Derose



Os três desaparataram no jardim já conhecido e Frederich, que estava lendo um livro à luz opaca do sol em uma cadeira de armar, caiu no chão ao ouvir o estampido.


- Vocês quase me matam do coração! – ele vai ao encontro do grupo, sem notar a presença do quarto elemento – Quer dizer, se isso fosse possível...


- É – debochou Hermione – nós estamos mesmo tentando matar quem vai nos levar de volta – nisso ela recuou um passo e revelou Lavalle detrás de si.


- Parece que vocês não encontraram o Especialista – o professor virou a cabeça de lado, como um cachorrinho.


- Desculpe, eu esqueci de me apresentar – Lavalle se adiantou, esticando o braço para um aperto de mão – me chamo Lavalle, sou a Especialista em presente.


Nadal ficou olhando aquele braço esticado, como se fosse algum objeto extremamente tóxico.


- Ora, francamente! – Hermione se indignou, e agarrou a mão de Frederich, unindo-a a de Lavalle na marra – assim está melhor! – ela sorriu no que eles começaram a balançar o conjunto vagarosamente, para baixo e para cima.


- Tá bom! Tá bom, agora chega! – Harry separou os dois, ao ver que eles não passariam daquilo – Temos que visitar o segundo Especialista o mais rápido possível!


 


CAPÍTULO 6 – DEROSE


 


Eles consultaram a lista: o próximo destino ficava no Estreito de Bósforo. Era estranho ser num lugar tão movimentado – o fluxo era cinco vezes maior do que no Canal do Panamá – de qualquer forma, Harry já estava se acostumando com as coisas estranhas. Ele se sentia mais uma vez aquele garotinho de 11 anos que embarcava no Expresso de Hogwarts sem ter a menor noção do mundo novo que se descortinaria diante dos seus olhos. A diferença é que aquele mundo era fantástico e acolhedor, mas este era desconhecido e cheio de incertezas.


Hermione mais uma vez guiou-os até as coordenadas indicadas na lista. Desta vez era uma antiga zona portuária de aspecto fantasmagórico, um perfeito local de esconderijo para um serial killer. Harry podia ouvir a intensa movimentação no canal mais adiante, enquanto eles iam ladeando um canal artificial que cheirava esgoto.


- É aqui – Hermione avisou, e eles pararam defronte um galpão idêntico aos tantos outros que ficavam mais atrás.


Harry e Rony empurraram a pesada porta de ferro e suas costas ficaram ambas com um traço grosso de ferrugem. Hermione limpou-as e acendeu a varinha. O sol aparentemente tinha acabado se pôr, e dentro do galpão estava um breu total.


Rony caminhou até o fim da faixa clara que a porta aberta projetava no chão de concreto partido.


- Tem certeza absoluta de que é aqui? – ele olhou ao redor, como se fosse enxergar alguma coisa. Então Hermione o ultrapassou, dando mais alguns passos na direção do escuro.


- Claro que tenho! As coordenadas são bastante precisas! – mesmo assim ela ergueu a varinha, disposta a iluminar um pouco mais, mas não conseguiu ver nada que não fosse o concreto partido aos seus pés. Era como se o lugar tivesse uma espécie de vácuo.


- Vamos – Harry estava impaciente, então acendeu a varinha e saiu correndo para o escuro – não podemos perder tempo.


- Harry! – Rony gritou assustado, e, lutando contra o próprio medo, seguiu o amigo com Hermione nos seus calcanhares.


A convergência dos três raios de luz propiciaram uma visão do galpão maior do que eles imaginaram. O galpão estava de fato vazio, tinha apenas algumas placas de ferro cobrindo o que deveria ser uma porta, precariamente instalada na parede oposta.


Eles caminharam para lá mais depressa do que queriam e mais vagarosamente do que deveriam. Hermione bateu na placa de aço, que produziu um eco indiscreto.


Muito sutilmente, eles puderam ouvir do outro lado, um par de pés se aproximar. Uma chave encaixou na fechadura ruidosamente, antes da porta – que não era precária coisa nenhuma, e tinha por baixo uns dois metros de espessura – abrir igualmente sem censura.


Demorou um pouco para eles verem a figura que abriu a porta, mas no que ela acendeu a lanterna amarrada em sua testa, tiveram que olhar para baixo.


Era um homem.


Bem miudinho.


E parecia ter não mais que um e quarenta de altura.


E trinta anos vividos – aparentemente, é claro.


- Quem são vocês? – ele perguntou, pelo visto não tinha nem um pouco da sutileza de Lavalle.


Harry na verdade demorou em interpretar a pergunta, pois todos estavam hipnotizados pelo som que vinha – do túnel – detrás do homenzinho. Parecia um milhão de asas batendo sem sincronia alguma.


- Quem são vocês? – ele repetiu, parecia ter algo muito mais importante para fazer.


- O senhor é Derose? – Hermione perguntou, olhando para baixo.


- Sou! E não me encare assim de cima! – ele balançou o indicador que mais parecia um giz de cera – Eu não sou uma formiga numa placa de Petri!


- Desculpe – ela recuou um pouco – bem... eu me chamo Hermione.


- E eu Harry.


- E eu Rony.


- Da próxima vez que lhe perguntarem isso, respondam de um jeito que vocês não pareçam uma trupe de circo.


- Ok – os três se entreolharam.


- Entrem – ele abriu caminho – e me desculpem, eu não sou assim normalmente! É que hoje uma fita enrolou!


Harry a princípio não entendeu o que aquilo significava, mas conforme iam descendo no túnel, e o som das asas ia se tornando mais forte, ele pensou que tivesse alguma ligação com o som.


E tinha.


Quando o túnel acabou, numa pequena escada em forma de meia lua, os três se depararam com o que deveria ser o maior espaço escavado existente na face da terra.


Era uma espécie de poço tão fundo que era impossível olhar as beiradas, excepcionalmente largo e excepcionalmente caótico.


A cada meio metro havia na parede do poço uma tábua de madeira, que formavam algum tipo de escada colossal. Mas aquilo não era uma escada. Cada espaço estava ocupado por uma máquina de escrever. Centenas de milhares de máquinas de escrever justapostas e datilografando – sozinhas – freneticamente, em um milhares de quilômetros de tiras de papel que vinham de algum lugar lá no alto.


Por mais fundo que aparentasse ser, o poço não era escuro. Lá em cima parecia haver uma iluminação fortíssima, que dava certo ar acolhedor ao ambiente.


- Não me pergunte como eu fiz isso – comentou Derose, ao notar o espanto de Harry.


- Para quê servem essas máquinas de escrever? – perguntou Hermione, entretida com o balé das teclas de uma das máquinas.


- Servem para registrar todos os meus pensamentos – ele respondeu, como se aquilo fosse a mais normal das coisas – controlo cada uma usando a mente, é melhor para pôr os pensamentos em ordem.


- Hum – Rony coçou o nariz - e eu que não consigo nem formar um Patrono por muito tempo.


- Até que não – interveio o Especialista – você formou seu primeiro Patrono numa organização chamada Armada de Dumbledore, e ele era perfeito. Era um cão terrier.


Harry esquecia das habilidades impressionantes dos Especialistas. E quando lembrou-se daquilo não deixou de se sentir um pouco vulnerável.


- Você controla todas elas usando a mente! – Hermione ainda se entretecia com o som das máquinas golpeando o papel a toda velocidade.


- Na verdade é perfeitamente possível para qualquer um – ele sorriu, com humildade – a imensa maioria das pessoas não chega a usar nem trinta por cento da sua mente.


- Viu Rony – ela caçoou – ainda há esperança para você.


- Muito engraçado – ele torceu o nariz.


- É claro que sempre ocorrem problemas – o professor continuou como se não tivesse sido interrompido, e ergueu uma máquina de escrever cuja fita estava toda presa entre os tipos.


- Hum – Hermione perdeu um longo tempo estudando a máquina, como se ela fosse um espécime muito raro de uma flor que desabrocha a cada doze anos.


- E por que o senhor vive num buraco? – perguntou Harry.


- Não é um buraco, é uma toca, um refúgio – Derose respondeu – “O homem nasce bom e a sociedade o corrompe”, não é mesmo?


Harry achou melhor não discutir a respeito, da mesma forma que não perguntou a Lavalle o porquê dela pintar uma cena de casamento. Talvez aquela citação estivesse intimamente ligada ao que Derose sofreu para ser obrigado a mexer com o tempo.


- Bem, ficar nesse buraco não vai adiantar muita coisa – ele falou tão alto ao ponto que Hermione acordou do transe em que estava num pulo – sei bem o que vocês querem que eu faça, e sei que estavam com pressa quando vieram aqui.


- Vai nos ajudar então? – perguntou Harry, aquilo estava sendo fácil demais.


- Não que eu queira – Derose argumentou – mas achei o caso de vocês muito interessante e acho que posso aprender muito com isso.


- Obrigado – agradeceu Rony.


- Vamos! – ele agitou os braços na direção do túnel e pôs –se a caminhar – o passado de vocês três não é nada bom mesmo!

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