Uma Outra Ave



A manhã chegou e junto com ela, os dois rapazes levantaram. Havia uma missão a cumprir deixada por Lupin: descobrir onde ficavam os campos de Zingiba. A preocupação era tanta que eles mal tocaram na comida e se puseram a ler e reler os livros de Hogwarts.
- Vou buscar os livros antigos dos meus irmãos. Você sabe, os livros que eu iria usar este ano – disse Rony correndo em direção à sala onde os livros ficavam guardados numa estante de madeira, muito antiga e que, invariavelmente, abrigava alguma criaturinha fantástica e nojenta.
Ele voltou em seguida com alguns exemplares de livros velhos, cheirando a mofo e com as bordas das páginas já corridas por traças.
- Peguei outros sobre plantas e ervas raras que minha mãe comprou há um tempão – explicou Rony justificando o volume de livros que trazia.
- Sem problemas, vamos começar! – disse Harry tentando se mostrar animado.
Ele sabia que era preciso fazer aquele serviço, que a vida de Mione dependia da informação que buscavam, mas passar horas e horas com a cara enfiada em livros não era uma tarefa que ele apreciasse muito.
- Posso ajudar? – perguntou uma voz feminina parada de pé ao lado da porta de entrada.
- Gina! – exclamou Rony – Claro que pode! Toda ajuda é bem vinda. Nós precisamos encontrar referências sobre a Zingiba Fóllus. Procure nesse livro aí de capa verde escura que eu vou checar os livros do sétimo ano. Enquanto isso, Harry, tem um livro aqui de farmacologia bruxa. São plantas que se usam para fazer remédios... Quem sabe, né?
Os livros eram tão velhos que os índices já haviam desaparecido. Isso dificultava ainda mais a busca, pois os capítulos não listavam o nome das plantas e sim suas propriedades mágicas.
Depois de quase três horas de pesquisa intensa, Gina comentou tentando descontrair, enquanto se levantava, esticava as pernas e alongava os braços:
- Este ano eu vou ser a melhor aluna de Herbologia!
Rony também se levantou, reclamando de dor nas costas e nas pernas.
- Se elas ainda estivessem dormentes como no sonho, eu conseguiria ficar sentado mais tempo.
- Você disse “dormentes como no sonho”? - perguntou Gina.
- Disse, por quê?
- Harry – chamou a menina – procure aí por anestesia. Quem sabe conseguimos resolver o problema.
A idéia da menina foi logo posta em prática. Agora os três se debruçavam sobre o livro de plantas medicinais e folheavam sem parar, lendo e relendo cada página, para não deixar escapar um só detalhe.
- Achei! – berrou Gina.
- Onde? – perguntaram os dois ao mesmo tempo.
- Aqui, olha – ela apontou para o desenho de uma planta muito estranha, parecida com uma grande papa de agrião, cheia dos mesmos tentáculos venenosos que Rony conhecia bem.
- É por isso que foi difícil encontrar. O Lupin disse o nome da planta errado. Não é Zingiba Fóllus, é Zingaba Lóffus – disse Harry em tom divertido.
- A Zingaba Lóffus – Gina começou a ler – é uma planta muito usada em todo o mundo para preparar o mais poderoso anestésico, normalmente utilizado em casos de doenças graves e acidentes mágicos sérios. A Zingaba foi descoberta no século XIII por dois bruxos espanhóis que logo descobriram o poder do veneno secretado pelos tentáculos da planta.
“Aparentemente, a substância só provoca uma leve dormência muscular, mas quando absorvida em forma concentrada é capaz de anestesiar completamente até mesmo um centauro ou um hipogrifo. Atualmente, a plantação de Zingaba está concentrada na Planície Moldova, entre a Romênia, a Moldávia e a Ucrânia. São esses países que controlam sua produção, visto que a Zingaba se prolifera rápido...”
- Finalmente! – disse Rony.
- Ainda há mais aqui – comentou Gina.
- Mas a informação que nós precisamos é só esta. Então, Mione foi levada para um campo próximo à Romênia - falou Rony, anotando a informação num pedaço de pergaminho.
- Para que isso? – perguntou Harry.
- Para ter certeza de que ninguém irá se confundir quando tiverem que buscá-la.
O resgate de Mione era a coisa mais importante para Rony naquele momento. Que lhe interessava saber que trouxas a quilômetros de distância estavam sendo atacados? Enquanto Mione não fosse resgatada, ele não se sentiria tranqüilo.
Lupin chegou pouco depois que eles almoçaram. Estava cansado e parecia muito sujo.
- Por onde andou? – perguntou a mãe de Rony.
- Tive que me embrenhar em muita floresta para encontrar ajuda, mas já está tudo resolvido. Assim que localizarmos o lugar...
- Já localizamos – disseram Harry, Gina e Rony ao mesmo tempo.
- Sério? Ótimo, então hoje a tarde a gente sai em busca da Mione.
Os meninos colocaram o professor a par das pesquisas, entregaram a ele o papel com o nome do local e ainda tiraram onda com ele pela confusão dos nomes.
- Vamos lá, vocês não querem que eu me lembre de uma matéria que eu detestava, que passei com um Aceitável e com muito custo, há mais de 20 anos.
Eles ficaram a tarde traçando planos para a semana seguinte. Uma coruja havia trazido um bilhete de Moody que dizia que Abeforth emprestara novamente o porão para a Ordem.
No entanto, Harry não pode deixar de notar que de tempos em tempos, Lupin ia até a janela e olhava para o alto. Depois voltava para dentro da casa e procurava se distrair com alguma coisa.
Nem mesmo a chegada de Tonks fez o professor deixar de ir para a janela.
- O que tem ele? – perguntou Gina.
- Não faço idéia. Ontem ele saiu da reunião sem dizer aonde ia e nem chegou a dormir em casa – explicou Tonks sem parecer se importar com a situação.
O trabalho no Ministério ocupava grande parte da vida da auror e ultimamente ela nem tinha tanto tempo para brincar com o próprio visual como gostava de fazer. Mas ali na casa dos Weasley era diferente. Ela poderia aproveitar a presença de Gina, que sempre gostou das mudanças e fazer algo diferente.
Ela sentou na sala com os demais e chamando a atenção de Gina começou a modificar o nariz. Depois coloriu os cabelos com um azul turquesa, com as pontinhas prateadas e os deixou bem curtinhos, levemente arrepiados. Os olhos assumiram um azul claro quase branco, que davam a todo o conjunto um aspecto bem místico.
Gina riu divertida. Sempre gostara de ver Tonks se modificando.
- Eu gostaria de fazer esse tipo de coisa, sabe? – comentou.
Lupin se aproximou das duas e já ia sentar quando ouviu um barulho vindo de fora. Correu para a janela, mas logo voltou desanimado.
- São só as corujas de vocês.
Os rapazes pularam do sofá e foram direto para a janela a tempo de pagarem as corujas antes mesmo que elas entrassem em casa. Harry correu com Edwiges para cima e colocou-a no poleiro. Rony também levou Pitchi para descansar.
Havia várias respostas dos amigos. Quase todos, exceto Simas Finnigam, aceitaram voltar para a Armada de Dumbledore. Simas alegou aos amigos que os pais estavam de mudança, mas ele ainda não sabia exatamente para onde iriam: ou seria para a Rússia ou para a Alemanha.
Os rapazes, seguidos de Gina que havia subido junto, voltaram para a sala bem animados com as respostas. Eles deram de cara com Tonks já nas escadas.
- Ah, Gina vim procurar você! Será que você pode ir comigo lá fora um pouco?
- Claro!
As duas saíram e se sentaram na varanda.
- Ai, não agüentava mais ficar lá dentro vendo aquele “senta-levanta” do Lupin. E o pior é que ele nem quer dizer do que se trata. Aqui pelo menos eu me distraio conversando com você.
Mas elas mal começaram a conversar quando um longo e agudo pio soou por todo lado.
Lupin passou correndo entre as duas e parou bem no meio do jardim da Srª Weasley. Parecia extremamente feliz e emocionado ao ouvir aquele som e, logo depois, ver um pontinho escuro surgir no céu.
- Venham – chamou ele – nossa ajuda está chegando!
Todos atenderam o chamado e foram para o jardim. Estava um dia bem ensolarado e a luz do sol quase não os deixava enxergar o que estava surgindo no céu.
Logo eles notaram que uma enorme ave se aproximava. Era uma bela e grandiosa águia-imperial. Ela descia em círculos cada vez mais abertos e em grande velocidade.
Quando se aproximou cerca de seis metros do chão, suas patas foram se alongando, tomando a forma de pernas. Ela continuava a descer, mas o corpo foi modificando, até que a grande ave se transformou por completo numa mulher. As últimas partes da ave a se transformarem em humanas foram os braços, que só se modificaram quando ela pousou.
A bruxa ali em pé tinha longos cabelos castanhos escuro com alguns poucos fios brancos, olhos negros, pele morena e aparentava não ter mais que 40 anos. Ela jogou os cabelos para trás com um certo charme e veio em direção a Lupin, dando-lhe um grande abraço.
- Pessoal, quero que conheçam uma grande amiga minha. Esta é Roxanne Bones!
Todos cumprimentaram a amiga de Lupin. Harry e Rony ainda olhavam fascinados para a mulher que mesmo depois de assumir sua forma humana ainda exibia um ar imponente, sem arrogância, mas muito altivo, próprio das águias.
Ela sorria para todos e exibia dentes alvos e bem distribuídos.
- Essa viagem foi cansativa, mas creio que valeu a pena. Você – disse para Harry – com certeza é o filho de Tiago e de Lílian. É impressionante como você se parece com seu pai.
- Ela estudou conosco em Hogwarts, Harry – explicou Lupin.
- Venha, querida – chamou a Srª Weasley sempre hospitaleira – você deve estar precisando de um pouco de sombra e água fresca, afinal não deve ser nada agradável voar com esse sol escaldante sobre a cabeça.
Eles entraram na Toca e apenas Tonks ficou para trás. Aquela não era hora para ter ciúmes, mas ela não conseguia controlar. Respirou fundo, mudou os cabelos deixando-os lisos, na altura dos ombros e de um tom de roxo bem forte.
Na cozinha, Roxanne contava a todos como tinha sido a viagem e nem pareceu notar quando a auror entrou completamente diferente. Lupin, ao lado dela, parecia encantado com tudo o que a amiga falava e também não reparou quando Tonks passou direto para o banheiro e demorou a voltar.
Depois de algum tempo, Gina perguntou:
- Onde Tonks foi?
Eles se entreolharam. Nenhum deles tinha visto a auror passar.
- Não sei, Gina – respondeu Lupin – que eu saiba hoje é o dia de folga dela. Provavelmente está descansando.
Gina não gostou do pouco caso que o ex-professor fez de sua amiga. Saiu da sala chateada e se jogou numa poltrona perto da janela da sala.
- Impressionante como os homens ficam estranhos de uma hora para outra! – disse para si mesma.
Na cozinha a conversa tinha tomado um outro rumo. Lupin explicava a todos o que Roxanne poderia fazer por eles.
- Como já deu para notar, Rox é uma animaga. Então, a idéia é ela se transformar em águia para atravessar a barreira mágica. Transformada, ela suporta uma grande quantidade de peso e poderá trazer Mione pelo ar. E nós já resolvemos a questão do tributo.
- Assim que eu estiver com sua amiga – a animaga tomou a palavra – tentarei passar com ela pela barreira. Caso não seja possível, basta descer, voltar ao normal e pagar o tributo necessário. Levarei um objeto enfeitiçado comigo para tentar oferecê-lo. E se isso não for aceito, eu corto alguma parte do meu corpo, volto a ser águia e pronto, passo com a garota. Eu preciso descansar agora, pois pretendo ir para lá ainda hoje, assim que escurecer. Prefiro voar a noite. E será mais fácil para poder aparatar em algum lugar por perto. Mas preciso que algumas pessoas viagem comigo até lá para prestar socorro à menina caso ela esteja realmente muito machucada.
A Srª Weasley, junto com Lupin, se ofereceram para acompanhar Roxanne. Prepararam algumas coisas como poções e roupas para a garota e combinaram que sairiam assim que a noite começasse a cair.
Roxanne foi para um quarto indicado pela mãe de Rony e dormiu imediatamente. Os outros continuaram na sala, quando Tonks finalmente saiu do banheiro. Ela estava de uma forma completamente diferente de todas as que eles já tinham visto.
Os cabelos ondulados e pretos iam pela cintura, os olhos muito verdes, a pele branca com as bochechas pouco coradas e uma silhueta de fazer inveja a qualquer mulher no mundo todo.
Lupin não conseguiu dizer nada. Ficou olhando sua jovem namorada ali parada diante de todos. Nenhum sorriso, nenhuma fala. Ela apenas chegou e parou. Mais uma vez, foi Gina quem disse a primeira frase:
- Tonks, você está deslumbrante!
- Obrigada!
- Nunca vimos você desse jeito – comentou Rony.
- É, eu sei! Não gosto muito de ficar assim – respondeu um tanto emcabulada.
- Por quê? – perguntou Harry.
Ela olhou para o namorado. De todos ali o único que não falara nada era ele.
- Porque isso leva tempo. – respondeu voltando-se para Harry - Eu gastei esse tempo todo no banheiro pra conseguir fazer isso. Bom, na verdade, as pequenas mudanças que eu faço vão se acumulando e conseguir voltar ao normal é meio complicado.
- Então, você é assim naturalmente? – espantou-se Rony.
Ela confirmou com um aceno de cabeça e disse:
- Bom, agora eu preciso ir. Amanhã, depois que sair do Ministério venho para cá junto com Arthur e nós conversamos mais. Tchau para vocês!
Ela virou as costas e saiu. Lupin se levantou apressado e correu atrás dela. Mas só a alcançou quando já estavam na varanda.
- Você precisa mesmo ir?
- Você sabe que sim. Já lhe disse que esse lance de ser auror acaba com o tempo da gente.
- Mas então você não vai resgatar Mione conosco?
- Não, não vai ser preciso. Eu sei que vocês dão conta! São uma ótima equipe!
Ela já se preparava para aparatar quando lembrou:
- Ah, boa sorte!
Deu um beijinho rápido na ponta do nariz de Lupin, como sempre fazia quando tinha pressa, e aparatou.
Lupin voltou ainda atordoado para casa, mas logo foi envolvido pelos demais. O sol estava quase se pondo e eles precisavam acordar Roxanne.
Após localizar um pequeno vilarejo num grande mapa bruxo que os pais de Rony trouxeram quando foram visitar Carlinhos na Romênia, os três bruxos se despediram de todos. Foram para o jardim e com todos os preparativos bem guardados, aparataram.
- Que foi, Ron? Preocupado? – perguntou Harry vendo que o amigo ainda olhava para o lugar em que há alguns instantes os bruxos estiveram.
- Sim, muito! Mas não só com Mione. Nunca vi minha mãe participar de nada assim, ativamente, cara!
- Ei, fica tranqüilo! Não esqueça que sua mãe foi da primeira formação da Ordem. Ela deve saber muito bem o que está fazendo.
O rapaz suspirou e seguiu os outros para dentro. Faltavam apenas três dias para o começo das aulas. O jeito seria matar o tempo arrumando as coisas enquanto não tinham qualquer notícia da equipe de resgate.
Os livros do sétimo ano de Harry e de Mione e os do sexto ano de Gina foram trazidos pelo Sr° Weasley. As listas de material foram entregues pela professora McGonagal no dia da primeira reunião da Ordem no galpão da Toca.
Harry cuidou de bancar o material da amiga, além de encomendar novas vestes para ela e um novo malão, já que tudo havia se perdido durante o seqüestro. Mas ele teve o cuidado de deixar que Rony arrumasse as coisas da garota.
- Pronto, está tudo do jeito que Mione gosta – comentou ele – sempre a vi arrumando o malão. É engraçado como ela deixa tudo em ordem alfabética! Só faltou a varinha... Bom, espero que ela não tenha perdido, pois o Olivaras continua desaparecido.
Bem longe dali, num antigo povoado bruxo, os três membros da equipe de resgate apareciam. Molly, Lupin e Roxanne conferiram se tudo estava correto e se puseram a andar na direção indicada no mapa. Ainda faltavam bem uns 50 quilômetros para o campo de Zingabas.
- Não será arriscado aparatar mais perto? – perguntou Molly.
- Eu acho que sim! Sabe-se lá que tipo de feitiço teremos que enfrentar – ajuntou Lupin.
- Então vamos fazer o seguinte, eu consigo chegar lá em 15 minutos. Deixem que eu vou e se tiver algum problema volto aqui para chamar vocês. Se tudo der certo, trago a menina o mais rápido que conseguir.
Rapidamente Roxanne puxou a varinha, deu um leve toque na cabeça e assumiu sua forma de águia. Levantou vôo e partiu na direção dos campos de Zingaba.
Molly procurou um lugar mais limpo no matagal ao lado da estrada e, conjurando um caldeirão, começou a preparar poções.
- São para quando Mione voltar – explicou a Lupin que logo se prontificou a ajudar.
- Não precisa, pode deixar que eu cuido disso. Agora, o que acha de recolher algumas informações? Se existem comensais por aqui o pessoal do povoado deve saber alguma coisa.
Assim, cada um dos membros da equipe tratou de cuidar de uma tarefa importante. E cada um, a seu modo, encontrou problemas para realizá-las.
A primeira a enfrentar problemas foi Molly Weasley. Distraída com suas poções, ali na beira da estrada, ela não percebeu a aproximação de um grupo de bruxos trajando vestes azuis, com pequenas inscrições douradas.
Eles a abordaram numa língua que ela não conseguia compreender. Apontavam para o caldeirão e pareciam muito zangados. Falavam e gesticulavam sem parar e como ela não conseguia entender ou responder algo que eles conseguissem compreender, a situação foi se complicando ainda mais.
Por fim, um dos bruxos ali puxou a varinha e apontou para a própria garganta dizendo:
- Éthimus!
- Muito bem – disse o mesmo bruxo agora num inglês impecável – creio que agora será fácil de nos explicar o que faz aqui e por que está infringindo as leis de controle de uso dos caldeirões fora das áreas permitidas.
A Srª Weasley ficou pasma, mas tratou de responder.
- Bom, eu sou estrangeira e não sabia dessas regras, além do mais eu precisava preparar uma poção para uma amiga que está doente e...
- Então, vejo que você infringiu duas de nossas leis. Usar um caldeirão fora das áreas permitidas e praticar magia sendo estrangeira. Sinto muito mas teremos que detê-la até que todas as suas coisas sejam revistadas e as informações dadas por você, no devido tempo, sejam confirmadas.
Os outros dois bruxos da comitiva algemaram a Srª Weasley com um feitiço simples e a levaram para o povoado, trancando-a numa sela a prova de magia.
Não longe dali, Lupin tentava conversar com as pessoas, mas as poucas que compreendiam o que ele dizia, não se mostravam dispostas a cooperar. Era como se aquele vilarejo estivesse perdido no tempo, sem nem imaginar a existência a Voldemort ou de qualquer conflito no mundo bruxo.
Como ele pode constatar, aquelas pessoas sequer viam TV, liam jornais ou mesmo imaginavam a existência de seres não mágicos no mundo.
- Isso tudo é muito estranho! – pensou Lupin.
Há quase 60 quilômetros dali, Roxanne procurava o local onde Mione estaria presa. Voou por todos os lados até avistar um lago. Aproximou-se cautelosa e conseguiu passar pela barreira mágica. Procurou aproximar-se devagar, vendo que os dois comensais continuavam nas proximidades da cabana.
Eles usavam botas reforçadas de couro de dragão e pareciam bastante agitados. Buscavam um barco muito estranho e se preparavam para levar Mione de volta à ilha.
- Seria mais prudente esperar – pensou Roxanne. – Se eu investir agora, posso correr o risco de ser identificada.
A travessia no lago parecia bem complicada. Os inferis tentavam se aproximar do barco, pois a energia vital de Mione os atraía tão acostumados estavam de se alimentar dela.
A todo instante um dos homens precisava bater com os remos em um ou outro inferi. Mas isso acabou quando deixaram a jovem caída no centro da ilha, que já estava rodeada de abutres. Eles ainda espalharam novos pedaços de carniça pela cerca e trataram de voltar para a margem o mais rápido que conseguiram.
Imediatamente os inferis cercaram a ilha e Mione voltou a se contorcer, chorar e gemer. Estava inconsciente, mas sentia suas forças serem sugadas e isso parecia provocar uma imensa dor.
Os homens entraram na cabana e aparataram.
- Bom, eles conseguem aparatar só ali. E a julgar pelo fato de não usarem as varinhas para afastarem os inferis, ali deve ser a única zona aberta para magia.
Ela voltou a subir e foi em direção à ilha. Os abutres sentiram a presença de outra ave e tentaram atacá-la em grupo. Ela precisou investir contra eles, voar o mais rápido que podia e até mesmo se atracar com duas aves que, pelo tamanho, deviam ser as “chefes” do bando.
Quando o caminho ficou mais livre, ela pousou na ilha. Com o bico empurrou o rosto de Mione para se certificar de que haveria tempo o suficiente para salvá-la. Depois, agarrou a jovem pelos ombros.
- Desculpe, mocinha, mas infelizmente isso ainda vai doer – pensou a bruxa transformada em águia.
Realmente, Mione chorou mais ainda quando foi suspensa. As garras da águia, apesar de não provocarem ferimentos graves, machucavam seus ombros e os fazia sangrar.
Roxanne se apressou a alcançar a barreira mágica. Como previra, precisou pousar e se transformar em humana novamente. Ao colocar Mione no chão, algumas plantas ferroaram a garota e ela se sentiu melhor. O efeito anestésico aliviou as dores dos ferimentos e ela parecia dormir tranqüilamente dentro de poucos instantes.
Como ela parou de se mexer, as plantas pararam de atacar e Roxanne pode estudar um tributo a ser pago para a tal barreira.
- Magia das trevas sempre pede algo sombrio. Será que sangue é suficiente?
Fez um pequeno corte no braço e passou no lugar em que a barreira ficava visível. Mas nada aconteceu. Ela então observou o sangue que ainda escorria dos ferimentos da menina e recolheu algumas gotas, fazendo a mesma coisa. Outra vez, nada adiantou.
- O que pode ser? Não vou aparatar naquela cabana. Pode ativar algum alarme ou coisa do tipo. Só aqueles comensais é que já pagaram o tributo para poder entrar e sair. Bom, posso tentar o contrário. Pagar alguma coisa para entrar.
Ela se certificou que Mione estava bem, voltou a se transformar em águia e passou a barreira. Do lado de fora não conseguia enxergar nada. Era assim que os seguidores de Voldemort protegiam o lugar. Só por cima é que se avistavam os campos. De frente, parecia uma grande muralha natural.
- Bem, vou usar o sangue da menina de novo. Ainda restou alguma coisa nas minhas mãos.
Ela pingou o resto de sangue de Mione que ainda segurava e um desenho começou a se formar no muro. Era uma inscrição muito antiga. Mas o sangue não foi suficiente e ela teve que se machucar mais uma vez para completar o traçado.
Foram precisos mais 5 cortes em locais diferentes do corpo para que o tributo fosse aceito e a muralha se abrisse, deixando um vão para que ela passasse.
Roxanne assumiu sua forma de animaga e voltou para buscar Mione. A respiração da jovem estava cada vez mais fraca e ela precisava se apressar. Pegou a menina pelos ombros novamente e atravessou com ela o mais rápido que conseguiu.
Voou mais uma vez em direção ao local que deixara os dois companheiros de aventura, mas qual não foi a sua surpresa ao não encontrá-los lá.
Ela pousou numa clareira próxima à estrada, colocou a jovem no chão e voltou a ser humana. Estava cansada, mas ainda tinha muito que fazer pela jovem bruxa ali desmaiada. Retirou as roupas encharcadas da garota e a enrolou numa capa quente que acabara de conjurar.
Mione suspirou aliviada, como se sentisse a mudança das roupas e estivesse agradecida por isso. Roxanne pegou a varinha e lançou um sinal para o céu, para quem sabe conseguir chamar a atenção de um dos companheiros.
Lupin foi o único que avistou o sinal e correu em direção ao local. Chegou lá quinze minutos depois. Avistar Mione viva e salva foi um alívio para ele. Deu um beijo estalado nas bochechas de Roxanne e pegou Mione no colo.
- Não encontrei Molly ou qualquer sinal de onde ela possa ter ido – informou a animaga.
- Isso é muito estranho. Aliás, tudo aqui é muito estranho. Você acredita que as pessoas vivem como se estivessem presas no tempo?
- Como assim?
- Elas nem sabem da existência de trouxas e sequer ouviram falar de Voldemort ou dos comensais. Não existem jornais, revistas, rádio...
- Isso é um absurdo. Por todos os lugares que eu já andei e voei todos os bruxos sabem da existência de trouxas. Não há mais registros de povoados isolados desde a Revolta dos Duendes no século XVII.
- Bom, vamos indo, precisamos encontrar Molly e partir daqui imediatamente. Não quero que ninguém perceba que Mione foi resgatada antes de estarmos a salvos na Toca.
Eles correram em direção ao povoado. Chegaram apressados e tentaram buscar ajuda. Já era noite e eles batiam de casa em casa tentando falar com alguém.
- O idioma deles é tão antigo – comentou Roxanne – é algo como um saxônico rústico.
- Você entende alguma coisa disso?
- Um pouco, mas acho que vai ser suficiente para podermos nos localizar e entender o que se passa por aqui.
Finalmente um homem já de idade bem avançada deu atenção a eles. Roxanne explicou que estavam de viagem e que a filha deles havia caído doente. O velho bruxo se mostrou bem solícito e indicou um lugar onde poderiam conseguir ajuda para a menina.
- Por que disse que Mione era nossa filha?
- Porque se esse povo está realmente perdido no tempo, temos que agir como se fossemos da mesma época. E pelo que eu me lembro de História da Magia, antigamente, qualquer pessoa que viajasse sem sua família era visto como baderneiro ou bandido.
- Não é a toa que você passou com O em todas as matérias. Sabe que até hoje não entendo porque você abandonou o curso de auror? Seria uma das mais brilhantes!
- Você sabe que tive meus motivos!
- Nunca cai nessa conversa de vocação... Sua vocação sempre foi essa. Assim como essa bruxinha aqui. Se ela não se tornar uma auror eu deixo de ser um lobisomem.
- Chegamos!
- Depois a gente continua essa conversa.
Eles entraram numa casa escura, feita de pedras negras retiradas das encostas das montanhas da região. Era mobiliada com móveis rústicos e utensílios de cobre. Havia plantas, ervas, frascos com pedaços de bichos estranhos conservados num líquido esverdeado. Uma típica casa de curandeiro.
Roxanne cumprimentou o homem que apareceu logo em seguida, vestindo apenas um longo traje cinza. Logo explicou que a menina estava doente e precisava de alguns cuidados de seguirem viagem.
O curandeiro indicou uma mesa e pediu que a jovem fosse colocada lá. Examinou com cuidado as mãos e os pés da jovem e por fim disse:
- Ela foi vitima de magia das piores. Magia de quem tem o coração murcho e a alma perdida para sempre na escuridão.
Apesar de saberem que era exatamente isso, as palavras daquele homem simples provocou uma certa angústia em Rox e até Lupin, sem entender ao certo o que ele dizia temeu por Mione.
- Cuidar dela não vai ser fácil, mas também não vai ser impossível. Ela é poderosa. Uma bruxa como poucas que existem no mundo. Vou dar uma coisa para ela beber. E depois vocês podem ir.
- Só mais uma coisa, - pediu Roxanne – uma amiga nossa desapareceu. Ela estava na estrada a nossa espera, mas não a encontramos mais.
- Ah, sim. A maga vermelha.
- Maga vermelha? – repetiu Roxanne para que Lupin acompanhasse a conversa.
- Sim, maga vermelha. Ela está com os Guardiões das Chaves dos Segredos. Peguem isto – respondeu entregando a mulher um frasco que parecia estar cheio de fumaça – quando entrarem na casa dos Guardiões, utilizem isso e salvem a sua amiga. Mas me prometam uma coisa antes de ir.
A bruxa concordou com um aceno de cabeça e olhou para Lupin para que ele também concordasse.
- Quando tudo estiver resolvido. Quando ele for destruído, voltem aqui e salvem o meu povo! Agora andem logo, a menina aqui precisa de cuidados urgentes que eu não posso oferecer.
Eles saíram apressados em busca da casa dos Guardiões das Chaves dos Segredos. Encontraram rapidamente e fizeram como o curandeiro indicou.
A fumaça que saiu do vidro cobriu todo o lugar, mas os dois continuavam enxergando. Entraram na casa, procurando em todos os lugares algum sinal de Molly. Encontraram os pertences dela espalhados pelo chão e logo localizaram a sala em que ela havia sido presa.
Lupin arrombou a porta, visto que a magia Alorromora não funcionou. Molly saiu dali apressada. Juntou suas coisas e eles correram para fora. Ali, no pátio, diante de todos os outros bruxos, eles aparataram. Não sem antes notar que Molly, já de posso de sua varinha, amaldiçoava a casa, com um feitiço simples porém definitivo.
- Cupinus!
Eles chegaram à Toca por volta de 2 da manhã. As luzes ainda estavam acesas e todos continuavam na sala. Gina cochilava com a cabeça deitada no colo de Gui. Fleur preparava chá para todos de tempos em tempos. Rony andava sem parar de um lado para o outro e Harry apenas olhava para a janela.
- Chegaram! – berrou ele dando um pulo da cadeira.
Todos se agitaram e correram para a porta de entrada.
- Para trás, todos vocês! – falou com autoridade a Srª Weasley - Passamos apenas para tranqüilizá-los. Mione vai agora mesmo ser levada para o St. Mungus, onde está meu casaco?
Ela pegou o casaco e em seguida aparatou novamente acompanhada de perto por Lupin, com Mione no colo e Roxanne.
- Pelo menos nós poderíamos ir junto – reclamou Rony.
- E por que não vamos? – indagou Harry.
- De que jeito? O St. Mungus é longe daqui e ainda não podemos aparatar.
- Mas a minha moto ainda está aqui.
Eles concordaram com a idéia, avisaram que estavam de saída e partiram.
Harry experimentou usar os botões diferentes da moto e logo descobriu que ela voava. Chegaram no St. Mungus em meia hora e logo estavam recebendo bronca da mãe de Rony.
- Ta bem, mãe! – disse o garoto – Você está coberta de razão que foi loucura, imprudência e tudo o mais. Mas agora, por favor, me diga como está Mione?
- Oh, Rony – disse com um tom de voz bem mais carinhoso – ela está recebendo os cuidados necessários agora. Ela perdeu muito sangue, estava com febre e completamente inconsciente. Os medibruxos estão fazendo o possível.
Rony se deixou sentar numa cadeira e ficou ali, olhar perdido, sem saber o que poderia fazer.
- Nós podemos vê-la? – perguntou Harry.
- Ainda não – respondeu Roxanne – os primeiros procedimentos são os mais perigosos. Só amanhã pela manhã é que devem liberar as visitas.
- Venha comigo, Ron – chamou a mãe do garoto – vou avisar o pessoal de que tudo está indo bem.
A madrugada passou com os rapazes toda hora olhando ansiosos cada vez que a porta se abria. Esperavam que a equipe que atendia Mione viesse chamá-los.
Lupin trouxe café para eles, mas Harry e Rony nem chegaram perto. Não conseguiriam comer. A ansiedade cortava o sono, o apetite e até o bom humor dos garotos. Qualquer piada ou tentativa de aliviar o ambiente era logo fulminada com um olhar irritado e reprovador.
A hora do almoço chegou junto com o pai de Rony e a namorada de Lupin. Tonks continuava com seu visual exuberante e parecia bem menos cansada que no dia anterior.
Ela procurou Rony, abraçou o rapaz e falou em seu ouvido:
- Fica tranqüilo, ta? Mione vai ficar bem e vocês vão estar juntos antes do que imagina.
Depois falou com Harry alguma coisa, mas nem procurou por Lupin. Passou direto, depois de um cumprimento rápido e foi falar com as enfermeiras.
- Sua namorada é esquisita – comentou Roxanne.
- Bom, pelo menos ela não solta penas no verão – disse Lupin rindo. – Agora, que tal voltarmos ao nosso assunto?
- Está bem, eu lhe conto. Eu só larguei tudo depois que...
Mas Rox foi interrompida pelo burburinho que se formou na sala quando um medibruxo entrou informando que poderiam ver Mione.
- Ela continua inconsciente e isso é o que está nos preocupando mais. Ela já está fora de perigo, já fizemos com que recuperasse o sangue, mas não temos como afirmar quando ela vai sair do estado de inconsciência.
Entraram dois de cada vez. Rony quis ser o último, junto com Harry. Ele estava ansioso para ver a amiga, mas ainda tinha medo do que iria encontrar.
Molly e Arthur entraram, ficaram alguns segundo e saíram. Depois Lupin e Tonks visitaram a menina. Roxanne não quis ir, pois já tinha ficado com ela tempo demais e preferia ceder seu tempo para os demais.
Finalmente os meninos entraram no quarto. Mione estava deitada e parecia dormir. Suas bochechas já haviam recuperado a cor, mas os cortes eram visíveis e profundos. Havia marcas nos braços e pernas, além dos ombros feridos pelas garras de Rox.
Harry se sentou numa cadeira e Rony ficou em pé, ao lado da garota. Segurou nas mãos dela e ficou olhando o rosto emoldurado pelos cabelos bagunçados que ele tanto gostava.
- Mione – chamou baixinho – é tão bom saber que você está aqui e que isso não é um sonho.
Todos acompanhavam a cena da janela da porta, mas só Harry percebeu que Rony fazia força para não chorar.
- Vem cara, a gente precisa sair agora! Lembra que o medibruxo falou só cinco minutos.
Rony ainda deu um último olhar para a amiga.
- Volta logo pra gente! – pediu dando as costas e saindo para o corredor.
- Ron? – chamou uma voz bem baixinha.
Ele se virou e Mione estava acordando. Ela piscava muito, pois seus olhos haviam desacostumado da luz e da claridade. Tentou sentar mas não conseguia apoiar as mãos machucadas na cama.
Os dois rapazes voltaram correndo e todos que observavam da porta entraram no quarto.
- Você acordou! – exclamou Rony emocionado, já segurando a mão de Mione como tinha feito antes.
- Sim – respondeu ela com um sorriso ainda cansado – só acordei agora porque fiquei com medo de ser outro daqueles sonhos que eu tive na ilha em que via você ou o Harry.
- Isso não é mais sonho, Mione! – falou Harry.
- Agora eu sei que não – disse a menina enquanto apertava a mão de Rony – Obrigado, por mandar alguém me buscar!
Todos ficaram em silêncio. Um silêncio de alívio. Um silêncio que substituiria qualquer expressão de felicidade. Um a um eles saíram do quarto e deixaram Mione descansar.
Tonks se ofereceu para ficar de acompanhante da garota no hospital, mas Rony disse que só ia até em casa buscar algumas coisas e voltaria para lá, junto com Harry e Gina, se possível.
Os médicos apreciaram a recuperação da garota e elogiavam o trabalho feito pelo curandeiro que prestou os primeiros socorros.
Já na saída, Roxanne perguntou à Srª Weasley:
- Aquele feitiço que você usou na casa dos Guardiões. Qual é?
- Ah, uma invenção minha, sabe? Aqueles caras malucos vão descobrir que existem cupins que se alimentam de tudo, inclusive de pedra – respondeu com ar de brincalhona.

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