolaram sobre eles. Foi Lucius quem falou.

– Você está do lado dos homens que mataram a sua mãe.

– Foi um acidente – disse o rapaz, com exasperação.

– Você não pode acreditar nisso! – rosnou Lucius. – Eu... eu...

Draco encarou o pai com grande seriedade. Não se lembrava de jamais ter olhado nos seus olhos daquela maneira ou de ter feito o pai calar.

– Não se trata de acreditar. Eu lembro... Lembro de ele dizer que seu eu falhasse mais uma vez, ele me mataria. Se você falhasse mais uma vez, ele me mataria. Se ela falhasse... Ela falhou pai. Eu falhei. Foi seu precioso Lord que a mandou para morte.

– Potter e Longbotton...

– Potter e Longbotton não matariam uma mosca se pudessem evitar! Acha que dois tontos como eles fazem isso por diversão?!

Agora era Lucius que parecia ter corrido centenas de milhas e ofegava. Mas Draco não iria lhe dar chance de continuar a discutir.

– Ficaremos bem desde que não nos metamos nessa briga. Quando acabar... os dois lados nos receberão. Agora levante! – Ele puxou o pai pelo braço e este não ofereceu resistência, parecia, de repente, cansado e velho. – Temos de buscar um abrigo melhor. Tem como entrar na fortaleza? Pai?

– Tem – respondeu Lucius. – Por aqui, filho.

Os dois seguiram se esgueirando e se mantendo nas sombras. Circularam a ilha indo pelo lado mais externo, a poucos metros do desfiladeiro que se precipitava para o mar. Vez por outra, olhavam em direção à batalha, mas era impossível ver quem vencia. Um dragão passou tão perto que o vento das asas quase os derrubou, trazia dois inferi na boca. Eles apressaram a marcha. Lucius apontou sem falar para um declive no solo e Draco pode ver uma aldrava saliente sobre a grama e que marcava uma porta de entrada. Então, um feitiço passou zunindo na frente dos dois, quase atingindo Draco. Lucius o retirou pelo cangote da linha de ataque.

– Bom ataque – a voz da tia de Draco, Bellatrix, era puro desdém. – Mas nem se vocês sete se juntassem seriam páreos para mim!

Ainda escondidos, Draco e Lucius observaram Bella duelar ao mesmo tempo com Fred e Jorge Weasley. Um feitiço da bruxa jogou Fred a metros de distância, fazendo-o bater fortemente contra uma das pedras do círculo. O rapaz não levantou. A raiva com que Jorge voltou a atacá-la não ajudou em nada a melhorar a sua situação, ele perdia terreno continuamente. Contudo, quando as coisas pareciam feias de verdade, Percy Weasley apareceu ao lado do irmão.

Vamos, Draco!

Mas o rapaz não se moveu. Procurou localizar Potter com os olhos e também ao Lord Trevas. Não havia nem sinal deste último, mas Harry Potter estava no centro da situação toda, jogando feitiços poderosos com suas mãos nuas. Estava lá. Sendo heróico e com toda aquela gente disposta a morrer por ele. Estava pensando isso e em nada mais quando apontou a varinha e lançou um feitiço que empurrou Percy Weasley para longe de uma maldição lançada pela tia.

Você enlouqueceu completamente! Não se meta! – berrou Lucius.

Bellatrix procurou desvairada pela fonte do feitiço e seus olhos estreitaram ao localizar os dois Malfoys. Mas os irmãos Weasley continuaram a lhe dar combate e ela não pôde ir atrás deles, como Draco sabia que era a sua vontade. Ele olhou para a própria varinha, incrédulo com o que tinha feito, e talvez tivesse ficado um longo tempo tentando entender se o pai não o tivesse arrastado pelo braço. Os dois seguiram meio correndo, mantendo as cabeças baixas e procurando as sombras. A estupefação de Draco com a própria atitude continuava a esquentar-lhe o rosto e gelar-lhe as pernas.

– Chegamos – anunciou Lucius, ofegante.

Ele apontou a varinha para a aldrava. Mas ao invés de pronunciar o feitiço para abrir o acesso à fortaleza, ele deu um gemido surdo e uma luz verde ofuscou os olhos de Draco por um segundo.

– PAAAI!!

Lucius caiu inerte como uma marionete cujas cordas tinham sido cortadas. Draco ficou lívido, estático. Seus olhos presos ao corpo do pai, cujo rosto afundara na grama molhada, os braços e as pernas tinham ângulos estranhos e os cabelos prateados faziam um aro esquisito em torno da sua cabeça. Draco sentia como se tivesse sido congelado até a sua consciência. Podia sentir a pele pesando sobre os ossos, mas era tudo. Ele nem sequer sabia onde estava.

– Minha mira já foi melhor.

Draco virou a cabeça muito lentamente. Tudo era lento. Alguém tinha diminuído a velocidade do mundo inteiro. E Draco achou que, se parasse, ele poderia descer daquele trem maluco.

Bellatrix parecia ter se livrado dos irmãos Weasley e lhe apontava a varinha, furiosa.

Era para você, seu traidorzinho de uma figa! – Berrou ela. – Minha irmã teria vergonha em ter um maldito como você como filho! – Ela foi se aproximando até estar a pouco mais de um metro dele. Estavam fora da arena de combate, só a alguns metros do mar. – Mas vou lhe dar a chance de pedir desculpas a ela pessoalmente, Draquinho. – Ela posicionou a varinha apontando diretamente para o coração de Draco. – Avada...

Experlliarmus! – berrou uma voz forte e a varinha da bruxa saiu voando e se perdendo na escuridão.

Alucinada, Bellatrix procurou por seu o novo oponente e Neville Longbotton nem sequer piscou. Ele não estava sozinho. Ninfadora Tonks e Percy Weasley estavam com ele.

– Mas que diabos é isso? Uma convenção de filhotes? E eles acham que são o bastante para me derrotar? – Escarneceu. – Vocês se superestimam.

– Para uma bruxa desarmada, você ainda fala alto demais, Bellatrix – disse Tonks com seriedade.

A outra ergueu o queixo em desafio.

– Eu devia ter sido filha única a ter dois abortos como vocês dois como sobrinhos! Um retardado e uma mulher que deita com um mestiço imundo e cria outro!

Dobre a língua para falar do meu marido e do meu filho, sua... vadia!

Bellatrix riu.

– Ora... ela ficou brabinha... O que vai fazer, hein, esquisita? Vai me matar? Desarmada? Não é o seu estilo. Então, me faça o favor de não ficar latindo... O som da sua voz me irrita!

Tonks ergueu a varinha, mas não chegou a enunciar o feitiço.

Incarcerous! – Neville Longbotton disse friamente e cordas saíram de sua varinha e se enrolaram nos braços de Bellatrix, prendendo-a com firmeza. Ela ficou chocada com a audácia, mas o rapaz não lhe deu importância. – Estamos perdendo tempo com ela. Alguém fica de guarda e vamos voltar logo.

– Hã! – debochou a bruxa. – E não é que a besta do Longbotton ficou machinho. Papai e mamãe teriam tanto orgulho...

– Acho que é melhor amordaçá-la também – sugeriu Percy Weasley.

– Não. Vamos deixar ela apagada. – Falou Tonks cheia de raiva. – Me de a honra, Neville.

– Ela é toda sua – disse o rapaz, cheio de desprezo, e se afastando, para dar espaço.

Contudo, não havia muito espaço para Tonks cobrir. A frente deles Bellatrix recuava diante da varinha apontada de Draco Malfoy, que começara a caminhar firmemente contra ela. Por alguma razão, ela não parecia disposta a debochar dele ou de suas intenções.

Draco! Não! – ele não soube se o grito foi apenas de Tonks, embora a voz da prima tenha se sobressaído, mas achou que talvez Longbotton e Weasley também tivessem gritado. Se o mundo não estivesse tão lento, talvez, Draco os tivesse ouvido. Mas só tinha um jeito do mundo acelerar de novo.

Avada Kedavra!

O pasmo no rosto de Bellatrix foi tão grande que seus olhos pesados dobraram de tamanho. Tonks, Neville e Percy correram, mas somente seguraram Draco e ficaram assistindo e bruxa tombar para trás e sumir naquela parte em que o chão acabava e só recomeçava nas pedras, metros e metros abaixo. Vários segundos depois, foi que o mundo começou a voltar ao ritmo normal e Draco percebeu que os outros não o estavam contendo, apenas... de uma forma muito estranha, estavam ali. Com ele.

– Eu vou voltar – anunciou Tonks e começou a se afastar. O rosto dela era só choque.

– Vou com você – afirmou Neville. Havia frieza e uma espécie de exultação na voz dele.

Percy também começou a segui-los.

– Esperem!

Os três se viraram para Draco.

– Vocês não vão me deixar preso?

Tonks olhou imediatamente para Percy Weasley. Dois altos funcionários do Ministério, Draco sabia. Uma Auror e o secretário sênior do Ministro da Magia. Não era gente na frente da qual se poderia cometer um assassinato. Ainda tonto, Draco esticou a varinha, entregando-a.

– Estamos numa batalha, Malfoy – foi a resposta de Percy e Draco achou-o parecido com o pai ao dizer aquilo, apesar do jeito pomposo. – Pessoas morrem em batalhas.

– Eu... mas eu...

– Pode ficar aí com o seu pai – interrompeu-o Neville – ou descer do muro... e lutar.

Draco sabia que tinha a boca aberta e que, por mais que pensasse as palavras não saíam. Seu olhar foi novamente para o corpo do pai e não havia nada em sua cabeça que fizesse sentido. Certo, errado, verdadeiro, falso. Os outros não pareceram dispostos a esperar que sua cabeça voltasse ao eixo. Deram-lhe as costas e correram para a guerra. Eles sabiam porque estavam lutando. Draco mirou a varinha frouxa em sua mão. Ele tinha enlouquecido. Com certeza.

Correu atrás dos outros três.






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Uma nova bola de fogo, lançada por Mefistófeles, se arremessou diretamente para o lugar em que Harry, Rony, Hermione, Gina e as crianças combatiam. Antes, porém, que Harry se atentasse para desviá-la, um dos dragões mergulhou fundo e a engoliu, frustrando a ação dos demônios. Quase ao mesmo tempo, um feitiço de Hermione abateu um grupo de inferi, derrubando-os como peças de dominó. À esquerda deles, dois dos mortos-vivos encurralaram Alicia e os feitiços dela não os estavam rechaçando. Harry mirou nas costa de um deles.

Lumus solei!

A luz quente e amarela atravessou o inferius, que se voltou para Harry antes de tombar. Seu companheiro perdeu o interesse em Alicia e pareceu resolver que iria atrás do novo atacante. Contudo, ao dar as costas para a Alicia, foi derrubado pelo mesmo feitiço, só que agora, pronunciado pela garota. Não houve tempo para comemorar, um Comensal apareceu na sua frente e ela se viu embrenhada em outro duelo. Bem, perto de Alicia, Luna e Colin Creevey estavam às voltas com três soldados zumbis armados de machados, e Olívio Wood tentava vencer outro inferius e um Comensal para ajudá-los. Jorge e Kátia lutavam com as costas para uma pedra, junto a qual, Harry achou que podia distinguir um vulto inconsciente. Não eram os únicos que pareciam proteger um ferido, Lino Jordan estava de joelhos no chão e lançava feitiços enquanto abrigava entre os braços o corpo inerte de Angelina Johnson.

Temos que acabar com aquele caldeirão! – berrou Hermione.

– Estou aberto a sugestões – respondeu Harry sem parar de lançar tudo o que sabia do melhor jeito (nem sempre eficaz) que conseguia. Afinal, era a primeira vez que combatia sem uma varinha, mesmo uma falsa, em suas mãos.

A espada! – Rony lutava furiosamente, protegendo o flanco direito do grupo.

– O quê?

– A droga da espada, Mione! O Snape não disse que ela era capaz de um monte de coisa?

Harry lançou um feitiço escudo que rebateu uma maldição lançada contra Gina e, tão logo ele se desfez, ela retaliou o atacante com um estupefaça no rosto.

– Mas o caldeirão... – argumentou Mione, mas parou para desviar de uma faca arremessada contra ela – seu filho da mãe! – o inferius foi partido em dois e nenhum dos pedaços conseguiu levantar – só pode ser destruído se algo vivo for jogado lá dentro...

– A droga da espada não pode matar! – Argumentou o marido. – Isso tem que dizer alguma coisa!

Harry! – Isso tinha sido Hermione pedindo ajuda, para argumentar com Rony.

Harry estava dividido. Tentar mandar a espada para dentro do caldeirão poderia funcionar – pelo menos pensando da forma criativa que Rony estava sugerindo – e isso os livraria dos zumbis e equilibraria a batalha. Por outro lado, se não funcionasse, eles também perderiam uma arma poderosa.

Tentem! – berrou.

Sem esperar mais, Rony capturou Hermione pelo braço e começou a lançar feitiços, abrindo caminho até o caldeirão. Harry redobrou a atenção no lado que os dois descobriram. Porém, logo Hector e Josh corajosamente se colocaram onde Hermione e Rony estiveram e passaram a dar combate com tudo o que sabiam, até – Harry percebeu – com feitiços que haviam ouvido os adultos enunciarem e que nunca haviam lançado na vida. Isso causava reações estranhas nos atingidos, mas Harry não podia negar a sua eficácia. Algo, porém, os estava ajudando, os Comensais procuravam não lançar maldições mortais que pudessem atingi-lo. Isso significava que as intenções de Voldemort não haviam arrefecido e também que o tempo para o ritual fatídico, ainda não havia terminado.

A atenção de Harry foi capturada por algo se mexendo, quase na periferia do seu olho. Um movimento de cabelos prateados. Tentando manter a atenção à frente e atrás, Harry conseguiu discernir que Fleur estava conseguindo se aproximar do altar, desviando cautelosamente pela parte externa do círculo. Ela obviamente procurava pelas crianças. Harry trocou um olhar de alívio com Gina, precisavam de alguém que montasse guarda naquele ponto. Josh também notou a aproximação da moça e, correndo para ela, mostrou onde os pequenos estavam. Fleur agradeceu e fez o menino baixar a cabeça para escapar de um feitiço. Harry não pode acompanhar o que eles disseram ou fizeram, pois não podia perder a atenção aos ataques contra ele e Gina. Segundos depois, lá estava Josh postado novamente ao lado de Hector e atacando como se fosse gente grande.

A luta de Rony e Hermione para chegarem ao caldeirão estava se mostrando mais complicada a cada minuto. Como se as intenções deles tivessem sido percebidas, os zumbis intensificaram os ataques em torno do casal. Harry estava começando a ficar seriamente preocupado, quando, como que surgido do nada, Hagrid se uniu aos dois amigos. Agitando as mãos enormes como pás de moinho, ele passou a socar e arremessar para longe os inferi liberando o caminho de Rony e Hermione. Os três já estavam a poucos metros quando uma sucessão de coisas fez o coração de Harry quase parar e saltar pela boca.

Preocupado com os feitiços para defender sua posição, Harry só percebeu quando já era tarde demais que uma das bolas de fogo de Mefistófeles havia sido lançada em direção a Hermione. Harry nem pode gritar, embora ouvisse Gina fazê-lo ao seu lado. Rony deu um empurrão em Hermione ocupando o seu lugar e a bola de fogo atingiu-o em cheio. As chamas consumiram o rapaz e ele sumiu no meio delas. Foi como se a batalha houvesse silenciado. Até os ataques pararam. Harry sentiu seus braços frouxos tentando conter Gina, que se arremessara contra ele berrando pelo irmão.

As chamas ficaram mais vivas e então, como se tivessem sido aspiradas por seu próprio centro, elas diminuíram, se concentrando até revelarem o corpo intacto de Rony. O rapaz sorria. Ele pegou o resto de chama como quem arranca algo do peito e jogou contra Jarbon, o demônio que mantinha o caldeirão em funcionamento, fazendo este cair vários metros para trás.

Harry e Gina mal podiam acreditar no que viam. Hermione também. Ela se ergueu do chão pasma e se aproximou do marido como se ele não fosse real. Rony estendeu a mão, que ela segurou, e os dois continuaram a caminhar em frente.

– Sangue de dragão – Harry murmurou para a esposa ainda contida em seus braços. Ela soltou um misto de riso e bufo de alívio.

Como que tomado por uma nova força, Rony avançou em direção ao caldeirão, com Hermione e Hagrid em seu rastro. Os beusclainhs pareciam assustados pela simples figura de Rony e, ao invés de atacá-lo, se encolhiam e tentavam ficar juntos, como que para se proteger. A maioria deles ficou reunida, muito perto uns dos outros, logo atrás do caldeirão, embora Mefistófeles tivesse sumido de vista. Então Rony, como se soubesse o que tinha de fazer o tempo todo, ergueu o pulso em que estava o Pendragon. O pequeno dragão de prata que se enroscava até a metade do seu braço ergueu a cabeça, tomando vida, e soltou uma espécie de chama dourada pela boca. A chama serpenteou como um dragão oriental e circulou o grupo de demônios que ali estava. Harry pode reconhecer o famigerado Jarbon entre eles e também Marmodeu. O laço mágico prendeu-os e o grupo berrava e proferia impropérios e maldições terríveis, contudo, pareciam incapazes de livrar-se. Rony e Hermione lhes apontaram as varinhas e como se houvessem combinado, berraram.

Vingardium leviosa!

Uma força arrebatou o grupo de beusclainhs para o alto. Suas pernas finas balançavam sem chão. Por um segundo, Harry achou que os amigos pretendiam jogá-los ao mar, mas não foi o que ocorreu. Os dragões que ainda circulavam a ilha urraram cheios de excitação e, vindo, Harry nem pode ver de onde, Galton, o dragão treinado de Carlinhos, arremessou contra eles uma baforada de fogo vivo, numa pontaria certeira. O céu se iluminou como se um sol vermelho, pequeno, nascesse no meio da noite. Uma onda de energia, que emitiu um círculo de luz fluorescente e púpura, se espalhou pelo ar alongando-se até desaparecer na distância. Por longos momentos, a batalha em terra parou. Tudo o que se ouviu foram os rugidos dos dragões. Quando os olhos se acostumaram novamente a pouca claridade, não era possível ver nem rastro dos demônios.

Um brado de vitória se elevou entre os companheiros de Harry e a batalha recomeçou com força redobrada por parte deles. Os demônios remanescentes, porém, queriam vingança e passaram a lançar o que podiam em seus ataques, se tornando mais mortais. Harry precisou voltar ao seu posto de defesa junto com Gina, acreditando que o caldeirão de Pwyll era um problema a menos, mas não foi bem assim. Não havia mais nenhum demônio próximo ao caldeirão que pudesse comandá-lo, mas nada impedia, aparentemente, que um bruxo o fizesse. E, enquanto Rony e os outros comemoravam o triunfo, Enos Throop assumiu o lugar de Jarbon e o caldeirão fumegante se preparou para voltar a vomitar zumbis.

Ele teria conseguido não fosse o fato de algo voador passar a incomodá-lo, impedindo-o de pronunciar as palavras mágicas e fazer o caldeirão funcionar. Primeiro Harry achou que fosse um pássaro preto, mas as asas características lhe informaram que era um enorme morcego. O animal se batia sem medo contra o rosto do bruxo, que logo passou a lançar maldições contra ele. Isso deu tempo para Rony, Hermione e Hagrid continuarem a se aproximar. A garota retirou a espada que estava presa em uma bainha às suas costas e se preparou para lançá-la ao caldeirão. Contudo, dois inferi se arremessaram contra ela, mal dando tempo para que Hagrid e Rony pudessem impedir que ela fosse sufocada pelos socos deles. Ainda lutavam contra os zumbis e os feitiços que os Comensais começaram a arremessar contra eles, quando aparecendo, rápida e intempestivamente, Olho-Tonto e Remo se arremessaram contra Throop que, já tonto por causa do morcego, desequilibrou.

– NÃOOOO! – berrou alguém.

Mas não havia mais tempo para gritos. Throop perdera o chão e estava caindo dentro do caldeirão. O Comensal altíssimo jogou os dois braços na direção de Remo e o pegou pelo colarinho, puxando-o junto com ele. Foi muito rápido e, ainda assim, Harry sentiu seu coração rachar ao meio enquanto Lupin era arrastado com Throop para dentro do caldeirão. Olho-Tonto segurou-o pelos ombros e Snape, voltando à forma humana, prendeu Lupin pelas pernas. O caldeirão balançava com violência enquanto engolia os dois homens. Harry queria ajudar, mas os ataques a ele continuavam. Tonks passou berrando a sua frente indo em direção ao caldeirão e Gina, passando por trás dele, segurou Hector que queria correr até lá.

Em meio a confusão, Harry viu um destemido Olho-Tonto enfiar o braço no caldeirão e tentar fazer com que Throop soltasse Remo. Este, agora, estava enfiado até a cintura para dentro e só não caía porque Snape continuava a segurá-lo com todas as forças que tinha. Então, como um milagre, Lupin pôs as mãos na borda do caldeirão e ergueu-se num movimento brusco de quem escapa. Harry achou tê-lo visto quase sorrir aliviado para Olho-Tonto, mas o sorriso logo virou um berro. Sem nada a segurá-lo, o braço de Moody não resistiu a uma puxada vinda de dentro do caldeirão. Harry achou que lhe haviam arrancado o braço, mas no segundo depois, o ex-Auror mergulhou para dentro diante dos olhos aterrorizados de Lupin e Snape, que mal conseguiram reagir e tentar salvá-lo.

O caldeirão soltou um bramido e uma força poderosa arremessou Remo, Snape, Hagrid, Rony e Hermione, que eram os que estavam mais próximos, para longe. Depois, sacudindo tremendamente, uma luz azul-prateada saiu de sua boca e cruzou os céus. Os dragões se afastaram rugindo e um a um os inferi começaram a desmoronar, caindo ao chão como se a força que os mantivesse em pé estivesse se extinguindo. O exército de mortos-vivos elevava os olhos brancos e vazios acompanhando a luz até o alto e então caíam, sem expressão, sem força, finalmente mortos.

Quando o último deles derribou, o caldeirão recolheu a luz e caiu de lado, partindo-se, num estalo alto, em três grandes pedaços.

Harry viu Tonks se jogar sobre Remo, que ainda olhava a tudo, incrédulo, caído no chão. A Auror chorava muito quando o marido a abraçou. Gina se recusou a soltar Hector, mas o menino parou de fazer força para sair dali e se segurou na amiga mais velha, chorando também. Snape se ergueu com a ajuda de Neville, que havia chegado perto do grupo.

Num segundo, a vantagem dos Comensais inexistia. Havia poucos demônios à vista e Harry teve a impressão de que o seu lado tinha mais gente em pé, agora. O inimigo continuava a lutar, mas era claro que havia perdido. O lado de Harry, porém, já não lutava com sabor de vitória. A perda de Olho-Tonto de forma tão terrível e visível a todos abalara os combatentes. Além disso, muitos deles estavam caídos e não se podiam saber quais estavam feridos e quais estavam mortos.

O instinto de Harry, no entanto, percorreu sua espinha num arrepio agourento e uma voz em sua cabeça fez a pergunta claramente: Onde estava Voldemort? Foi com uma nova urgência que Harry varreu cada centímetro que podia da ilha. Nenhum sinal do bruxo. E não era apenas ele que faltava. Harry não via Malfoy, Bellatrix e, pior, nenhum sinal de Mefistófeles. Tinha certeza de que ele não estava entre o grupo de beusclainhs que tinha sido destruído pelo sopro do dragão. Seu coração acelerou na mesma medida em que suas entranhas congelaram.

Concentrou-se e, jogando o mais poderoso feitiço escudo que pode conjurar, ele se voltou para trás, para o lugar em que as crianças estavam escondidas. Correu contornando a mesa e mentalizou: “acio capa”. Obediente ao dono, a capa de invisibilidade foi direto para a sua mão revelando o pequeno grupo ainda adormecido. Harry nem precisou contar para saber quem faltava. Sirius, Kenneth e Sean circulavam a pequena Chantal, os quatro em profundo transe; Mel, caída ao lado deles, também estava desacordada. Gina parou ao seu lado, parecendo guiada pelo mesmo horrível pressentimento.

– Lyan! Cadê o meu filho? Fleur...

– Não era Fleur – disse Harry compreendendo imediatamente. – Era Tilial! Voldemort e Mefistófeles pegaram o Lyan!

As pernas de Gina falharam e Harry segurou-a. A garota agarrou as roupas dele, havia chamas nos olhos dela.

– Eu-quero-o-meu-filho!

Harry também. Apertou-a contra ele.

– Você pode localizá-lo, não pode, Gina? – falou entre os dentes. – Pode? Por favor?

Ela piscou. A consciência de Harry registrou brevemente que os sons da batalha diminuíam. Gina levou a mão ao decote e tirou de lá a pedra verde, pulsante. Ela a segurou com firmeza, talvez, até com força para quebrá-la se fosse possível. Respirava muito rápido e seus olhos desfocaram, como se ela visse algo que Harry não era capaz de ver. Então, ela o encarou com firmeza, e voltou a sustentar-se nas próprias pernas.

– Estão descendo, por dentro da fortaleza. Há uma doca do lado oeste. Estão indo para lá.

– Quantos?

Gina balançou a cabeça brevemente.

– Apenas Voldemort e os dois demônios.

– Certo.

Harry soltou-a e pegou a sua mão, pretendia fazer um sinal para Hector e Josh ficarem na defesa dos pequenos, mas naquele momento um urro de vitória se ergueu. Os dois meninos correram para eles e os abraçaram, comemoravam. Harry e Gina viam quase sem entender a felicidade dos amigos. No centro da ilha, os Comensais remanescentes estavam dominados. Havia alguns demônios. E estes estavam presos pelos aros dourados que, com certeza, tinha saído do Pendragon de Rony. Todos gritavam e se abraçavam. Muitos corriam para localizar e ajudar os feridos. Tonks e Remo gritaram por Hector e o menino abandonou os catatônicos Harry e Gina e correu para eles. A voz possante de Kingsley chamava pelo nome dos dois filhos. Josh correu para o pai que o ergueu alto do chão, enchendo-o de beijos, pouco depois, mancando e parecendo muito ferido, Otwani se juntou a eles, fazendo o homenzarrão que era o pai chorar.

Hermione e Rony, um Fred que se arrastava amparado por Jorge e Kátia, seguidos por Alicia vinham, na maior velocidade que podiam, em direção a Harry e Gina que continuavam sem se mexer. Todos gritavam muito, mas Harry não conseguia compreender uma só palavra. Viu-os agarrarem os filhos entre abraços e beijos e viu também quando Gui, carregando uma Fleur trôpega e com um grande hematoma na testa, chegou e arrebatou a filha do chão. O Sr. Weasley estava abraçado com Percy, ambos ostentando sorrisos felizes. O rapaz deixou o pai e se inclinou para, carinhosamente, ajudar Mel, fazendo a menina voltar a si. Do céu, urros selvagens de Carlinhos e seus companheiros, homens e dragões, davam o tom ainda mais alto a algazarra da vitória. Foi o Sr. Weasley que, repassando os netos como quem faz uma contagem, falou alto e fez todos silenciarem.

– Onde está o Lyan?

Um mal estar geral correu o grupo e Harry viu seus cunhados e cunhadas, instintivamente, apertarem mais fortemente os filhos contra si. Os que estavam mais distante da família Weasley logo foram percebendo que havia algo errado e Harry ficou observando seus sorrisos de vitória irem sumindo, um a um, os abraços e a comemoração perdendo a cor. Neville e Luna tinham parado bem perto deles e sustentavam Colin meio desacordado. Snape se aproximara mancando e seguido por Draco Malfoy, o ex-professor olhava para as crianças e a contagem o fez arregalar os olhos e olhar para Harry como quem pede explicações.

– Eles o levaram – respondeu com a voz estrangulada. Uma espécie de peso no fundo da sua garganta não o deixou falar normalmente, mas Harry não teria tempo para explicar, planejar ou suportar mais olhares de horror e piedade. Também não podia exigir mais daquelas pessoas que, à sua frente, sangravam, algumas mal podendo manter-se em pé. – Fiquem com os seus filhos, nós vamos atrás do nosso!

Houve protestos, mas Harry nem lhes deu atenção. Sabia que podia aparatar na ilha, então sussurrou para Gina.

– Guie.

Ele girou no lugar, mas antes de entrar naquele incômodo tubo compressor ao que associava a aparatação, sentiu dois braços finos se agarrarem a ele pelas costas. Quando finalmente pode abrir os olhos e respirar novamente, viu Rony o encarando com muita seriedade por sobre a cabeça de Gina. Ele olhou para trás, mas nem era preciso, os braços à volta da sua cintura eram de Hermione. Os dois tinham se agarrado a ele e Gina, e agora os quatro estavam parados numa galeria escavada na rocha no interior da ilha-fortaleza.

Que diabos deu em vocês dois?! – disse soltando-se de Gina e Hermione.

– Por que achou que deixaríamos virem sozinhos? – argumentou Rony com uma calma exasperante.

– Ah, Harry, por favor – lamentou Hermione – nós já não havíamos superado isso?

– E o Sirius? – perguntou Gina.

– O entreguei para o seu pai – respondeu a cunhada.

Gina deu um suspiro conformado e se virou para seguir pela galeria úmida e escura. Ela murmurou lumus para a própria varinha e levou alguns passos para perceber que os três continuavam parados.

– O que foi?

– Vocês quase morreram lá em cima! – vociferou Harry, ainda parado no mesmo lugar e olhando para Rony e Hermione como se os visse pela primeira vez.

– Todos nós – a voz de Rony denotava cansaço.

Harry avançou para ele, pegando-o pelas vestes. Sentia vontade de bater no amigo. Ele e Hermione tinham perdido completamente o juízo, como podiam segui-lo depois de terem o filho são e salvo nos braços?

– O que vocês querem? Outro órfão? Já não tivemos o bastante disso?

– Não se trata de viver ou morrer, Harry! – Rony afastou bruscamente as mãos do amigo que tinham se agarrado à lapela da sua jaqueta. – Se trata de poder olhar dentro dos olhos do nosso filho quando ele crescer. Você não pode tirar isso da gente.

Harry chegou a dar um passo para trás. Hermione tinha se colocado ao lado de Rony e o enfrentava com a mesma determinação.

– Perfeito! – interrompeu Gina. – Vocês vão ficar aí ou vêem comigo?

Hermione foi a primeira a se mexer, Rony acompanhou as duas mulheres em silêncio. Harry foi atrás deles sem saber direito se continuava exasperado ou se Rony e Hermione continuariam pela vida a fora a emocioná-lo com sua lealdade e amor por ele. A galeria seguia para baixo. Cheiro de pedra úmida, maresia e terra se mesclavam em trechos que alternavam partes cuidadosamente lavradas e outras que o tempo e os deslizamentos tinham tornado mais toscas. Num desses pedaços do caminho, Harry tomou a frente para poder ajudar Gina, que não parava de reclamar do inconveniente de ainda usar seu vestido de festa. Rony também ficara à frente de Hermione, usando as pernas compridas para ir testando o terreno antes que ela pisasse.

A trilha não parava de afundar e Harry não conseguia se livrar da sensação de que estavam indo lento demais. Uma lufada de vento trouxe gotículas marinhas e os quatro, com renovado afinco, intensificaram os passos. A vontade de correr fez com que Harry escorregasse em uma rocha lisa e quase despencasse num lado mais fundo da galeria. Rony e Gina o seguraram pelas costas das vestes e o amigo o içou para cima.

– Valeu! – agradeceu, embora estivesse furioso com a própria estupidez.

– Ponha na nossa conta – resmungou Rony.

Caminharam mais algum tempo até avistarem uma abertura na pedra. Lá fora, uma noite ainda muito escura se erguia alto e Gina murmurou nox, fazendo-os mergulhar nela. À frente, uma plataforma de rocha se estendia numa pequena praia; e, completando-a, um cais flutuante de madeira tinha ancorado um barco pequeno. Harry teria prestado mais atenção à embarcação se a cena que se descortinava para ele não tivesse atraído todos os seus sentidos.

No chão do cais, um montinho de pano tinha sido desvelado e Harry podia ver claramente a cabecinha, os braços e pernas do seu filho. O menino estava aparentemente adormecido, não chorava ou emitia qualquer som. Ajoelhados, diante dele, estavam os dois beusclainhs que pareciam murmurar encantamentos, enquanto voavam as mãos nodosas a uma certa distância acima do corpo do bebê. Em pé, Voldemort, ainda preso ao corpo de Richard Oates, assistia e esperava.

– Vamos ser educados? – perguntou Rony.

– Nem um pouco – respondeu Harry.

– Ótimo!

Se alguma das garotas pensou em protestar ou planejava uma abordagem mais sutil nem teve tempo de falar. Rony irrompeu na plataforma com passos largos e ergueu o pulso mirando Tilial. Antes que os demônios sequer se dessem conta de sua presença, a chama dourada envolveu o beusclainh e o jogou contra a murada de madeira, preso. Quase ao mesmo tempo, Harry lançou um feitiço contra Mefistófeles e este foi igualmente atirado para longe de Lyan. Gina correu e se arremessou em direção ao filho, tomando-o nos braços e correndo de volta para onde estavam Harry e os outros. Quando Voldemort conseguiu se recobrar da surpresa, ergueu a varinha de Oates e enunciou com firmeza:

Estupefaça!

A maldição teria atingido Gina pelas costas, mas Hermione, atenta, se pôs entre os dois e brandiu a espada desviando o raio vermelho, que se perdeu no mar.

Harry puxou Gina colocando-a, juntamente com Lyan atrás dele. Rony ficou ao seu lado, de mãos dadas com Hermione. Dentre os inimigos, apenas Voldemort estava em pé, Tilial se mexia continuamente tentando se livrar da amarra dourada e Mefistófeles parecia completamente desacordado.

– Por que não desiste, Riddle? – disse Harry. – Acabou.

Não! – vociferou Voldemort. – Não acabou! Não vai acabar enquanto um de nós dois viver. É a profecia! Só um jeito de superá-la, e é se nós dois nos tornarmos UM. Você sabe que é verdade! Soube que era verdade quando absorveu meus poderes e os tornou seus. – Voldemort avançou. Seus olhos vermelhos na palidez cadavérica de Oates lhe davam a aparência de um bizarro boneco de cera animado. – Você apenas adia o inevitável, Harry Potter!

– Não – Harry experimentava uma serenidade nova ao encarar seu inimigo. Era como se nada pudesse acontecer de mal agora que Lyan e Gina estavam com ele. Mesmo não carregando mais o Graal junto de si, Harry quase podia senti-lo pulsar daquele jeito confortador e pacífico. Não tinha a menor idéia de como poderiam derrotar definitivamente Voldemort, mas de um jeito estranho e louco, ele simplesmente acreditava que podiam fazê-lo. Só isso. Acreditava. – Eu o tenho vencido nos últimos vinte e cinco anos, Riddle. Venci-o quando eu tinha apenas um ano de idade e, por mais coisas e pessoas que você tenha me arrancado, eu continuei vivendo e... vencendo. Não estou adiando o inevitável. Não existe “o inevitável”. Você é que parece insistir continuamente em ser derrotado.

Harry achou que Voldemort teria uma de suas crises de fúria, mas o bruxo fez o contrário disso. Ele lhe lançou um sorriso de escárnio, deformando o rosto emprestado que usava.

– Sempre o mesmo tolo arrogante, não é? Olhe o seu filho, Harry Potter! Tudo o que conseguiu foi alongar a profecia, foi dar-me mais e mais chances para superar a morte. Se eu não tiver o corpo que você me deve, eu terei o do seu filho, ou o do filho dele. Você tornou a nossa batalha eterna. E ela continuará até que a minha vitória seja completa!

As palavras saíram dos lábios de Harry sem que ele tivesse controle ou as planejasse.

– Meu filho é a prova de que você nunca vencerá, Riddle. Você quer a eternidade? Eu já a tenho. Lyan e Joanne são a minha eternidade. E se eu não conseguir derrotá-lo, eles o farão. E se ainda assim você conseguir voltar do inferno algum dia, os filhos deles farão isso. Eu venci. Simples assim.

Não houve nenhum sorriso de desprezo dessa vez. O rosto de Oates era apenas uma máscara de ódio e rancor e sua voz saiu numa rouquidão furiosa.

– NÃO! Ainda não! Você não tem idéia do que eu seria capaz para matá-lo, Harry Potter! Ainda há pactos que podem ser feitos.

Foi muito rápido. Saindo da posição em que fingia estar apagado, o velho Mefistófeles, com uma agilidade surpreendente, pulou, largando a bengala, e se agarrou as costas de Oates. Apavorados Harry, Gina, Rony e Hermione observaram o corpo do bruxo absorver o do demônio, enquanto ambos eram erguidos no ar por uma força invisível. Ambos berraram como se sentissem uma dor insuportável enquanto as carnes se fundiam em meio a uma fumaça escura e labaredas. Quando o processo parecia quase terminado, o braço da nova criatura se esticou e Tilial, escorregando para fora da amarra do Pendragon, uniu-se àquilo.

Instintivamente, Rony e Harry amontoaram as duas garotas e o bebê entre eles enquanto assistiam, cheios de pavor, Voldemort fazer algo que apenas nos livros das magias mais escuras era mencionado. Algo que o próprio Livro de Fausto, estudado por eles durante quase um ano, dizia ser o mais terrível passo para um ser dotado de alma. Tom Riddle, que depois se tornara Lord Voldemort, abandonou completamente qualquer resquício de humanidade naquele momento e tornou a si mesmo um demônio. Sua alma humana deixou de existir. Harry não pode dizer quanto tempo aquilo durou, mas depois do que lhe pareceram segundos imensos as labaredas sumiram e os corpos queimados e fracos dos dois demônios foram arremessados para longe do conjunto. Cada um caiu de um lado do cais, grunhindo e resfolegando.

Não houve tempo para reagir. A voz fria e aguda de Voldemort elevou-se na noite e ele olhou-os de cima, ainda suspenso no ar.

– Terei o que me roubou, Harry Potter! Terei tudo! De uma maneira ou de outra!

O ataque veio na forma de uma esfera de fogo, que Harry desviou. Rony desviou a segunda e Hermione rebateu a terceira com a espada. Voldemort divertia-se.

– Nada do que vocês têm seria forte o bastante agora. Enquanto essa noite durar eu terei a força de uma raça inteira de demônios! Esse foi o meu pacto. Minha alma, pelo poder de destruir você, Potter!

Protego! – Uma labareda parou no ar, sustentada por um escudo invisível. – RONY! TIRE-OS DAQUI!

Obviamente que Rony não o escutou. Ele apontou o Pendragon para Voldemort, mas o bruxo rebateu a chama dourada, que sumiu no oceano. Os quatro começaram a recuar. Harry lançou um feitiço que formou uma bolha quente e de um dourado cristalino, a qual pareceu prender Voldemort por alguns instantes. O bruxo esticou os braços e num movimento seco dos pulsos quebrou a bolha e faz com que os estilhaços saltassem sobre eles. Harry precisou de um novo feitiço escudo para protegê-los.

– Viu, seu menino burro e idiota! Você não é páreo para mim. Nunca foi! Precisou roubar os MEUS poderes para conseguir me enfrentar e agora, nem mesmo eles o ajudarão. De que adianta ter o poder de dois bruxos diante de alguém que tem o de mil demônios? – Voldemort saboreava as palavras. – Não existe ninguém que tenha poder o bastante para me derrotar!

Harry estava inclinado a concordar e toda a força da sua mente agora se dirigia em como tirar Gina e Lyan dali. No entanto, foi a voz de Gina que pareceu resgatá-lo.

– Um só não poderia... – os outros três voltaram a atenção para ela e se depararam com os olhos escuros e fulgurantes. Aradia. – Mas todos...

Sem esperar que os três compreendessem totalmente o que ela dizia, a jovem tirou o Graal de dentro do decote e entrelaçou seus dedos da mão em que estava a pedra com os de Harry. Depois, mantendo Lyan firmemente em seus braços, ela os fez avançarem erguendo a pedra acima de suas cabeças e apontando-a para Voldemort. O bruxo ainda tentou reagir. Lançou contra eles uma de suas bolas de fogo, mas ela se desviou sem que Harry precisasse de qualquer esforço. Depois vieram as maldições mortais, uma enviada para cada um deles, porém elas se dissolveram antes de chegarem perto deles, como se houvessem sido sopradas. O Graal havia começado a brilhar fortemente e sua pálida luz verde-esmeralda foi se tornando cada vez mais clara e mais intensa. Ao invés de atacar, a energia emitida pelo Graal envolveu o corpo de Voldemort, abraçando-o. Ele berrou em agonia e tentou reagir, mas a luz permaneceu firme, enroscando-o, minando a escuridão dentro e fora dele.

O rosto de Oates tornou-se ofídico, como Voldemort fora após ter readquirido seu corpo. Depois, as feições se tornaram mais humanas e pareciam com o Riddle que Harry vira somente na penseira de Dumbledore – adulto e deturpado. Por fim, o rosto bonito e cheio de ódio do jovem Tom Riddle estava ali, olhando para eles. Harry pensou que se pudesse haver qualquer luz dentro daqueles olhos haveria alguma chance para ele, mas não encontrou. Ele continuava a lutar como se a claridade que o envolvia lhe fosse insuportável, quando Harry sabia que não era. O que o Graal emanava era somente a energia de todos os amigos que tinha se disposto a lutar com Harry. Não eram apenas gotas de sangue, mas seus corações que pulsavam ali. Gina tinha razão, não era o poder de um bruxo, mas de todos.

Ele olhou para o rosto da esposa tão próximo do seu, mas Gina estava ali só em parte, a outra parte era o poder da bruxa Aradia, ligado novamente a força de uma Sétima Filha. Foi quando ele entendeu. Religare. Fora desse jeito que ele tinha vencido Voldemort da outra vez. O poder de Aradia tinha unido sua magia a de Gina, Rony e Hermione. Agora, lá estava novamente, mas não apenas dos quatro. Não era apenas a sua capacidade de amar que contava, não quando ela podia ser somada a de outros. Esse era o grande poder. Nem mesmo uma raça inteira de demônios poderia contra ele.

– Rony! – Gina chamou pelo irmão e apontou com o queixo os dois demônios que continuavam caídos ao chão, sem forças, embora olhassem em pânico para o que acontecia com Voldemort.

Sem precisar de nenhuma dica, Rony fez com que o Pendragon capturasse os dois beusclainhsI e ergueu-os no ar com a varinha. A luz do Graal se estendeu e aprisionou-os também. Os berros de dor e, não havia outra palavra para descrever, tristeza se tornaram ainda mais profundos, mais cheios de agonia.

– Hermione! A espada!

Harry viu que Hermione não sabia o que fazer e lhe pareceu que ela considerava que golpeá-los, naquele momento, seria algo muito errado para ser feito.

– Aponte a espada para eles e dê a ordem – disse Gina, a voz grave de Aradia se sobressaindo sobre a dela.

– Que ordem? – perguntou Hermione, mas quando o seu olhar cruzou com o de Gina, foi como se um raio a atingisse. Ela apontou a espada para o alto e gritou: – Esse mal termina aqui!

Obediente a espada começou a absorver a energia do Graal e com ela Voldemort, Mefistófeles e Tilial. Os três foram se alongando na luz. Seus corpos se tornando transparentes. Seus gritos e sua luta contra a magia clara e luminosa que os envolvia se tornando distantes, fracos. Harry viu quando o jovem rosto de Riddle fechou os olhos e parou de lutar, depois os demônios, e então eles eram apenas parte da luz poderosa que agora envolvia a lâmina da espada. A noite, lentamente, tinha voltado a escurecer em torno deles.

O Graal entre os seus dedos e os de Gina parara de pulsar e tornara a forma de pedra da lua. Simples, sem nada de marcante. Apenas uma pedra.

– Harry... – Gina o chamou e colocou a pedra em suas mãos. Ela não estava mais tomada pelo Poder da Sétima. – Você tinha razão, eu não teria acreditado se tivesse me dito lá em cima o que era.

Ele olhou para a espada que Hermione segurava com alguma dificuldade, a lâmina continuava fluorescente.

– Acabou?

– Só quando vocês devolverem o que lhes foi confiado – disse Gina, com sabedoria.

Harry, Rony e Hermione não precisaram perguntar como. O Pendragon desenroscou-se do braço de Rony e novamente, como se tivesse vida, voou em direção ao punho da espada enrodilhando-se nele, por entre os dedos de Hermione. Num instante, ele parecia ser apenas uma decoração em prata do punho. Entendendo o recado, Harry abriu a mão e o Graal saiu dela indo se alojar no espaço que lhe era destinado, como uma incrustação na empunhadura da espada.

– E agora? – Perguntou Hermione muito ofegante.

– Harry é o portador do Graal – falou Gina. – Não lhe ocorre o que fazer?

“A magia lhe fala, não é? Ela agora é alimentada pelo Graal: ouça-a!” Foi o que Mérlin tinha lhe dito quando tudo o que ele pedira fora que sua maldição jamais alcançasse o seu filho. E estava certo. Harry não se arrependia da sua fé, nem de sua confiança nos seus amigos ou naquela estranha pedra que lhe fora confiada. Talvez, ainda não fosse possível entender o Graal, o que ele significava ou todo o seu poder. Mas uma coisa, Harry tinha entendido, o Graal era um portador. Ele carregava aquilo em que se acreditava. E, naquele momento, Harry acreditava com mais ardor do que nunca no que um velho sábio lhe tinha dito ser a força mais poderosa do mundo.

Com um sorriso e reverentemente, Harry pegou a espada das mãos de Hermione, que a cedeu com um suspiro emocionado. Depois ele deu alguns passos, mirou a lâmina luminosa e na qual não parecia haver mal algum e, tomando de toda a força que era capaz, jogou a espada para o mar, o mais longe que conseguiu. Ela girou no ar subindo e depois começou a descer, mas, antes que tocasse a água, a mão de sua eterna guardiã emergiu do mar e tomou pelo punho. Por fim, sua luz desapareceu calmamente nas ondas. Talvez, para sempre.

Harry contemplou o mar por alguns instantes e então se virou para os outros. No momento seguinte, corria para eles com os braços abertos rindo e respirando como ele certamente não fazia há um ano. Gina e Lyan se aninharam nele, tornando a felicidade algo quente e palpável. Rony dava urros de vitória e erguia Hermione no ar. Então, o amigo colocou os braços compridos em torno de Harry, Gina e Hermione apertando-os e tentando levantá-los como um urso feliz. O movimento acordou Lyan e, para a alegria dos pais, o bebê finalmente começou a chorar: saudável, sem nenhuma magia maléfica e reclamando do mundo inteiro.




FIM



XXX – – – XXX



R/F: É, não é uma N/B, é uma R/F A Reverência de uma fã! - Uma beta seria a pessoa que sugere alterações e corrige erros, de ortografia ou deslizes no enredo, que escaparam do crivo rigoroso do autor. Entretanto, o que eu realmente fiz durante o desenrolar desta espetacular história foi aprender com a Sally, mais e mais, a cada capítulo, na mesma proporção que crescia em mim a admiração por ela. - Aprender como se usa as palavras para demonstrar emoções, fazendo-as reais. Aprender o cuidado e o apreço pelos detalhes, pois cada um deles é importante para se chegar ao desfecho. Aprender a essencial consideração pelo nosso idioma, que é lindo, e quando bem usado, torna toda a história mais cativante. Aprender como se ter respeito – e muito – pelos leitores, sem deixar de tê-lo pela idéia original da obra, mantendo-se amorosamente leal a ambos. Enfim, aprendi um bocado sobre ESCREVER. Por esse aprendizado lhe agradeço, talentosa Anam! Por ele e por essa fantástica história que por hora finda, mas que não terminará de fato para nós, seus fãs, que voltaremos aqui muitas e muitas vezes pelo prazer de relê-la. - Fantástico, Anam! Indiscutivelmente. Decididamente. Reverentemente, FANTÁSTICO! – Eu a aplaudo e reverencio!!! - Um grande beijo no seu coração e um abraço apertado e emocionado! Nos vemos nas próximas emocionantes aventuras! Obrigada pela honra de participar deste sucesso! Amo você, TALENTOSA ANAM!!!!! - =D –

P.s.: Alguém aí estranhou a falta dos meus brados empolgadamente alucinados... Aguardem o comentário da leitora Sônia! Rsrsrsrsrsrsrsrsrs - ;D



N/E (Nota do Editor – isso mesmo! Apesar de silencioso, eu sempre tive alguém com uma tesoura e cheio de exigências por trás dessa história toda. Ele disse que comentaria apenas no final).
Acompanho essa fic há dois anos e jamais havia comentado. Por isso, me reservo o direito de ocupar muito espaço. Esse capítulo é tudo o que se poderia esperar do final de “Harry Potter e o Retorno das Trevas”, de Sally Owens. Quase setecentas páginas e a única reclamação que tenho é que desejaria ter podido ler tudo mais rápido, sem ter que esperar angustiado pelos capítulos seguintes. Porém presenciar, passo a passo, a criação de uma obra como essa, foi um privilégio maravilhoso.
A primeira parte é para ser bebida em goles longos e lentos, saboreada em todos os recantos da boca, como o melhor dos vinhos. Se eu pudesse dizer algo aos que ainda não leram seria: leiam devagar, não devorem: apenas e completamente deixem-se invadir e transportar, aceitem a longa queda nesse outro universo: uma queda completa e bela, como uma dança. A segunda parte... essa não dá pra dar conselho porque você vai precisar de toda a sua atenção e coragem para mergulhar nela.
Já disseram que a arte é aquilo que tem o poder de nos levar ao longínquo, sem sair de onde estamos. Pois é dessa matéria que é feito o texto de Sally Owens. Ela é senhora dessa magia, ninguém duvida. Por um tempo que não consigo ainda precisar (e talvez jamais consiga), eu estive bem longe daqui, sem que precisasse sair da minha sala. Estive ao lado daqueles que se puseram a esperar na borda do rochedo, senti meus músculos retesados e a força da energia bruta agitar todo o meu corpo, como um mar em fúria, enquanto esperava pelo sinal. A mão firme de Hermione foi a minha mão a riscar o chão, os olhos de Harry foram os meus olhos esquadrinhando cada metro, cada inimigo em busca daqueles que amo. Por uma fração de segundo, confesso, cheguei a pensar na oferta de Riddle: uma vida sem dor, doença, velhice. Uma vida sem caminhar para a morte. Mas Harry me resgatou: seria mesmo possível chamar isso de vida, se tudo que é vivo na terra nasce, cresce, envelhece, morre e renasce em outras formas? É preciso vencer o medo, Harry disse. Ele está certo. Estive com ele quando viu Gina chegar perto e respirou-a, “sentido-a real e sólida”. Lutei. Lutei. Lutei. Lutei em cada lance, em cada duelo da batalha que se estendeu por toda uma noite. Vi tantas coisas, presenciei tantos fatos, estive ao lado de tantos seres incríveis e luminosos, que seria impossível descrever aqui, sem uma noite estrelada e uma fogueira para tornar tudo mais real. Eles me acompanharam por dois anos e terminar essa jornada com o choro do pequeno Lyan exigindo a vida com tudo que ele tem direito, foi perfeito.
Este capítulo final esteve à altura de toda a obra que é uma das que mais gostei de ler em toda a minha vida de leitor, que já tem uns 30 anos, desde que decorei uma revistinha do Tarzan. Se minha mãe tentava pular um quadrinho, eu corrigia... E asseguro que sou e sempre fui um leitor chatíssimo, muito difícil de agradar mesmo.
Este capítulo está ao lado dos outros dois capítulos que mais gosto nesta fic extraordinária: “Famílias” e “Harry Potter”. Esses capítulos me trespassaram e agora fazem parte de mim: ainda andam comigo, até hoje, por onde quer que eu vá. A Nika é capaz dessas maravilhas. E fico completamente feliz de saber que ela ainda vai fazer muitas e muitas outras.



N/C (Nota da Consultora – exatamente! Essa pobre amiga era a quem eu recorria quando precisava de uma luz do tipo, estou acertando ou devo refazer. A pobre lia aos pedaços, mas foi fundamental): Bem, quero começar dizendo que tenho uma dívida com nossa querida ficwritter Sally Owens. Foi ela quem insistiu para que eu lesse os livros do Harry Potter. Eu havia visto os quatro primeiros filmes, mas ainda não havia lido nenhuma página escrita pela tia Jô. Claro que tinha intenção de lê-los... Um dia. Até que finalmente, minha amiga Darla (beta da Sally) me emprestou um dos livros. O que dizer!? Devorei todos, um por um, sem dó e remorso. Enquanto isto, a Sally estava escrevendo uma fanfic chamada “Harry Potter e o Retorno das Trevas”. E eu, que achava que não seria possível gostar mais de HP, acabei virando uma “tresloucada” (é assim que o marido dela se refere a mim, carinhosamente) pela saga do Harry e de seus amigos. O mais interessante nisto tudo é que enquanto lia cada capítulo postado por ela, descobria uma escritora profundamente talentosa, sempre preocupada em “costurar” muito bem os elementos e o ritmo da história. Alguém que entendia magistralmente os personagens criados pela J.K. e em suas versões mais velhas e maduras. É impossível não ler “As Relíquias da Morte” e não ver o “Harry, o Ron e a Mione” da Sally. Sem contar que por causa dela, nos apaixonamos ainda mais pela Gina (todos estávamos esperando a “Gina da Sally” no 7º livro!). E isto me deixou muito orgulhosa! O Retorno representa muito não só para você, minha querida amiga. Junto à sua construção, houve o fortalecimento da nossa amizade e carinho. Te amo muito e espero de todo o coração que você nos dê a oportunidade de lermos muito mais de suas histórias maravilhosas. Um grande beijo.


N/A: Quero escrever isso com muita calma, então até o Epílogo.
Beijos da Sally

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