O Espelho dos Desejos (Parte 1



Capítulo 15



O Espelho dos Desejos (Parte 1)


A manhã de sábado se ergueu com a cara de outono. Um brilho frágil de sol banhava a névoa baixa e fria que tinha se formado sobre os jardins de Hogwarts e quase cobria a Floresta Proibida. Em frente ao castelo, as águas do Lago lembravam um espelho cinzento e calmo, de onde lentamente se desprendia um vapor que lhe dava a estranha impressão de estar fervendo a uma temperatura muito baixa. Das janelas era possível perceber que a paisagem já mudava de cores, assumindo tons dourados, amarelos e castanhos.

Estranhamente, muitos alunos acordaram cedo naquele dia, o que era bem incomum para uma manhã sem aulas ou jogos de Quadribol. Mel riu do espanto dos amigos quando entraram no Salão Principal.

– Ora, vocês deviam esperar por uma coisa assim – comentou dirigindo-se com o grupo direto para a mesa da Grifinória, aproveitando a maior liberdade nas refeições por ser sábado. – Isso se chama efeito Harry Potter. Quero ver esses quatro se deslocarem pela escola sem um bando de gente atrás.

A garota tinha razão. Os alunos mal olhavam para os pratos. Pareciam não querer perder nem um movimento dos quatro jovens sentados à mesa dos professores. Podiam ver Hagrid conversando muito seriamente com Harry e Rony, enquanto Gina devorava com apetite uma omelete e Hermione comia e fazia anotações, ora consultando a amiga, ora consultando a profa. McGonnagal. Entre os outros professores, os amigos não puderam deixar de trocar olhares divertidos ao perceber que o prof. Widenprice parecia ainda mais nervoso ao lado de Rony Weasley. Mesmo sentado, o ruivo era quase uma cabeça maior que ele e mais largo. Josh espichou o pescoço tudo o que pode, mas, como acontecera na noite anterior, não pode localizar sua musa. A profa. Shadowes ou não havia chegado ainda ou não tinha vindo.

– Alguma idéia de como vamos saber o que eles vieram buscar aqui? – Perguntou Hector quando os cinco se acomodaram na mesa para tomar o café da manhã.

Os outros pareceram estar tão vazios de idéias quanto ele e começaram a se servir em silêncio enquanto pensavam. Katie Ling, uma menina do mesmo ano de Hector, Andrew e Danna, que estava sentada ao lado deles, pareceu estranhar a presença de dois alunos de casas diferentes. Olhou desagradada para Mel e comentou em voz alta.

– Esta AINDA é a mesa da Grifinória. Vamos ficar todos misturados, agora?

A garota da Corvinal chegou a suspender o movimento de pegar uma torrada, mas Hector respondeu rápido.

– É, vamos. Acostume-se. Ou você pode ir sentar com o pessoal da Soncerina, ELES não se misturam.

A menina ficou roxa, lançou um olhar furioso para Hector e deu-lhe as costas quase o acertando com a trança comprida que usava. Mel terminou o movimento de pegar a torrada com um olhar agradecido para o novo amigo.

– Boa, Hector – falou Andrew servindo-se de mingau de aveia – mas você podia ter dito a mesma coisa de forma mais gentil.

– Ah, essa menina é muito metida – resmungou Hector, sem dar atenção ao fato de que a garota poderia escutá-lo – devia se preocupar em ficar suspirando, como o resto do Salão, em vez de se incomodar com a gente.

Danna deu uma olhadinha para trás e percebeu que o colega tinha razão. Boa parte do Salão, especialmente a formada por garotas, tinha um ar bastante sonhador em seus olhares para a mesa dos professores. Voltou-se para frente aos risinhos, acompanhada por Mel.

– Será que eles dois faziam tanto sucesso assim quanto estavam na escola? – Quis saber Josh com a boca cheia de bolo.

– Pelo que eles contam, não – respondeu Hector. – Acho que eles só se deram bem lá pelo sexto ano quando o Rony se tornou o goleiro titular do time da casa e o Harry foi nomeado capitão, ao mesmo tempo em que apareceu toda aquela história do Eleito, é claro.

– Será que a gente vai ter de aprender Quadribol para fazer sucesso com as meninas? – Andrew fez a pergunta provavelmente mais para si, pois quando percebeu que tinha falado em voz alto ficou da cor de um tomate. – Digo, no futuro... no futuro – se apressou em completar.

Josh se engasgou com o bolo e as meninas fixaram os olhos nos pratos, fazendo o possível para não rirem da cara, já púrpura, de Andrew. Hector olhou zombeteiro para o amigo.

– Não se preocupe, Andy. Caso precise de umas aulas eu posso dar. Sei jogar Quadribol super bem. – Falou como quem sabe das coisas e completou. – Só não estou no time da casa porque ainda não abriu vaga.

– Me diz uma coisa, Lupin – falou Josh com ar de troça, já recuperado do engasgo – tem alguma coisa que você não faça SUPER bem?

As meninas agora pararam de disfarçar e caíram na risada, dessa vez, acompanhadas por um Andrew com uma expressão de quem estava sendo vingado. Hector, que não estava sentado, mas apoiado sobre os joelhos no banco, dobrou os dois braços sobre a mesa e encarou o outro.

– Não sou muito bom em agüentar alfinetadas, mas convivendo com você e a Mel acho que vou ficar expert nisso também.

– Heiii! Eu estou quieta aqui! – Protestou Mel ainda rindo, embora reconhecesse que a recente amizade dos dois teria de sobreviver às implicâncias mútuas. Isso porque, na verdade, ela só não tinha feito a mesma pergunta que Josh por ainda estar agradecida pelo fato de Hector ter defendido a sua presença na mesa da Grifinória.

Ela, porém, fez uma cara tão injustiçada que Hector acabou rindo também. Foi Danna que os fez voltar ao assunto principal.

– A gente combinou que tentaria ajudá-los – começou num tom baixo e imperativo, chamando a atenção dos outros – Mas para isso temos que descobrir o que eles vieram procurar em Hogwarts?

– Bom, o que eu ouvi meu pai falar – repetiu Hector – era que eles viriam pegar uma pista sobre alguma coisa com o quadro do Dumbledore. E sabemos que o Harry foi ao escritório da McGonnagal ontem.

– Como você sabe disso? – Perguntou Mel.

– Ouvi um monitor comentar, quando voltou da ronda, que tinha visto a diretora entrar na sala dela acompanhada de Harry Potter.

– Alguma idéia de como a gente pode descobrir o que eles conversaram? – Josh falou de novo com a boca cheia, agora de salsichas.

– Bem, se eu sei alguma coisa sobre Hermione Granger, digo, Weasley – corrigiu-se Mel – tenho certeza de que ela vai daqui direto para a Biblioteca. A gente podia ir para lá como quem não quer nada e tentar ver que livros ela consulta e ou quem sabe ouvir alguma coisa.

Hector considerou a idéia da garota, era a melhor que tinham. Dividir-se e seguir os quatro poderia ser outra possibilidade, mas, nesse ponto, ele tinha que concordar que a tietagem do resto da escola ia tornar bem difícil qualquer aproximação. Além disso, se eles fossem fazer algo de diferente ou importante, certamente dariam um jeito de despistar os fãs.

Na mesa dos professores, Harry havia erguido o braço para colocar a mão sobre o imenso ombro de Hagrid, num gesto de consolo. O meio-gigante estava bem menos satisfeito que na noite anterior, olhava tristemente o prato, apenas remexendo a comida com o garfo, como se tivesse recebido péssimas notícias. Na verdade, ele tinha a mesma aparência tensa que a profa. McGonnagal exibira na noite anterior após receber os quatro. O que quer que estivesse preocupando Potter e os amigos parecia agora também preocupar o professor de Trato de Criaturas Mágicas. Hector abriu um sorriso lento. Sabia reconhecer uma idéia brilhante quando tinha uma. E essa, nem os amigos poderiam dar contra. Inclinou-se novamente para o meio da mesa, baixando a voz para que só os quatro amigos o ouvissem.

– O que eu acho... é que a gente deveria fazer uma longa visita ao Hagrid.

Andrew e Danna estreitaram os olhos um pouco confusos. Mas Mel e Josh, que conheciam a história dos grifinórios com muito mais detalhe, saudaram Hector com imensos sorrisos de compreensão e quase malvados. Se tinha uma coisa que poderia ser considerada relativamente fácil era fazer Rúbeo Hagrid entregar um segredo.




********


Cerca de meia hora depois, Harry e Rony deixaram o Salão Principal com a intenção de irem diretamente para o corredor do terceiro andar, enquanto Hermione e Gina iam para a Biblioteca. Antes de se separarem, porém, os dois ainda ficaram uns bons dez minutos ouvindo as recomendações de Hermione. “Não se arrisquem”. “Tenham cuidado, não sabemos se Dumbledore colocou alguma defesa ou não nesse caminho”. “Se acharem que está perigoso, voltem, podemos organizar um grupo maior”. Os dois ouviram pacientemente. Harry fazia sinais, o tempo todo, para que Rony não retrucasse, caso o contrário, ele e Mione começariam a discutir e os dois não sairiam dali antes do almoço. Gina, no entanto, estava bem quieta. Harry sabia que isso era sinal que ela estava preocupada. Ficou assistindo o sermão da amiga, a mão pousada sobre a barriga, que com quase quatro meses, já era um pouquinho aparente. Harry a enlaçou assim que Hermione pareceu finalmente tomar fôlego, o que era a deixa para ele e Rony tentarem escapar o mais rápido possível.

– Não se preocupe. Vamos voltar logo – sussurrou em seu ouvido.

– Ai de você, se não voltar logo e inteiro, Potter – Gina respondeu apertando-o com mais força.

Harry lhe deu um beijo.

– Pode deixar, Sra. Potter – ele tentou tornar a voz o mais zombeteira possível. – Sabe que suas ordens são como um pedido para mim.

Gina sorriu, mas menos confiante do que ele gostaria. Harry achou que o melhor era irem de uma vez e acabarem logo com aquilo. Soltou Gina e puxou Rony, que nesse momento estava se despedindo de Hermione e empenhado em não deixá-la falar. Os dois saíram em direção ao corredor do terceiro andar. Harry estava com pressa, agora. A operação, no entanto, se mostrou bem mais difícil do que esperavam. Depois que a primeira das alunas tomou coragem e chegou pedindo um autógrafo, os dois foram cercados por um grupo entusiasmado de estudantes que parecia disposto a segui-los onde fossem, a maior parte, meninas. Harry suspendeu os autógrafos, que Rony distribuía todo sorridente, dizendo que eles fariam isso outra hora e arrastou o amigo do cerco das fãs, lamentando não poder colocar naquele momento a sua capa de invisibilidade.

– Rony, pelo amor de Mérlin, diminui – rosnou entre os dentes enquanto davam voltas nos corredores para despistar os grupos mais insistentes.

– Diminui o quê? – Perguntou o ruivo com um sorriso bobo, virando a cabeça para todos os lados para registrar quem os estava olhando.

– Você inteiro! Tá parecendo um pavão!

– Ah, Harry! Qual é? Não é tão ruim ser admirado.

As experiências de Harry e Rony com a notoriedade eram bem diferentes. Harry sempre fora visado, desde que entrara na escola, e isso quase nunca fora agradável. Já Rony quase sempre foi conhecido por ser irmão ou amigo de alguém. Depois da guerra, o ruivo passara a partilhar de parte da fama do amigo, mas o mundo dos adultos, em que viviam, era bem mais controlado que o bando de adolescentes que os tinha como ídolos. As meninas, então, chegavam a simular desmaios quando um deles – quem fazia isso, em geral, era o Rony – sorria para elas.

– Espera a Mione ver você gostando de ser “admirado” desse jeito – falou Harry já sem paciência.

O peito de Rony baixou um pouco.

– Ah, bom... – falou num tom mais inseguro – sabe... a Mione não é muito ciumenta.

– Nããnn, imagina! Você ainda tem as cicatrizes dos canários assassinos que ela fez te atacarem quando você começou a namorar com a Lilá, não tem?

Rony enfiou as mãos nos bolsos e passou a seguir o passo apressado de Harry sem olhar mais para os lados.

– Ok – resmungou enquanto Harry o pegava pelo braço e, para desviar de grupinho que fechava um corredor, o fazia entrar por uma passagem secreta – apenas fico pensando que isso podia ter acontecido quando a gente estava em Hogwarts, quero dizer, as garotas te perseguiram uma época, mas eu...

Harry nem o deixou terminar.

– Tá bom, Rony! Como se fosse adiantar! – E acrescentou sarcástico. – Naquela época, que eu lembre, você era um pobre menino solitário, que não era afim de ninguém...

– Ahh! Não exige, Harry! A Mione diz que gostava de mim, mas nem me dava bola.

Harry lançou um olhar que fez o ruivo se encolher mais. Às vezes perdia a paciência com o Rony. Mesmo depois de tanto tempo, ele ainda achava que não tinha sido ele a empacar o namoro com a Mione.

– Cara, você é inacreditável!!! E olha que eu sempre me achei um desastre com garotas! Tanto a Mione quanto a Lilá precisaram sacudir bandeiras vermelhas na sua frente para que você se tocasse e se não fosse a Gina ter te desafiado...

– Tá, tá, já tinha de vir com a sua preciosa Gininha... – bufou. – Corredor do terceiro andar, ô Príncipe Encantado! – Anunciou Rony com mau humor quando ergueu a tapeçaria que cobria a saída da passagem secreta.

Harry passou por ele, decidido a ignorar a provocação, e puxando a varinha de dentro das vestes rumou direto para a porta que antes escondia o Fofo, o cão de três cabeças de Hagrid. Forçou a porta, mas como imaginava, ela estava fechada.

– Harry? – Chamou Rony meio sem graça e Harry o olhou – você não vai dizer para a Mione que eu estava, bem...erm...

– Gostando de ser assediado por menininhas de 15 anos!

– Ai, falando assim fica horrível! – protestou Rony com as orelhas em chamas. – Você sabe que é só a Hermione que me interessa e...

– Eu sei, Rony, eu sei... – falou Harry num tom cansado – não vou falar nada, a não ser...

– A não ser, o quê?

– Que você comece a ficar parecido demais com o Lockhart – respondeu Harry cínico.

Rony fez uma careta e rumou para a porta.

– Vamos nos focar no que viemos fazer aqui? – Passou de cara fechada pelo amigo apontando a varinha para a fechadura. – Alorromorra! – A porta abriu facilmente. – Bom, pelo menos esse feitiço não foi trocado – o ruivo comentou, enquanto os dois empurravam a porta para entrar.

– É... – disse Harry olhando para dentro – e também parece que o Fofo não está mais aqui.

– Acho que ia ser difícil manter aquele “bichinho”, sem exercícios, aqui dentro por 15 anos, não é?

Harry riu. Os dois trocaram olhares divertidos, já esquecidos da discussão, e depois passaram a analisar o lugar. De fato, pensou Harry, era a primeira vez que podiam ver claramente a sala já que, das outras vezes, o Fofo havia meio que “tapado” a visão deles. Ela parecia um longo corredor, as paredes eram sujas, como se ninguém passasse por ali há muitos anos e o chão de tábuas gastas, parecia tremular suavemente à luz da claridade que entrava pelas altas janelas.

– Bom, acho que é só puxar o alçapão – comentou Rony seguindo direto para a aldrava que havia no chão, mas ele não chegou lá. No terceiro passo, o ruivo afundou até a cintura como se tivesse caído num poço de areia movediça. – Aaaarreeee!

– RONY! – Harry chegou a dar um passo em direção ao amigo, mas seu próprio pé afundou alguns centímetros e ele voltou.

Rony continuava afundando.

– Harry, faz alguma coisa!

Harry olhou para os lados procurando nem sabia exatamente o que. Uma idéia, uma corda, qualquer coisa. Rony tentou uns feitiços, mas a capa estava prendendo os seus braços e ele não conseguia fazer os movimentos com a varinha.

– Quem sabe é só relaxar e sair no andar de baixo? – Tentou Harry, lembrando do Visgo do Diabo.

– Acho que não – falou Rony ainda afundando e batendo inutilmente com a varinha no chão que já o cobria quase até o peito. Tem alguma coisa quente aqui em baixo! Droga, Harry – ergueu a voz aflito – meus sapatos estão quase pegando fogo!!

O ruivo estava com o rosto muito vermelho e já suava em profusão. Parecia mesmo estar sendo assado.

– Petrificus Totalus! – Harry berrou o primeiro feitiço que lhe veio à cabeça, apontando para o chão que imediatamente parou de engolir Rony.

– Boa – disse o amigo – mas eu tenho que sair daqui ou vou virar churrasco!

– Tá! – Ele se ajoelhou e tentou chegar até Rony com as mãos.

– Não adianta você vir aqui, eu estou preso.

– Tenta tirar o braço da varinha de dentro da capa, talvez você consiga se movimentar para fazer um feitiço – sugeriu Harry.

Rony concordou e começou a tentar se soltar da capa, mas seu braço era muito comprido e ele definitivamente não tinha espaço para se movimentar. O tecido da capa parecia ter se incorporado ao chão de tábuas, agora absolutamente maciço.

– Aiiii – gemeu Rony – isso está ficando muito quente!

Harry teve uma idéia.

– Rony, eu vou cortar a sua capa e soltar o chão, aí você tenta um feitiço para subir, ok?

– Certo – concordou o amigo.

Harry apontou para a manga da capa de Rony e lançou um feitiço de corte. Imediatamente o ruivo ergueu o braço podendo movimentá-lo livremente. No segundo seguinte, Harry se concentrou no chão e novamente as tábuas começaram a tremeluzir como se estivessem vivas e Rony voltou a afundar ainda mais rapidamente. O jovem moveu rápido o braço para cima, laçando o feitiço para se libertar.

–Acendio!

Rony subiu do chão rapidamente em linha reta em direção ao teto. Quando os pés finalmente se soltaram, Harry laçou um Imobilus e o chão voltou a endurecer. Rony caiu pesadamente sobre o assoalho com uma careta de dor e as calças e os sapatos fumegando. Ele se livrou da capa, agora, em frangalhos, enquanto Harry se aproximava preocupado.

– Você está legal?

– Tô – resmungou batendo nas calças para dispersar o calor – mas o Dumbledore vai ficar me devendo essa. No que ele estava pensando em botar um chão vivo aqui?


– Acho que em impedir que as pessoas chegassem ao espelho, não é?

Rony ergueu-se do chão ainda batendo nas calças.

– Não faz sentido, Harry – exclamou pensativo. – O Fofo e todos os outros feitiços que enfrentamos estava aqui para proteger a Pedra Filosofal. O espelho era só uma parte destas defesas. Quero dizer, se tem um chão vivo aqui, então...

– Essa descida pode ser bem mais perigosa do que pensamos – completou Harry muito sério.

– É, mas por quê? Esse espelho esteve por anos em uma sala qualquer até você encontrá-lo. Só depois é que o Dumbledore teve a brilhante idéia de esconder a pedra dentro dele.

– Mas e se for à mesma coisa agora? – Disse Harry seguindo o raciocínio do amigo. – Se não for apenas uma pista do paradeiro do Livro. E se o Livro de Fausto também estiver escondido no Espelho?

– Pode ser... Mas o Snape não tinha dito que o livro estava perdido?

– Sim, mas também disse que tinha sido Dumbledore que o havia escondido e que ele erguera proteções para impedir que outras pessoas pudessem pega-lo novamente.

– E você acha que ele pode tê-lo escondido em Hogwarts? – Perguntou Rony.

– Quer lugar mais seguro que sob as vistas dele?

Rony concordou, mas ainda parecia incomodado.

– O que estou querendo dizer é que se as proteções forem desse nível, bem, não só é possível que o livro esteja lá, como... Dumbledore achava REALMENTE que alguém poderia querer vir atrás dele.

Uma luz se fez na cabeça de Harry.

– Será que Voldemort suspeitava que o livro poderia estar aqui?

Os dois se olharam por um instante antes de Rony completar.

– Ele sempre quis entrar em Hogwarts, lembra... E nós nunca conseguimos compreender exatamente por que.

– Então... – disse Harry – acho que teremos uma descida realmente difícil. – Vem – e começou a rumar para o alçapão – a gente não pode parar por aqui!

Rony o seguiu, com passos lentos, testando o chão imobilizado. Harry puxou a aldrava e abriu a passagem. Os dois se aproximaram, mas não havia nenhum indício do lugar quente em que Rony quase fora cozido. Pelo contrário, um ar úmido e frio podia ser sentido facilmente roçando os cabelos dos rapazes.

– E, agora? – Perguntou Rony.

– Bem, que eu me lembre, a gente tinha calculado uma distância enorme até o Visgo do Diabo.

Rony balançou a cabeça.

– Acho que a medida não deve ser tão imensa assim, a gente pode ter se impressionado. Não éramos muito grandes naquela época. – Harry concordou brevemente. – Mas mesmo assim é uma queda e tanto. E se não tiver mais a planta para amortecer?

– É uma possibilidade – disse Harry. – Podemos tentar um feitiço quando estivermos mais lá em baixo. Arriscamos?

– Tá maluco? – Rony fez um movimento e conjurou uma escada de corda que se colou à porta do alçapão e se estendeu pela escuridão de aparência infinita que se seguia abaixo deles. – Temos filhos para criar, cara!

Harry deu um sorriso em concordância. Às vezes ele tinha que lembrar que estava apenas se acostumando com uma condição com a qual o amigo já convivia há quase um ano. Mas, afinal, era por isso que ele estava ali. Porque ia ser pai. Estava ali pelo seu filho que ia nascer e só essa lembrança já foi suficiente para enchê-lo de energia. Prendeu a varinha no cinto e jogou as pernas para dentro do buraco do alçapão. Começou a descer a escada rapidamente, aproveitando da luminosidade que entrava pelo alçapão. Rony o seguiu. Os dois desceram por quase uns vinte minutos sem ter a menor indicação de que estariam próximos ao chão. No meio do caminho tiveram de sacar as varinhas e invocar um Lumus, pois a claridade vinda de cima já não podia ser mais percebida.

– Talvez a gente não tenha superestimado tanto a distância – falou meio sem fôlego para Rony, que concordou apenas com um resmungo.

Uns cinco minutos depois Harry achou que seu pé finalmente havia roçado em algo firme. Tirou o pé da escada e testou. O chão parecia firme, embora estranhamente... ele achou que a palavra era crocante. Levou a varinha para baixo a fim de ver o que estava sob os seus pés. O Visgo do Diabo tinha desaparecido. Em seu lugar, os cadáveres chamuscados de inúmeros insetos se estendiam por uma sala relativamente pequena.

– A-acho que você não vai gostar daqui – comentou saindo da escada para Rony continuar a descer, o amigo, no entanto, paralisou.

– Por favor, não me diga que tem aranhas!

Harry olhou o chão mais de perto. Não chegou a identificar aranhas entre os insetos mortos, não era fácil identificar qualquer um, mas não gostou do fato de que nenhum estivesse vivo.

– Não sei! Mas o que quer que tenha aqui em baixo gosta das coisas bem tostadas.

Rony finalmente colocou os pés no chão com uma careta de repugnância.

– Será que o Dumbledore pediu ajuda para o Hagrid de novo? Isso parece coisa dos “bichinhos” dele.

– Não sei... Mas se estamos na altura de onde era o Visgo do Diabo, então ainda temos de descer mais um pouco.

Rony ergueu a varinha estudando as paredes.

– Isso aqui parece completamente fechado – virou-se para Harry – alguma idéia?

– Não... – Mas antes que completasse a resposta percebeu que algo se movimentava na escuridão por trás de Rony. Uma coisa vinha se esgueirando pela parede. Harry viu a luz da varinha refletindo nos olhos negros de uma criatura que parecia ter o corpo coberto por grossos pelos avermelhados. – SE ABAIXE! – Gritou.

Um raio de luz roxa cruzou sobre Rony que se agachou num reflexo rápido. Ouviram um grito fino e rascante e depois um baque seco. Os dois se olharam por um segundo, sem fôlego, e depois se aproximaram um pouco do animal abatido.

– Que diabos é isso? – Perguntou Rony.

– Não tenho idéia, mas acho melhor que eu o tenha deixado fora de ação por um bom tempo. Isso não tem jeito de ser um bichinho de estimação.

Os dois se olharam.

– Hagrid! – Exclamaram ao mesmo tempo.

– Achei que depois dos explosivins ele tivesse desistido das criações experimentais – lamentou Rony.

– Na verdade, isso até pode ter sido antes... – ponderou Harry, mas o que quer que Hagrid criasse ali já tinha perdido o interesse, eles tinham que prosseguir. Num momento de iluminação, apontou a varinha para o chão.

– Reducto!

O solo explodiu cobrindo os dois de insetos assados, mas abrindo uma passagem razoável para o estágio abaixo. Eles sacudiram as vestes e os cabelos para se livrarem da cobertura nojenta e seguiram para a abertura. Rony inspecionou com a luz da varinha, mas desta vez o próximo andar era bem visível e os dois pularam rapidamente para baixo.

– Por aqui! – Apontou Harry para a esquerda e os dois se puseram a seguir pela passagem que parecia levar ainda mais para baixo, sob a terra. Ao chegarem ao fim do caminho se deparam com uma sala clara, de teto alto em forma de arco, e com uma grande porta de madeira em sua outra extremidade. A sala das chaves, lembrou-se Harry. Mas não havia nenhuma chave voando. A sala parecia vazia. Mais clara até, mas vazia.

Os dois trocaram olhares inquisitivos. Com certeza uma sala vazia no mundo mágico não representava o mesmo que nada. Empunharam as varinhas e começaram a andar cheios de cautela. Por experiência, iam testando o chão a cada passo. Mas nada aconteceu. Ao chegarem diante da porta, perceberam que esta era diferente da que haviam cruzado há 15 anos atrás. Parecia bem menos antiga. Era de uma madeira brilhosa, maciça, cheia de relevos geométricos entremeados com arabescos, o que lhe dava uma aparência bem original. A maçaneta era de bronze e exibia contornos esverdeados pela falta de uso. Harry tocou-a vagarosamente com a mão e testou. Obviamente trancada. Abaixou-se para analisar a fechadura. Ao contrário da outra vez em que estivera ali, a fechadura não era nem grande nem antiga, na verdade, tinha espaço apenas para uma chave bem pequena. Rony o tinha acompanhado no movimento para olhar a fechadura.

– Um Alorramorra não vai funcionar aí, vai?

– Duvido muito – respondeu Harry pensativo.

– Então, a chave deve estar em algum canto por aqui. Possivelmente encantada. Se ela é desse tamanho aí – apontou para a diminuta fechadura – vamos ficar aqui milênios.

Harry começou a testar todos os feitiços para arrombar portas que conhecia, mas sabia de antemão que nenhum funcionaria. Quando o terceiro feitiço bateu barulhento contra a porta sem nem mover a fechadura, uma música suave invadiu o ambiente ao mesmo tempo em que um canto do outro lado da sala começou a brilhar com mais intensidade.

– O que é isso? – Perguntou Rony indo em direção ao canto iluminado de onde a melodia parecia vir.

Harry pensou em dizer-lhe para ter cuidado, mas também estava curioso. Além do mais a música era muito, mas muito, bonita. Os dois foram atravessando a sala até o ponto iluminado. Havia um tipo de nicho ali. Dentro dele estava o objeto mais maravilhoso que os dois já haviam visto. Era uma espécie de harpa grande, quase do tamanho deles, dourada, que parecia emitir sua própria luz. As cordas tocavam-se sozinhas reproduzindo sons tão divinos que não poderiam ser descritos em palavras humanas. Era como ouvir uma melodia vinda diretamente do céu.

A parte frontal da Harpa era esculpida com o corpo e o rosto de uma bela jovem. Harry olhou para Rony que parecia tão encantado com a música quanto ele. Os dois trocaram sorrisos bobos e, quando olharam para a Harpa novamente, a jovem dourada havia aberto os belos olhos azuis e os mirava docemente. Antes que pudessem se impressionar com o fato da escultura parecer viva, ela começou a cantar e tudo mais sumiu da mente deles. A canção era em uma língua desconhecida, mas Harry tinha certeza que jamais escutara nada tão bonito. Era a voz mais linda, mais doce, mais perfeita que ele já tinha ouvido. Era como ser mergulhado dentro da felicidade. Ele poderia ficar ali para sempre, apenas ouvindo a Harpa cantar. Seus braços caíram ao longo do corpo e ele ficou ali, ouvindo. Esqueceu até de Rony ao seu lado, só queria que a Harpa continuasse a tocar e cantar.

Harry não saberia dizer quanto tempo ficou ali sem que nenhum pensamento conexo lhe cruzasse a cabeça. Então, apareceu. Lá no fundo. Ele demorou a entender que era uma espécie de vontade que se formava nele. Ainda enlevado pela canção ele percebeu que gostaria era que mais pessoas pudessem ouvir a Harpa. Isso! Se todo mundo pudesse ouvi-la, ele tinha certeza que as pessoas ficariam tão felizes quanto ele. Tudo o que ele tinha a fazer era a pegar a Harpa e levá-la para cima. Todos iam adorar! Gina ia adorar!

Um choque elétrico percorreu-lhe o corpo. Gina! O bebê! Não havia nada de feliz no fato deles estarem em perigo. Um sentimento de pavor e de urgência começou a fazer com que a música lhe parecesse um pouco irritante, já que lhe impedia de pensar direito. Olhou para os lados. Rony ainda exibia um sorriso bobo e encantado. Encantado! Claro! A Harpa os encantava para que parassem. Para que não prosseguissem. Apontou a varinha para a Harpa que ainda teve tempo de exibir uma expressão assustada.

– Silêncio!

O som sumiu e a moça lançou um olhar furioso para Harry. Ela continuava a mexer os lábios, mas deles não saia nada auditível. Ela revisou suas cordas, que continuavam a se mover, mas também sem qualquer ruído. Fez um esforço como que para cantar mais alto, mas nada. Cruzou os braços numa atitude francamente irritada.

– O que foi isso? – Perguntou Rony com uma voz sonolenta enquanto piscava diversas vezes os olhos.

– Se estou bem lembrado das coisas que Dumbledore gostava, acho que acabamos de ser vítimas dos poderes mágicos da música clássica – respondeu Harry.

Rony olhou para a Harpa, que exibia uma expressão enfurecida, e dela para Harry.

– Não acredito que perdemos um tempão nisso – resmungou contrafeito.

– Não subestime o Dumbledore, ele não colocaria isso aqui se não estivesse de alguma forma testando quem ia passar.

– Beleza – disse Rony sem emoção – você passou e eu rodei. Têm coisas que não mudam!

– Não acho que eu teria saído do transe se não tivesse lembrado do que me trouxe aqui em baixo. Era isso que provavelmente ele queria testar. As razões de quem faria essa busca – considerou Harry, com uma expressão triste e preocupada.

Rony entendeu. Colocou a mão sobre o ombro do cunhado e deu um aperto encorajador.

– Vamos conseguir, cara! A gente nunca deixou de conseguir antes, não é? – Harry sorriu concordando. – Então, não vai ser agora! Vem, vamos procurar a tal da chave.

Harry começou a segui-lo para longe da Harpa, mas alguma coisa lhe chamou a atenção. Nada que ele tivesse visto. Foi mais uma sensação. Era incrível como os seus sentidos mágicos haviam se tornado aguçados. Harry não saberia dizer quando isso acontecera exatamente. Mas eles estavam ali. Fortes. Arrepiando os cabelos da nuca e dos braços. Ele voltou-se rapidamente para trás e pegou a Harpa olhando os dois com um sorriso maroto. Ela tentou mudar de expressão quando Harry virou, mas não foi rápida o suficiente.

– Acho – disse Harry chamando a atenção do amigo – que a mocinha aqui sabe onde está a chave.

Rony olhou para a Harpa, que olhava para o teto com cara de que nem era com ela.

– Tem certeza? – Harry confirmou e Rony já estivera com ele em situações como aquela tantas vezes que nem ousou duvidar. – O que vamos fazer? Será que ela fala? Ou só canta? Por que se ela começar a cantar, vai ser aquilo de novo... Será que estava na canção?

– Acho que é o mais provável – considerou Harry sem tirar os olhos da Harpa que continuava olhando para cima, toda dissimulada.

– O que vamos fazer?

Harry pensou um pouco. A idéia se formou rápida e clara. Às vezes achava que ter observado Dumbledore por tantos anos o ensinara mais que todos os poderes que ele adquirira depois. Ele deu um sorrisinho. Lançou um feitiço tampão nos ouvidos e fez sinal para Rony fazer o mesmo. Depois retirou o feitiço da Harpa que, mesmo sem parecer entender o que ele tinha feito, recomeçou a cantar concentrada, fazendo força para que os rapazes a ouvissem.

O jovem bruxo fez um movimento amplo de varinha, como se regesse uma orquestra e uma fita dourada formou-se no ar. Nela estava escrita, numa caligrafia inclinada e bonita, a letra da canção cantada pela Harpa. Rony fez um gesto mudo de aprovação e quando a letra estava toda na fita dourada, ele voltou-se para trás e silenciou a Harpa, que novamente cruzou os braços, indignada.

– Bom, o problema, agora, é descobrir o que as palavras significam – falou Harry analisando a fita sem identificar nada que se parecesse com uma língua conhecida – se ao menos a Mione estivesse aqui.

Rony lançou-lhe um olhar superior e depois apontou a varinha para a fita. Uma luz prateada envolveu as palavras e depois, lentamente, começou a vertê-las, uma a uma, para o inglês.

– Como...?

– Feitiço de tradução! Um dos favoritos da Mione. Ela usa quase o tempo todo. Diz que é mais rápido do que ler em outra língua. Só não pode ser usado em livros muito antigos porque detona com eles.

Harry não pode deixar de rir da explicação do amigo. Mas agradeceu mentalmente por Rony sempre ter prestado tanta atenção ao que Hermione fazia, mesmo que não prestasse a mesma atenção às aulas e aos professores.

Quando a luz prateada se extinguiu os dois finalmente puderam ler as palavras e, como Harry previra, eram o caminho para a chave:

"Se quiser passar
Primeiro
Vai ter de me escutar
Mas se quiser prosseguir
Depois
Vai ter de parar de me ouvir
Se me perguntar,
Porém
Saiba que nenhuma resposta eu vou dar
Pois até um trouxa saberia
Onde a chave deve estar."


– Beleza – falou Rony desanimado – um enigma! Agora realmente precisávamos da Mione!

Harry leu e releu o texto. Tentou cruzá-lo. Trocar palavras. Já decifrara o enigma de uma esfinge uma vez, não era tão ruim nisso. Mas quanto mais pensava. Mais a resposta lhe parecia impossível, improvável, ou no mínimo, uma piada. Harry olhou para a Harpa que o observava com atenção.

– Não pode... – murmurou – tão fácil!

A Harpa fez um movimento impaciente com os ombros, colocou uma mão na cintura e com a outra apontou para si mesma. Os olhos fuzilando-o, furiosa.

– Sei... – disse Harry rindo – a parte difícil era você!

– Do que você está falando? – Perguntou Rony confuso.

Mas Harry estava achando aquilo tão hilário que mal ouviu o amigo. Inclinou-se cortesmente para a Harpa.

– Parabéns, moça! A senhorita foi muito competente! – A Harpa deu de ombros, tentando parecer indiferente, mas Harry notou nela um sorrisinho lisonjeado. – Vamos! – Chamou Rony, ainda rindo.

– Eu não entendi nada – Rony o seguia confuso, olhando de vez em quando para a Harpa que lhes dava um adeusinho. – O que você falou com ela? Você sabe onde está a chave?

– Sei – respondeu Harry simplesmente.

Rony olhou de novo para trás e a Harpa os olhava sorrindo, e mexendo no cabelo.

– Incrível... – comentou o ruivo e Harry o olhou – seu charme com essas coisas.

– Que coisas?

– Coisas esquisitas, fantasmas e sei lá mais o que... A Harpa já está te olhando com a mesma cara da Murta quando te via.

Harry revirou os olhos e Rony começou a rir. Eles chegaram em frente a porta.

– E aí? Onde está a chave? – Perguntou Rony.

Harry parou em frente à porta e olhou para cima. Esticou o braço e ficou na ponta dos pés para atingir o espaço entra a madeira que enquadrava a porta e a parede. Ele tateou por uns segundo sentindo a poeira sob os dedos quando uma coisinha fria pareceu deslocar-se sob eles. Harry esticou um pouco mais o corpo e puxou para longe da parede o objeto que tinha tocado. Quando desceu o corpo, ele segurava uma chave minúscula na mão direita.

– Como...? – Perguntou Rony, abismado.

– Vantagens de ser criado por trouxas, meu amigo! Eles têm a mania de esconder chaves extras em lugares próximos às portas, em cima ou no capacho.

Rony pareceu impressionado.

– “Até um trouxa saberia...” – recitou. – Brilhante! Verdadeiramente genial! Que bruxo pensaria em algo assim? Digo, para nós isso é estranhíssimo. – Mas aí pensou um pouco mais. – Mas se todos os trouxas fazem isso, e todo mundo tem conhecimento disso. Não é meio inseguro, digo, em relação à casa dos trouxas?

Harry deu de ombros, pôs a chave na fechadura e a girou. A fechadura fez um clic e a porta abriu rangendo um pouco. Os dois atravessaram a porta seguindo por uma sala bem menos iluminada que a anterior, os olhos procurando se acostumar. Acharam melhor empunhar novamente as varinhas. Dumbledore tinha, até ali, trocado todos os feitiços que eles haviam enfrentado há 15 anos para chegarem ao espelho. Harry estava se perguntando o que estaria no lugar do jogo de xadrez, com o senso de humor do diretor, provavelmente um Snap Explosivo gigante... Mas quando seus olhos acostumaram-se a penumbra, Harry percebeu que estavam diante do que parecia ser um terreno em ruínas. Em torno dele, uma névoa suave que parecia se tornar mais clara na medida em que se aproximavam. Buscou o olhar de Rony, mas ao contrário dele, o amigo parecia estar reconhecendo o que via.

– Rony? – Arriscou, sem parar de caminhar.

– Harry, é o jogo!

Harry olhou para frente. A névoa estava cada vez mais brilhante e parecia proteger, como uma cúpula, os destroços a sua frente. Ele não precisou perguntar para Rony. Era claro. Estavam diante dos restos do jogo de xadrez de 15 anos atrás. As peças estavam exatamente no mesmo lugar em que Harry, orientado por Rony, tinha lhes dado o xeque-mate.

– Isso é incrível! – Comentou Harry. – Ele não mexeu em nada aqui!

Rony nem conseguia fechar a boca. Guardava aquele jogo na memória como um dos seus momentos mais brilhantes. Ele, sozinho, tinha vencido. Tinha ajudado Harry e ganhado 50 pontos para a Grifinória. Sem dúvida, um de seus melhores momentos. Harry podia ler isso com facilidade na expressão do amigo, mas ainda tinha um probleminha. Não acreditava que aquela névoa os deixasse passar facilmente. Detestava arrancar Rony das suas lembranças felizes, mas eles tinham que atravessar o tabuleiro.

– Rony? – O outro o olhou. – Temos que passar.

– Ah, claro! Claro!

Harry fez um movimento direção à névoa com a varinha em punho. No entanto, antes que se aproximasse o suficiente para tentar atravessá-la, percebeu que algo começou a se agitar em frente aos seus olhos. Rony se aproximou. No instante seguinte, materializou-se em frente a eles, como se houvesse aparatado, um pequeno pilar de metal com uma placa em bronze com um pequeno texto gravado. Os dois chegaram mais perto para ler.

"Neste tabuleiro teve lugar, em junho de 1991, o mais memorável jogo de xadrez da história de Hogwarts. Foi vencedor o Sr. Ronald Weasley, acompanhado pelo Sr. Harry Potter e pela Srta. Hermione Granger. Em honra destes e
como reconhecimento desta escola foi erguida esta placa.
Hogwarts, 18 de julho de 1995.
Diretor: Alvo Dumbledore
Vice- Diretora: Minerva McGonagall"


Harry e Rony ainda olhavam a placa, estupefatos, quando uma outra, menor, apareceu abaixo dela como se houvesse se desdobrado, presa por duas correntinhas.

"Caso você não seja nenhum dos Sr.s apontados acima, terá de jogar novamente.
Mas realmente espero que você seja um jogador brilhante,
pois as peças me garantiram que querem uma revanche.
Alvo Dumbledore".


– Doido! – Disse Rony rindo atordoado. – Ele era completamente doido!

– Pois eu continuo achando ele brilhante! – Falou Harry também rindo. – Bem, Rony, faça as honras – completou apontando para a névoa.

Rony parecia lisonjeado e satisfeito quando ergueu o braço da varinha. Como Harry previra, a névoa se dissipou e os dois puderam entrar calmamente e passar pelo tabuleiro. Harry percebeu que algumas peças, que estavam inteiras, pareciam reconhecer Rony. As pretas, com que eles haviam jogado, os saudavam alegres. Os peões inclinaram-se respeitosamente, assim como um bispo e uma torre. O rei preto inclinou a cabeça solene, enquanto a rainha fez uma reverência cerimoniosa. Do lado das brancas foi diferente. Havia uma certa animosidade, embora com respeito. Apenas umas poucas peças os cumprimentaram.

Harry olhou para o lado quando saíram do tabuleiro e Rony parecia andar nas nuvens.

– Rony?

– Que? – Respondeu o outro, ainda bobo.

– Diminui! – Falou antes de cair na gargalhada.

O amigo o acompanhou e já se preparava para responder quando uma coisa arrancou a varinha que pendia frouxa na sua mão. Harry não teve tempo nem de admirar-se, pois logo uma nova chicotada arrebatou sua própria varinha. Ele virou-se para ver o que os atacava e foi surpreendido por um galho que tentou enlaçar seu pescoço. Desviou rápido ao mesmo tempo em que ouviu Rony gritar. Olhou para o local de onde o grito vinha. Rony estava sendo preso pelos braços e pelas pernas pelo que pareciam ser sebes. As sebes vivas que ele enfrentara no labirinto, no quarto ano! Elas, agora, cobriam as paredes das salas onde, da outra vez, eles haviam encontrado o trasgo de Quirrel e as chamas coloridas e poções de Snape.

Um galho fez a volta na barriga de Harry e pressionou com violência o estômago tirando-lhe o ar. No segundo seguinte, galhos e folhas avançavam pelo seu corpo, pressionando os músculos e arrastando-o em direção à parede de cerca viva. Rony gritava, xingava, mas quanto mais se debatia, mais preso ficava. Os dois estavam sem varinha e Harry não conseguia nem ao menos localizá-las. Tentou mentalmente um feitiço convocatório, mas apenas ouviu um movimento mais alto em alguns dos galhos. “Ótimo, faz isso de novo Harry e você vai conseguir é quebrar a sua varinha”, o pensamento de ser engolido pela sebe era tampouco confortador. Rony continuava aos berros, tentando libertar-se tão violentamente quanto ele próprio. Mas era inútil. Ele chegou a sentir um segundo de desespero, mas então aconteceu de novo. Estava ali! A sensação de que ele sabia exatamente o que deveria fazer. Era uma sensação forte, poderosa, como um instinto.

– Rony, cala a boca! – Berrou e o amigo silenciou surpreso, e depois com um olhar de entendimento.

Harry fechou os olhos, respirou fundo e simplesmente deixou que a mágica fluísse dele. Não fez nenhum movimento a não ser continuar a respirar. Por um instante os galhos da sebe pareceram cobri-lo com maior velocidade, mas logo depois, eles pararam. Harry podia sentir a sebe. A planta parecia incomodada, tentava seguir e não conseguia. Ele abriu os olhos, e sem mais nenhuma resistência os galhos afastaram-se, soltando a ele e a Rony. Em segundos, os dois estavam completamente livres e as sebes estavam novamente silenciosas, coladas às paredes, inertes. Harry esticou o braço direito e as duas varinhas vieram para a sua mão. Seus olhos encontraram com os de Rony. O amigo tinha a boca entreaberta e parecia levemente assustado.

Harry fechou os olhos e respirou fundo novamente, se não se controlasse, logo alguma coisa ia explodir. Quando os abriu, já podia sentir o corpo normalmente. Adiantou-se para entregar a varinha de Rony. O amigo estava inclinado sobre uma das pernas que sangrava abundantemente, as roupas rasgadas e o rosto coberto de arranhões.

– Tudo bem?

– Cara... Como você consegue fazer essas coisas? – Perguntou Rony, sem fôlego. – Eu... Por mais que eu veja... Isso assusta, sabia?

– Também me assusta, Rony! – Mas Harry não conseguiu sustentar o olhar do amigo. Uma parte dele sempre identificava esses poderes com Voldemort, com a profecia, com as Horcruxes, e ele realmente detestava pensar nisso. – É melhor a gente dar um jeito na sua perna. – Falou mudando de assunto.

– Tá – aceitou Rony, que pareceu preferir não insistir.

Harry passou a varinha sobre o corte que imediatamente cicatrizou. Ergueu-se e se livrou da capa, agora em frangalhos. Sua aparência, certamente, não devia estar melhor que a do amigo. Os dois seguiram em frente, mas andavam de forma um pouco mais penosa. Os músculos das pernas e dos braços reclamando da recente tortura. De vez em quando, as sebes farfalhavam levemente, mas não voltaram a atacá-los. Alguns instantes depois, os dois se viram no alto de uma escadaria. Abaixo dela estendia-se uma sala ampla, iluminada por inúmeros archotes. Rony nunca tinha estado ali, mas Harry a reconhecia claramente. Era a sala em que ele encontrara Quirrel, Voldemort e o Espelho de Ojesed.

Mas havia uma sensível diferença. Não havia nenhum espelho no centro da sala.

Os dois trocaram um olhar levemente desanimado. A sala toda estava coberta de espelhos. Dos mais deferentes tipos e molduras, dispostos em várias fileiras que se estendiam até os recantos mais escuros da enorme sala. Rony desceu um degrau e sentou, exausto.

– Você se lembra da moldura do Espelho de Ojesed? – Harry fez um sim breve com a cabeça.

– Mas não consigo localizá-lo daqui – respondeu Harry descendo também um degrau.

– Certo. Mas e se todos esses espelhos forem mágicos? Até que a gente chegue às fileiras detrás... Quero dizer, sabe-se lá o que eles podem refletir ainda mais se quiserem nos atrasar.

Rony tinha razão, aquilo poderia levar muito tempo, sem falar que espelhos podem ser muito perigosos. Harry analisou a sala. Tinha que ter um outro jeito... Um jeito de passar pelos espelhos sem refletir neles... “Você às vezes é lento, Harry Potter”, censurou-se levando a mão dentro do casaco e tirando de lá a capa de invisibilidade. Rony fez uma expressão de compreensão, mas não se levantou.

– Agora é com você, cara! Essa capa não vai cobrir nós dois e acho que vai ser mais rápido se você estiver sozinho diante daquele espelho.

Harry concordou.

– Você está legal? – Rony parecia pálido e cansado.

– Tô, sim! Meio amarrotado, mas vou sobreviver.

Harry deu um sorriso e desceu uns dois degraus desdobrando a capa. Já ia vesti-la quando uma súbita curiosidade o assaltou. Voltou-se para o amigo que o observava do alto da escada.

– Rony, se você ficasse na frente do Espelho de Ojesed, o que acha que veria?

– Hoje? – Harry fez que sim. – Se minha irmã, meu sobrinho e meu melhor amigo não estivessem em perigo? – Harry achou a ponderação justa e assentiu. Rony deu um sorriso lento. – Acho que só veria a mim mesmo.

– Deixa a Mione saber disso – falou Harry cínico.

– Ela sabe – disse Rony se escorando no degrau às suas costas – mas conte para ela e você vai ter inveja dos insetos que o amiguinho do Hagrid estava devorando.

Harry não pode conter uma risada antes de sumir sob a capa de invisibilidade e descer os degraus em direção às fileiras de espelhos.

– Se precisar, grite! – Ouviu Rony berrar às suas costas.

Ele seguiu pelo meio dos espelhos, mas por segurança preferiu não olhá-los diretamente, fixando sua atenção na parte de cima das molduras. Lembrava que na parte de cima do espelho que procurava havia algo escrito e entre as palavras estava ojesed. Além disso, era possível que um ou outro daqueles espelhos, se fossem mágicos como Rony sugerira, não pudesse ser enganado por uma capa de invisibilidade.

Olhou a primeira fileira e nada. Na segunda também não existia nada que se parecesse com a sua lembrança. Já estava achando que aquilo ia demorar muito tempo quando a parte de cima de uma moldura alta na quarta fileira lhe chamou a atenção. Aproximou-se e lá estava: “Ojesed ooãça roc eutod samot sor euto ort somoãn ue”*. “São palavras refletidas em um espelho”, pensou prestando realmente atenção pela primeira vez. “Eu não mostro o teu rosto, mas do teu coração o desejo”. Um frio na barriga o reteve por um segundo. Eram 15 anos desde a última vez em que estivera em frente àquele espelho. Muita coisa tinha mudado! Ele não era mais um menino carente de 11 anos que ansiava pelo carinho de uma família, que sentia uma falta imensa do pai e da mãe que ele nunca tinha conhecido. Também não podia dizer que estava ali apenas para impedir que um bruxo das trevas pegasse um objeto mágico, sem ter nenhuma intenção de utilizá-lo em proveito próprio. Não sabia exatamente o que o livro continha, mas não teria o menor pudor de usá-lo se isso pudesse deixar Gina e o bebê a salvo. Não ia perder sua família de novo. Por nada desse mundo. Esse pensamento não lhe pareceu muito nobre ou correto e, pensou, talvez, isso não fosse o suficiente para quebrar o feitiço de Dumbledore. Mas era tudo o que o Harry adulto podia oferecer naquele momento. Respirou fundo mais uma vez e puxou a capa deixando-se refletir.



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N/A: Gente, obrigada pela leitura, pelos coments e pelos votos. Quero pedir desculpa a algumas pessoas que comentaram o capítulo 12 e como eu não fiz agradecimentos pessoais no 13, acabei não respondendo a elas. Para corrigir a gafe horrível, incluí essas pessoas aqui, mesmo que não tenham comentado o último capítulo.
Sobre o capítulo 15. Desculpem, mas aconteceu de novo, eu tinha uma idéia na cabeça e quando comecei a escrever o capítulo foi ficando cada vez maior e achei que seria melhor parti-lo em dois. Acho que ele já ficou “Growp” (usando a terminologia da Belzinha) o suficiente, espero não cansar ninguém.

Morgana Black: Adorei sua reviw, querida! Cena por cena, hehe! Que bom que você gostou do toque gótico, do Snape em cima do muro e da ceninha final. E, sim, a Doninha albina está de volta. Para o quê? Nem sei se ele sabe, hihi. Beijão (cadê seu capítulo novo? Esperei o dia todo).
Luna Weasley: Você sabe que seus comentários me deixam nas nuvens, não é, menina? Adoro! Especialmente quando você aponta os detalhes. Saber que a gente passa no crivo de um leitor cuidadoso é bom demais. Beijo grande! (Hei, e vc tb está devendo capítulo novo, mocinha!)
Bruna: Puxa Bruna, ser comparada com a Sônia é realmente um elogio imenso, já que acho que ela é uma inspiração. Valeu mesmo! Quanto à sua crítica. Nossa, vc é realmente uma leitora detalhista e cuidadosa, hein? Para falar bem a verdade, escolhi não contar apenas do ponto de vista do Harry para poder explorar um pouco as outras personagens, embora, quase sempre que ele aparece, as coisas são meio que pelos olhos dele. Espero mais comentário seus. Beijo grande.
Bernardo: Coisas malignas!? Hahaha! Pode deixar! Adorei seu comentário, tanto aqui quando na short “Ron & Mione”. Valeu mesmo! Ah, escreve a short H/G, eu te acho maravilhoso escrevendo esse ship. Vou cobrar, tá? Beijão!
Belzinha: Hihihi! Só para manter o ritmo: seu comentário foi muito fofo, hehe! Adorei vc referir aos medos de infância, foi neles que me inspirei. E quanto à Hogwarts, bom, para qualquer potteriano q se preze, a escola é o centro do mundo!!!!! Beijo imenso!
MarciaM: Adorei seu comentário, ainda mais porque li outro seu (em outra fic) e fiquei sabendo do seu gosto H/G (me identifiquei, hehe). Beijão e obrigada!
Charlotte Ravenclaw: Que vc melhorou da gripe. Obrigada pelo comentário, pelo elogio e por ser essa amiga maravilhosa que vc é. Também estou louca de saudades. Beijo grande!
Samoa: Adorei vc dizer q adora os pequenos. Acho que introduzir personagens novos é sempre um risco, então a gente fica muita satisfeita quando alguém diz que gosta deles. Muito obrigada, mesmo! Bj.
Maria Luísa: Não precisa agradecer o e.mail, ninguém tem mais interesse pela leitura de vcs que eu, hehehe. Obrigada pelo comentário!
Grazi DSM: Pleasee, não se castigue, não! Isso acontece! Eu nem estranhei porque li o segundo comentário primeiro, hehe. Obrigada por comentar e um beijão. Ainda não pude ir na sua fic por falta de tempo, mas vou lá assim que der, ok?
Carolzinha: Seu comentário foi, como diria a Bel, “fofo demais”. Adorei! Sabe que fico toda boba quando elogiam minhas ceninhas românticas porque morro de medo de ficar piegas e eu gosto tanto de escrevê-las... Sim, o Draco é uma coisa mesmo! Valeu pela revew, beijão!
Kika: Obrigada, adorei o comentário! Sim, os comensais tiveram coragem de se associar com os monstros, mas pelo menos, os beusclaih não parecem melhores do que são, enquanto os Comensais adoram enganar. Ah, a Mione não foi, mas garanto que é por um bom motivo, mas vc ainda vai ver o trio maravilha junto. Aguarde e confie!
Carline Potter: Antes de tudo, obrigada vc pelas “resenhas”, hehe, elas me fazem pensar o capítulo todo de novo e isso é muito bom. O q vc falou sobre os demônios e o Harry, por exemplo. Quanto a Danna... aguarde o próximo capítulo e leia tb o capítulo 4 da Bel (HP e o Segredo de Corvinal)! E quanto aos casais, siiiimmm, o que posso dizer, sou H/G, R/H e C/A (Carlinhos e Ana) para sempre!!!! Bjs imensos!
Trinity Skywalker: Valeu, Trinity, de coração! Toques de Arquivo X e agora de Charmed (parece que assistimos as mesmas séries, hein?), hehe. Livro 8? Espírito de JK? Isso vindo de vc é um elogio imenso, porque acho que vc é a pessoas que tem acesso direto às idéias que a tia Jô não põe nos livros. Acho que vc deve ser Legilimente, só isso explica as suas fics, hihihi. Beijo imenso, amiga!
Eddy: Que bom que vc curtiu a história dos demônios. E, acredite, eu tb não aprecio o Draco, gente invejosa e escorregadia é uma péssima combinação. Quanto a frase final do capítulo, obrigada pela nota! Valeu mesmo!
Bruna Perazolo: Obrigada pelo comentário, que bom que correspondi à propaganda! Beijão!
Até o próximo capítulo: COMENTEM, please!

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