Areia, sol e um herdeiro sem h

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Falsos Heróis


Capítulo 1 – Areia, sol e um herdeiro sem herança


- Venha cá, Draco.

A voz áspera de sua mãe não poderia ser ignorada. Ele parou de alimentar a coruja gigante e cor de chocolate e foi até onde ela o esperava, na porta do corujal.

- Que foi, mãe? – ele reclamou, nunca gostava de ser interrompido. Fazia o que queria.

- Onze anos. Você sabe o que isso quer dizer.

- Vou ter ir para a escola – de novo, sua voz era irritada. Ir para escola queria dizer sair de sua casa, parar de fazer o que queria, significava menos tempo para se divertir.

Amanhã era o seu aniversário, e ele ia receber as cartas.

- Seu pai quer que você vá para Durmstrang.

Draco não respondeu. Ele sabia disso. Seu pai contou tudo sobre a escola, e ele estava menos irritado de ir para lá. Aprenderia arte das trevas e estava ansioso para começar a testar nos elfos domésticos.

- Você não vai para lá. Vai para Hogwarts.

- Como eu vou aprender feitiços poderosos lá, mãe? Eles não ensinam...

- Não. Mas não importa. Você vai estar mais perto de casa. E magias que realmente importam vão ser aprendidas depois. Não pense nisso agora.

- Mas lá tem sangue-ruins, mãe...

- Não reclame. Hogwarts vai ser importante, Draco. Pessoas importantes estarão lá.

- Meu pai disse isso?

Sua mãe olhou para ele, irritada com a insistência dele de ter a aprovação constante do pai.

- Independência, Draco. Já falamos sobre isso. Seja independente, ou então não será nada. Aprenda a se adaptar a outras circunstâncias. Outros tempos. Quando convém, faça isso, quando não, faça aquilo. Seu pai é um obstáculo.

- Não é!

- Ele nunca vai estar contente com você, Draco. E você vai acabar em problemas se continuar a depender dele assim.

- Você é um obstáculo! Não ele! E eu não quero ir para a estúpida Hogwarts idiota!

Draco saiu correndo do corujal para o jardim da casa. Não foi para muito longe, tropeçando no caminho e ralando seu joelho.

Ele colocou a mão no ferimento, reclamando de dor.

Sua mãe veio até ele, uma expressão rara de carinho no rosto.

- Prometo que você vai gostar de Hogwarts, querido. Seu pai e eu estudamos lá, e você continuará a tradição dos Malfoy indo para a Sonserina e conquistando a liderança lá. Sangue-ruins sofreram em suas mãos. Além disso, mandarei os elfos fazerem seus doces prediletos e vou manda-los por Pegasus todos os dias para você saboreá-los no café da manhã e se lembrar de casa.

Draco olhou para mãe, ela sorria. Era tão raro que ele retribuiu, se sentindo melhor. Ela ofereceu sua mão para ele levantar.

Os dois foram em direção à mansão Malfoy de mãos dadas.

- Desculpa, mãe.

- Independência, Draco. Não se esqueça disso.

Mas ele se esqueceu. Não prevendo que haveria uma guerra em breve.

Cairo - Nove anos e cinco meses depois


O calor foi a primeira coisa. A segunda foi mais calor ainda. A terceira coisa foi a bebida.

Calor, mais calor e bebida, as causas de sua terrível dor de cabeça quando acordou.

Maldito deserto. Maldito calor, maldita areia que entrava em tudo. Maldito Potter. Maldita guerra estúpida.

Sua cabeça estava explodindo, os efeitos do álcool e os xingamentos se misturando incoerentemente.

Ele abriu seus olhos devagar, lutando contra a luz que invadia seu quarto sem convite.

Para a sua grande infelicidade ele não estava na sua cama de algodão que era mais espaçosa que um pequeno quarto. Não estava perante as paredes familiares entalhadas de estilo vitoriano, nem das cortinas ricas acinzentadas que cobriam as janelas altas impedindo toda manhã que o sol ousasse entrar sem pedir licença e retira-lo de seu sono.

Nada disso.

Ele estava dormindo em uma cama mal cheirosa, fedendo a suor. O local onde esse...pedaço de lixo em que ele se encontrava era mais repugnante ainda. Um hotelzinho de quinta na parte mais quente e...pobre da Cairo mágica.

Sim. Pobre.

Ódio transbordou como o Nilo na época de enchentes. Pobre. A palavra era odiosa, nojenta...E dominava seus pensamentos todos os dias, do nascer até o por do sol.

O ódio era enorme, incontrolável. E completamente e totalmente inútil.

Nem vingança era cogitada mais.

Sua vida agora se resumia em: se esconder e evitar ser pego.

Droga, ele era Draco Malfoy e não um rato de esgoto! Herdeiro da família mais pura e influente da droga do mundo mágico! Exceto que não havia nada para herdar.

Dinheiro? O maldito governo pegou tudo. Influência? Tudo foi pro esgoto graças ao imbecil do Potter, que venceu a maldita guerra.

A sua vida perfeita, rica e limpa tinha sido roubada porque seu pai foi incompetente o bastante para se aliar ao lado que perdeu.

Voldemort...O nome era odiando tanto quanto o nome do estúpido Potter.

A causa era boa. O motivo muito interessante, a possível recompensa; tentadora. O resultado, um desastre total.

E tudo por causa da profecia ridícula feita pela ridícula e incapaz da imbecil da Trelawney. E porque Voldemort foi estúpido demais e não considerou talvez que ele deveria matar Potter e não o contrário!

Potter venceu. Sobreviveu mais uma maldita vez.

Agora Draco precisava fugir dele e de seu grupinho infeliz. Ordem da Fênix! Que nome ridículo.

Eles deveriam se chamar abóboras sem cérebros andantes, isso sim combinava!

A dor de cabeça o impediu de continuar pensando em sua desgraça. Ele se levantou, em uma inútil tentativa de diminuir a enxaqueca, passando a mão na testa e secando o suor que dominava seu rosto.

O sol, como sempre naquele país nojento, estava quente demais. Tudo estava quente demais, até o ar.

Era difícil respirar o oxigênio abafado.

Draco odiava calor. Calor era coisa de pobre. A nobreza era fria, sangue azul, branca. Calor significava suor, podridão e mau cheiro, nada nobre.

O fato era que ele fedia e suava como um porco pronto para ser morto. Nada nobre também, e isso o irritava.

Estava usando as mesmas malditas roupas há três dias. Roubara de um marinheiro bêbado no navio que o trouxera para a África.

Navio. Não-mágico.

O quão baixo ele chegara para conseguir sobreviver.

No entanto não podia não deixar de se orgulhar de seu plano. Nunca que Potter e seus aurores inúteis iriam pensar na possibilidade de Draco Malfoy pegar um transporte sangue-ruim.

Isso garantiria pelo menos uma semana de vantagem para ele.

Agora tudo era assim.

Sempre a um passo na frente deles. Sempre olhando para por cima das costas temendo que eles o encontrariam, a paranóia tomando conta. Sombras, olhares suspeitos...Tudo era motivo de preocupação.

Não que ele tivesse medo deles. Não, ele nunca admitiria isso para si mesmo.

Ele não queria era dar o gostinho da vitória para Potter e seus amiguinhos.

Podiam tirar seu dinheiro, sua mansão, sua mãe, seu pai, sua vida até a última foto amassada, mas não iam destruir seu orgulho, malditos!

Seu estomago roncou, revelando mais um problema de ser...Não ter dinheiro e ser um fugitivo.

A falta de comida. E a fome por conseqüência.

Xingando ainda mais sua situação ele saiu do quarto e desceu duas levas de escadas. Chegando no “lobby” (mais para sala-pequena-fedida-que-ele-chamava-de-lobby-por-falta-de-xigamento-forte-o-bastante) do hotelzinho “Camelo Vesgo”, ele nem ousou olhar para o “recepcionista” (usar tal palavra era um absurdo, estava mais para “árabe gordo e fedido que passava a mão debaixo do braço repetitivamente e depois colocava a mesma mão nas chaves dos quartos e no nariz“), indo direto para a saída daquele inferninho.

Além de não estar a fim de papo furado, Draco também preferia evitar pessoas. Elas têm a tendência irritante de ter olhos. E isso significava que provavelmente seriam testemunhas ou rastros até ele.

Quanto menos olhos o vendo, melhor seria.

Atravessou a rua da “Passarela Ondulada” (imitação barata do Beco Diagonal) e foi para o “O Tapete Voador Rasgado”, o bar bruxo mais próximo. Esbarrou em uma mulher na entrada e passou pela porta do lugar mais mal humorado ainda.

Sentou-se na mesa mais distante possível de outros seres.

Notou que se tratava da mesma da noite anterior quando tomara dezoito (ou mais, tinha parado de contar, bêbado demais para cálculos) “Batidas Ali Babá”.

Ele nunca foi de beber nada além de garrafas de vinho bruxo da França e de anos bons. Qualquer coisa mais plebéia que isso incomodava seu paladar.

Mas...Aquela fora uma ocasião excepcional.

Contra o seu gosto, começou a lembrar de coisas. E lembrar de coisas era algo ruim.

Azkaban. Seu pai.

Não valia a pena pensar naquilo.

Fazia ele querer esquecer e para isso tinha que se rebaixar e tomar bebidas de segunda. Que davam dor de cabeça no outro dia e o faziam se desconcentrar da tarefa de permanecer incógnito.

Por que ele tinha a estranha sensação que na noite anterior alguma coisa aconteceu que não devia.

- Meu macaquinho inglês!!

Oh sim. Alguma coisa bem errada acontecera durante sua embriaguez.

Uma boca nojenta e suada chegou perto de sua bochecha e o traumatizou. Draco tinha sido beijado por uma mulher que parecia ter acabado de sair do sarcófago mais próximo. Seu rosto era chupado de tão magro, suas rugas era mais horríveis ainda devido à exposição constante ao sol. Seu nariz era defeituoso ao extremo e sua boca era suada e tinha perebas nos lábios.

Era o pior pesadelo de Draco. Era Jasmine Quishabe, a dona daquele bar sujo.

- Meu macaquinho inglês! Senti sua falta!!

- Eu não. Sai daqui, sua nojenta.

Era inútil. Os insultos batiam e voltavam, sendo ignorados completamente. Ela o abraçou e o cheiro de álcool e perfume barato invadiu as narinas delicadas de Draco.

Irritado ele a empurrou fortemente para trás.

Tinha se esquecido completamente da horripilante mulher. Devia ter passado bem longe do maldito bar.

Agora os eventos voltavam a sua mente. Porcaria de memória fraca.

Não lembrava exatamente do que tinha acontecido na noite anterior, mas sabia que envolvia a feiúra.

- Escuta aqui, Quishabe. Seja lá o que for que está passando na sua mente vazia, esqueça. Eu sou bonito, você é horripilante. E suada. E cheira mal. Eu estava bêbado e meus sentidos mortos. Pessoas feias não servem para bonitas.

- Ah, fofo! Você só fala isso agora! Ontem eu era a mais linda das mulheres! Ta falando isso porque sabe que eu gosto que me tratem mal, não é meu macaquinho?

O estomago resolveu relembrar da miséria dele. Draco sabia, para o próprio desgosto, que os três sicles no seu bolso não pagavam nem uma migalha de pão amassado pelo diabo.

Era nojento e potencialmente traumático, mas precisava ser feito. Sobreviver hoje, lamentar amanhã.

- Se você me trazer uma refeição decente, eu posso...Até considerar a sua presença.

A múmia em sua frente riu. Apertando as maças do rosto de Draco, suas unhas sujas fincando em sua pele pálida. Era repulsivo, mas droga, ele estava com fome.

- Já está saindo, um café da manhã completo para o meu queridinho!

Ela o soltou, indo até a cozinha velha e imunda cantando alguma música de qualidade extremamente duvidosa em sua voz aguda e desafinada.

Draco considerou a possibilidade de correr para longe e nunca mais voltar para perto daquela mulher. Mas quais a chances de conseguir uma refeição de graça em outro lugar?

Xingando os céus, Merlin e Potter, ele fez a única coisa que podia: continuou no mesmo lugar, a fome suficientemente dolorosa para superar o orgulho.


Se dias atrás alguém chegasse e falasse para Gina: “Quer ir para um lugar quente e exótico?” Ela gritaria bem no ouvido da pessoa: NÃO.

Tinha caído nessa já. E não ia se repetir nunca mais.

Agora só iria aceitar missões em lugares quentes desde que: primeiro; houvesse praia. Segundo; hotel decente e bebida gelada...Serviço de quarto e massagem incluídos.

O lugar em que estava era tudo, menos isso.

Quente, apertado e lotado de gente.

Draco Malfoy não seria tão burro assim de se esconder ali. Seria fácil demais.

Se bem que considerado tudo, talvez ele fosse burro assim. Com certeza explicaria a escolha por um lugar como aquele.

Em sua curta carreira como auror Gina havia aprendido a nunca subestimar o inimigo. Ele sempre tinha uma carta na manga...Ou melhor, uma varinha.

Mas era difícil não achar que seu alvo atual, Draco Malfoy, não passava de um filhinho de papai que perdera o papai no caminho. Não havia o que subestimar nele.

A única coisa que podia se dizer dele era que: vaso ruim não quebra. Não se você não usasse um feitiço bem forte.

O rastro de Malfoy terminava ali, na Passarela Ondulada. E ela já estava há dias tentando achar pistas de onde ele teria se enfiado agora.

Pelo menos ele era previsível. Ao contrário de Nott, o último que ela tinha perseguido. Nott de repente resolveu que se esconder em lugares trouxas não era tão ruim assim, comparado com uma vida inteira em Azkaban. E isso dificultou muito o trabalho dela, lugares trouxas era o que não faltava!

Malfoy não faria isso, nem se sua vida dependesse disso (e dependia).

Estava certo que Gina devia dar mais crédito a ele, afinal de contas conseguiu despistar a Ordem na Grécia. E eles só o encontraram quando um marinheiro contou a sua namorada que suas roupas tinham sido roubas só que ele não se lembrava como. A namorada contou para a tia que contou para a vizinha que falou para o pescador da esquina que resolveu falar desse fato para a dona da loja de animais que por coincidência era uma bruxa capaz de reconhecer os efeitos de um feitiço de memória.

E lá estava Gina agora. Fervendo no sol egípcio. Desde a madrugada fazendo batidas em hotéis de quinta categoria em busca de um loiro convencido pálido.

Sua boca estava tão seca que ela faria qualquer coisa por um copo de água (que não estivesse sujo de barro e com um cheiro suspeito).

Felizmente havia um bar perto dali.

Felizmente, a vida é cheia de coincidências porque quando ela pisou dentro do lugar imundo bateu os olhos direto em um loiro com nariz comprido.

Draco Malfoy.

Hoje era o dia de sorte de Gina.

Claramente, porém, não era o de Draco porque além da feiúra que estava sentada em seu colo, passando a mão em seu cabelo, Draco teria que enfrentar uma Gina irritada com o calor.

“Ha! Que me diz agora, Harry? Eu disse que eu ia achar ele.”

Abrindo um sorriso satisfeito e com sua varinha na mão ela marchou até próximo residente da prisão de Azkaban.


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