No quarto ao lado

No quarto ao lado



Capítulo 17

NO QUARTO AO LADO

- Não vá muito longe, Draco!


Seus pés bateram no chão, impulsionando sua vassoura. Sentiu imediatamente o vento em seu rosto, os cabelos loiros voando para trás. Sabia naquele momento que estava destinado a voar e a grandes feitos.


Mal podia acreditar que estava tão distante do chão, os raios de sol esquentando seu corpo como uma camada protetora. O céu claro e limpo refletia em seus olhos cinzas, tornando-os levemente azuis. Sorria a cada manobra.


Passou pelos jardins de sua casa, zunindo contra o vento. Subiu mais e mais, passando pelo telhado escuro da mansão, e pôde ver tudo que havia ao redor da propriedade Malfoy, Wiltshire inteira à sua disposição.


Estava livre e feliz. Seu primeiro vôo de vassoura era tudo que sempre sonhara. Estava em seu sangue voar.


Ficou por alguns momentos admirando a vista e o dia maravilhoso. Lá embaixo podia imaginar a irritação de sua mãe em sua demora. Sentindo que já havia testado a paciência dela o suficiente, Draco Malfoy voou para baixo, com a intenção de reunir-se a seus pais, que esperavam-no ansiosos.


O pouso foi perfeito e seus pés tocaram em segurança a grama.


- Ótimo vôo, Draco – sorriu Lúcio. – Terá uma vaga garantida no time de Quadribol da escola. Está no seu sangue voar tão bem.


Nada mais poderia tê-lo deixado mais feliz, seu pai estava orgulhoso dele... O menino de sete anos sorriu como se tivesse acabado de ganhar o melhor presente de Natal de sua vida.


- Você está todo sujo! – disse sua mãe, abaixando-se e ficando na sua altura. – Vai ser a terceira vez que terei que mandar o elfo-doméstico limpar essas vestes...


Sorrindo, Narcissa lambeu o dedo e limpou as bochechas de Draco.


- Mãe! – reclamou. – Eu já tenho sete anos!


- Então deveria saber que não pode se sujar assim!


- Deixe o garoto se sujar um pouco, Narcissa. Compro mais dez vestes se for necessário.


- E uma vassoura nova? – pediu Draco. – Uma mais rápida!


Narcissa levantou, cruzando os braços.


- Mais rápida? Para que você quer voar tão rápido?


- Para vencer a Copa Mundial!


Lúcio riu, bagunçando os cabelos do filho com mão.


- Ambicioso como o pai.


- Não, como a mãe – retrucou Narcissa, sorrindo e ajeitando o cabelo do filho.


- Obviamente foi do lado Malfoy...


- Lúcio, querido, quem conseguiu ser Monitora-Chefe? Quem passou por cima de todas as suas pretendentes e conquistou você?


- Certamente, Narcissa, mas você deve lembrar de como eu subi no Ministério e...


- Foi a mistura! – anunciou Draco, depois de pensar no assunto enquanto os pais trocavam argumentos, divertindo-se. – Black e Malfoy são as melhores famílias puro-sangue!


- Ele está certo, Narcissa.


- Completo de razão, Lúcio. Mas é claro, afinal, é inteligente como a mãe.


- Sem dúvida – concordou seu pai.


Trocando sorrisos satisfeitos, a família caminhou pelo jardim ensolarado, Draco no meio de seus pais, segurando sua vassoura e feliz como jamais seria de novo.



Seus olhos se ajustaram à luminosidade com dificuldade, abrindo e fechando. Estava vivo? Não em mil pedacinhos?


Um cheiro de limpeza e poção calmante invadiu suas narinas... O ar estava fresco e havia algo que lhe passava uma sensação de segurança e calma à sua volta. Lembrou de quando ficou doente quando pequeno e toda a família lhe encheu de doces, brinquedos...


Finalmente abriu os olhos por completo, não encontrando o rosto de sua mãe ou de seu pai, mas um quarto de hospital vazio e impessoal. Cortinas brancas levantavam contra o vento, raios de sol passando por entre elas, o som abafado de passos e conversas chegava ao quarto pela fresta da porta fechada.


Onde estava? E por que estava lá?


De repente tudo que acontecera nos últimos meses voltou como um soco no rosto. No mesmo momento o humor de Draco sofreu uma mudança drástica. De confuso foi para irritado e assustado, imaginando-se sem alguma parte do corpo depois de uma explosão tão violenta.


A primeira coisa que fez foi tentar levantar mas metade de seu corpo reclamou da tentativa, ardendo. Confuso, tocou um lado de seu rosto com a mão direita e sentiu um pano frio onde deveria estar sua bochecha esquerda. Sentiu logo em seguida que todo seu lado esquerdo estava gelado, provavelmente sob os mesmos pedaços de pano.


O que tinha acontecido?


Sentiu um medo terrível ao imaginar a razão de metade de seu corpo estar coberto... Teria ficado deformado na explosão?


Mas como tinha sobrevivido...


Lembrava claramente dos cabelos ruivos de Weasel desaparecendo, deixando-o para trás... De ele pegando o medalhão do bolso... Abrindo a jóia...


- Rodolphus ama Bellatrix – murmurou, a foto do dia do casamento de sua tia e tio surgindo em sua mente. – R.A.B. Quem diria?


O medalhão não era algo perigoso ou poderoso... Simplesmente uma recordação do marido dela... Tinha pego a jóia, percebendo que a hora de usá-la chegara. Mancou até o salão de música, usando as paredes como apoio.


Viu Potter, Weasel da orelha gigante segurando Granger e... Weasley, os quatro encurralados por Bellatrix. E então simplesmente jogara o medalhão no caldeirão mais próximo. Depois tudo era um borrão...


- Ah, você está acordado! Graças a Merlin... Estávamos começando a achar que havia mais ferimentos...


Draco olhou para a porta de seu quarto, por onde uma enfermeira havia entrado segurando uma bandeja com vários cálices borbulhantes, provavelmente poções calmantes.


- Como está se sentindo?


- Como eu deveria estar me sentindo? Não sei onde estou... Não sei como cheguei aqui... E muito menos o que aconteceu comigo! – gritou Draco, frustração por tudo, chegando à superfície rapidamente. – Como você acha que eu estou me sentindo?!


A mulher pareceu assustada com a reação tão violenta.


- Você está em St. Mungos, Hospital para Ferimentos e Doenças Mágicas... Não sabemos o que aconteceu com você. Chegou aqui com uma perna e várias vértebras quebradas, ferimentos de todos tamanhos, sinais de ter sido estuporado várias vezes e com várias queimaduras sérias no corpo. É um milagre que esteja vivo.


- Eu não acredito em milagres. Quanto tempo eu estou aqui?


- Três dias...


- A mansão?


- Que mansão?


Então a notícia ainda não havia se espalhado... Ou então aquela mulher ignorante não juntou as duas coisas.


- Nada que te interessa. Como eu vim parar aqui? – insistiu, seu tom ainda furioso.


- Eu não sei... Alguém trouxe você aqui... Uma moça...


- Moça? Que moça?


- Não fui quem lhe atendi na hora... Não sei lhe dizer...


- Como ela se parecia? – a mulher abriu a boca para responder mas Draco interrompeu. – Faça algo de útil e descubra, mulher!


A enfermeira ficou tão assustada com seus gritos que murmurou algo que pareceu com “buscar mais poções calmantes” e correu para fora do quarto, quase derrubando sua bandeja.


Três dias numa cama de hospital... O que teria acontecido com a mansão? Destruída sem reparos? E Bellatrix teria morrido?


Parte dele sentia-se mal por ela... Não saía de sua cabeça que sua tia o poupara de alguma forma e não tinha intenção de matá-lo, apesar das ameaças. Afinal, oportunidade não foi o que faltou. Além do mais, Bellatrix era seu último elo com sua família... Agora... Agora, estava sozinho definitivamente.


A enfermeira inútil não voltou e por horas longas e tediosas Draco ficou deitado naquela cama, sem saber o que passava no mundo lá fora ou mesmo no corredor ao lado. Estava cheio de perguntas para fazer e queria sair de lá o mais rápido possível.


Apenas quando o quarto estava escurecendo, iluminado agora por uma tocha esverdeada, que algum medi-bruxo resolveu lhe dar satisfações.


- Enfermeira Spore me avisou recentemente que você havia acordado. Bom. Sinal que está se recuperando bem. Meu nome é Emeric Havelog. Estou encarregado da sua saúde.


- Ótimo, então você é quem me deve explicações.


- Faça suas perguntas à vontade... Mas antes eu preciso fazer algumas – pegou uma pena e prancheta. – Seu nome?


- Draco Malfoy.


O homem pareceu confuso, como se tivesse ouvido errado.


- Malfoy? Por Merlin! Você sabe o quanto os jornais estão falando de você? O Ministério inteiro está te procurando!


Ótimo! Provavelmente deviam estar querendo colocá-lo de volta em Azkaban, por ter ajudado sua tia. Devia ter inventado outro nome...


- Eu prefiro continuar perdido – avisou, tentando parecer ameaçador.


- Entendo perfeitamente – respondeu o bruxo, surpreendendo Draco. – Não contarei a ninguém, respeitamos o sigilo de nossos pacientes. Porém, aconselharia você a permitir que o Ministério seja avisado de seu estado...


- Não – cortou, irritado. – Ainda não.


- Está bem... Outra pergunta: algum parente ou amigo que quer avisar?


Se tivesse algum....


- Não.


- Certo... Bem, acredito que quer saber sobre seu estado? – Draco assentiu, deixando o homem continuar. – Praticamente todos seus ferimentos foram curados sem maiores problemas...


- Mas e o meu lado esquerdo? O que aconteceu? – interrompeu, ansioso para descobrir se haveria algum dano permanente.


- Só podemos supor que você foi atingido por algum tipo de explosão... As queimaduras se recusam a melhorar devido à sua natureza mágica... Mas com uma ou duas semanas de tratamento gradualmente desaparecerão.


Draco respirou, aliviado. Não ficaria com a aparência de um trasgo! Uma boa notícia enfim.


- Ajudaria muito saber o que aconteceu com você. Sua recuperação seria beneficiada imensamente.


- Eu não me lembro – mentiu, não arriscaria revelar mais nada.


- Compreensível. Agora vou deixá-lo descansando, com licença.


O medi-bruxo estava fechando a porta do quarto quando Draco o chamou de volta, ainda precisando perguntar algo.


- Quem me trouxe aqui? Aquela enfermeira me disse sobre uma moça...


- É... Ela trouxe você aqui há três dias. Não sabemos quem era e depois que você foi levado ela simplesmente desapareceu.


- Era... Ruiva?


O bruxo pareceu tentar se lembrar por alguns breves momentos, enquanto Draco segurava sem perceber a respiração.


- Não. Na verdade, agora que penso nisso, ela parecia ser uma fã daquele grupo As Esquisitonas. Roupa de couro, cabelo roxo, óculos escuros... A combinação toda. Muito estranho.


Weasley! Estava viva então... Vaso ruim não quebra fácil. Pelo jeito não tinha criatividade com disfarces, se estava usando o mesmo que usara no Egito...


- Amiga sua? – perguntou o medi-bruxo, interpretando a expressão satisfeita de Draco erradamente.


- O quê? – exclamou bruscamente, surpreso com a pergunta.


- Achei que talvez fosse...


- Não... Não conheço ninguém assim.


Era óbvio que Havelog não acreditou, porém, felizmente, não quis comentar mais o assunto e saiu do quarto, fechando a porta atrás de si.


Quem diria que Weasel havia salvo sua vida... A insistência dela em cruzar em seu caminho era incrível e Draco continuava a se perguntar por que fazia isso. O mais estranho era que não sentia raiva ou repulsa pela idéia de que devia sua vida a ela.


Há alguns meses a mera possibilidade de um Weasley o salvar era nojenta. Agora simplesmente não lhe incomodava. Querendo ou não, Weasel já o havia salvado em Azkaban... E ao mesmo tempo era quem o tinha jogado lá!


Esquisito? Estranho? Louco? Com certeza.


Havia tantas reviravoltas naquela história toda que Draco duvidava que algum dia compreenderia o que se passara.


Passou cinco dias sem levantar de sua cama, os panos frios um a um sendo retirados. Durante esse tempo ninguém veio visitá-lo ou incomodá-lo. Não sabia se isso era bom ou ruim. Era sinal, pelo menos, que o medi-bruxo havia cumprido sua palavra e mantido a boca fechada.


As enfermeiras preferiam evitar seu quarto, sua reputação de ser grosso, rude e mal-humorado já espalhada por todo o hospital mas ainda conseguiu convencer uma a lhe dar uma edição recente do jornal O Profeta Diário.


O que leu não lhe trouxe conforto ou ajudou a melhorar seu humor. O Ministério não estava atrás dele, felizmente, mas havia todo tipo de rumor sobre o que havia acontecido com sua mansão. Inclusive que estava praticando algum tipo de ritual de magia das trevas que acabou dando errado e o matando. Higgs dera mais de três entrevistas afirmando que isso não era possível, tentando desesperadamente não desacreditar o testemunho de Draco, o que causaria dúvidas sobre se realmente a Ordem o torturara.


Nenhuma palavra sobre Bellatrix.


O que não era nada bom. Sem corpo, sem provas de sua morte. O que significava que até que houvesse alguma notícia viveria olhando atrás do ombro, esperando ser estuporado de surpresa.


Nada sobre Weasel e os outros três também. Perguntava-se como teriam conseguido se curar de todos os ferimentos sem que ninguém suspeitasse da ligação entre os dois acontecimentos.


Sabia que alguma hora teria que sair daquele quarto... E estava ansioso para fazê-lo, o que não queria era ter que enfrentar o Ministério e suas perguntas irritantes. Queria simplesmente sair dali, ir para sua casa e começar a reformá-la, pulando a parte chata de burocracia e leis.


Foi no sexto dia de sua recuperação que começou a ouvir agitação no quarto ao lado do seu, vozes e risadas atravessando o corredor de forma extremamente irritante. Acordou certa manhã com os barulhos e, depois de uma noite ruim, em que teve insônia, revirando na cama a cada instante, Draco não ficou nada contente com o fato que havia alguém feliz no mundo. Queria saber qual era a razão de tanta felicidade! Estavam em um hospital, não em uma festa!


Quanto mais risadas e vozes chegavam ao seu quarto mais irritado ficava, sempre descontando nas enfermeiras que quase suplicavam para que tomasse poções calmantes.


No sétimo dia a coisa toda piorou. Durante a manhã toda viu pessoas passando segurando balões! Balões! E coloridos! Draco só desejava explodi-los com o olhar.


Desde que acordara pela primeira vez em St. Mungos não conseguia dormir direito. Sempre havia algo em sua mente que o impedia... Fossem memórias ruins, arrependimentos ou irritação por não ter nada o que fazer ou com quem falar. As enfermeiras burras e ignorantes não eram companhia, o máximo que faziam era deixar cálices e comida para ele e sair apressadas do quarto.


Quando abria a boca era para gritar com elas... E isso perdeu a graça rapidamente. Quando estava em Azkaban achava que apenas lá estava solitário mas agora era claro que já estava sozinho há muito tempo.


Isso e o fato que alguém no quarto ao lado não estava sozinho, deixaram Draco num humor tão péssimo que estava próximo de fazer flores murcharem e crianças chorarem de medo só pelo olhar. Foi então que decidiu que era o bastante. Levantou da cama.


Sua perna esquerda estava curada das queimaduras felizmente e podia agora se mexer com facilidade. Ainda era obrigado a deixar seu braço em uma tipóia gelada, descobrindo que se tratava de uma loção para curar efeitos de poções explosivas, assim como seu estômago estava enfaixado. Fora isso, estava se sentindo como novo.


Descalço e ainda de camisola de paciente, andou pelo corredor do hospital, desviando de medi-bruxos e doentes inválidos e lentos. Sua intenção era visitar a mãe na ala de efeitos da Maldição Cruciatus mas infelizmente foi impedido por Havelog e uma enfermeira, que o pegaram no meio do caminho.


Ainda mais irritado, foi forçado a voltar para seu quarto e tomar uma poção. Tentou dormir mas era impossível porque, não bastasse isso, as vozes alegres do quarto ao lado insistiam em zombar dele, cada vez mais altas e contentes.


Irritado e à beira de um ataque de raiva, levantou de novo, pisando decidido e indo em direção ao maldito quarto vizinho.


Mandaria aqueles imbecis idiotas calarem a bosta de dragão da boca deles!


Mas ao chegar a porta do quarto um mar vermelho o impediu de fazer qualquer coisa.


- E então Fred disse: Mas isso é a sua mulher?


O quarto explodiu em risadas.


- Meninos, isso foi muito rude! – criticou uma mulher gorda e baixinha. – Ainda mais sendo a esposa do ministro!


Mas não havia ar de reprovação real no tom dela e as pessoas continuaram a rir da história. Havia dezenas de balões enfeitando o cômodo, flores, cartões e doces por todo o lugar. A diferença de seu próprio quarto era tão gritante que estava paralisado.


O primeiro ruivo que viu era familiar de algum modo... Parecia tentar imitar um baterista dos Esquisitonas, seu rosto cheio de cicatrizes e tinha o braço em volta da cintura de uma das únicas criaturas não-ruivas dali, uma mulher estonteante de cabelos prateados. O segundo e terceiro eram idênticos e os que contavam as piadas, além de serem também familiares a Draco. O quarto era a figura de Arthur Weasley, mais velho que Draco se lembrava mas não menos irritantemente feliz. No entanto, seu pai, se estivesse vivo, ficaria contente em saber que a careca do Weasel aumentara muito. A sexta ruiva então deveria ser sua esposa e a mãe de todos aqueles ruivos, a gorda baixinha.


O sétimo Weasel era impossível de não reconhecer. Possuía as já conhecidas orelhas grandes e se tratava de Ronald Weasley em pessoa. Para completar, estava sentando perto da cama, segurando a mão de ninguém mais que sangue-ruim Granger! Viva e com um sorriso nos lábios, apesar de ser a paciente e estar pálida.


Imediatamente procurou a oitava ruiva mas não encontrou. Ao invés bateu os olhos em ninguém mais que Longbottom e uma moça loira de cabelos maltratados e olhos vidrados.


Estavam todos rindo, contentes e conversando animados, tão concentrados na piada de um dos gêmeos que não perceberam a figura confusa e desorientada de Draco Malfoy parado na porta, boca aberta pronta para gritar mas congelada de choque.


Imediatamente foi tomado por algo que nunca sentira antes... Estava com inveja dos Weasley! O que rapidamente se transformou em raiva. Eles tinham o que ele perdera e nunca mais teria de volta. Estavam juntos, dando conforto a Granger, contando piadas e se divertindo... Eles eram uma família.


- Malfoy?


A voz de Ronald Weasley o tirou de seu choque. Todos os ruivos, incluindo a dos cabelos prateados, Longbottom e loira descabelada, viraram-se para ele em um misto de surpresa e raiva.


Draco abriu e fechou a boca, tentando encontrar uma saída para aquela situação embaraçosa e extremamente irritante, mas nada lhe veio na cabeça. De repente a única coisa que queria era estar bem longe dali.


- Malfoy, o que você está fazendo aqui? – foi Granger a primeira a ter coragem de cortar o silêncio.


Outra vez fez o movimento de peixe burro. A mulher de cabelos prateados que era segurada pelo ruivo baterista perguntou algo no ouvido dele.


- É uma longa história – respondeu o outro.


- Ah... Eu ivaminei – entendeu, sua voz com um forte sotaque francês.


- Malfoy, você quer alguma coisa ou só veio abrir e fechar a boca? – perguntou Weasley “Sombra do Potter”, irritado.


Algo que jamais acontecera em sua vida inteira, aconteceu. Draco Malfoy ficou com as bochechas vermelhas, afetado de verdade pelo insulto. Extremamente frustrado canalizou sua irritação e raiva em uma única frase:


- Será que vocês podem calar a boca, infelizes?! Estamos em um hospital e não naquele chiqueiro que vocês chamam de casa! – gritou, sem saber de onde conjurou a coragem para ofender um quarto lotado de ruivos sem sua varinha ou apoio.


Os gêmeos ameaçaram se levantar da cadeira, assim como o namorado idiota de Granger, mas a sangue-ruim e a mãe gorda os impediram. Surpreendentemente foi Longbottom quem interviu.


- Você está sozinho, Malfoy. Se não quer encrenca é melhor dar a volta e ir embora – avisou, sua voz com um tom de imposição que jamais ouvira saindo da boca de Longbottom.


As palavras do perdedor eram tão verdadeiras que foi como quase sentir fisicamente um tapa. Odiando-se por não ter um insulto pronto ou ânimo para enfrentá-los, Draco simplesmente fez o que Longbottom sugeriu.


Não viu, então, quando a loira de cabelos mal-cuidados abaixou o rosto por um momento antes de sair correndo o quarto e o seguir, ignorando as perguntas de Longbottom e Weasel das orelhas grandes.


Voltou para seu quarto e o contraste era inegável. Estava vazio de pessoas e vida. Um lugar branco e impessoal. Nem um mísero cartão de melhoras ou flores murchas... Aproximou-se da única janela e fixou olhar ao nada, irritado e xingando o mundo silenciosamente.


- Malfoy?


Virou-se, achando que seria outra enfermeira querendo enfiar calmantes sua goela abaixo.


- Eu não quero outra poção idiota, sua mulher infer...


Estava errado... Na sua frente estava a loira descabelada do quarto ao lado.


- O que você quer? Veio me irritar? Jogar na minha cara que não sou ruivo e pobre? – gritou, esperando que ela fosse embora assustada, infelizmente ao invés a garota fechou a porta do quarto.


- Não. Eu vim ver você.


Draco soltou uma risada amarga, duvidando das palavras daquela louca. Quando ela não se mostrou afetada, por isso, a encarou, desconfiado.


- Equem é você?


A loira abriu um sorriso, o que a deixou parecendo mais louca ainda. Seus olhos eram estranhos e vagos... Draco não gostava deles.


- Tecnicamente eu sou Luna Lovegood.


- Lovegood? Você é aquela louca de Hogwarts? Di-Lua?


- Não.


- É sim. A menina idiota que se vestia como uma pirada.


- Ela não é idiota... Mas sim é a Luna. Só que eu não sou ela.


Draco estava começando a acreditar que a garota era definitivamente um caso sério e pretendia chamar um medi-bruxo em breve...


- Eu salvei a sua vida.


- Está louca? Eu nunca falei com você...


- Draco, eu salvei sua vida. Trouxe você para cá.


Arregalou os olhos, finalmente entendendo o que ela queria dizer.


- Weasel? Desde quando você é loira?


- Desde que eu tomei uma poção polissuco! Você é lento, hein, Malfoy? – provocou com um sorriso. – Esqueceu que eu sou procurada?


- Então Longbottom...


- Era o Harry.


- Pena, achei que Potter tinha morrido finalmente.


- Aposto que ele está pensando a mesma coisa sobre você.


Um silêncio desconfortável caiu sobre os dois, nenhum deles sabendo o que falar em seguida. Durante a pausa Weasel/Lovegood passou seus olhos vidrados pelo quarto e Draco imediatamente ficou incomodado, sabendo que perceberia o quanto estava vazio de cartões, presentes e balões estúpidos. Jamais havia se sentindo tão abaixo de Weasel antes e a sensação o deixou nauseado. Era humilhante.


Por alguma razão Weasley decidiu não comentar, mudando de assunto totalmente.


- Seu braço?


- Que você acha? Está queimado...


- Vai melhorar?


Draco deu os ombros, evitando os olhos agora não mais castanhos e extremamente inquisitivos dela.


- O que você quer, Weasel?


- Desde que saímos da mansão... Muita coisa aconteceu. Harry, Rony e Hermione estavam fracos demais para aparatar e tivemos que chamar ajuda... Um medi-bruxo daqui faz parte da Ordem e por sorte estava de plantão. Enquanto ele fazia o que podia pelos três eu voltei para a sua casa e encontrei você no meio dos escombros. Estava todo...


- Queimado? Em mil pedacinhos? Essa historinha tem algum objetivo?


- Você estava péssimo mas vivo. Assim que pude o trouxe para St. Mungos, depois tudo ficou complicado e não consegui vir aqui e... E ver como você estava. Harry teve o braço curado e os cortes mas não podia ficar em recuperação porque era capaz de o Ministério vir atrás dele... Tivemos que fazer um plano às pressas... Hermione estava em coma e só acordou há dois dias... Enquanto isso Neville e Luna se ofereceram para ajudar... E aqui estou: loira.


- De novo, qual o objetivo dessa história?


Era complicado entender o rosto novo de Weasel, as expressões familiares distorcidas naquele rosto cumprido, de nariz longo e sem sardas. Não sabia dizer se agora ela estava sentida ou irritada com ele.


- A sorte foi que conseguimos sair de lá antes que o Ministério aparecesse... Não sei se você sabe mas sua mansão sobreviveu bem, considerando tudo. O incêndio no que restou do salão de música, onde você estava, morreu sozinho... E o restante foi apagado pelos bruxos do Ministério. O corpo de Bellatrix, infelizmente, não foi encontrado... Mas é impossível ela estar viva...


- Improvável, não impossível.


- Talvez.


Outra pausa se estendeu, dessa vez sustentada por Weasel, que parecia tentar se decidir se devia ou não seguir com a conversa... Ou estava tentando encontrar alguma mosca gigante invisível no teto, era difícil dizer com aqueles grandes olhos azuis bizarros.


- O que foi aquilo que você jogou no caldeirão?


- Algo que minha tia gostava muito – respondeu simplesmente, não querendo elaborar mais.


- Isso eu percebi, não sou cega... Mas o que era? O que fazia? Algo com magia das trevas?


Deixou escapar um suspiro irritado, ela não deixaria a pergunta passar, não é?


- Era um medalhão com uma foto dentro e as letras “R.A.B”. A foto do casamento dela com Rodolphus...


- Foto de casamento? – repetiu, perdida.


- Isso. “Rodolphus Ama Bellatrix” – informou amargamente. – Era só isso. Uma recordação. Ela provavelmente morreu por um pedaço de ouro sem valor.


- Eu nunca pensaria que era algo assim...


- Deixe-me adivinhar... Os seus inimigos são incapazes de sentir, não é? Como um Comensal pode amar? – seu tom era amargo e perigoso.


- Algo assim, é.


- Você está errada.


- Às vezes espero que sim.


Havia algo escondido naquela frase mas nenhum dos dois teve coragem de descobrir o que era. Depois de outra longa pausa, Weasley continuou sua historinha, chegando finalmente ao ponto que desejava:


- O que realmente aconteceu naquele dia ninguém tem idéia. E o Ministério nem suspeita que a Ordem esteve envolvida... Até agora.


- O que você quer dizer com isso?


- Você acordou. Eles vão descobrir isso em breve... E quando descobrirem...


- Eu sabia... Você veio aqui para ter certeza que eu não vou contar a verdade, não é? Veio só para salvar a própria pele e a do seu queridinho Potter.


- Não. Eu...


- Pode ficar tranqüila, Weasel... Não tenho interesse em contar nada para aqueles idiotas, não tenho nada a ganhar com isso. Contente, agora?


Weasley não respondeu ou se mexeu. A falta de reação apenas serviu para irritá-lo mais.


- Por que ainda está aqui? Quer que eu assine algum papel para ter certeza que estou dizendo a verdade?!


- Agora escute aqui, Malfoy, e cale a boca uma vez! Eu não sou você. Não sou interesseira. Vim aqui para ver você... Acha que eu não percebi a sua cara lá no quarto da Hermione?


- Que cara?!


- Você estava triste. Estava no seu rosto.


- Triste?! Por que eu estaria triste? Estou vivo!


- E isso basta?


- Que te interessa?


- Você tem alguma bondade lá, bem lá no fundo, eu tenho certeza. Mesmo que não queria admitir... Além do mais, salvou minha vida...


- Eu NÃO salvei sua vida! – rugiu imediatamente, como se a mera idéia de tal coisa fosse um insulto terrível.


- Não? Então o que foi aquilo? Por que jogou o medalhão de Bellatrix, praticamente se sacrificando para salvar nós?


- Para provar que você estava errada! – gritou, pulmões ardendo.


- O quê?


- Eu não sou um covarde, Weasel. Você me chamou de um e mostrei para que não era.


- Quer dizer que você não se importou em morrer desde que me provasse errada? – sorriu. – Está dizendo que fez aquilo para se provar para uma pessoa que você supostamente odeia e não deveria se importar com o que pensa?


- É... É isso que estou dizendo – confirmou fracamente, não sabendo se isso era bom ou ruim. Weasel riu, divertindo-se. – Qual a graça?


- Você. Acho que é uma das criaturas mais orgulhosos que conheço. Qual o problema de admitir que quis me salvar só porque...


- Por que o quê? Por que eu ia querer te salvar?


- Não sei... Mas acho que quem deveria estar se perguntando isso é você.


- O que você quer, Weasel? Por que não me deixa em paz? Por que não me deixa...


- Sozinho? – completou, sua voz ficando mais alta. - É isso que você quer? Ficar sozinho para o resto da sua vida infeliz?


- Não estou sozinho!


- Olha à sua volta, Malfoy! Quem veio te visitar? Alguém mandou algum cartão? Qualquer coisa?


- Ninguém sabe que eu estou aqui! Não deixei que o medi-bruxo contasse...


- Mas alguém veio procurar por você? Alguém se preocupou em saber se está vivo ou morto? Eu não vejo Pansy esperneando na porta do hospital para descobrir se está aqui ou não...


A verdade em suas palavras fez com que começasse a ficar cada vez mais desesperado em provocá-la, mandá-la embora, expulsá-la dali... Qualquer coisa.


- Eu não me importo. Não preciso de Pansy ou de ninguém.


- Por que é tão difícil pra você falar a verdade? – gritou a ruiva.


- O que você quer que eu fale? Desde que você apareceu em Azkaban parece que inventou uma ilusão doida sobre mim... Você acha que me conhece, aposto quer provar alguma teoria idiota sobre redenção ou qualquer bobagem do tipo... Mas está errada, Weasel. Eu sou Draco Malfoy, filho de Lúcio Malfoy e Narcissa Malfoy, herdeiro dos Black e Malfoy... E um Comensal. E é isso.


- Não é. Você não é igual aos outros... Queria se libertar de Voldemort. Eu vi.


- Viu? Como...


- Sua penseira em Azkaban.


A resposta o atingiu como um raio, raiva crescendo cada vez mais dentro de si.


- Como você ousou fazer isso? Com que direito você acha pode invadir a mente dos outros?! – gritou, avançando em sua direção.


Weasel deu dois passos para trás mas não pegou sua varinha ou tentou sair do quarto.


- Estava procurando algo que me ajudasse com Bellatrix. Vi as penseiras de todos os Comensais... Mas a sua era diferente... Se é só um Comensal, se não sente nada por ninguém a não ser por si mesmo, então o que foi aquilo?


- Aquilo foi medo! – gritou, sem pensar no que dizia.


Weasley o encarou, confusa. De repente Draco sentiu uma enorme vontade de simples gritar tudo que passara, todos os seus problemas e arrependimentos...


- Aí está a sua resposta, Weasel! Eu estava com medo. Não queria morrer, não queria mais... Fazer o que ele me mandava. Não queria minha família destruída e morta. Eu pedi e pedi para o meu pai... Pedi... Mas ele não quis fugir... Não quis deixar Voldemort – sua voz começou a falhar. – Não foi por ideais heróicos, não foi por remorso... Foi medo. Contente?


Ela não respondeu mas Draco não precisava de uma resposta, já sabia o que Weasel pensava dele agora. Uma vez covarde, sempre covarde.


- Eu era um... Idiota. Achei que podia provar para todos que era capaz... Recuperar o orgulho da família depois... Depois que meu pai foi preso, mas não tive coragem para seguir adiante. E paguei por isso. Mas não importa mais, não é? Acabou e perdi minha família de qualquer jeito. Espero que esteja satisfeita, Weasel.


Não querendo mais mostrar fraqueza, virou para a janela. A memória de seu pai mais clara do que nunca, mascarado e distante, olhando seu sofrimento sem se mover. As risadas de Voldemort, as ameaças... O ódio, fracasso e medo voltando à tona. Draco conseguia esconder suas emoções, sempre conseguiu... Por isso que era tão bom em Oclumência. Mas naquele momento não queria esconder mais nada.


Mesmo agora a dor de saber que seu pai não era o herói que sempre pensou que fosse estava clara e presente. Fechou os olhos, segurando qualquer tentativa de lágrimas correrem.


Fazia anos que não falava com ninguém sobre aquilo... Sobre qualquer coisa que importasse. Na verdade nunca havia dito aquilo a ninguém. Mesmo sendo humilhante se expor assim para Weasel... Sentia como se um peso tivesse sido tirado de suas costas.


Uma mão tocou seu ombro direito, dando-lhe um susto, muito mais acostumado com estuporações, empurrões e brigas do que com um gesto de conforto.


- Sinto muito. Se você quiser...


- Eu não preciso da sua pena, Weasel – sibilou, o orgulho ferido mais presente do que nunca.


- Ótimo, porque não estou oferecendo pena. Estou te oferecendo minha amizade.


Draco se virou, olhando para a loira mas enxergando os olhos castanhos e os cabelos ruivos como se a poção polissuco misteriosamente tivesse perdido o efeito. Ela retornou o olhar intensamente.


Era um desafio. Quem desviaria o olhar primeiro? Ao contrário daquela vez tão distante no Egito, foi a vez de ele perder. Virou o corpo de volta para a janela, dando às costas para Weasley.


- Eu preciso ir – anunciou de repente. Ela abriu a porta do quarto mas antes continuou. - Se você não se importar, Malfoy... Eu vou voltar para te visitar outro dia.


Antes mesmo de ouvir a resposta tinha saído, deixando Draco para trás e extremamente confuso.


N/A: There... Draco e Gina finalmente tem uma conversa aberta e sincera. Mais ou menos... Risos.


Fan art da fanfic (Delete os espaços e copie e cole):


Cena do Draco observando os Weasleys, Hermione, “Luna” e “Neville”:


http://img.Photobucket.com/albums/v57/Scila/fhcap17color2.jpg

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