Verde



- ...e Lilá Brown conta uma história sobre uma invasão à sua casa durante o verão.- encerrava Hermione enquanto servia suco de abóbora em seu copo.

- O que temos no horário, pra começar?- perguntou Rony para Harry, que examinava o horário de aulas.

- História da Magia dupla, Advinhação e Transfigurações.- disse Harry.

- Nada mal.- disse Rony.- Ao menos não temos poções logo de cara.

- Mal posso esperar até poder ter aula de defesa contra as artes das trevas com Tonks.- murmurou Hermione antes de sumir por trás do profeta diário.- A propósito, Ronald, temos reunião de monitores hoje à noite.

- Por enquanto minha única preocupação é chegar a tempo na aula de Feitiços, Mione.- retrucou Rony enquanto se levantava e apanhava a mochila.

Harry fez o mesmo e, ele e Rony, caminharam em direção à saída do salão principal. Algum tempo depois Hermione os alcançou.

A aula de história da magia foi tão chata como sempre. O Prof. Beans começou o ano falando sobre a história moderna e a primeira guerra e Harry logo descobriu que fugir de olhares curiosos não seria uma tarefa fácil.

Depois da cansativa aula ele e Rony se separaram de Hermione e seguiram para a velha sala de Advinhação.

- Porque Dumbledore tinha que trazer Sibila de volta?- perguntava Rony impaciente.

- Não sei.- disse Harry, apesar de na verdade ele saber muito bem o motivo.

- As aulas com o Firenze eram bem mais produtivas. - queixou-se Rony no momento em que o alçapão se abriu e os alunos começaram a subir pela escadinha.

- Fundo.- cochichou Harry. Ele e Rony tiveram que correr para que Dino e Simas não ficassem com a mesa mais escondida.

- Bem vindos a mais um ano.- disse a voz da Profª. Sibila vinda de um canto.- Mais um infeliz ano, carregado de mortes e empecilhos, me arrisco dizer.

- Ela nunca esquece a parte trágica. - sussurrou Rony.

- Neste ano, concentraremos nossos estudos na arte de ler as mãos.- disse a professora finalmente surgindo iluminada pela fraca luz esverdeada da lareira.

- De novo?- indagou Rony.- Achei que já estivéssemos estudado o suficiente sobre isso.

- Contaremos com a visita ilustre de uma das maiores bruxas na área da quiromancia. - prosseguiu a professora. Lilá e Parvati davam gritinhos de excitação. - Hoje, porém, vamos começar pelo estudo das profecias. Abram o livro na página 262, lá encontraremos uma excelente definição para essa palavra tão simplória e tão complexa... profecia!

Harry sentiu seu estômago dar uma reviraravolta. Sabia que sem Hermione por perto, para impor limites a Rony, o amigo iria, mais cedo ou mais tarde, perguntar sobre a profecia.

A professora Sibila voltou a falar sobre as profecias e fez isso por quase toda aula. Harry fitava o fogo na lareira com o pensamento a quilômetros e quilômetros dali. Pensava em Sirius. Lembrava-se da noite em que o padrinho se foi. Daquele véu, que o chamava, e chamava...

- Harry?!

O rapaz piscou e se virou para Rony.

- A aula acabou.- informou.

- Já?- perguntou Harry enquanto apanhava a mochila e se levantava.

- Você estava tendo sonhos?- perguntou Rony.

- Não.- disse Harry.

- Estava sim!- disse Rony com firmeza.- Como no dia do N.O.N.s. de História da Magia.

- Não, eu não estava. Eu estava apenas me lembrando de Sirius.- disse Harry em um tom baixo.

- Acho que você devia procurar Tonks.- disse Rony.- Você-Sabe-Quem anda passeando pela sua mente novamente.

- Olá!- era Hermione.- Sobre o que estão falando?

- Sobre o....- começou Rony.

- Sobre a aula de adivinhações.- cortou Harry.

- Estamos estudando profecias.- disse Rony.

Harry não conseguiu esconder uma careta. Não tinha deixado Rony falar sobre Sirius ou seu cochilo durante a aula para fugir da profecia. Era estranho, durante o verão prometera a si mesmo falar sobre tudo com Hermione, mas agora sentia algo como medo.

- O que foi, Harry?- perguntou Hermione.

- Nada. É que eu estou com fome, vamos descer para o almoço?

E assim fizeram. Depois do almoço seguiram pra a aula de Transfigurações, onde a professora McGonagall fez uma introdução da matéria do ano: Mutação.

Quando a tarde começou a cair, Harry seguiu sozinho para a Cabana de Hagrid, queria rever o amigo. Rony e Hermione tinham reunião de monitores.

- Como foi o seu verão?- perguntou Hagrid enquanto servia chá.

- O de sempre. – informou Harry desanimado enquanto observava um machucado na testa de Hagrid.- Ainda o Growp?

- Sim.- disse Hagrid.- Ele está do nosso lado agora, você sabe, mas ainda dá algum trabalho.

Harry forçou um sorriso.

- Ele já sabe falar o meu nome.- disse Hagrid com um sorriso maternal no rosto.- Se não fosse por ele, creio que os centauros já teriam invadido a escola.

- Porque eles andam tão inquietos?- perguntou Harry.

- Firenze nos disse que Marte anuncia um fim. E não é um fim exclusivamente humano. - disse Hagrid. Na opinião de Harry aquelas palavras pareciam ditas pela Profª. Sibila, e não por um Centauro. Tomou um gole do chá enquanto fitava o fogo esverdiado na lareira.

- Como anda essa cabeça, garoto?- perguntou Hagrid.

- Porque a cabeça?- perguntou Harry sem entender o verdadeiro sentido da pergunta.

- Qualquer pessoa carregando o peso que carrega nas costas já teria enlouquecido.- disse Hagrid diminuindo o tom de voz.

- Você sabe?- perguntou Harry.

- Da profecia?- perguntou Hagrid num sussurro. Harry fez que sim com a cabeça.- Sim, Dumbledore me contou.

Harry soltou um suspiro.

- Você já falou sobre isso com algum de seus amigos?- perguntou Hagrid.

- Não.

- Pois deveria.

- Não me sinto a vontade.- disse Harry após esvaziar a xícara num gole e se levantar.- Melhor eu ir para o castelo antes que a noite caia por completo.

Durante todo o caminho, Harry pensou no pouco que Hagrid dissera. Ele também achava que precisava falar sobre aquela profecia com alguém, mas não queria assustar seus amigos. Durante o verão, em algumas noites, ficava imaginando a reação deles ao receber a notícia. Ficariam apavorados.

Nem era pra menos. Ele próprio, Harry, sentia uma ponta de pavor ao pensar naquelas frases. Por outro lado, pensava, era até reconfortante saber que se algum comensal conseguir driblar a segurança do castelo não poderia matá-lo. Na realidade ele sempre ria depois de pensar nisso. Ria de desespero.

- Cabeça de dragão.- disse ele para a mulher gorda.

O salão comunal estava relativamente cheio. Assim que Harry atravessou o buraco do retrato viu que alguns rostos curiosos o fitavam. Por esse motivo preferiu subir para seu dormitório.

Ao se jogar em sua cama percebeu a gaiola de Edwiges por ali, quase esquecida. Por onde a coruja andava? Em outros tempos Harry se alegraria ao perceber que sua coruja estava ausente há tanto tempo, pois provavelmente quando reaparecesse traria alguma coisa de Sirius. Mas os tempos agora eram outros.


*


- Cabeça de Dragão.- disse Gina. Ela, Rony e Hermione atravessaram o buraco do retrato. O salão comunal já estava vazio àquela hora.

- Vou subir e dormir. - disse Gina quando Rony jogou-se em uma das poltronas. - Essa coisa de N.O.N.s. mal começou e já está me matando.- completou antes de subir as escadas veloz, quase pisando em Bichento no caminho.

Hermione se assentou na poltrona defronte a de Rony. Logo o gato laranja estava em seu colo.

- Por onde anda o Harry?- perguntou Rony pensativo.

- Não sei.- disse Hermione.- Sabe, eu tenho a sensação de que o Harry tem nos escondido algo.

- Como assim? Acha que ele está mentindo para nós?- perguntou Rony se ajeitando na poltrona para ficar mais perto de Hermione e poder diminuir o tom de voz, como se alguém pudesse ouvi-los.- Você acha que o Harry pode ter passado para o outro lado e estar nos enganando?

- Não seja tolo, Rony!- disse Hermione irritada. - Francamente.

- Não entendo o que o Harry pode estar nos escondendo, então. - disse Rony voltando para seu lugar.

- Ai Rony, às vezes você é tão tapado!- disse Hermione. Na verdade ela não se referia apenas a coisas como aquela. Fazia algum tempo, vinha esperando que Rony tomasse algum tipo de iniciativa para com ela.

- Oras bolas, Mione!- disse Rony ficando irritado também. Não sabia se entendera o que a amiga quisera dizer. Aquela parecia um afrase, como diziam os trouxas? Detonativas, não! Denotativas, era isso! Uma frase que tem um sentido, mas é usada em outro sentido diferente. Só de pensar no outro sentido Rony sentia suas orelhas ruborizarem. - Você me conhece já faz cinco anos, se já sabe que sou “lerdo”, como gosta de dizer, porque não me ajuda a combater a minha “lerdesa”, então?

Hermione encarou Rony. As orelhas dele estavam vermelhas, o que mostrava que ele havia entendido o recado. Mais do que depressa Hermione pulou para o assento ao lado de Rony. Bichento caiu no chão e saiu miando ofendido. Rony a fitava. Ela sentiu seu coração incrivelmente disparado. Nunca pensou em ter que tomar uma iniciativa daquelas, mas já que estava ali...

Rony, paralisado, viu Hermione assentar-se mais perto dele. Talvez devesse alisar as costas dela, como Harry havia feito com Cho, mas...eles nem estavam abraçados. Antes que Rony pensasse no que fazer Hermione aproximou o rosto dela do dele de modo que ele enxergava bem dentro dos olhos castanhos dela. Porém, no segundo seguinte, ela fechou os olhos e Rony sentiu os lábios dela tocarem os seus. Eles eram quentes.

Rony estava paralisado. Essa era uma das situações nas quais ele realmente não sabia o que fazer. E, quando a língua de Hermione tocou a sua, ele entendeu - ou acreditou entender - exatamente o que Harry quisera dizer no dia em que descrevera o beijo de Cho. Foi algo molhado.

Aquilo era nojento.

Antes que Rony pudesse pensar no que estava a respeito de suas ações,e se levantou levando uma das mãos à boca. Tinhas os olhos fechados e sentia-se vermelho como nunca estivera antes. Sem conseguir olhar para Hermione ele subiu as escadas para seu dormitório correndo.

Após passar apressadamente pela porta, Rony encostou na mesma, ainda com a mão na boca.

- Rony, você é um idiota!- disse para si mesmo.

Ainda no salão comunal, nervosa, Hermione arrancou sua varinha do bolso e a atirou contra a lareira.

- Droga!- disse ela enquanto se levantava no sofá onde esteve paralisada até então. - Não vai adiantar nada você estragar sua varinha, Hermione Granger!

Sentia-se tão idiota como nunca se sentira antes. Sabia que aquilo só podia significar duas coisas: Ou Rony não gostava dela como ela imaginara, ou ele era muito mais tapado do que ela poderia prever. Porém, antes que pudesse se decidir entre uma das opções - agora agachada diante da lareira - reparou algo errado ali.

Pra começo de conversa o fogo que ainda ardia na lareira era verde e mais estranho ainda, a varinha continuava intacta em meio às chamas.

De sobrancelha erguida ela olhou à sua volta procurando algo para atirar no fogo. Não seria legal queimar qualquer objeto do salão comunal, então arrancou o distintivo do peito e encostou uma de suas extremidades no fogo. Ela sequer o sentiu esquentar.
Como teste final, mergulhou a própria mão no meio das labaredas verdes e apanhou sua varinha. Em seguida se levantou e foi até a poltrona onde estava sua mochila, esquecida, e apanhou ali um pedaço de pergaminho.

Novamente agachada diante da lareira deixou que a ponta do pergaminho pegasse fogo e então o largou no chão, em poucos segundos ele virou cinzas.

Enquanto procurava outra coisa para jogar no fogo, bichento miou. Sobressaltada, Hermione apanhou um livro em sua mochila e fingiu ler.

- Ainda de pé, Srta. Granger?- perguntou a voz da Profª. McGonagall que acabara de atravessar o buraco do retrato.

- Me distraí lendo, Professora.- justificou com simplicidade.

- Está muito tarde, querida, vá dormir.- disse Minerva.

Hermione silenciosamente guardou e livro e com a mochilas nas costas começou a subir as escadas. Ao alcançar a entrada de seu dormitório ela ainda pôde ver a Profª. McGonagall observando, encabulada, as cinzas no chão. Será que ela não tinha reparado no tom verde do fogo?


*


- E se eu não quiser me juntar a vocês?

- Um bom Sonserino o fará.- disse Draco calmamente cruzando os braços.

- Então não sou um bom Sonserino.- respondeu o garoto de uns treze anos.

- Você quer perder a sua vaga no time, Malcolm?- perguntou Draco sorrindo.

- Você não pode me tirar a vaga no time.- disse o garoto com o máximo de firmeza que conseguiu reunir.

- Ah! Posso sim!- disse Draco.

- Eu não tenho medo de você, Malfoy!- respondeu o garoto.

- Tem sim!- disse Draco.- Todos aqui o tem!

- Harry Potter não tem!- disse o garoto.

Draco crispou a boca e ficou ainda mais pálido, se é que isso era possível.

- O que você disse?

- Harry Potter não tem medo de você!- disse Malcolm.- Nem ele nem os amigos dele.

Por um momento o pequeno Malcolm se sentiu aliviado por Malfoy não fazer nada. Mas no segundo seguinte seu nariz foi acertado por um soco que o fez cambalear para trás.

- Pense direito nessa sua decisão, Baddock.- disse Draco enquanto caminhava na direção da escada para seu dormitório.- Ela será definitiva, não aceito arrependimentos depois.


*


Harry sentia o vento gélido lambendo seu rosto como frias lâminas. Não sabia onde estava. Tudo era escuridão. Ele parecia estar caindo. Não havia nada embaixo de seus pés. Sentia pânico, queria acordar. Como sabia que estava sonhando? Ele já se acostumara com os mais estranhos tipos de pesadelo. Talvez devesse esperar que este acabasse. Já devia ser manhã e ele tinha de marcar o treino de quadribol.

Harry abriu os olhos e viu o teto de sua cama. Levantou-se. Rony ainda dormia. Trocou de roupa e desceu.


*


- O que está fazendo, Mione?- perguntou Harry assim que atravessou o buraco do retrato e avistou a amiga agachada diante da lareira onde as últimas brasas ainda perduravam.

- Ah! Olá Harry.- disse Hermione se levantando.

- Aconteceu alguma coisa?- perguntou Harry detectando uma ruga de preocupação no rosto da amiga.

- Comigo?- perguntou ela.- Não. Está tudo bem. E com você?- completou evasivamente.

- Estou bem.- disse Harry.

- De pé tão cedo?- perguntou Hermione a título de manter o diálogo.

- Fui resolver algumas coisas sobre o quadribol.- explicou Harry.

- Porque não descemos para o café?- perguntou Hermione.

- E o Rony?- perguntou Harry.

- Não somos grudados no Rony. Depois ele vai também.

Encabulado, Harry acompanhou Hermione até o salão principal, onde alguns alunos já saboreavam o café.

Harry e Hermione se assentaram um defronte o outro. Algum tempo depois Rony apareceu por ali e assentou-se ao lado de Harry.

- Bom dia, Rony.- disse Hermione erguendo o rosto para ele.

Pelo canto dos olhos Harry viu Rony ficar vermelho.

- Bo- bom dia.- respondeu ele.

- A propósito, Harry, estive pensando sobre a AD.- disse Hermione virando-se para Harry.

- Não vou continuar com a AD.- cortou Harry olhando para seu prato.

A princípio Hermione não disse nada. Já esperava aquela resposta. Hesitou mordendo o lábio inferior.

- Deve haver um motivo. - concluiu em voz alta.

- Sim.- Harry limitou-se a responder.

Rony brincava inquieto com o bacon em seu prato.

- Posso saber qual é?- perguntou ela.

Harry não queria responder o verdadeiro motivo. Sabia que Hermione faria um imenso discurso e o convenceria a continuar a AD caso contasse o verdadeiro motivo. Aliás, os verdadeiros motivos. Se ele falasse sobre a profecia e contasse que desde que Sirius se foi faltava um pedaço dentro dele, ela lhe daria outro motivo – nobre - para continuar com aquilo. Essa era Hermione Granger. A garota que sempre via nas coisas um motivo para continuar. Um motivo pra recomeçar. Na verdade ele receberia sim uma boa resposta da amiga para seus medos mais tarde, quando se abrisse com ela. Agora, limitou-se a erguer os olhos para ela.

Harry se assustou. Os olhos castanhos de Hermione estavam presos nele de modo que ele podia enxergar um estranho brilho dentro deles. Ele não sabia o que isso significava.

- Tenho que procurar Tonks.- disse se levantando.

- Espere!- disse Rony se levantando também.- Temos defesa contra as artes das trevas no primeiro tempo, vou com você!

- Então vamos todos.- disse Hermione

Eles subiram calados até a porta da sala de Tonks. Hermione bateu.

- Entre.

Obedeceram. Tonks estava mergulhada em um livro, assentada atrás de sua escrivaninha.

- Bom dia, garotos.- disse ela.

- Bom dia.- responderam os três de forma monótona.

- A aula de vocês só começa daqui a quinze minutos. O que procuram aqui?- perguntou Tonks sorrido.

- Harry veio trazer o mapa.- disse Hermione.

Ao ouvir isso Harry se virou para ela. Não vinha trazer o mapa, e sim conversar com Tonks. Mas não ia fazer isso na frente dos dois.

- Ah!- fez Tonks fitando Harry.- E onde ele está?

Harry fingiu procurá-lo nos bolsos, apesar de saber que ele estava bem guardado em seu malão.

- Acho que esqueci.- disse Harry.

- Porque você e Rony não vão buscá-lo, então?- perguntou Hermione sorrindo de uma maneira que irritou Harry.- Eu os espero aqui.

Harry concordou com a cabeça e saiu silenciosamente seguido por Rony. Isso também era Hermione Granger: Saber criar situações inesperadas e inexplicáveis como aquela.

Assim que a porta bateu Hermione puxou uma cadeira e se assentou defronte a Tonks.

- O que Harry está me escondendo?- perguntou ela. Desde o primeiro dia em que se conheceram, Tonks e Hermione se tornaram boas amigas, mesmo com a diferença de idade e tudo o mais. Hermione não temia qualquer assunto com Tonks.


*


Harry saiu da sala e caminhou na direção da sala de aula de defesa contra as artes das trevas. Rony o seguiu.

- Não vai ir buscar o mapa?- perguntou o garoto ruivo.

- Você não notou, Rony?- perguntou Harry.- Hermione falou do mapa pois queria ficar a sós com Tonks.

- Pra quê?- perguntou Rony.

- Eu não consigo ler a mente das pessoas.- disse Harry irritado.

- Não precisa ser grosso...- disse Rony quando eles pararam defronte a sala.


*


- Lhe escondendo?- perguntou Tonks.

- Sim.- disse Hermione.- Eu sei que ele está escondendo alguma coisa desde aquela visita ao ministério. Só que toda vez que entro no assunto ele foge.

- Harry ainda não se conformou com a morte de Sirius, Mione.- disse Tonks.

Hermione fez um muxoxo de impaciência.

- Eu sei que Sirius foi um dos motivos pelos quais Harry não se juntou a nós no verão.- disse Hermione.- Mas você está se esquecendo que eu sou Hermione Granger, Tonks, eu sou a pessoa que não se satisfaz com o que satisfaz a maior parte das pessoas.

- E como você percebeu que há outra coisa?- perguntou Tonks como se considerasse o que Hermione acabara de dizer.

- Nem o Rony nem o Harry sabem, mas eu consigo perceber o que se passa pela cabeça de ambos olhando-os nos olhos.- disse Hermione séria.- Porém, desde o episódio no Ministério, não tenho conseguido fazer isso funcionar completamente com o Harry.

- Você já considerou a hipótese de possuir o dom da Legilimancia?- perguntou Tonks.

- Não desvie o assunto.- disse Hermione.- Eu não leio a mente deles. Eu apenas sei o que eles estão sentindo pela luminosidade, ou coisa assim.

Tonks sorriu parecendo estar divertindo-se com o discurso de Hermione, a qual ficou irritada.

- Já vi que você não vai me falar o que é, não é mesmo?- perguntou Hermione.

- Eu sinto muito, Mione, mas acho que se o próprio Harry não lhe contou qual é o problema dele, eu não tenho o direito de fazê-lo.- disse Tonks.

Hermione soltou outro muxoxo e se levantou.

- Só uma coisa.- disse Tonks. Hermione, que já caminhava na direção da porta, se virou.- Você sabe tanto quanto eu sei que o Harry não funciona muito bem sobre pressão.

- Eu o conheço fazem cinco anos e não sabia disso.- disse Hermione srcasticamente.- Obrigado por me informar.

Em seguida ela saiu da sala deixando uma Tonks que se divertia com aqueles sentimentos adolescentes alheios.

Hermione já se dirigia para a sala de aula quando avistou um Sonserino do terceiro ano em comportamento suspeito. Ajeitando o distintivo de monitor ela correu até ele.

- Algum problema?

- Não.- disse o garoto se virando para ela. Ele tinha o nariz inchado.

- Como é o seu nome?- perguntou Hermione.

- Vai me dar detenção, monitora?- perguntou o garoto no tom arrogante natural dos Sonserinos.

- Qual o seu nome?- repetiu Hermione.

- Malcolm Baddock.- disse o garoto.
- Escute, Baddock.- disse Hermione.- Como sabe sou monitora e o meu dever é manter a ordem no castelo. Então se você avistar coisas estranhas ou pessoas que distribuem socos no nariz dos outros é só me procurar, ok?

O garoto, levemente assustado, fitou Hermione e fez que sim com a cabeça. Ela se virou e começou a andar novamente na direção da sala de defesa contra as artes das trevas. Já estavam todos em seus lugares. Caminhou até a outra extremidade da sala e se assentou por ali exatamente na mesma hora em que a porta interna da sala se abriu e por ela entrou Tonks. Quase todos a olhavam com um ar curioso, afinal de contas não era todo dia que aparecia uma professora de defesa contra as artes das trevas tão jovem, de vestes coloridas e cabelos da cor de chiclete.

- Bom dia.- disse a mulher que vinha cantarolando enquanto girava a varinha entre os dedos.- Se quiserem guardar estes livros, creio que não vamos usá-los muito aqui.

Com um ruído de mochilas que se abrem todos guardaram seus livros.

- Para os que ainda não me conhecem, meu nome é Tonks.- disse ela antes de deixar a varinha cair no chão. Meio sem graça ela se abaixou e apanhou a mesma. Lilá Brown tinha o braço no ar.

- Seu nome é simplesmente “Tonks”?- perguntou com um ar de desconfiança para a professora.

- Na verdade é Ninfadora Tonks, mas se a sua mãe tivesse colocado um nome desses em você, você provavelmente gostaria de ser chamada de Tonks também. - respondeu amavelmente.

Alguns alunos sorriram divertidos.

- Como ia dizendo, meu nome é Tonks, sou Aurora do Ministério da Magia e responsável pela segurança de Hogwarts.- disse ela.- Fui convidada por Alvo Dumbledore a passar alguns de meus conhecimentos para vocês. Creio que devo começar dizendo que, por mais que nós treinemos feitiços defensivos aqui, não será a mesma coisa quando você estiver frente a frente com um Bruxo das Trevas.

Harry escutava atencioso apesar de já saber, por experiência própria, sobre tudo o que Tonks estava falando. Tinha que admitir que como Professora, Tonks era melhor até mesmo do que o falso Moody que os ensinara aquela mesma matéria no quarto ano.

- Um duelo em meio a uma guerra bruxa é mais imprevisível do que qualquer outro ramo da Magia. Mais impreciso do que a própria adivinhação.- dizia ela.- Você pode estar preparado para um duelo e acabar nocauteado em St. Mungus por um simples feitiço estuporante, como pode também sair vivo depois de uma maldição da Morte.

Harry sentiu os olhos do restante da classe pregados nele.

- Estive analisando o conteúdo passado a vocês durante os últimos cinco anos, com as outras turmas de sexto ano eu terei de começar do começo. No caso de vocês, com o treinamento que receberam durante o ano anterior, creio que poderemos ir direto para feitiços bloqueadores. Antes de começarmos com estes quero ter certeza de como vocês andam com feitiços estuporantes, Patronos e desarmadores.

Aquela foi com certeza uma das aulas mais produtivas que eles já tiveram. Conseguiram, em uma aula apenas, praticar com facilidade tudo o que Harry lutara para ensiná-los durante quase todo o ano anterior.

Após o almoço, ainda empolgados com a aula de defesa contra as artes das trevas, tiveram aula dupla de Feitiços. Depois desta Hermione seguiu para sua aula de Runas e os outros dois foram para a torre da Grifinória.

- Com licença Profª. Vector.- disse uma voz rouca à porta.- Posso falar com a Srta. Granger um minuto?

Ao ouvir seu nome Hermione ergueu o rosto do pergaminho repleto de runas. Parado à porta estava Malcolm, o Sonserino do terceiro ano.

- Srta. Granger.- chamou a professora.

Hermione se levantou e saiu da sala fechando a porta ao passar. O garoto parecia aflito.

- Você pediu para avisar sobre comportamentos estranhos.- disse ele aos sussurros.- Sonserinos pegando elfos na cozinha.

- Do que você tá falando?- perguntou Hermione.

- Não diga quem lhe avisou. Mas vão pegar Elfos como cobaias.- após dizer isso o garoto saiu correndo.

Hermione ficou parada por um momento processando as informações. Levou alguns segundos para decidir se iria à cozinha checar o que estava acontecendo ou se voltaria para a aula de Runas. Acabou indo para a cozinha.

- Anda Elfo maldito!- dizia uma voz.- Não podemos ser pegos aqui.

- Não meu senhor. Tenho trabalho a fazer. Piedade meu senhor!- resmungava o Elfo.

Hermione sacou a varinha e ajeitou o distintivo.

- Solte-o!- disse ao ver um sextanista Sonserino puxando o Elfo pela orelha.

- Oras bolas! Se não é a Sangue Ruim!?- sibilou uma voz arrastada e de uma sombra Hermione viu surgir Draco Malfoy.

- Resolveu maltratar Elfos agora, Malfoy?- perguntou ela.

- Eu não estava maltratando Elfos, estava?- perguntou ele sorrindo.

Hermione observou o outro garoto soltar o elfo e este voltar correndo para a cozinha.

- Eu...- começou Hermione.

- Você não tem provas contra mim.- disse Draco.

- Mas tenho a palavra de monitora.- disse Hermione.

- Contra a palavra de um monitor.- disse Draco.- Agora me dê licença, tenho mais o que fazer.

Hermione observou irritada Draco sumir de vista. Ela realmente não tinha provas e odiava aquilo! Acabou voltando para a aula de Runas.


*


- Mione acredita que você está nos escondendo algo.- disse Rony. Ele e Harry estavam assentados no salão comunal lustrando suas respectivas vassouras.

- Como o que, por exemplo?- perguntou Harry. Ele sabia bem o tipo de coisa que estava escondendo dos amigos, mas realmente não queria falar daquilo com eles.

- Não sei.- disse Rony. Ele na realidade procurava algum assunto no meio do qual pudesse contar para Harry o ocorrido entre ele e Hermione, mas até agora não tinha encontrado.- Você conhece a Mione, sempre com algumas idéias malucas na cabeça.

Harry permaneceu em silêncio durante algum tempo. Talvez Rony devesse saber. Faltava-lhe apenas coragem para contar. E quando esta finalmente pareceu suficiente o buraco do retrato se abriu e por ele entrou a própria Hermione com sua imensa mochila nas costas.

- Boa tarde.- disse ela enquanto se jogava no sofá perto dos garotos. Parecia cansada.

- Onde esteve?- perguntou Harry fitando-a.

- Parece que Malfoy achou que seria divertido seqüestrar um elfo da cozinha.- disse Hermione, bichento veio veloz e se acomodou no colo da garota.- Eu estava impedindo-o de fazer isso.

- Para quê ele seqüestraria um Elfo?- perguntou Rony. Aquela ela a primeira vez em que ele dirigia a palavra a Hermione desde a noite anterior.

- Prática de Magia Negra.- disse Harry.

- Foi exatamente o que eu imaginei.- disse Hermione.


Logo a noite de Sexta feira caiu trazendo o primeiro Sábado em Hogwarts. Era incrível a maneira como faltava tempo para pensar na guerra lá fora. Talvez a tática dos professores fosse passar tantos deveres de casa que não sobrasse tempo para os alunos pensarem em outras coisas, ou ter medo.

Harry toda vida ouvira Hermione dizer que ele e Rony eram os seres mais tapados que vagavam pela terra. Mais tarde Harry descobriria que ela tinha razão.

Durante aquela semana Hermione e Rony mal se cumprimentavam. Harry nem percebeu. Talvez porque estivesse realmente cheio de coisas a fazer, talvez porque fosse mais lerdo que o normal mesmo, ou ainda fosse pelo fato de que ele vinha constantemente se isolando do restante do mundo.

As aulas com Snape não haviam mudado em muita coisa. O professor continuava grosso como sempre e Harry sentia vontade de matá-lo toda vez que o olhava e lembrava-se de Sirius.

Agora, Harry estava no salão comunal terminando os últimos deveres de Transfigurações.

- Mal posso esperar até o primeiro treino.- dizia Rony quando Gina e Hermione se aproximaram.

- Já está na hora do jantar.- disse Gina.

- A minha barriga já deu o aviso, Gina.- disse Rony levemente mal humorado.

- Vamos, então?- chamou Gina.

- Vamos. Tenho que ir à sala de Tonks depois do jantar.- disse Harry se levantando.

Rony fez o mesmo, mas Hermione, que até então estava de pé, se assentou em uma das poltronas. Iria fazer o que tinha que ser feito.

- Rony, espere.- disse ela. Não só Rony, mas Harry e Gina também se viraram.- Será que a gente podia trocar uma palavrinha?

Rony corou e concordou com a cabeça. Harry fitava Hermione com imensa curiosidade, mas ela nem notou, sentia-se nervosa.

- Nos encontramos lá em baixo, no jantar, então.- disse Gina interrompendo o silêncio.

- É.- concordou Hermione.
Ela observou Gina e Harry sumirem pelo buraco do retrato. O salão comunal estava praticamente deserto, todos deveriam estar no jantar. Rony permanecia de pé, com as mãos nos bolsos da calça.

- Porque não se assenta?- perguntou Hermione indicando a poltrona defronte a dela. Rony, sem jeito, concordou com a cabeça e obedeceu.

Silêncio.

- Não se preocupe, eu não vou beijá-lo novamente. - disse Hermione sentindo-se, em seguida, extremamente idiota. Aquilo não era coisa de se dizer para um garoto.

Rony por sua vez sentia-se estranho. Quando aconteceu, na outra vez, ele sentira nojo, mas agora sentia uma imensa vontade de beijar Hermione novamente. Só não sabia como fazê-lo.

- Desculpa pelas coisas que aconteceram, ok?- disse Hermione.- É que eu... Eu esperava que você fosse parecido com o Vítor, que tivesse alguma iniciativa, sei lá...

- Hermione...- começou Rony.

A garota baixou a cabeça. Sentia vontade de chorar agora. Estava com muita vergonha do que acontecera uma semana antes.

- Diga.- disse com a voz fraca.

- VOCÊ JÁ BEIJOU O KRUM?- disse Rony em um tom demasiadamente alto tamanha fora a sua surpresa.

Hermione sentiu-se ruborizar.

- Sim.- disse ela com a voz ainda mais fraca.

Rony fez um barulho inconfundível de nojo.

- Esse não é o assunto.- disse Hermione erguendo o rosto para Rony.

- Qual é então?- perguntou Rony que parecia extremamente irritado.- O que vai me dizer? Eu até iria ter algo contigo se você não tivesse sido tão idiota.

Hermione se levantou.

- Cala a boca Rony!- disse ela.- Eu gosto de você.

Rony engasgou.

- Você não pode gostar de mim.- disse ele.- Você é Hermione Granger, a heroína dessa história toda, pela lógica você deveria gostar do Harry.

- Isso não tem a mínima lógica, Rony.- disse Hermione.- E não sei porque você diz que sou a heroína, eu nunca fiz nada de mais.

- Você tá brincando comigo.- insistiu ele.- Como brincou no dia em que me beijou.

- Eu não sou uma pessoa de brincadeiras.- disse Hermione séria.- Você sabe muito bem disso. Eu gosto de você, pateta como você é.

Rony fitava os sapatos. Estava muito, mas muito vermelho.

Seguiu-se um minuto ou mais de silêncio até que Rony falou.

- Certo, e o que eu devo fazer agora?

Hermione sorriu por dentro.

- Faça o que achar que deve ser feito.- disse ela, seu coração estava disparado.

Rony, ainda com as mãos nos bolsos se levantou e caminhou até ela, observando atenciosamente o chão. Ele nunca tinha feito aquilo antes, mas não devia ser difícil. Considerou por um momento o fato de ser muito mais alto que Hermione. Harry também era mais alto que Cho e isso aparentemente não tinha atrapalhado muito.

- Será que a gente pode se assentar?- perguntou ele sentindo-se corar violentamente de novo.

- Tudo bem.- disse Hermione com simplicidade antes de se assentar na poltrona. Rony se assentou ao lado dela e no segundo seguinte os dois estavam aos beijos como se nada nem ninguém tivesse importância no mundo, só eles.


*


- Com licença.- pediu Harry ao entrar na sala de Tonks.

- Olá Harry, como você está?- perguntou a mulher de cabelos rosa choque de trás de sua mesa.

- Como sempre.- disse ele observando o rosto carrancudo de Rodolfo Lestrange, em um dos pôsters na parede, que o encarava.

- Você sabe porque está aqui, certo?- perguntou Tonks.

Harry concordou com a cabeça e em seguida colocou o mapa do maroto sobre a mesa.

- Não é só isso.- disse Tonks.- Você se lembra como se pratica oclumência, pressuponho.

- Mais ou menos.- disse Harry se assentando.

- Quer que eu explique novamente o que é e para quê serve?- perguntou Tonks

calmamente.
- Não.- disse Harry.

- Então creio que podemos começar logo a praticar.- disse Tonks.- Esvazie sua mente e se levante, Harry.

Tonks se levantou e deu a volta na mesa. Tinha a varinha em mãos. Harry, pego de surpresa, se concentrou durante algum tempo. Deveria esvaziar sua mente. Ele fechou os olhos e concentrou-se em se concentrar. Devo esvaziar minha mente, repetiu mentalmente e em seguida se levantou respirando fundo.

- Vamos lá.- disse enquanto se posicionou defronte a Tonks.

- Legilimens!

Harry de veras se concentrou o máximo que pode, mas mal ouvira a palavra mágica e já não estava mais ali. Voava. Ele via as luzinhas na rua trouxa lá em baixo. Ele olhou para o lado e viu Luna voando em um Trestalio. Atrás dela vinha Hermione e... Ele deveria estar ali.

Harry abriu os olhos, estava de joelhos no chão.

- Acho que deveria ter lhe orientado sobre como fechar esvaziar mente.- disse Tonks esticando a mão para que Harry se levantasse.

Harry estava novamente de pé, mas Tonks deu a volta na mesa e se assentou. Harry fez o mesmo.

- Feche os olhos, Harry.

Harry obedeceu.

- Agora pense em um... em um biscoito.- disse Tonks.

Harry, achando aquilo algo extremamente bizarro, concentrou-se em um biscoito.

- Concentre-se somente nesse biscoito e mais nada.- disse Tonks.- Faça com que esse biscoito seja a única imagem a ocupar sua mente.

Harry se concentrou o máximo que pôde no tal biscoito, mas mal ouviu as palavras mágicas sussurradas por Tonks e o biscoito se tornou mais nítido do que deveria ser.

A Professora McGonagall fitava Harry de trás de sua escrivaninha.

- Pegue um biscoito, Potter ...

Abriu os olhos. Tonks o encarava severamente. Harry achou que algo naquela Tonks anormalmente séria lembrava a Sirius.

- Você deve se concentrar.- disse Tonks.

- Eu estou tentando.- disse Harry com simplicidade.

- A vontade que você sente de acordar e achar que está sonhando não deixa você esvaziar a sua mente.- disse Tonks ainda séria.- E é isso que Voldemort quer.

- Você fala o nome dele...

- Sim.- disse Tonks.- Harry, você precisa entender uma coisa.- Sirius morreu. Isso não é um pesadelo. Por isso você deve deixar sua mente livre dos acontecimentos que antecederam e sucederam a morte dele.

Harry permaneceu calado.

- Voldemort quer que você se culpe e se afunde nessa falsa culpa ao ponto de sair do castelo e deixar-se vulnerável a ele. - disse Tonks.- E isso não pode acontecer!

Harry escutava calado. Sabia que não conseguiria superar aquilo. Quando alguém se sente culpado, esse alguém era plenamente capaz de superar tal culpa. Não se sentia culpado, sentia-se vazio.

- Sirius levou um pedaço de todos nós junto com ele.- disse Tonks.
Harry respirou fundo.

- Sirius não era mais um amigo meu.- disse Harry.- Não era meu tio, não foi meu amigo de escola, nem de duelos ou de guerra. Eu passei longos anos da minha vida com um enorme vazio dentro de mim. Eu nunca tive um pai, Tonks. Ele era um pai pra mim. Foi como perder meu pai uma segunda vez.

- Para quantas pessoas você já disse o que sente?- perguntou Tonks.- Quero dizer, com quantas pessoas você conversou sobre esses últimos acontecimentos?

- Com Dumbledore, apenas.

- Porque não fala sobre o que você sente com seus amigos?- perguntou Tonks.

- Acho que eles ficariam assustados e no fim não me compreenderiam.

- Muitas vezes a gente se engana com as reações que achamos que as pessoas terão a respeito de determinados assuntos.- disse Tonks.

Silêncio.

- Talvez compartilhar isso com alguém fosse bom para a sua cabeça, Harry.- disse Tonks.- Chega de oclumência por hoje. Volte na sexta e tente praticar.

Harry concordou com a cabeça e em seguida deixou a sala de Tonks. Caminhava lentamente rumo à torre da Grifinória. Mal sabia que em alguns minutos aconteceria algo que mudaria sua vida. Algo que a princípio ele não entenderia, mas seria algo realmente grandioso.


*


Enquanto um pacto era selado no salão comunal da Sonseria, Harry entrava no salão comunal da Grifinória e encontrava Gina, Hermione e Rony por ali. Riam.

- Olá Harry.- disse Hermione.

- Achei que demoraria mais na sala da Tonks.- disse Gina.

Harry se assentou ao lado de Gina e examinou os rostos dos três, sério. Algo estava errado ali.

- Porque vocês não foram jantar?- perguntou ele a Rony e Hermione.

Hermione deu um estranho sorriso brejeiro.

- Errr...- fez Rony.

- Contem a ele!- disse Gina sorrindo empolgada.

- Eu e a Mione...- começou Rony ficando vermelho.

- Estamos juntos.- completou Hermione.

A princípio Harry não entendeu o que significava aquele estar juntos. Mas então a ficha caiu.

- Vocês o que?- perguntou ele.

- Eles estão namorando, Harry.- disse Gina.

Harry processou as informações rapidamente. Rony sempre gostou de Hermione mais do que como amiga, mas ela sempre foi tão compenetrada... Será?! No fundo ele sabia que aquilo, mais cedo ou mais tarde, aconteceria, só não esperava sentir-se tão incomodado. Não porque Rony arrumava uma namorada, mas porque Hermione acabava de descer de seu pedestal, onde residia como um protótipo perfeito da Professora McGonagall, e fazer-se mortal, arrumando um namorado.

- Hum...- fez Harry fitando algum ponto acima do ombro de Rony.- Que bom!

Rony sorriu. Hermione não. Ao ouvir o tom arrogante na voz de Harry tornou-se extremamente séria. Esperava que ele ficasse feliz pelos dois, mas isso aparentemente não ocorrera.

- Escuta.- disse ele.- Eu estou cansado, vou me deitar.

Os três o observaram subir as escadas e desaparecer.

- O Harry é estranho!- disse Rony.

- Não.- disse Gina.- Ele só está inconformado com o destino dele.

- Quem disse isso?- perguntou Rony.

- Luna.- disse Gina com um olhar estranhamente aéreo.- Escutem: Vou dormir também. Boa noite.

- Boa noite, Gina.- responderam Rony e Hermione.

Os dois observaram Gina desaparecer pelas escadas também.

- Acho que vou ir me deitar também.- disse Hermione se levantando.

- Não esqueça o "beijo de boa noite" no seu namorado.- disse Rony.
Hermione sorriu e caminhou até ele.


*


Harry ouviu Rony entrar no quarto, mas fingiu que dormia. Não que culpasse Rony, só não queria conversa. Os roncos de Neville ecoavam pelo quarto. Simas e Dino ainda não tinham subido. Poucos minutos depois se escutava os roncos de Rony também.
Ele, Harry, não conseguiu dormir. Para variar tinha a cabeça cheia. Muitos pensamentos martelavam freneticamente e faziam sua cicatriz doer.

Tinha planejado, durante o verão, desabafar com Hermione todos os seus problemas assim que se encontrassem em Hogwarts. Mas agora que estavam ali, sentia que a amiga não o entendia como antes.

Harry não conseguiu admitir, mas estava com ciúmes de Rony. Não que não desejasse que Rony e Mione fossem felizes. Mas vendo-os juntos, sentia que nenhum dos dois teria tempo para ele.

Mal sabia Harry que no outro lado da torre certa garota pensava nele.

Ela recapturava os principais fatos de sua vida nos últimos cinco anos. Do último para cá alguma coisa definitivamente mudou entre ela e Harry. A começar pela sensação de ele estar escondendo algo. Algo que ela não sabia o que era. Algo como Trestálios, você não os vê, mas sabe que eles estão lá. E agora a reação dele ao saber do namoro. Porque ele ficou tão nervoso? Já estava nervoso antes de saber ou sentiu ciúmes?

Hermione sorriu e em seguida sentiu-se idiota por tê-lo feito. Harry com ciúmes dela... Não era isso. Ele não sentiria ciúmes dela, eram apenas amigos. Apenas bons amigos. E quem era ela para que Harry sentisse ciúmes dela. Era apenas mais uma garota de dezesseis anos de idade que sempre teve sobrenatural auto-controle e não podia acreditar seu coração estar confuso. Era apenas Hermione Granger. Apenas.


Ainda em seu dormitório, Harry concentrava-se em um biscoito. Tinha de esvaziar sua mente antes de dormir.

A quinta-feira chuvosa chegou preguiçosamente. Entre as aulas de Historia da Magia e Adivinhação Harry, não sabia por que, tentava se manter meio distante de Rony e Hermione. Na aula de Transfigurações sentou-se junto de Neville.

- Eles estão juntos, não é?- disse o garoto.

- Sim.- respondeu Harry seco.

Neville não foi o único a fazer aquela pergunta. Naquela tarde aconteceria uma reunião de Monitores e após o jantar Harry foi obrigado a deixar o salão comunal sozinho.

Subia sem ânimo as escadas para o terceiro andar quando encontrou Luna fitando, interessada, uma teia de aranha no teto.

- Como anda, Harry?- perguntou ela assim que o viu. Os dois se assentaram na escada.

- Como sempre.- respondeu o garoto.

- Como estão Hermione e Rony?- perguntou Luna fitando-o.

- Devem estar bem. Quer dizer, ambos estão saudáveis, e nenhum deles perdeu o padrinho recentemente.- disse Harry.

- Eles estão juntos, não estão?- perguntou Luna.

- Sim.- disse Harry.

- E você não se perdoa por não ter percebido que gostava dela antes.- cantarolou Luna.- E por ter deixado-a passar... se quer saber a minha opnião coisas como esta acontecem todos os dias.

- Você às vezes diz bobagens, Luna.- disse Harry.

- Depende até que ponto você é capaz de crer.- disse a garota calmamente. A maior vantagem de conversar com Luna é que ela raramente se ofendia com o quer que fosse.- Hoje não estou muito para bobices.

- Você não sabe de nada.- disse Harry secamente.

- Sabe, eu sou uma Corvinal e não pude deixar de ouvir boatos sobre o fim de seu caso com Cho Chang..- disse Luna.- Cho diz-se trocada pela "Granger trouxa".

- Eu não a troquei por ninguém!- disse Harry.

- Meu pai às vezes me conta casos do tempo dele em Hogwarts. - disse Luna.- Tem uma deles em que ele conta a história de uma garota, e de um garoto que estudavam aqui em sua época. Diz que ele era uma espécie de herói da escola. Acho que porque vivia sempre a desafiar Sonserinos praticantes de Magia Negra, também por ser um excelente jogador de Quadribol.

"A garota, bem, era nascida trouxa, mas mesmo assim era uma aluna exemplar. A sabe tudo. Monitora. E ela implicava com tal rapaz por descumprir os regulamentos da escola. Diz que ele não admitia gostar dela, talvez para os mais próximos sim, mas para o restante, bem, ele não devia explicações. E ela não sabia que gostava dele até que teve um pequeno caso com um amigo dele. Isso foi o suficiente para eles descobrirem que se amavam."

Harry olhava para os sapatos, distraído.

- Não adianta lutar contra isso. Quando um cara é o herói, está escrito que ele vai ficar com a mocinha.- disse Luna.

- Mas o que aconteceu no fim da história?- perguntou Harry.

- Eles terminaram Hogwarts. O mundo estava em guerra. Ela entrou para o ministério. Diz que foi colega de mamãe no trabalho. E eles tiveram um filho. Mas um amigo os traiu e hoje os dois estão mortos.- despejou Luna.

Com um frio na barriga Harry percebeu de quem ela estava falando.

- O final não é exatamente feliz.- disse Harry.

- Não se preocupe, Harry.- disse Luna se levantando e sorrindo.- Um raio não cai duas vezes no mesmo lugar. Estarei encrencada se me encontrarem passeando por aí a essa hora.

Harry a observou sumir enquanto, sem perceber, passeava o indicador pela cicatriz. Não tinha certeza se deveria acreditar em histórias de Luna Lovegood. Sentiu falta de Sirius. Lembrou-se do episódio em que viu seu pai humilhar Snape e que ele procurara Sirius.

Mas não estava gostando de Hermione. Ele não podia gostar de Hermione. Ela era uma amiga apenas, e não dá certo gostar de amigos. Rony e Hermione também eram amigos antes, mas só eram amigos por não admitirem que se gostavam.

Ele se levantou e segui para a torre da Grifinória. Inexplicavelmente sentiu sono e subiu direto para seu dormitório.


***continua**

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