Godric's Hollow, inverno de 18

Godric's Hollow, inverno de 18



A casa adiante era formosa em todos os sentidos. Kassandra abriu o portão pintado de branco lentamente, mas mesmo assim ele rangeu irritado. Alguém espiou por entre as cortinas e a porta da frente foi entreaberta. Uma última olhada para o céu e Kassandra se imaginou em uma pintura tamanha era a beleza do sol se pondo.
Olhares se cruzaram. Tiago e Lily permaneciam de pé; o filho pequeno aconchegado nos braços da mãe, e logo atrás dele havia outro homem, vestido de negro.
— Não - murmurou Kassandra e tornou a fitar os Potter, desconfiada e com receio.
— Está tudo bem, Kassie - acalmou Lily, venha conhecê-lo.
— Conhe... conhecê-lo? - surpreendeu-se ela. Já conhecia Severo Snape havia anos. E caminhando com pressa e temor, parou ao lado de Lily, que tocou levemente no ombro do homem de costas. Quando ele virou, o suspiro de alívio que saiu da boca de Kassandra foi sonoro.
— Este é Harry - apresentou Lily. Kassandra riu alto.
— É um prazer conhecê-lo e é um prazer maior saber que você está vivo.
— Ele ainda não apareceu por aqui - Harry falou logo depois de apertar a mão de Kassandra.
— Talvez tenha descoberto o plano, eu não faço idéia do quanto Snape leu em minha cabeça...
De repente, estalidos seguidos começaram a rasgar o ar lá fora e Tiago correu para a janela.
— Estão aqui, falou sorridente. Todos eles! - e gargalhou.
— Mudança de planos Kassandra - disse Harry colocando a mão sobre o ombro dela. - Volte à América e espere-nos.
— Voltar? - ela parecia preocupada.
— Sim. Voltar - ele foi específico e depois deu as costas a todos, tornando a ficar na mesma posição pensativa.
Lily baixou os olhos, tomou a mão de Kassandra e acompanhou-a até a saída, por onde agora começavam a entrar aurores e aliados de todos os cantos da Inglaterra.
— Ele sabe o que está fazendo, Kassie, confie nele.
— Eu não me importo em morrer - confessou Kassandra -, mas não posso deixar que machuquem os McCoy. E como vou defendê-los sem minha varinha? Snape está com ela!
— Isso não é problema - Harry falou de longe e caminhando até Kassandra, continuou: - Você vai ficar muito bem com esta daqui.
Kassandra arregalou os olhos e não pôde acreditar, era sua varinha.
— Onde está Snape? - foi a primeira pergunta que lhe saiu da boca, sem qualquer resguardo.
— Ele está no porão. Mas não é hora de lembrar os velhos tempos. Voldemort ainda não apareceu, já lhe disse. Volte para...
— Eu quero vê-lo.
— Não - Harry ordenou. - Volte para seu posto...
— Escute aqui, menino - rosnou Kassandra erguendo o dedo em riste. - Eu não sou uma idiota qualquer. Se não fosse por mim, você nem estaria aqui! Agora saia da minha frente e me deixe falar com o maldito.
Harry estendeu a mão, em ironia, mostrando a ela o caminho e a observou encontrar a porta que levava ao andar inferior. Ela desceu lentamente a escadaria mal iluminada e pôde ver pés e pernas na penumbra do aposento, bem no canto, ao lado de uma goteira. Aproximou-se, acocorou e sentiu pena, ali estava Snape, preso pelos pulsos, como uma caça prestes a ser abatida. Acariciou-lhe o rosto machucado e ele se mexeu, apertando-se contra a parede.
— Não se assuste.
E pela primeira vez, Snape ficou feliz ao ouvir a voz de Kassandra.
— Solte-me.
— Não posso, não por hora. Espere até tudo estar terminado...
— Não, Kassandra. Não!
— Não seja turrão. Aceite o destino.
— Se você me deixar aqui, o garoto irá me matar... Ou pior, irá me entregar ao Ministério.
Era bem verdade o que ele dizia, mas não poderia libertá-lo, porque se ele escapasse, correria à barra da saia de seu mestre, juntando-se a ele novamente.
Acariciando mais uma vez o rosto dele, desta, afastando uma mecha de cabelos que caíam sobre os olhos cansados e tristes de Snape, ela disse:
— Lily está salva, não vê? Então deixe que o mundo explodir! Que o Lorde seja aniquilado...
— É fácil para você, falar dessa forma. O que será de mim no mundo bruxo senão um ex-comensal? Não há redenção para isso, você sabe.
— As pessoas esquecem e perdoam, Severo.
Ele fechou os olhos, virando o rosto para o outro lado, desviando da carícia dela.
— Você prefere morrer a não poder ficar ao lado dela, não é mesmo? - murmurou Kassandra.
Os olhos de Snape grudaram nos olhos de Kassandra.
— Eu entendo você muito bem. - Ela ficou de pé, passou as mãos pelo vestido, como que o desamassando e lhe deu as costas. - Mas prefiro vê-lo preso a morto. - E deixou Snape com seus pensamentos.
Kassandra voltou à sala de estar e se aproximou de Harry, olhando em volta, já havia muitas pessoas para tão pouco espaço.
— Você cresceu com seus pais, Harry, foi amado...
Ele a encarou com uma das sobrancelhas erguidas.
— Não deixe que matem Snape, é só o que eu lhe peço. Ele pode ser preso, Harry, mandado a qualquer lugar, mas não o mate.
— Sabe que está me pedindo demais.
— Sei - murmurou baixando os olhos para as mãos trêmulas. - Mas lhe peço de coração, porque eu o amo.
Harry entendia muito da palavra amor, por isso sorriu, ergueu o queixo de Kassandra e disse:
— Eu não cresci com os meus pais. Eu cresci com você, até Snape tirá-la de mim.
Não poderia haver confissão ou surpresa mais horrenda: até Snape tirá-la de mim...
— E é por isso que não posso deixá-lo viver...
Kassandra parecia não ter compreendido o que ele dissera. Na verdade, ela nem conseguia se esforçar para pensar, as palavras “cresci com você” não se encaixavam.
— Vá à América - ele disse apertando o ombro dela. - E me espere.

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