Sonhos e Pesadelos



Sonhos e Pesadelos


- Alguma coisa?

- Não, ainda não. - Respondeu Hermione, fechando o livro. – Vamos encontrar, não se preocupe.

Gina concordou com a cabeça e pegou outro volume, particularmente grosso, dentre os que agora cobriam a mesa da cozinha ampla e iluminada da casa dos Potter, em torno da qual, ambas estavam sentadas. Sirius ressonada em um bercinho próximo a elas. Pelos janelões que ocupavam a parede da pia, abertos para o frescor da noite de verão, entravam as vozes e os risos altos dos dois homens no jardim.

Tinha sido um dia perfeito. A festa de aniversário de Harry começara com um almoço e seguira até quase dez horas da noite. Harry queria diminuir o número de convidados todos os anos, mas isso era quase impossível. Não havia como diminuir a família Weasley, que parecia ter sido vítima de um feitiço Engorgio, pois desde o fim da guerra, era raro o ano em que não havia um membro novo no clã. A Sr.ª Weasley mais velha (pois agora elas eram muitas) costumava dizer, numa exasperação fingida que não escondia a sua alegria, que nesse ritmo acabariam com uma mesa que iria da Toca até Londres, só para acomodar aquele exército de ruivos (embora algumas outras cores de cabelo começassem a se insinuar no meio). Além da família, não se podia dizer aos amigos que não viessem. Lupim, Tonks e o filho; Neville, Luna, o velho Olho-Tonto, a Prof.ª Minerva e Hagrid sempre apareciam. Definitivamente, não tinha como a festa ser menor. E apesar de Harry comentar o número extraordinário de pessoas, ele amava cada minuto de seus aniversários, como se todos os que ele vivera até seus dezoito anos pertencessem a outra vida.

Depois que os mais renitentes convidados se retiraram – e esses foram os gêmeos que explodiram fogos até serem arrastados pelas esposas Alicia e Cátia, ambas com garotinhos ruivos adormecidos em seus colos – Harry, Rony, Gina e Hermione começaram a arrumar a bagunça resultante da festa. As duas ficaram com a organização do interior da casa, onde tudo já estava em ordem há quase meio hora, apenas um paninho solitário enxugava sozinho o balcão da cozinha, de vez em quando indo até o ralo e torcendo a si próprio para tirar o excesso de água. Elas, agora, debruçavam-se sobre os inúmeros livros sobre a mesa. Hermione sabia que Gina queria provas antes de falar qualquer coisa para Harry e Rony. Por isso não os haviam apressado. Era óbvio que a limpeza deles fora mais divertida e menos objetiva que a delas. Pelas gargalhadas e estrondos dava para adivinhar que eles estavam fazendo duelos com cada um dos móveis antes de guardá-los no galpãozinho do jardim. Hermione fechou com força o livro que estivera olhando e passou imediatamente para outro, dando uma breve olhada para a cunhada. Gina não pareceu perceber o movimento. Seus olhos estavam pregados em uma página do livro grosso e antigo, estava pálida e uma sensação de náusea começava a torcer-lhe os cantos da boca.

- Tudo bem?

- A-a achei... – respondeu a outra num fio de voz.

Hermione levantou-se rapidamente rodeando a mesa e se curvando sobre o livro que a outra segurava. Era uma descrição pobre, como de alguém que apenas ouvira histórias incompletas ou ficara repugnado demais para narrar tudo, mas Hermione sabia que não teria algo extremamente completo em casa. Uma descrição detalhada daquele tipo de ritual somente apareceria em um livro que contivesse avançadíssimas magias das trevas. Ela apenas queria que achassem um ponto de partida. Se estivessem certas, (e como ela pedia para que não estivessem) iriam aprofundar a pesquisa, talvez na biblioteca do Ministério, talvez na de Hogwarts, certamente Minerva não negaria à eles o acesso ao que quisessem consultar. Ficaram tão absortas que não reparam quando os dois homens entraram na cozinha. Rony escorou-se no batente e cruzou os braços. Lançou um olhar para Harry parado logo atrás dele e voltou-se para as duas.

- E então...- elas se sobressaltaram – quem começa?

Hermione e Gina se olharam.

- Acho que um chá vem a calhar – disse a primeira – porque não se sentam – moveu a varinha em direção ao fogão, onde o fogo se acendeu sob uma chaleira. Num segundo movimento, o armário se abriu e quatro canecas saíram voando indo aterrizar sobre a mesa.

Rony e Harry puxaram cadeiras e sentaram. Havia um grande desconforto no ambiente. O nervosismo das duas era óbvio e eles estavam levemente indignados com o fato de que era muito claro que elas estavam escondendo alguma coisa. Haviam comentado no jardim. Chegaram até a achar que não podia ser nada muito sério, ou elas teriam falado antes, mas ao vê-las na cozinha, os rostos brancos, os olhos cheios de horror, perceberam que alguma coisa estava realmente errada.

Hermione serviu as xícaras e sentou-se.

- Bom...- começou, mas Gina interrompeu.

- Deixa comigo, Mione. Você me ajuda.

Ela respirou fundo. Olhou para o irmão e depois para o marido.

- Não tenho dormido muito bem desde o início da gravidez. Não que eu não tenha sono, mas é que ... tenho visto...hum... coisas quando durmo. Coisas...

- Pesadelos são comuns, Gina, Hermione tinha sempre e...

- Não interrompe, Ron – ralhou a mulher – deixa ela falar.

- Rony, eu conheço a diferença entre um pesadelo e o que eu vi. Acredite. Sei a diferença. Aprendi no meu primeiro ano na escola. Não há como confundir os dois. – Falou Gina exasperada.

Rony engoliu seco e recostou-se na cadeira. Harry observou a sombra que passou pelo rosto da mulher. Quis tocá-la para assegurar que coisas como as que tinham passado nos anos de escola não voltariam a acontecer, não com Voldemort morto. Mas achou que talvez isso dificultasse o que ela estava querendo contar. Inclinou a cadeira para trás equilibrando-a nas pernas traseiras e colocou as mãos nos bolsos do jeans. Fez um movimento de cabeça para que Gina continuasse. Ela respirou fundo novamente.

- Tenho visto, repetidamente, uma cena ... é terrível, macabra. Às vezes ela tem mais detalhes, às vezes menos, mas é sempre a mesma. Eu não sabia exatamente o que estava vendo, exceto de que era um horrível ritual de magia negra e que parecia ser muito real.

Ela se calou e Hermione pegou na mão da amiga e continuou.

- Gina me contou sobre as visões, eu achei que já havia visto algo sobre isso. Não na escola, porque sei que nenhum bruxo que se preze acredita nessas coisas. Sempre os vi darem risada das idéias que os trouxas têm a respeito da magia negra. Como ela tinha um pressentimento muito forte de que o que estava vendo era real, começamos a investigar e...bom, parece que achamos alguma coisa. Quer dizer ainda temos que pesquisar muito, mas...bem, é um começo...e

- Pelo amor de Merlin chega. – Harry quase gritou, o que fez Sirius mexer-se no bercinho. Como o garoto continuou dormindo, ele voltou-se para as duas, pegou as mão de Gina e falou mais calmo e mais baixo. – O que você tem visto, amor?

- Uma missa negra. -Disse Gina com a voz quase chorosa.

- E que diabos é isso? Perguntou Rony.

Hermione lhe estendeu o livro que as duas estavam lendo. O ruivo se inclinou e leu algumas linhas. O descaso que havia em seus olhos no início da leitura evaporou-se nas ultimas linhas. Ele praticamente jogou o livro para Harry.

- Isso é coisa de trouxas malucos. É pervertido e maléfico, mas não é sério, né? Quer dizer, é só assassinato, não tem magia de verdade...

A seriedade dos outros o fez calar.

Harry deu uma olhada no livro. Sabia do que se tratava uma Missa Negra. Falara dela num trabalho que fizera em seu terceiro ano com a ajuda do dono da sorveteria do Beco Diagonal. Na época achara interessantes os detalhes escabrosos. Coisa de garoto. Não dera real peso ao que lhe haviam contado. Agora, no entanto, seus instintos de Auror, tanto quanto aqueles que ele tinha apenas porque, afinal, ainda era Harry Potter, lhe diziam que aquele era um assunto para se levar a sério.

- Ok. – Respirou fundo. – Essas visões... hum... Gina, meu amor, elas parecem coisas que vão acontecer, que já aconteceram ou que estavam acontecendo?

- Eu não sei ao certo, mas... – Ela levantou e pegou um jornal dentro de uma gaveta e o entregou a Harry. O marido deu um olhar rápido o suficiente para compreender o alcance das palavras e passou-o para Rony.

Era um jornal trouxa, no qual se sobressaía uma manchete no lado direito, que havia sido circulada.

MISTÉRIO EM LONDRES. QUATRO CRIANÇAS DESAPARECIDAS E NENHUMA PISTA. A SCOTTLAND YARD ESTÁ ÀS CEGAS.


Abaixo havia fotos das crianças todas bem pequenas.

Rony negava veementemente com a cabeça.

- É horrível, mas nada aqui parece ligar isso com as suas visões, Gina. E mesmo que tivesse alguma ligação, repito, é coisa de trouxas malucos. Quem tem que se envolver com isso é a... como é mesmo... plicia deles, não a gente!

- Polícia. O Rony tem razão. Sei que é horrível, mas não parece haver qualquer indício de magia envolvido nesse ritual. Você mesma admitiu Hermione que isso tem sido desprezado pelos bruxos.

- Acontece que tem magia de verdade envolvida. – Disse Gina em um fôlego. Ela olhou firmemente para Harry. – Em uma das visões eu vi algo que me fez reconhecer o oficiante e ele era um bruxo, com toda a certeza.

Gina sabia que se continuasse jogaria por terra todos os anos de paz que haviam construído, mas não havia alternativa. Hermione colocou a mão sobre os seus ombros e pressionou com carinho.

- O oficiante... tinha a marca negra!

Rony ficou estático. Harry soltou as mãos da mulher e levantou. Escorou-se na pia atrás dele voltando o rosto para a janela. O ar ficara impressionantemente rarefeito. Precisava por as idéias em ordem. Forçou-se a ser objetivo. Sabia o quanto Hermione e Gina eram inteligentes, mas podiam estar somente muito impressionadas. Gina estava particularmente sensível. Voltou-se para os outros, um pouco zangado com a Mione. Ela não tinha de incentivar os pressentimentos de Gina. Podia não ser nada além de coisa de grávida.

- Não faz sentido. Primeiro, pegamos todos os Comensais da Morte, tenho certeza disso. Bom, pelo menos os realmente perigosos. Segundo, se algum deles tivesse escapado, porque se envolveria com um ritual trouxa de magia negra considerado ridículo. E terceiro, qual seria a finalidade disso? Ele está morto!! EU O MATEI! – Controlou-se, pois novamente Sirius reclamou no berço. – Simplesmente não faz sentido. Não existe magia que possa reviver os mortos.

- Você tem razão, Harry. – Começou Hermione com aquele ar que tanto o irritava de que ele não estava tendo a visão correta das coisas. – Mas não creio que você esteja fazendo as questões certas sobre isso.

- O que quer dizer?

- Quero dizer que, se admitirmos que esses desaparecimentos estão ligados às visões de Gina – Rony mexeu-se na cadeira, e ela acrescentou rápido. – Coisa que temos que investigar, embora a gente já tenha tido experiências suficientes com visões para descremos totalmente delas. Bom, o fato é que, para mim, existe uma coisa nisso tudo que é quase tão importante quanto sabermos quem é esse oficiante que possui a Marca Negra, isto é, quem exatamente deixamos escapar, e o que ele quer com esse ritual horrível.

- O quê? - Perguntaram Harry e Rony juntos.

- Por que Gina tem tido essa visões? E por que elas começaram justamente quando ela engravidou?

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