A Carta de Despedida



- Harry! Anda cara, vamos acabar nos atrasando! – chamou Rony, despertando o amigo que aparentemente sonhava acordado.
Ainda estava sentado na cama do dormitório da Grifinória, as vestes a rigor, devidamente alinhadas pela Srª Weasley, penduradas num cabide mágico, que flutuava displicente pelo quarto.
O rapaz segurava um grosso maço de pergaminhos bastante amassado e com marcas de dedos por todos os lados. Sabia de cor o conteúdo daqueles papéis, mas pelo menos uma vez por semana ele os pegava e relia.
Recebeu aquela carta há quase um ano. Pouco depois da batalha na Floresta Proibida. E no entanto sentia que isso tinha acontecido há séculos. Aquele último ano foi tranqüilo e ele sorriu quando pensou que não foi parar na ala hospitalar uma única vez.
Agora faltava menos de uma hora para sua formatura. Ele e os amigos conseguiram concluir sua formação em Hogwarts, que reabriu sob a direção da professora Sprout, já que Minerva McGonagall recusou o cargo, preferindo dedicar-se exclusivamente a cuidar da Grifinória, como fez nos últimos 25 anos. A Taça das Casas ficou para Corvinal e o campeonato de Quadribol teve a Sonserina como campeã.
Para Harry tudo o que acontecia no castelo tinha agora uma aura incomum. Não estava habituado a ver os alunos discutindo sobre o futuro, nem mesmo a olhar os sonserinos sem a antipatia de sempre.
Sentia-se estranhamente calmo, sinal dos tempos de paz que ele nunca conheceu. Andou mais uma vez pelo quarto que dividiu durante tanto tempo com Rony, Simas, Dino e Neville. A cama do rapaz assassinado por Voldemort continuava ali, intacta, à espera dos próximos alunos que ocupariam aquele quarto no ano seguinte.
Em cima do malão de Harry estava a varinha nova ao lado do presente que sua madrinha enviou pelo correio coruja. Um belo porta-retrato com a imagem de sua mãe, ainda grávida, ao lado dela.

Harry, Lupin me informou que o que você mais gostaria era ter lembranças de seus pais. Então, aí está, eu divido as minhas com você!

Afetuosamente,
R.A.B.

Quando leu o bilhete, Harry não conseguiu conter um sorriso. O presente era lindo e emocionante, mas foi a assinatura que deu um toque todo especial.
Deixaria Hogwarts em breve e logo ingressaria junto com Hermione no Curso de Aurores. Rony aceitou o convite de Carlinhos e passaria três meses na Romênia, fazendo um estágio. De alguma maneira que Harry não conseguia entender, enfrentar o dragão na Câmara de Gelo sob Durmstrang despertou no amigo um interesse muito maior por essas criaturas. E junto do malão do rapaz, ele podia avistar um enorme livro sobre o assunto, que Hagrid dera de presente de formatura para o ruivo.
Harry havia acabado de se trocar. Só faltava dar o laço que prendia a capa vermelha sobre as vestes. Cada Casa tinha sua capa de formatura, e os alunos da Grifinória usavam uma vermelha, com o leão bordado em dourado nas costas.
- Anda, Harry! Só falta você! – chamou Hermione da porta do quarto.
Ele pegou a varinha e acompanhou a amiga até o Salão Comunal, onde os outros alunos os esperavam. Rony correu, pegou a mão de Hermione e eles foram para a fila.
Harry andou atrás dos amigos, pensando no quanto eles foram feitos um para o outro. Quando a guerra acabou, ainda demoraram uns dois meses para se acertarem. Mas desde então, as brigas acabaram e ficar perto deles era sempre motivo de risos e brincadeiras.
O retrato da Mulher-Gorda girou para frente e a fila de formandos desceu as escadas rumo ao Salão Principal.
As mesas das casas deram lugar a fileiras de cadeiras, identificadas com as cores de cada uma das quatro casas. Sobre a mesa que acomodava os professores, uma grande bandeira, com o brasão da escola, cobria toda a parede e as janelas.
Os alunos se acomodaram nos locais indicados e só então puderam observar o quanto o Salão estava cheio. Parentes e amigos vieram presenciar a primeira formatura em Hogwarts depois de oito anos.
Nos anos anteriores, o final das aulas era invariavelmente marcado por algum acontecimento importante que impedia a realização da cerimônia de entrega de diplomas da Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts.
A diretora Sprout se levantou e todos no salão se calaram. Ela começou a fazer um discurso emocionado, dizendo o quanto aquele dia era importante, pois era o primeiro sinal de que o mundo bruxo estava novamente em paz.
Os olhos de Harry corriam pelo salão reconhecendo os pais de um ou de outro amigo. Numa fileira pouco atrás dos alunos da Grifinória, ele divisou os cabelos extremamente loiros de Lucio Malfoy.
Apesar de tudo, o ex-comensal ainda mantinha o ar arrogante e sua mulher, que estava ao seu lado, tinha a mesma expressão enojada de sempre.
Tem coisas que não mudam. – pensou consigo mesmo.
Continuou a checar quem estava presente na formatura e observou uma senhora muito distinta, de vestido de veludo verde, com uma pele sobre os ombros e uma grande bolsa vermelha.
Augusta Longbottom, avó de Neville, havia comparecido à formatura que seria a de seu único neto. Harry observou o quanto ela parecia diferente a cada vez que a via. Da primeira vez em que a encontrou, ela lhe pareceu tão mandona quanto Hermione. Foi há cerca de três anos, quando o pai de Rony precisou ser hospitalizado e ele, o amigo e Hermione encontraram Neville visitando os pais.
A segunda vez, foi durante o funeral de Neville. O mais triste que Harry já presenciou. A bruxa não lembrava em nada a velha autoritária de antes. Olhava o neto deitado no caixão e acariciava o rosto do rapaz, enquanto uma torrente de lágrimas lhe descia pela face sem maquiagem.
Era óbvio que todos sentiam a morte de Neville, mas a dor de Augusta era incomparável. E ela não conseguiu suportar quando viu que os curandeiros do St. Mungus liberaram os pais do rapaz para irem ao enterro.
Alice se aproximou com passos ainda imprecisos e olhou para o filho, segurou as mãos do rapaz e falou baixinho: bebê! A comoção foi geral, e Augusta Longbottom precisou ser socorrida pelos curandeiros.
Aquela era a terceira vez que Harry a via. Ela parecia muito mais calma, resignada e menos altiva. Ainda era uma bruxa distinta, mas alguma coisa mudou em suas feições tornando-a mais “humana”.
Harry foi despertado de suas lembranças quando Hermione, que estava sentada à sua frente, se levantou. Os diplomas já estavam sendo entregues. Só faltava o discurso da amiga, que foi escolhida como oradora do ano e eles poderiam ir embora.
Quando seu nome foi chamado, dirigiu-se até a frente e pegou seu diploma. Voltou para seu lugar com o pergaminho enrolado formigando entre seus dedos. Logo Rony chegava com seu diploma também.
Apesar das palavras difíceis que mais pareciam com as do Chapéu Seletor, o discurso de Hermione foi breve. Mas Harry não saberia repetir uma única palavra do que ela disse.
Seus pensamentos estavam perdidos novamente, nas linhas da carta que ficou sobre o malão. Só olhou para a amiga quando os aplausos indicaram que o discurso havia chegado ao fim.
A diretora Sprout se levantou novamente. Pegou sua varinha e encerrou a cerimônia lançando um feitiço que fez chover uma espécie de pó brilhante sobre a cabeça dos alunos, que se levantaram animados, comemorando e gritando abraçados uns aos outros.
Harry sentiu-se finalmente feliz. Apesar da expectativa de deixar a escola que foi sua casa durante tanto tempo, ele não conseguia mais gostar de Hogwarts como antes. A escola sem Dumbledore, sem Neville e sem todos os mistérios e problemas que sempre o perseguiram não tinha mais o mesmo encanto.
Quando foi procurar Hermione para abraçar a amiga, avistou Luna Lovegood indo em direção à avó de Neville, com um vaso de uma planta estranha e muito bonita. Ela entregou o vaso para a bruxa, falou algumas coisas e saiu, deixando Augusta verdadeiramente emocionada.
Os agora ex-alunos voltaram para seus quartos a fim de arrumar os últimos detalhes e preparar o malão para partir. Eles voltariam no Expresso de Hogwarts pela última vez e nenhum deles, sem exceção, queria perder a viagem. Haviam combinado uma comemoração no vagão reservado para os alunos do sétimo ano.
Já no trem, Harry se jogou num dos assentos de uma cabine ao lado da namorada e dos amigos. Luna estava com eles e falava animada sobre o trabalho que faria na revista do pai.
Todos comentavam seus planos para o futuro, quando Hermione falou sem paciência:
- Vai me deixar ler essa carta ou não?
A moça se dirigia a Harry que mais uma vez segurava os vários pergaminhos escritos à mão. Ele já havia contado um resumo do que estava escrito lá, mas não deixou que nenhum dos amigos lesse a carta de verdade.
Já fazia um ano, e ele sentia que era hora de seguir em frente. Entregou os papéis na mão de Hermione, rindo junto com os outros quando Rony pediu:
- Pelo menos leia em voz alta, né?
Hermione atendeu ao pedido do namorado e procurando uma posição confortável, deu início à leitura:

Harry,

Temo que meu tempo se esgote antes que eu tenha a chance de me sentar em sua companhia para lhe dar as devidas explicações. Há tanto para dizer...
O que eu mais desejo, ardentemente, que você saiba é que eu sinto muito! Sinto ter mentido para você durante tanto tempo. Sinto não ter tratado você como o adulto que sempre foi, e ter escondido as informações mais importantes acreditando que assim preservaria sua infância e juventude.
Meus devaneios de velho utópico me impediram de ver que você nunca teve infância. Não pelo modo como seus tios lhe trataram, mas pelo pesado fardo que seu nome carregou durante todos esses anos.
Eu deveria ter criado coragem para dizer o que me fazia confiar em Severo. Não sei se ainda há tempo para remediar essa situação, mas Severo é meu sobrinho. Um sobrinho que só conheci depois que ele veio para Hogwarts e que eu tentei proteger, quando Eileen me procurou.
Severo foi uma criança sofrida, Harry. O marido de Eileen era um homem bastante rude e não pensava duas vezes antes de agredir minha irmã. Nunca levantou a mão para o menino, mas descontava em Eileen toda sua frustração com o mundo.
Não admitia que ela não usasse seus poderes para que eles pudessem ganhar dinheiro e aos poucos transformou a vida dos dois num inferno.
Você há de concordar que criança nenhuma que cresça num ambiente assim se tornará um adulto amável.
Não espero despertar em você nenhum carinho por ele. Só um pouco de compaixão, se puder lhe pedir alguma coisa. A compaixão é o único sentimento, além do amor, capaz de dar redenção a uma alma atormentada.
Se eu tivesse mais tempo, teria tentado curar essa ferida na alma de Severo. Ainda me lembro da dor que ele tentou ocultar muito bem quando me informou o que teria que fazer.
Entenda, Harry, o ato de Severo não foi uma traição, como aposto que todos estão pensando. Severo não sabia da missão de Draco quando Narcisa o procurou. Ele conduziu a conversa com ela da melhor maneira possível, e só fez o voto perpétuo acreditando que Tom não daria a um adolescente uma tarefa tão séria.
Quando compreendeu a gravidade do problema, ele veio até a mim, para buscar uma solução para o problema em que havia se metido. Eu ordenei que ele cumprisse com o voto. Foi por minha causa, pelas minhas ordens e pelas minhas suposições que Severo se meteu em tamanho problema.
Eu deveria dar um jeito de protegê-lo. Não pude proteger a ele nem a sua mãe quando eles precisaram de mim. Aquela seria a chance de me redimir com meu sobrinho... com minha irmã.
Cuidei disso pessoalmente, e apenas Hagrid soube do meu segredo. Um homem muito leal, o Hagrid. E foi por isso que deixei Fawkes sob seus cuidados. Ele merecia ter uma criatura realmente fantástica e que o fizesse ter vontade de continuar em Hogwarts.
A princípio ele protestou, mas depois compreendeu as minhas razões e aceitou me ajudar, cuidando de mim quando eu mais precisei.
Ele já conhecia o Jardim dos Mortos, pois sempre andou pela Floresta travando amizades com as criaturas que a maioria dos bruxos menospreza. Mais um dos motivos para que eu considere Hagrid como um grande bruxo, embora ele não tenha o seu diploma.
Acredito cada vez mais que a grandeza de um bruxo se mede pela grandeza do seu coração.
Hagrid me levou até o Jardim, cuidou de preparar um quarto que me servisse de acomodação e foi responsável por preparar meus alimentos, a poção que Severo indicou para tratar minha mão e por organizar tudo que precisei durante esses meses, inclusive depois de você e seus nobres amigos me encontrarem.
Não esquecerei nunca o seu espanto e sua satisfação ao me ver vivo e lúcido quando chegou, pela primeira vez, ao Jardim. Naquela ocasião eu lhe prometi que depois explicaria como tudo aconteceu e é isto que vou fazer.
Há algum tempo, um amigo me procurou no castelo. Chegou na calada da noite, preocupado com um problema que atormentava toda sua família. Nicolau Flamel, o mesmo alquimista que criou a Pedra Filosofal, veio ter comigo, para discutir uma idéia.
Sua família era atormentada todos os dias por dezenas de repórteres que especulavam sobre seu estado de saúde, desde que a notícia da destruição da última pedra vazou.
Orientado por mim, e com o auxílio de Severo, Flamel aceitou preparar a poção do morto-vivo e forjar seu próprio funeral, para que pudesse viver seus últimos anos em paz. Encenou tudo muito bem e toda a comunidade bruxa acreditou.
Flamel viveu seus últimos anos gozando de uma paz que não conhecia e nem o diagnóstico de uma moléstia fatal, que lhe comprometia os órgãos vitais, o fez perder o ânimo.
A única coisa que o atormentava era o fato de se sentir em débito comigo. Procurava-me várias vezes, escrevia-me quase diariamente dizendo que não poderia morrer sem arcar com essa dívida.
Eu lhe respondia dispensando qualquer pagamento, mas depois entendi que lhe privar disso seria ainda mais cruel.
Convidei-o a vir ao castelo e quando ele chegou, eu havia acabado de discutir com Severo a respeito da missão. Afirmei-lhe que se preciso fosse, que ele me matasse, desde que protegesse você quando chegasse a hora.
Cheguei ao meu escritório e Flamel já me esperava. E como todo amigo de longa data, ele compreendeu que algo me atormentava. Não era o medo da morte em si, mas o temor de fazer com que meu próprio sobrinho cometesse um assassinato.
Sim, eu sei tão bem quanto você que Severo não é nem nunca foi santo. Mas esse era um crime que ele não queria cometer. E eu não poderia colocar a vida dele em risco.
Atormentado, contei a Flamel meu dilema e fiquei surpreso quando ele se ofereceu para tomar o meu lugar. Disse-me que só lhe restavam poucos meses e seria muito mais honroso morrer para salvar um amigo, do que se entregar numa cama macia esperando complacente a vida deixar seu corpo.
Discutimos várias horas até que ele me convenceu. E desde então ele passou a tomar poção polissuco periodicamente e testar as pessoas que me conheceram para termos certeza de que o plano não seria descoberto.
Assim, quando você deixou o castelo para buscar o medalhão de Slytherin, era de Nicolau Flamel que você estava acompanhado. Ele fez exatamente como eu indiquei e foi ele quem tomou a poção que cobria o medalhão.
Você me relatou o desespero dele enquanto bebia a poção e eu senti um remorso sem tamanho. Sabe, Harry, Flamel viu seus filhos serem torturados e queimados quando ele e a esposa foram acusados de bruxaria, por um movimento criado por um bando de trouxas, conhecido como Inquisição.
Ele e sua esposa eram recém casados e viviam na França, o berço desse movimento, quando foram acusados por um vizinho. Para que confessassem, os inquisidores começaram a torturar as crianças pequenas, um menino de 4 anos e uma menina de 2.
Imagino a dor que ele reviveu naquela noite. Não foi justo atormentar tanto um homem que instantes depois morreria para salvar a vida de um amigo. Se eu soubesse o que o esperava naquela caverna, teria ido pessoalmente.
Hagrid cuidou de tudo como o combinado. Ele quem recolheu o corpo de Flamel antes que o efeito da poção terminasse e preparou tudo para o funeral. Foi muito bonito e eu só temi que alguém notasse quando Fawkes escapou e foi atrás de mim na Floresta.
Uma ave e tanto, você não acha?
Sei que ainda existem muitas dúvidas atormentando seu espírito! Mas não me atreverei a sanar todas elas, mesmo porque eu não tenho as respostas para tudo. Se as tivesse, provavelmente teria sido capaz de impedir que todas essas coisas horríveis tivessem acontecido.
Neste momento, enquanto escrevo esta carta, imagino como deve estar se saindo na Fortaleza. Anseio para que tudo corra bem, e mando meus pensamentos de sorte e coragem para cada um de seus amigos e aliados.
Você é um rapaz que tem a maior riqueza do mundo, Harry! Tem amigos leais, unidos, capazes e que lhe amam muito. É só a continuidade da sua vida que eu desejo agora, ao lado de quem sempre se preocupou com você.
O destino prega peças engraçadas nas pessoas. Foi ele quem retirou você do convívio com seus pais. Foi ele que colocou você no mesmo vagão que Ronald Weasley, que fez o sapo de Neville Longbottom fugir e que colocou Hermione Granger para ajudar o tímido rapaz a encontrá-lo.
Esse mesmo destino fez de você mais um filho para Molly e Arthur, independente do que você e a Senhorita Weasley sentem um pelo outro. Não fique envergonhado com esse comentário meu. Já lhe disse que a velhice nos torna imprudentes e insensatos. Mas também nos faz enxergar além daquilo que as aparências mostram.
A moléstia que o anel me causou já se alastrou muito, e a cada dia se torna mais difícil contê-la. Não negarei que falta pouco para que eu possa seguir em frente. Continuar a grande mágica do Universo numa dimensão mais iluminada, mais calma e longe das misérias humanas.
Estou feliz de ter vivido a minha vida do modo como escolhi. Vou feliz, por ter pouco do que me arrepender!
Só lamento perder a sua formatura em Hogwarts e, provavelmente, no curso de aurores. Você vai ser um ótimo bruxo, Harry! Você é uma ótima pessoa!
Não pense em fazer nada por mim, está bem? Nenhuma cerimônia de despedida, nada do tipo. Eu já tive o meu funeral, com todas as honras quando “morri” ano passado e isso já me basta.
Já falei com Hagrid e ele vai me deixar aqui, no quarto que preparou para mim. Ah, esse Jardim na primavera! Tem tantas flores lindas, e as estátuas ficam cobertas de flores brancas e perfumadas.
Cuide-se, está bem? Seja feliz! E, por favor, viva para lembrar ao mundo que o mal pode tentar, mas sempre haverá boas pessoas para colocar tudo em ordem!



Hermione terminou a leitura emocionada, assim como todos que prestavam atenção. Olhou para a porta da cabine e viu que muitos outros alunos, inclusive de outras casas, ouviam as últimas palavras de Dumbledore, redigidas com a letra fina e inclinada do ex-diretor.
Harry olhava pela janela do trem, que avançava rumo a Estação de King’s Cross rapidamente. As palavras, lidas em voz alta por uma voz que não era a dele, davam um novo significado a cada frase.
Agora ele também lamentava que Dumbledore não estivesse presente em sua formatura. E lamentou também outros inúmeros acontecimentos que o ex-diretor não presenciou como o nascimento de Louise, filha de Gui e Fleur, seis meses depois da queda de Voldemort, e a nomeação de Arthur Weasley para chefe do Departamento de Relação com os Trouxas, criado para que bruxos e trouxas tivessem uma interação mais amistosa.
O Expresso de Hogwarts finalmente chegou à estação e os ex-alunos desciam do trem estranhando o quanto a estação parecia diferente. Harry e Hermione voltariam com os Weasley para A Toca que foi reconstruída com um pouco mais de luxo, mas que continuava tão bagunçada quanto antes.
Eles só saíram dali quando o curso de aurores, para o qual foram aprovados, começou. Rony partiu uma semana depois para seu estágio na Romênia.
Os quatro amigos não se viam mais com a mesma freqüência. Escreviam-se todas as semanas, mas sentiam que as coisas haviam mudado. Não que a amizade e o amor que existia entre eles estivesse acabando.
Pelo contrário, a cada dia eles se uniam mais e mais, como uma grande e única família. Mas as relações amadureceram e quando se encontravam vez ou outra não era mais com a euforia de jovens estudantes. As conversas sempre giravam em torno das profissões e dos planos cada vez mais adultos para o futuro.
Rony e Hermione ficaram noivos antes de Harry e Gina. O ruivo conseguiu um emprego como adestrador de dragões para o Ministério e prestava serviços para várias entidades como o Gringotes e Azkaban, que substituiu os Dementadores por nove tipos diferentes de dragões que cercavam a propriedade.
Gina foi a capitã do time da Grifinória em seu último ano e saiu de lá direto para o Chudley Cannons. Em pouco tempo ela conquistou um grande destaque na equipe, assumindo o posto de capitã e levando o time de volta à Liga Nacional.
Harry e Hermione se formaram aurores após mais quatro anos de estudo e treinamento intensivo. O curso exigia cada vez mais de ambos e Harry não pôde deixar de notar o quanto tudo em sua vida acontecia com essa pressa urgente, de quem acredita que vai se deparar com uma maldição imperdoável a qualquer momento.
Quando a guerra acabou, ele acreditou que teria dias mais “lentos”. Mas a pressa com que suas horas passavam continuou a mesma. E sua formatura como auror chegou tão rápida que seria impossível imaginar que naquele intervalo tantas coisas aconteceram.
Fleur e Gui tiveram mais um filho. Agora um menino forte e rosado, chamado Arthur em homenagem ao avô paterno. Essa escolha permitiu que Rony e Hermione batizassem o casal de gêmeos com os nomes dos pais da moça: Joshua e Lauren.
Ao contrário do que muita gente pensou, nem Fred, nem George ficaram com Angelina. A bruxa se casou com Lino Jordan e eles se mudaram para a Espanha, onde montaram uma filial das Gemialidades Weasley.
Luna seguiu sua carreira de repórter no Pasquim, mas não agüentou ficar presa numa redação apenas escrevendo e pouco depois foi morar com os avós na fazenda onde criavam pégasus.
Tonks e Lupin se casaram numa cerimônia simples, com a presença dos amigos. Viviam em Londres e agora trabalhavam para o Ministério. Tonks continuava no Departamento de Aurores, e Lupin foi admitido no Departamento de Integração com Meio-Humanos.
Não tiveram filhos, pois Lupin temia que o bebê nascesse com a mesma maldição dele. Por isso, adotaram três crianças, cujos pais morreram na guerra contra Voldemort. Eduard, Charles e Isabelle adoravam ver a “nova mãe” mudar a cor do cabelo enquanto o pai ensinava tudo o que eles precisavam saber para cuidar dos quatro cachorros que tinham em casa. Uma vez por mês eles iam almoçar na Toca, de onde saíam adormecidos depois de passar uma tarde inteira brincando com os filhos de Gui e Fleur.
Lucio e Narcisa foram encontrados pouco tempo depois que a Guerra chegou ao fim, mas não foram presos. A família, incluindo Draco, foi condenada a prestar serviços sociais, auxiliando os pacientes em recuperação no St. Mungus e em dois orfanatos bruxos. Dessa forma, Draco conseguiu voltar para a escola e se formou em Hogwarts junto com os outros.
Quando a pena a qual sua família foi submetida terminou, os Malfoy se mudaram da Inglaterra sem deixar nenhum sinal de onde poderiam estar.
Hagrid abandonou a carreira de professor e se dedicou a cuidar exclusivamente dos animais que habitavam a Floresta Proibida e os terrenos de Hogwarts. Grope e Freyja voltaram para as montanhas do norte e até onde se sabe, estavam vivos, bem e com filhos.
Harry recebeu uma carta da Srª Figg contando que sua Tia Petúnia estava de mudança. Ia para uma cidade do interior, seguindo recomendações do médico de Duda, que ainda fazia terapia.
A velha bruxa abortada contou que Valter Dursley havia se separado da mulher. Aparentemente, como ele passava muito tempo fora de casa para não ter que conviver com o filho doente, acabou conhecendo outra mulher e pediu a separação.
Petúnia não deu tanta importância a isso. Arrumou um emprego como auxiliar de enfermagem numa clínica particular e escreve para a Srª Figg com regularidade.
A Harry pareceu muito injusto que aquele velho gordo, que agora ele não mais precisava chamar de tio, tivesse abandonado a mulher. Ela sacrificou tanta coisa por ele. Inclusive a magia do único filho.
Ingrato! Valter sempre o chamava assim e no entanto não pensou que agia com ingratidão para com a mulher.
Os dias passavam invariavelmente e o trabalho como auror tomava boa parte do tempo de Harry. Eram comuns os boatos sobre grupos de comensais que ainda insistiam em seguir o modo de vida ensinado por Voldemort.
Harry e Hermione trabalhavam até tarde e mesmo com o profeta Diário sempre em cima das atividades do Ministério, em especial do Departamento de Aurores, a atenção que o mundo bruxo dava a Harry desfazia-se aos poucos.
O “garoto que sobreviveu” não era mais tão famoso quanto antes e isso lhe proporcionava um certo alívio. Ninguém encarava mais sua cicatriz com admiração ou surpresa.
Para todos, a cicatriz de Harry era um sinal de esperança em dias melhores. Dias em que o bem triunfaria. E como o mal havia sido finalmente derrotado, aquela cicatriz passou a ser apenas uma cicatriz, como a marca deixada pela Taça de Hufflepuff na barriga do bruxo.
Harry olhava para o relógio ansioso. Seus dias sempre passaram muito corridos. Desde pequeno tinha a impressão que o dia tinha horas a menos. Quando cresceu e entrou para Hogwarts, suas suspeitas de que o tempo não gostava dele e sempre passava mais rápido do que devia se reforçaram.
No entanto, naquele dia, o tempo parecia ter esquecido de passar. Estava naquela sala a uma eternidade. Andava sem parar, olhava o relógio de pulso, conferia o que estava na parede e voltava para a janela.
Ninguém se atrevia a falar com ele. Sua cara não era de quem queria conversar. Não podia se distrair, pois qualquer sinal vindo da sala diria que a espera havia terminado.
Quando o curandeiro finalmente saiu da sala, seguido de perto por Hermione, e anunciou que era uma bela e forte menina, todos que esperavam entraram no quarto. Menos Harry.
Sua filha havia finalmente chegado e ele, o “garoto que sobreviveu”, que enfrentou Voldemort tantas vezes, que lutou com comensais, lobisomens e inferis, não tinha coragem de entrar.
Suava frio. Precisou respirar fundo várias vezes para sentir as pernas pararem de tremer e só então foi para a porta do quarto.
Gina estava ali, com a mesma cara cansada de quando chegava de um treino intensivo de quadribol. A pequena Sarah estava aninhada num cobertor de lã cor de rosa, tricotado pela avó orgulhosa.
Ele ainda ficou um tempo encostado na porta, quando Gina o chamou para pegar Sarah. Com aquele embrulho todo cor de rosa no colo, Harry olhou comovido para a esposa e para toda família.
Sentia-se feliz. E pensou, sem lamentar desta vez, que era exatamente assim que Dumbledore gostaria de tê-lo visto.

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