Neve, um aperto de mão e despe

Neve, um aperto de mão e despe



Capítulo 18

NEVE, UM APERTO DE MÃO E DESPEDIDAS

Draco virou para o lado, puxando as cobertas com violência e batendo no travesseiro como se fosse Potter.


Era sua última noite naquele quarto miserável e ainda sim não havia como conseguir dormir por mais que duas ou três horas. O tempo se arrastava como uma velha rabugenta com problemas nas costas e não podia fazer nada para apressá-la, apesar da incrível vontade de chutá-la no traseiro.


Talvez fosse sobras dos efeitos dos dementadores ou quem sabe o vazio do quarto... De qualquer forma dormir era algo que não fazia corretamente há muito tempo. E era extremamente irritante.


A cama de colchão duro e o travesseiro com cheiro de cabelo sujo (não dele, claro... Mas só de imaginar a quantidade de pacientes que já tinham encostado suas cabeças mal lavadas lhe dava náuseas) não ajudavam na guerra contra sua insônia.


Desejava com todas as suas forças ir para casa. Por três anos não passou tempo suficiente em um lugar só para chamar algum esconderijo de casa, agora tinha finalmente a oportunidade de conseguir essa parte de sua vida de volta.


Era algo tão simples... E ao mesmo tempo tão distante.


Reconstruiria a mansão e finalmente poderia chamá-la novamente de sua casa. Por mais sozinho e sem futuro Draco Malfoy poderia passar o resto de seus dias miseráveis em um lugar só.


Virou para o outro lado, chutando as cobertas para longe e estufando o travesseiro embaixo de sua cabeça, consciente que a insistência era inútil.


Seria liberado daquele hospital no dia seguinte e toda a história com Bellatrix poderia desaparecer. Alguns dias antes Draco finalmente desistiu de manter sua presença em segredo e o Ministério foi avisado que estava vivo e bem. Recebeu logo em seguida a visita de um representante do Ministro, pronto para oferecer o que quisesse desde que Draco seguisse com a versão dos eventos que o Ministério criara. Alguma coisa com uma armadilha vingativa de algum Comensal e um feitiço feito durante a Segunda Guerra. Não era tão longe da verdade e, mesmo se fosse, Draco não tinha problema nenhum em mentir desde que isso significasse que estivesse fora de Azkaban e com sua herança.


Claro que o bruxo do Ministério queria saber a versão verdadeira para passar para Higgs, Draco o convenceu que durante uma limpeza na casa acabou encontrando um objeto amaldiçoado que explodiu ao tentar ser aberto... Foi o melhor que conseguiu inventar mas foi o bastante.


Enfim, o assunto morreu na imprensa e pareceu que a curta fama dele foi esquecida. Por todos. Nem mesmo Pansy apareceu ou mandou qualquer coisa.


Isso o deixou, por um tempo, infeliz. Não é que se importava com seus antigos amigos, deixaram de ser tal coisa há muito tempo... Mas o sentimento de abandono não queria desaparecer.


E não ajudava em nada que Weasley não apareceu depois da conversa bizarra que tiveram. Irritava imensamente a Draco que realmente estivesse esperando que ela aparecesse alguma hora... Mas iria embora no dia seguinte e nem sinal de ela cumprir sua promessa.


No entanto Draco não deixou que isso o abalasse tanto, preferindo parar de ter pena de si mesmo e começar a pensar no que faria assim que reformasse sua casa.


Tinha dinheiro suficiente para não precisar trabalhar mas, surpreendentemente, a idéia de ficar sem fazer nada e sozinho na mansão não lhe parecia muito boa.


Outra vez se virou na cama, puxando cobertas e colocando o travesseiro em cima de sua cabeça. A fraca luz que iluminava o quarto foi bloqueada de seu rosto e finalmente Draco dormiu, mesmo que se apenas por uma hora antes de acordar de novo e continuar a pensar sobre sua vida.



Gina sentiu Harry pegar sua mão delicadamente.


- Vou ficar bem.


- É melhor mesmo. Se não vou até lá e arrasto você de volta.


Abraçaram-se e imediatamente ela sabia que aquilo era certo. Parecia simplesmente certo estar abraçando Harry e percebeu o quanto tinha sentido falta de estar próxima dele.


- Luna ainda vai ficar um mês procurando um Blibbering Humdinger. Você vai poder andar livre até ela voltar da África.


- É até divertido ser outra pessoa mas agradeço se você pensar em plano para nos tirar dessa.


- Esse é o departamento da Hermione.


Os dois sorriram. Depois da luta contra Bellatrix, Gina e Harry haviam voltado a falar e uma coisa levou a outra, agora estavam juntos de novo. Era estranho que fora necessário explosões e ferimentos para que Gina percebesse o quanto Harry ainda gostava dela e para que ele juntasse coragem para confessar isso a ela.


Mas agora deveriam se separar outra vez. Poção Polissuco ou não, era necessário sair da Inglaterra por um tempo. Enquanto Harry partiria para a Bulgária Gina foi convidada a passar suas “férias” na França junto com a irmã de Fleur, Gabrielle. Ainda não sabia como Harry a convencera a aceitar seu “empréstimo” (Gina insistira que pagaria de volta) para a viagem mas era tarde demais para mudar de idéia.


Beijou-o na bochecha, dando-lhe um abraço outra vez. Era tão bom ter alguém tão próximo dela, alguém que a amava. O que tornava ainda mais péssimo saber que teriam que se separar em poucos minutos.


- Vou sentir sua falta... Por que temos sempre que nos separarmos justo quando as coisas estão boas? – sorriu fracamente, encostando seu rosto no peito dele.


- Para aumentar nosso desejo de ficarmos juntos? – ofereceu Harry, passando a mão em seu cabelo ruivo. – Ou alguma outra razão boba e heróica?


Continuaram abraçados, apenas aproveitando a presença um do outro. Então Harry, sem saber, falou algo que a fez se sentir extremamente culpada.


- Eu estava tão sozinho e perdido antes de você voltar na minha vida...


Sozinho.


- É isso que você quer? Ficar sozinho para o resto da sua vida infeliz?


- Não estou sozinho!


- Gina?


Ficou vermelha contra sua vontade, como podia pensar em Malfoy quando tinha Harry ao seu lado?


- Ah, desculpe, Harry.


- Está tudo bem?


- Não... Você está indo embora... Não vamos nos ver sabe-se lá por quanto tempo... Não dá para dizer que isso me deixa contente, não é? – sorriu.


- Alguma coisa vai acontecer, Gina – avisou, de repente ficando sério. – Eu posso sentir. Não sei o que é... Mas... Tome cuidado, está bem?


- Eu sempre tomo. Quem está toda hora em perigo é você.


Harry riu, beijando-a na boca logo em seguida. Sentiu arrepios... Era uma sensação maravilhosa, como estivesse flutuando e isso era apenas um beijo rápido...


- Tenho que ir, já estou atrasado dez minutos.


Ela assentiu, soltando um suspiro. Em questão de segundos Harry aparatou, deixando-a sozinha no jardim d'A Toca. Um vento frio passou levantando seus cabelos ruivos, era final de outono e mal havia percebido que neve estava prestes a cair.


Quem pensaria que o Dia das Bruxas havia passado e nem notara?


Entrou em casa, sentando na cozinha vazia, perdida em pensamentos. Sentia-se péssima e culpada por não ter ido visitar Draco. Inventara dezenas de desculpas para si mesma numa tentativa frustrada de justificar sua falta de coragem em vê-lo de novo. Era verdade que estava ocupada sendo Luna, reatando com Harry e se preparando para a viagem mas... Também era verdade que estava evitando St. Mungos.


Por que tinha dito todas aquelas coisas para ele? Por que oferecera sua amizade, de todas as coisas do mundo, para um Malfoy?


A questão era que não sabia se era capaz de cumprir sua oferta. Nem sabia como poderia. Amigos, ele e ela?


Não negava que queria ajudá-lo e que sentia compaixão pela situação dele. Além do mais, negando ou não, Draco havia salvado sua vida duas vezes.


Mas quem disse que ele estava interessado em amizade? Não teve coragem para ficar naquele quarto e saber, saindo apressada quando percebeu o que tinha acabado de dizer a ele e como Draco havia desviado seu olhar.


Alguns dias depois tentou sentir menos culpa enviando um cartão ou doce para ele mas não sabia o que escrever no papel sem passar a mensagem errada ou irritá-lo e quando tentou comprar um doce percebeu que não tinha noção de qual ele gostava ou não. O pior foi quando tentou arrumar ajuda, perguntando para Hermione:


- Todo mundo tem algum doce favorito, não é? – havia começado com cuidado, tentando parecer querer puxar uma conversa inocente. As duas estavam comendo os chocolates que foram enviados para Hermione como presente de melhoras.


- Acho que sim... Tirando meus pais que acreditam que comer doces deveria ser algum tipo de crime – riu, pegando um pedaço.


- Certo, tirando os seus pais... Até mesmo, digamos, Draco Malfoy gosta de doces?


Hermione levantou uma sobrancelha.


- Suponho que sim... Mas...


- Agora, que tipo de doce uma pessoa tão... Amarga, que nem ele gostaria?


- Bem, Malfoy sempre recebia doces caseiros da mãe dele... Lembro bem disso porque Rony e Harry não pararam de chamá-lo de “queridinho da mamãe” quando descobriram.


Quando Gina pareceu incomodada com a memória Hermione ficou mais desconfiada ainda.


- Mas por que você quer saber?


- Nada... Só curiosidade – respondeu rapidamente e não convencendo nem um pouco a amiga.


A conversa não ajudou em nada porque Gina não sabia cozinhar e muito menos compreendia o que “doces caseiros” queria dizer... Podia ser qualquer coisa, desde caldeirões de chocolate até penas doces.


Odiava-se pela covardia... Tentava se convencer que Draco não estava se importando com sua ausência mas toda vez lembrava da expressão triste dele ao ver a reunião Weasley e de sua voz trêmula confessando o medo de perder sua família sabia que Draco precisava de alguém, de um amigo.


Levantou da cadeira e saiu da cozinha, subindo as escadas estreitas d'A Toca e indo para seu quarto onde tomou a Poção Polissuco.


Já totalmente transformada em Luna, Gina aparatou até St. Mungos. Não importava se teria que viajar no dia seguinte e devia estar terminando de arrumar suas malas, precisava ver Draco Malfoy antes que deixasse o país ou sentia que se arrependeria por muito tempo.



As enfermeiras estavam particularmente contentes naquele dia. O medi-bruxo parecia cantarolar sozinho algumas vezes... E por mais irritante que isso fosse Draco compartilhava da felicidade deles.


A manhã chegou anunciando um belo dia para um recomeço. Vestido com uma roupa emprestada (suas vestes estavam arruinadas pela explosão) mas tolerável e totalmente recuperado Draco deu, com muito prazer, adeus àquele quarto de hospital.


Olhou uma última vez para o cômodo com uma única e minúscula gota de desapontamento, acabavam-se as chances de Weasley ir visitá-lo.


Saiu e seguiu pelo corredor, quase sendo atropelado por uma mulher correndo, e foi visitar sua mãe. Queria vê-la mais uma vez antes de voltar à mansão, sentia que devia explicações para ela mesmo que fosse incapaz de compreender o que ele falava.



Gina correu pelos corredores de St. Mungos, preocupada em não chegar tarde demais. A recepcionista do hospital lhe informara que Draco havia sido liberado e sairia naquela manhã de seu quarto. Tinha que visitá-lo antes que partisse.


Durante todo o caminho esbarrou em várias pessoas sem notar quem eram, apenas preocupada em ir até lá o mais rápido possível.


Toda sua corrida, no entanto, se mostrou inútil. Chegou à porta do quarto de Malfoy e o encontrou vazio. A cama estava feita e nenhum traço de seu ocupante anterior restava.



- Oi mãe – começou incerto.


Sentou na cadeira ao lado da cama em uma distância segura. Era apenas a segunda vez que entrava lá e tinha certeza que estava longe de se acostumar com aquilo. O rosto inexpressivo, que tantas vezes o assombrou, continuava idêntico e ainda não sabia como poderia começar a contar tudo que ocorreu desde que a visitara.


Resolveu falar sobre os jardins da mansão, sabendo que de alguma forma sua mãe gostaria de ouvir o que havia acontecido com sua parte preferida da casa. Fez questão de incluir seus planos para recuperar a velha glória e reviver as plantas. Não houve reação.


Continuou, mencionando o estado empoeirado dos quartos e cômodos e também com cuidado de lhe dizer que pretendia deixar tudo limpo e como novo assim que pudesse. Novamente não conseguiu reação nenhuma dela.


Mesmo depois de um momento de hesitação contou sobre o mausoléu e sobre a placa onde seu pai estava enterrado. Por um momento achou que sua mãe virara levemente o rosto em sua direção mas foi apenas um truque da luz e seu desejo de vê-la reagir tomando conta.


Com menos detalhes disse o que aconteceu depois, incluindo as partes sobre Bellatrix e as explosões. Falou sobre seus ferimentos mas garantiu que estava recuperado agora e pronto para retomar sua vida. Ainda sim, não houve sinal de reação.


- ... Eu vou fazer Pansy se arrepender muito por não ter ido me visitar. Ela não fez isso porque provavelmente agora que não sou mais interessante ou estou nos jornais, não quer gastar tempo comigo. Mas ela vai ver só quando eu voltar à ativa. O nome Malfoy vai voltar a ser respeitado, mãe, prometo!


Deixou escapar um suspiro sem querer e virou para a janela ao lado, observando a neve caindo. Nem tinha percebido que o inverno havia chegado.


- Agora posso realmente começar de novo. Do zero. É uma nova chance, acho, de fazer a coisa certa e vencer. Não vou desperdiçar isso.


Olhou para os olhos vidrados e azuis da mãe, buscando desesperadamente por permissão para o que diria em seguida. Precisava para que pudesse seguir adiante.


- Uma vez... Há muito tempo atrás você falou para papai se livrar da máscara e do quadro. Falou que era simples e que devia ser feito. Agora... Eu quero fazer o mesmo. Minha máscara já está perdida e quero que continue assim... O quadro está ainda pendurado no escritório dele, me esperando. Eu vou tirá-lo da parede e não pretendo nunca mais vê-lo. Um dia espero que você esteja bem o suficiente para entender o porquê disso.


Tirar do peito aquilo foi como levantar vôo como uma Firebolt. Sentia-se livre pela primeira vez em anos e confiante.


Os olhos de sua mãe viraram para os dele por um mísero segundo e depois perderam o foco em seguida, como se jamais houvesse acontecido algo, mas Draco sabia que havia. Aquilo lhe deu esperança de que um dia Narcissa Black Malfoy sairia daquele estado, lutando contra a loucura.



Gina olhava a neve cair com tristeza, mal percebendo os flocos caindo sob seus ombros e cabelo. Estava encostada na vitrine falsa do hospital, arrependimento ocupando a maior parte de seus pensamentos. Se ao menos tivesse tido coragem de visitá-lo antes...


A rua estava vazia, um manhã de domingo calma e fria. A diferença entre os últimos tempos que passou era extraordinária... Era errado preferir ação à paz e silêncio que agora lhe rodeava?


Não via como a viagem para a França seria de alguma forma interessante ou excitante, sentira muitas saudades da Inglaterra, de Harry, Hermione, Rony e, estranhamente, de Draco Malfoy. Será que algum dia as coisas voltariam, em certos aspectos, ao normal? Estavam todos há tanto tempo presos à guerra, tendo acabado ou não, que era complicado saber o que exatamente podia ser chamado de “normal”. Como se suas vidas tivessem ficado congeladas no tempo, sua juventude esperando até que Voldemort fosse destruído e a guerra terminasse. Mas com a Ordem aquilo pareceu se estender... E sentia que havia sido a mesma coisa com Draco. Suas vidas estavam ligadas demais com o passado, presas uma luta que, ao que parecia, finalmente agora chegara o fim.


Bellatrix era o último resquício de Voldemort. Acabou e o que seria de todos envolvidos?


- Sua cabeça está doendo?


Virou para o lado, assustada com a voz tão próxima. Encontrou Draco Malfoy a olhando intensamente, cabelo loiro cheio de flocos de neve, o que indicou que estava há muito tempo lá.


- Deve estar porque você está pensando. Deve doer, não é mesmo? – sorriu arrogantemente.


- Se você não sabe é porque nunca pensou. O que é bem pior – respondeu, cruzando os braços.


- Insultos não combinam com esse rosto de tonta. Não está fingindo muito bem, Weasel.


- Não tem ninguém para enganar aqui – o que era outra maneira de dizer “Eu contei da poção porque confio em você”, mas Gina não sabia se havia entendido assim.


- Mesmo se tivesse, você não conseguiria – o que queria dizer “Eu te conheço muito bem, perceberia na hora”, porém Gina não interpretou assim.


Como de costume seguiu-se um silêncio mas que deixara de ser desconfortável há muito tempo atrás... Olharam para cima, observando com calma a neve cair. Era incrível como conseguiam continuar com a fachada de tranqüilidade quando ambos lados estavam ansiosos para falar sobre a tal “amizade” que supostamente estariam cultivando.


- Como está o braço? – começou com cuidado.


- Curado – respondeu, dando os ombros.


- Obrigada por não ter... Contado para o Ministério e os jornais.


- Já falei para você, Weasley... Não tenho nada a ganhar com isso.


- E se tivesse?


Draco soltou uma risada curta.


- Merlin, você gosta de fazer perguntas irritantes, não é, Weasel?


- Não teria graça se eu deixasse você escapar tão fácil – sorriu, adorando irritá-lo.


- E também não teria se eu respondesse – abriu, irritantemente, um sorriso de volta.


- Mas seria muito satisfatório.


- Os jornais estão bem envenenados contra Potter. Leio cada matéria divertida... Uma preferida é a que recomenda que ele seja submetido a uma terapia de choque, o choque sendo, claro, vários hipogrifos pisando em cima dele. A imagem não quer sair da minha cabeça... Potter sendo pisoteado várias e várias vezes.


- Harry não liga para isso. Já está acostumado com as mentiras que publicam.


- Potty cabeça de melão é agora um fugitivo asqueroso, correndo para não ser pego. A ironia me deixa tão contente que eu poderia dar uma festa.


Gina, um pouco irritada com o que acabara de falar, cruzou os braços.


- E quem iria nela? – falou, não se importando por um momento que aquilo o ofenderia. – Além do mais, se não é engano meu, você, não faz muito tempo, também era um fugitivo, correndo para não ir para Azkaban.


- Por isso que eu chamo de “ironia”, Weasel. Eu era um, agora ele é também. Irônico, entendeu?


Soltou apenas um resmungo, não querendo admitir derrota. Tentando esfriar a cabeça deixou que alguns momentos de silêncio passassem, virando o rosto para o lado oposto de Draco.


- Granger ainda está aqui, então?


- Quê?


- Granger ainda está aqui, no hospital. Você veio para cá para visitá-la, não foi?


Voltou a encará-lo, alguns segundos se passando antes de entender o que ele queria dizer.


- Ah... Não. Ela já foi liberada alguns dias atrás.


- Viva – revirou os olhos, palavras em tom sarcástico. – Por que está aqui?


“Ah, faça meu favor, como se você não soubesse!” pensou. Não podia acreditar que estava fazendo-se de bobo! Queria que admitisse estar se sentindo mal por não ter visitado antes? Ou talvez... Achava a idéia tão ridícula que ignorou a possibilidade totalmente?


- Veio me ver?


A pergunta foi tão inesperada e direta que Gina arregalou os olhos e abriu a boca sem deixar nenhum som sair. Draco só a olhava com divertimento de sua surpresa no rosto.


- O quê? É muito cedo para enrolação – defendeu-se com um sorriso.


- Está bem. Sim, vim te ver.


- Achei que não ia. Demorou bastante tempo até resolver dar as caras.


- Eu... Fiquei ocupada.


- Trocando saliva com o Potty? – provocou.


Ele não podia imaginar que o que tinha acabado de falar era verdade. Gina ficou, para sua raiva, vermelha. Draco percebeu isso e o sorrisinho arrogante perdeu lugar para uma expressão de nojo.


- Eca, Weasel. Que mau gosto!


- Olha quem fala! Quem é que dorme com a Pansy?!


- Dormia. No passado. Não sabe conjurar verbo?


Cada um virou o rosto para o lado oposto, não desejando encarar o do outro. Discutir suas vidas privadas era extremamente incômodo.


Depois de um longo período de tempo Gina tomou coragem e virou o rosto levemente, olhando-o de lado. Draco continuava observando a neve cair, o rosto fixado em um ponto qualquer no céu. A ponta de seu nariz pontudo estava vermelha devido a exposição ao frio mas o resto continuava pálido como sempre. Não havia barba de Azkaban em seu rosto mas o cabelo permanecia cumprido, quase chegando aos ombros. Embaixo de seus olhos cinzas estavam profundas olheiras caudas provavelmente por falta de descanso... Mas era sua expressão que surpreendeu Gina, ele parecia um menino de 11 anos maravilhado com o primeiro dia de neve e não havia nenhum traço da expressão arrogante ou grave que ela se acostumou a ver.


De alguma forma inexplicável Gina se viu sorrindo ao vê-lo parado embaixo da neve, seus cabelos e ombros cobertos com flocos. Draco Malfoy naquele momento era fofo.


- O que foi?


- Nada – respondeu, não conseguindo segurar o sorriso.


Draco a olhou, suspeita no rosto, mas não continuou o assunto.


- Vai continuar bancando uma loira louca até o fim dos seus dias? – disse, indicando os cabelos despenteados de Luna.


- Você consegue, não é?


- Ha, ha. Estou sentido.


- Amanhã eu vou embora do país. Na França não sou procurada, ainda, então não preciso ser Luna lá.


- França? Você não tem classe para ir para França, Weasel – provocou outra vez, sorriso nos lábios.


Em outra ocasião, alguns meses antes exatamente, Gina ficaria ofendida mas agora, sem querer, começou a encarar aquilo como uma provocação “amigável”... Ou alguma coisa do feitio. O mais surpreendente era que sabia que Draco também encarava do mesmo jeito.


- Por quê? Acha que não sou capaz de bancar a francesinha fresca e delicada? – disse, jogando o cabelo pra atrás com a mão numa tentativa de imitar Fleur Delacour. – Bonjour, non sou a coisa maz perveita que você jaz viu?


Draco gargalhou e ela se uniu em seguida.


- Acho que melhor você bancar a turista americana lá, Weasley. Daquelas que voam em vassouras pretas, usam jaqueta de couro, xingam e cospem no chão. É mais a sua cara.


- Como se você fizesse melhor.


- Eu nasci em uma família influente e rica, Weasel. Fui criado como um cavalheiro.


Gina não se segurou e soltou uma gargalhada.


- Você, um cavalheiro? Não me faça rir!


Quase engasgou com a própria risada ao vê-lo fazer uma reverência pomposa mas não foi apenas isso, ele ainda pegou sua mão e a beijou de leve. Vendo a reação surpresa dela, Draco riu outra vez.


- Viu? – disse com o sorrisinho arrogante de sempre nos lábios.


- Quem diria! Você pode ser educado quando quer!


- É, bem, não se acostume, Weasel. É só para quem merece.


Por alguma razão Gina não levou a ameaça a sério. Sentiu que era apenas Draco não querendo admitir que sim, ela poderia se acostumar. Velhos hábitos eram, afinal, difíceis de se perder. Preferindo deixar que ele continuasse a se resguardar contra o óbvio por puro orgulho Malfoy, Gina mudou de assunto.


- O que você pretende fazer agora que saiu do hospital?


- Coisas.


Gina revirou os olhos.


- Que “coisas”? Coisas do tipo “tentar conquistar o mundo” ou do tipo “casar, engordar e ter um herdeiro mimado e esnobe”?


- Nenhum nem outro. Casar? Está pirada? Engordar? Você acha que EU, o homem mais lindo da Inglaterra, vou engordar?


- Quem sabe a primeira coisa que devia fazer era comprar um espelho.


- Então você sabe o que é um?


- Já ouvi algumas lendas sobre tal objeto – sorriu.


- Mas claramente essa Lovegood não.


- Ela tem outras preocupações...


- Potty está beijando você assim ou...


- Não é assunto seu. Eu não pergunto o que você e a Pansy fazem – respondeu rapidamente, por alguma razão, na defensiva.


- Faziam. Passado!


- Que seja!


- Potty pode estar apaixonado pela loira, não pela ruiva, sabe?


- E você se importa?


- Não. Mas seria engraçado.


- Não mais que um murro na sua cara.


- Ai, estamos na defensiva, não? Não me diga que eu atingi um nervo?


- Imagina... Eu só acho a idéia de Harry batendo em você muito interessante. Briga na lama... Esse tipo de coisa – piscou.


- Eca, Weasel!


Isso terminou definitivamente, como Gina previra, com a conversa sobre Harry e ela.


- Você ainda não me respondeu o que vai fazer.


- Eu não vou voltar para os meus dias de Comensal malvado, se é isso que você acha.


- Não acho. E também não acredito que um dia você foi um Comensal malvado. Não de verdade – falou, aproximando-se dele.


- Me poupe do sentimentalismo, Weasel – dando um passo para trás e se afastando sem perceber. – Mas... Obrigado. Pelo voto de confiança e essa baboseira toda.


- De nada – sorriu.


- Não que signifique alguma coisa... Eu ainda... Ainda tenho a marca no meu braço para provar que você está errada. E não espere que eu... Sei lá, seja bonzinho como Potty. Porque isso já é ser mais que burra, é ser lufa.


- Ei, se você começasse a agir como o Harry eu mesma bateria na sua cabeça com um cabo de vassoura. Um já me basta.


- Um já é demais, isso sim. Nenhum seria o ideal.


- Mas aí com quem eu poderia trocar saliva? – riu.


Não houve resposta e após um momento desconfortável voltaram a encarar a neve caindo. Agora estavam cobertos de neve e suas roupas grossas começando a falhar em bloquear o frio. Gina sabia que estava na hora de ir embora. Trouxas começavam a povoar a rua, devagar aumentava o número de pessoas indo e vindo.


- Por que você veio até aqui, na rua da Londres trouxa? Por que não usou Flu para ir embora do hospital?


- Você estava aqui.


- Como...


- Uma das enfermeiras me falou quando eu voltei para assinar uns papéis.


- Ah. Faz sentido.


- Não, sério?


- Acho... Que está na hora de eu ir... Tenho que fazer as malas, despedir de... Muita gente.


Draco não respondeu, observava uma família trouxa andando com sacolas de compra e conversando animadamente.


- Então, é isso... Acho – tentou outra vez, relutantemente.


- É...


Encararam-se, sem saber direito o que fazer. Como seria melhor se despedir? Um abraço? Um beijo na bochecha? Um aceno de cabeça?


- Hum... É... Tchau – tentou, estendendo a mão para ele, sem obter reação.


Já estava afastando a mão, sentindo-se ridícula, quando ele a apertou de leve.


- Não deixe que eles peguem você – avisou, uma sombra passando pelo seu rosto. – Azkaban não é o seu estilo.


- Eu tenho alguns truques na manga, ainda.


- Sei que tem – sorriu. – Até demais, Weasel.


Trocaram sorrisos... O dela confiante e o dele com o ar arrogante familiar. O aperto de mão terminou e se afastaram, virando em direções opostas. Gina continuou andando pela rua londrina e Draco estava se preparando para entrar pela vitrine falsa que dava a St. Mungos.


Será que um dia encontraria Draco Malfoy de novo? Esperava que sim e daquela vez isso não a deixou surpresa.


Havia muito mais nele do jamais imaginara. E, sendo recíproco ou não, agora o considerava um amigo. Daqueles que você vai ter sempre um pé atrás, sempre vai trocar alguns insultos e nunca vai concordar sobre certos assuntos mas também daqueles que pode trocar risadas, chutar o traseiro de inimigos juntos e, quem sabe, confiar sua vida.


Desde Cairo alguma coisa mudara nele... E ambos sabiam. Aquele Draco, Comensal e fugitivo, agora não era mais o mesmo. Finalmente estava um passo mais perto de superar e aprender a aceitar suas escolhas do passado, sem mais medo. E ela estava orgulhosa dele por isso. Seria uma longa jornada mas confiava que Draco conseguiria.


Virou para olhá-lo: atravessava a barreira mágica mas não sem antes abrir um sorriso arrogante para ela e dar uma piscadela. Leu seus lábios formarem “Tchau, Weasel. Não chore muito de saudades de mim” e respondeu para ele revirando os olhos.


Sorrindo, voltou a caminhar pela rua. Apesar de ter perdido a Ordem ganhara algo muito mais importante e duradouro: um amigo.


E, claro, um namorado também. O que era ótimo.


Os dois, de um jeito totalmente diferente, eram os seus heróis. Harry estava destinado a isso... E Draco? Draco lutou para ser um e, para Gina, isso o fazia o herói mais verdadeiro de todos.


FIM


N/A: AHHH... FIM?! O QUÊ? Eu não acredito mas é o fim mesmo... 140 páginas sobre Draco! Eu sei que todos os D/Gs que estão lendo essa fic provavelmente querem me matar ou estão realmente decepcionados. Sorry! Eu espero muito que essa fic praticamente sem romance foi divertida o bastante para sustentar a falta de ação D/G. Se não conseguiu ser, então sorry! Eu sei que também tem gente que vai querer me matar por ter colocado H/G! SINTO MUITO! Mas o Harry estava, como eu espero que vocês tenham percebido, louquinho pela Gina desde o começo (erm, não desde o começo porque eu não planejei isso nos 5 primeiros capítulos, risos) e estava agindo daquele jeito “tenho algo preso no meu traseiro” por causa dela. Desse modo ele pode voltar ao ser o Harryzinho feliz de novo. E o Draco? Draco tem a Gina como amiga. Risos. *Se esconde das pedras sendo atiradas* SORRY. Mas é assim que eu achei que funcionaria a história. Eles se agarrando em Azkaban NÃO dava certo, por mais que eu quisesse. E eles se recusaram a se beijar nesse final, sorry! Além do mais, sempre disse que a fic era centrada no Draco. Era o crescimento dele, a libertação dele do passado. Ele conseguiu isso, está livre... Erm, em termos claro. Eu não conseguira escrever um romance com a Gina de modo “realista” sem antes eles passarem pela fase da amizade. Não é o que acontece com a maioria das fics D/G, pelo que eu imagino (meu conhecimento de fics desse casal é pequeno. Li umas 6 ou 7 até agora), mas, risos, Falsos Heróis nunca teve intenção de ser uma fic como a maioria, mesmo porque eu nunca escrevi D/G “normal” e não acho que seria capaz, risos.


N/A2: Quanto ao final... Não teve “ação” mas espero que tenha sido, pelo menos, “fofo”. Uma das minhas preocupações foi se o Draco estava muito OOC (out of character), se estiver então eu definitivamente não vou fazer continuação, risos.


N/A3: Quero agradecer a todos que mandaram reviews. Em particular à Melissa Hogwarts e a Lisa que foram as primeiras que leram e gostaram. Também muito a Pichi que, por razões AINDA misteriosas, risos, betou essa fic tão bem que eu morro de vergonha em postar minhas outras fics cheias de erros sem a betagem dela! Risos. Obrigada, Pichi! E claro, para TODAS as pessoas que mandaram as reviews que recebi! Eu ainda estou boba com a quantidade... E temo que fiquei mal acostumada! Risos.


N/A4: (A última, prometo!) Ok, hora de propaganda! Quem quer ler uma (outra não é bem a palavra, né?) D/G minha, leia Rising Moon Setting Sun. Uma fic AU baseada na lenda de Camelot. Pode não parecer mas a fic é D/G sim. E nela eles se BEIJAM! AHHH! E não só ficam no aperto de mão! VIVA!


A continuação de FH chama-se "Ligações Pergiosas" É ela é D/G MESMO!

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