Verde



- Lembrem-se de que vocês têm mais ou menos umas 10 horas – alertou Derose.


- Sim – respondeu Harry, pronto para desaparatar. Queria acabar com aquilo tudo de uma vez.


- Vai ser difícil encontrar uma planta como essa – Hermione ergueu as anotações de Brandon – além do que...


- Hermione, desculpe ser grosso, mas não temos tempo para discutir essas coisas. Também sou contra seguir pistas deixadas ao acaso por Brandon, mas não há outra alternativa – ele quase riu, era o que Brandon havia dito.


- É mesmo seguro levá-la? – Rony indicou Lavalle, semiconsciente e apoiada em seu ombro.


- Não sei se vai dar tempo de voltarmos antes que o veneno haja por completo – esclareceu Harry, um arrepio cortava as suas costas como uma lâmina fria ao lembrar o que Brandon o reservava. Era repugnante.


Chegava a ser ridículo, tantas coisas complicadas eles haviam resolvido habilmente, e agora tudo acabaria com eles procurando uma mísera plantinha!


- Vamos tentar não nos matar enquanto isso – e Harry foi girado na escuridão mais uma vez.

 


CAPÍTULO 3 – VERDE


 


Demoraram um pouco mais para atingirem o chão, e quando o fizeram, foi com uma força anormal. Parecia haver vários desvios naquele terreno.


Uma paisagem estranhamente modificada. Outrora haveria uma exuberante floresta temperada cercando aquele pequeno pedaço de tundra, e naquele momento podia-se ver claramente onde as plantas mágicas de diversas eras estavam sufocando a floresta.


Em vários pontos grossos troncos de árvores estavam literalmente dobrados sob o peso das inquilinas cujos cipós tinham mais de dois metros de espessura, às vezes verdes, outras, cinzas como pedras. Aqui e ali a vegetação original estava retorcida em imensos “Us” invertidos – um protesto mudo daquelas plantas para permanecerem vivas – com aberturas suficientemente grandes para que uma pessoa os atravessasse.


Harry não quis pensar nas pessoas que por ali passavam, que ali viviam. Não deveria ser uma morte muito agradável.


Estavam apenas à uma hora de Dublin, como o Ministério desconhecia a existência daquelas terras? Como não havia tomado nenhuma providência a respeito daquilo? Eram as perguntas que começavam a povoar a cabeça de Harry.


Mas ele não dava muita atenção, já que havia coisas mais importantes com o que se preocupar.


Por exemplo: sua existência.


Então, num assomo de preocupação, Harry começou a ver aquele ambiente com outros olhos. Percebeu que a vegetação parasita ia se adensando mais além, se entrelaçando, formando uma grande barreira que se estendia na horizontal.


Um muro.


- Vejam! – ele acenou na direção daquilo, sua voz ecoou no ambiente quase-morto.


- É uma parede? – perguntou Rony, com sua voz igualmente ecoada.


Ambos olharam para Hermione, esperando sua conclusão costumeiramente brilhante. Para surpresa dos dois, ela estava parada vários metros atrás deles, com o olhar vidrado naquele emaranhado horizontal de raízes.


- Isso me soa...familiar – ela completou, sem desgrudar os olhos do “muro” – parece que já li sobre isso em algum lugar...e não foi nos “Segredos”...


- Espere – interrompeu Rony, e que estava com certa dificuldade em apoiar Lavalle – você não está pensando o mesmo que eu?


- Pelo amor de Deus! Será que alguém pode me explicar o que está havendo?! – Harry detestava ficar desatualizado – O que vocês querem dizer com isso tudo? – ele gesticulou violentamente com os braços, abrangendo a floresta.


- Desculpe Harry – Hermione desligou-se daquele olhar, seguindo uma das raízes que passava rente aos seus pés e ia aumentando de calibre até se juntar ao “muro”. Afastou-se instintivamente – realmente não sei como não notei a semelhança quando li aquilo que Adalberto escreveu. Mas agora faz sentido, e não posso deixar de relacionar isso à “Fonte da Sorte”


- A Fonte do quê? – perguntou Harry, achando que fosse uma piada, ou uma incrível incoerência.


- Por favor Harry! Eu lhe dei uma cópia dos “Contos de Beedle, o Bardo” no seu último aniversário! – protestou Hermione, ligeiramente ofendida.


- Sim, eu sei... – Harry coçou a cabeça, não havia de fato lido o volume, mas pelo que havia passado o olho na ocasião em que o recebera, dava para ter uma idéia geral do conto.


Hermione então focalizou o alto e usando o pouco de paciência que ainda restava, proferiu um resumo das palavras decoradas durante a tradução:


- “No alto de um morro, em um jardim encantado envolto por muros altos e protegidos por poderosa magia jorrava a Fonte da Sorte... Uma vez por ano, entre o nascer e o pôr-do-sol do dia mais longo do ano, um único infeliz recebia a oportunidade de competir para chegar à Fonte... No dia aprazado, centenas de pessoas viajavam de todo o reino para chegar ao jardim antes do alvorecer... cada qual na esperança de ser escolhido para entrar no jardim.” – ela suspirou – Faz sentido agora?


- Não – ele e Rony, mesmo conhecendo o conto, discordaram.


- Ora, raciocinem! – ela ajudou Rony a apoiar Lavalle, cujo rosto a cada segundo – Não sei se os senhores notaram mas temos pouquíssimo tempo!


- Então nos ajude! – reclamou Rony.


- É bem simples! – ela começou – Lawliet tinha o costume de ajudar as pessoas com suas plantas, então elas devem ter perpetuado essa tradição após a sua morte, apenas uma vez ao ano, e no solstício! Quando as plantas recebem mais sol e ficam mais ativas! – as expressões no semblante de Hermione mudavam com estranha rapidez – Mas não creio que haja realmente uma fonte lá dentro, muito menos “da Sorte”. Mas com certeza o antídoto está lá dentro....


- Isso seria realmente ótimo! – explanou Rony.


- Mas há um pequeno porém – ela cortou – se isso for realmente verdade, essas plantas não devem permitir a nossa entrada...


- Espere! Veja só o que elas fizeram com essas árvores! – Rony estava tendo um pequeno acesso de histeria – imaginem o que fariam com os nossos ossos...com os nossos...


O som de um tapa ecoou pela floresta, e cinco os cinco dedos da mão direita de Hermione ficaram estampados na bochecha de Rony em vermelho vivo.


- Acho que todos nós sabemos o que pode acontecer! – ela massageava a mão, que também havia ficado bastante vermelha – e desculpe... – acrescentou, após notar que o noivo fazia o mesmo com o rosto.


- Pelo menos assim saberemos se a história é verdadeira! – Harry animou-se, mas não ficou menos preocupado.


- Ótimo! – disse Rony, pondo-se a caminhar – Só espero que a gente não morra enquanto...


- RONY NÃO! – Hermione tentou impedir, mas já era tarde, Rony pisara distraído numa das raízes, caindo com força numa bem maior.


Naquele exato instante, um vento forte, quente e agourento começou a soprar. Parecia que as plantas estavam se comunicando, avisando que havia intrusos...


E foi com alguma violência que o “muro” adiante começou a tremer, os ramos contorcendo-se num movimento rítmico e quase obsceno, cada vez mais acelerado.


Abruptamente surgiu uma imensa “boca” entre os ramos, o que fez com que todo o vento soprasse com uma força que seria capaz de arrancar as árvores das raízes, como se estivessem querendo expulsá-los dali.


- Vão embora – a voz feminina, sedutora e letal cortou os ouvidos de Harry antes que desse talvez o pior grito que ele já ouvira na vida.


Seguido do grito, o vento atingiu a intensidade de um furacão, ao mesmo tempo em que da cavidade saíam em alta velocidade milhares de ramos finos, alguns viscosos, outros de aspecto cortante.


- CORRAM! – a ordem de Harry foi desnecessária, pois todos passaram a correr o mais rápido que podiam na direção oposta. Aquela era uma mensagem clara: só deixo que entre um por ano, ninguém mais.


Ele corria como se sua vida dependesse daquilo.


E de fato dependia.


Os ramos o perseguiam em alta velocidade, cortando pela metade  as árvores para abrir caminho. Harry ouvia os gemidos da floresta, reclamando em contra-tempo com as batidas do seu coração.


Foi só então que notou ausência de Lavalle.


Ele olhou para trás no exato momento em que era preso pelos pés. Tombou de costas na rocha dura, ele sangrava e sentia-se inchar, sendo arrastado pelos vários metros que havia corrido, desta vez em menos de um segundo. Ele sentiu que iria colidir com aquelas plantas, ser engolido por elas, mas ao invés disso sentiu seu pescoço baixar enquanto suas pernas subiam. Aquilo estava acontecendo rápido demais.


Então ele olhou para baixo e milagrosamente seus óculos não se espatifaram. Ele sabia que sua sorte não duraria por muito mais tempo. Antes que ele pudesse ser lançado vários metros sobre a floresta, apontou a varinha rapidamente e ordenou:


- Relaxo! – automaticamente a planta o soltou, então ele se deu conta que estava despencando a doze metros de altura. Apontou a varinha para o solo e berrou:


- PULVILLOS!


Um colchão de ar se materializou no chão, resultado do Feitiço Amortecedor. Mesmo assim, ele foi ricocheteado no ar e caiu de dois metros. Lavalle estava ao seu lado, encolhida instintivamente em posição fetal numa das reentrâncias do terreno.


Hermione estava sendo lançada ao ar da mesma forma que Harry, mas ele entrou em ação rapidamente com o Feitiço Amortecedor, então ela foi lançada em cima dele.


- COMO VAMOS ENTRAR? – ele perguntou aos berros por causa do vento, e uma grande quantidade de terra entrou na sua boca.


- NÃO FAÇO ID... – Hermione foi interrompida por um ramo que avançou a toda em cima deles, mandando-os para direções opostas.


Harry olhou em volta, buscando respostas, mas o caos imperava. Rony passou, também sendo arrastado, ao seu lado e ele ajudou:


- Reducto! – o ramo que o prendia estourou, espalhando uma grande quantidade de terra. Ajudou Rony a se levantar, e por uma fração de segundo não teve sua cabeça atravessada por um cipó cortante. Ele abaixou-se a tempo de ver que um ramo semelhante perseguia Hermione.


Harry pôs-se a correr na direção da amiga, mantendo-se alinhado com ela.


- HERMIONE VENHA AQUI! – ele pediu, sua voz agora clara mesmo apesar do vento. Ela olhou perplexa para ele, mas logo entendeu suas intenções.


Harry agarrou o braço de Rony, que por sua vez ergueu Lavalle. Os ramos mortíferos perseguindo aqueles que corriam um na direção do outro, aqueles que colidiriam em alguns segundos.


Não fosse pelo fato de terem desviado no momento exato.


Os dois ramos se entrelaçaram, formando uma gigantesca coluna que se estendia em direção ao céu.


Mas não por muito tempo.


- SUBAM! – Harry gritava, aquela era provavelmente a última chance deles entrarem no jardim, mas eles já estavam alguns metros acima dele, escalando com dificuldade os ramos retorcidos que pendiam para lá e para cá, podendo esmagá-los a qualquer momento. Até Lavalle estava usando os últimos resquícios de força para subir, algo que parecia impossível visto sua situação.


- Só mais um pouco... – sussurrou Harry – AGORA!


Como que obedecendo a sua ordem, a planta pendeu perigosamente para a direita, dobrando-se por cima do muro, e lançando-os mais uma vez contra o chão duro, desta vez dentro do jardim.


 


Harry estava desacordado, mas ainda podia ouvir o farfalhar dos ramos além-muro. Ali estava absurdamente mais quente do que na floresta morta.


Abriu os olhos, uma luz forte e sem som invadiu-o. Parecia estar deitado sobre o que outrora fora uma movimentada rua de paralelepípedos. A cidadezinha parecia ter sido conservada pelas plantas.


Ele se levantou. Rony, Hermione e Lavalle estavam mais adiante sentados numa pedra, curando os ferimentos com a utilíssima essência de Ditamno. Mas não foi isso que prendeu a sua atenção.


O “jardim” se estendia até os limites do horizonte naquela cidade fantasma. O cenário só poderia ser comparado a uma cidade depois de um bombardeio, quando sobram apenas as fachadas dos prédios em chamas. A diferença é que não haviam chamas, e cada milímetro quadrado que recebia luz do sol estava coberto pelo verde.


Uma versão aveludada e verde do inferno.


Harry olhou para trás, o “muro” estático, como se nunca tivesse sido despertado.


- Parece que conseguimos – ele se reuniu a Hermione e os outros, e disse embora soubesse que entrar no jardim seria apenas o primeiro embargo. Não era fácil encontrar uma planta em um ambiente normal, muito menos num onde absolutamente tudo era verde ou coberto de liquens.


- Acho que sim – ela suspirou, nem ela acreditara na mentira que acabara de dizer. Pegou o pergaminho surrado que havia guardado em sua bolsinha.


Harry admirava-se com o fato de ela estar sempre com ela todo aquele tempo e ainda assim que ela permanecesse intacta. Observou o papel nas mãos da amiga, ele representava uma planta completamente desconhecida, devia crescer como a grama, ou uma espécie de trepadeira. No centro um corpo do tamanho de um lápis do qual partiam várias “gramas” circundando o “lápis” em espiral. De todas as pontas menores despontavam microscópicas esferas douradas, como elegantes cachos, e do centro partia algo como um espinho.


Não havia qualquer indicação científica, Harry usara o Mapa do Maroto por tempo suficiente para identificar o latim. As poucas observações estavam em alemão, e grafadas com uma caligrafia que mais parecia uma linha reta, as poucas palavras visíveis serviam apenas para identificar a língua.


- Temos que admitir, isso não vai ser nada fácil! – concluiu Rony.


- Ninguém disse que seria! – interpelou Harry – além disso, a gente só vai descobrir se tentar!


- Claro – Hermione levantou-se, caminhando vagarosamente pela rua.


Os outros a seguiram, adentrando no labirinto fantasma daquela cidade que, apesar de tomada pelo verde, não exalava nenhum perfume. Havia apenas as cores – ou a cor – um calor nauseante, e o silêncio agourento quebrado apenas pelo som de seus passos sobre a superfície dura e lisa.


As casas tinham um ou dois andares, a maioria com fachadas simples e sem muitos ornamentos. Mas, conforme iam aproximando-se do centro da cidade, as construções iam ficando mais elaboradas, de modo que as plantas não tinham muito para onde ir a não ser para baixo. Chegaram ao final da rua, defronte uma bela casa onde deveriam escolher entre o caminho da direita e o da esquerda. Tomaram o da direita e notaram que dali alguns metros o calçamento fora violentamente rachado pela força das raízes.


O caminho se estendia pelo subsolo, havendo espaço suficiente para um ônibus de dois andares. Se não houvesse uma árvore torta e brilhante bloqueando o caminho. Foram por ali mesmo sem ninguém manifestar essa opinião, na verdade, era como se houvesse um letreiro em neon piscando intermitentemente sobre aquele buraco com os dizeres “Aqui é o Lugar das Coisas Misteriosas”.


O túnel não era muito profundo, descia dois metros, e devia ter uns dez de extensão – grande o suficiente para passar por baixo das construções. Desviaram com todo o cuidado da árvore, que era de um verde-azul acinzentado, e entraram no túnel. De fato, era possível ver a luz solar do outro lado, mas coberta por brumas.


- ARGH! – Hermione agarrou o braço de Rony, e Harry logo viu o porquê.


Acima das suas cabeças, rastejavam meia dúzia de caracóis do tamanho de buldogues.


Harry não ficou preocupado com aquilo. Estava mais preocupado com as cortinas de grama que estavam encobrindo o fim do túnel. Aquilo não era bruma. Era uma grama verde e fina bastante pegajosa.


- Diffindo! – e ordenou, e a cortina verde se desfez aos seus pés.


A cidade continuava ali fora, Harry olhou para trás e notou que haviam vencido um pequeno morro. Ruas tortuosas desciam por um estreito vale onde as plantas mais estranhas se encontravam. Lá embaixo, deveria estar o que um dia foi a casa de Lawliet.


- HARRY CUIDADO!


Ele ouviu Rony gritar, mas não adiantou.


Sentiu uma picada no pescoço logo abaixo da orelha.

Apagou.



********** 

Eu sei que todos estão ansiosos para o final desta fic tanto quanto eu. Há mais uns três ou quatro capítulos por vir, e o último é realmente IMENSO.
Espero que todos estejam gostando, e agradeço MUITO MUITO MESMO a todos aqueles que comentaram e/ou votaram.
Vocês não têm ideia da diferença que isso faz.
Estou revisando cada detalhe do texto - que tem aproximadamente 240 páginas - e vou fazer o possivel e o impossível para terminá-la dia 11/03.
Estou muito ansioso por esse momento.
Até lá, lhes deixo meu costumeiro abraço,
AUGUSTO 

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