Amnésia



- Não vamos acorda-la, garanto que ela não sabe de nada.

Hermione sentia-se cansada. Não voltara para casa, ou para casa de Tonks, melhor dizendo. Esta partira de noite para o ministério e até as quatro da manhã, hora em que Hermione adormecera, não havia dado sinais de vida. Dormira pouco e desconfortavelmente em um dos sofás da sala de estar.

- Ela não sabe do quê?

Hermione esfregou os olhos e se assentou. Ainda ouvia as vozes no corredor. Espreguiçou. Suas vestes estavam amarrotadas. As vozes que a acordaram estavam distantes e praticamente inaudíveis agora.

Tivera um sonho estranho. Muita água, dor, gritos e então um choro constante como trilha sonora. Poderia ficar horas ali, refletindo a fim de encontrar um significado racional para o estranho sonho, mas aquilo realmente a acordara a levava agora na direção para a qual seguira as vozes minutos antes.

-... Ela pode o ter encontrado ao sair do ministério.- dizia a voz de Gui de dentro de um cômodo no qual Hermione nunca entrara.- Ela pode ter contado que achava que a Comensal estava na França, então ele pode ter fugido para tentar avisa-la.

- Não.- era a voz de Tonks agora.- Draco Malfoy pode ter o pai que tem, pode ter a idade que tiver, mas o único fato que fez dele e Hermione amigos era a inteligência que possui, muito similar à dela.

Hermione se encostou com cuidado à porta para tentar escutar melhor. Por um momento pensou em deixar seu corpo e adentrar a sala, mudou logo de idéia.

- Se esse fosse o motivo ele conseguiria outro jeito de avisa-la que estamos nos encaminhando para a França.- continuou Tonks.- Pois sabe muito bem que não há mais segundas chances para ele. Digo, se ele fugisse teria que ser para sempre. Deve ter acontecido algo realmente grave, para leva-lo a isso, a esse extremo...

Hermione ouviu passos subindo alguma escada. Desencostou-se dali sem conseguir deixar a porta da sala, precisava ouvir mais.

- E se por acaso ele voltar?- indagou Gui.

- Se ele voltar ao menos livrará a pele de Severo.- disse Tonks.- Mas não posso fazer mais nada além de reabrir o processo contra ele, que é o que eu deveria ter feito quando ele completou dezessete.

Os passos estavam mais próximos, Hermione avistou o vulto desengonçada e sujo de Mundungo Fletcher. Fingiu que vinha pelo corredor.

- Dia.- disse ela ao homem que apenas sorriu antes de entrar pela porta onde antes a garota estivera encostada.

Hermione respirou fundo e encostou-se ali outra vez.

- Chegou uma carta de Hogwarts.- disse a voz do recém chegado.- De Hagrid, informando que encontraram um aluno nos jardins essa manhã. Ferido por um punhal. O nome dele é...

- Draco.- murmurou Hermione desencostando-se novamente da porta e tratando de sumir dali.

Minutors depois Tonks deixou a sala e seguiu afoita até a cozinha, onde sumiu pela lareira sem sequer desejar a Hermione ou à Senhora Weasley um bom dia.

- Há muito não consigo entender o que está acontecendo nessa casa.- disse a Sra. Weasley enquanto servia bacon e ovos a Hermione.

A garota a olhou seriamente e de forma impulsiva falou com peculiar voz rouca.

- Pois eu acabo de entender.- disse lembrando-se do sonho.- Seu neto nasceu.




****




- Eu sabia que um Malfoy aparecer por aqui a essa altura do campeonato não podia ser sinal de boa coisa!- despejava o velho do Cabeça de Javali.- Devia tê-lo tocado daqui!

- Cale-se homem!- despejou Belatriz enquanto ajeitava seu pequeno filho ruivo em uma espécie de cesto.- Nada vai lhe acontecer.

- Assim que encontrarem o rapaz, aqueles outros dois ruivos virão atrás de mim novamente.- disse o velho.

- Mas você não vai estar aqui.- disse Belatriz calmamente enfiando a mão em um dos bolsos e tirando de lá uma pequena chave dourada que estendeu ao velho.- Conta 565 de Gringotes, há galeões suficientes lá pra lhe fazerem sumir no mundo.

O velho encarou a chave com os olhos brilhando.

- E quando digo sumir no mundo, falo de sumir dentro de quatro horas.- Completou.

O velho sorriu mostrando seus dentes amarelados. Belatriz deu as costas e virou-se para o baú aonde vinha carregando a prataria que Draco trouxera de casa. Fechou-o.

- Este você levará consigo, até Paris, onde me encontrará dentro de quinze dias.- disse ela ainda calma.- E não tente ser esperto de forma alguma. Já matei pessoas maiores e melhores que você.

- Tu-tudo bem.- gaguejou o velho.- Mas e o outro?

Belatriz desviou os olhos para um segundo baú. Este era muito mais perigoso, para ela, que o primeiro. Continha todos os seus escritos desde que deixara Azkaban. Se alguém indesejado os encontrasse, descobriria todo o plano e através de Granger conseguiriam encontra-la ou até descobrir alguma forma de vence-la. Tinha que sumir com aquilo, mas não podia levá-los consigo.

- Há algo extremamente mortífero, aí dentro.- disse em tom ameaçador ao velho.- A única forma de me livrar disso seria destruindo, tacando fogo ou algo assim. Mas não tenho tempo.

- Levarei comigo e me livrarei disso se a Sra. assim desejar.- disse o velho entendendo.

- Você faria isso?- indagou Belatriz espetando seus olhos maléficos no velho.

- Pelo ouro.- disse ele erguendo a chave do cofre de Gringotes com sua muxibenta e trêmula mão.




****




Tonks e Gui saltaram das vassouras e atravessaram velozes o gramado de Hogwarts. A enfermeira preocupada os esperava no saguão de entrada.

- É uma punhalada bem profunda na altura do estômago.- informava ela.- Mas não é uma facada qualquer.

- O que quer dizer?- indagou Tonks pensativa.

- Só vi igual uma vez.- disse a enfermeira com os olhos levemente arregalados.- Faz mais de vinte anos. Lúcio Malfoy estava em seu sexto ano e se desentendeu com um aluno nascido trouxa pelos corredores, ele sacou um punhal e o atacou. Era de um metal mágico, como todo um arsenal que sua família mantinha em casa. O rapaz atingido passou alguns meses de repouso até que os pais o levaram embora de nós.

- Acha que alguém foi vingar a dita traição?- indagou Gui fitando Tonks.

- Me assustei ao identificar a causa do ferimento.- Prosseguiu a enfermeira ignorando a pergunta do rapaz ruivo. Já avistavam a porta da enfermaria, metros à frente.- Depois do episódio o ministério apreendeu todo o arsenal. Deveriam estar guardadas, e não sendo usadas por aí.

Gui e Tonks se entreolharam, a enfermeira empurrou a porta da enfermaria e os guiou até um cortinado semifechado. Draco Malfoy encontrava-se adormecido ali, sem camisa e com uma larga faixa enrolada na cintura. A fênix de Dumbledore em sua cabeceira.

- Ele não vai dormir por meses, ou vai?- indagou Tonks.

- A medicina bruxa evoluiu bastante nos últimos vinte anos, Ninfadora.- disse Madame Pronfey com um sorriso discreto de auto-aprovação nos lábios.

Tonks sorriu de volta e fitou o rapaz adormecido por algum tempo. Distraiu-se em seguida na Fênix. Até hoje não entendia bem o porque de Minerva acatar a sugestão de sua mãe de colocar aquela ave na cola do rapaz. Mas como já não se sentia capaz de entender sua mãe e o poder de persuasão que ela tinha sobre as pessoas, virou-se novamente para a enfermeira.

- Snape está?- indagou.

- Passou o verão pelas masmorras concentrado na tal poção.- disse a enfermeira após fazer que sim com a cabeça.

- Pode ir até lá por mim?- indagou Tonks.- E pedir que providencie um Veritaserum?

- Tudo bem.- disse a enfermeira antes de se retirar em obediência.

- Você sabe o que tem que fazer, Gui.- disse ela virando-se para o rapaz.

- Não estamos mais em uma “situação de emergência”, preciso de uma autorização para invadir o pub.- disse Gui. Tonks olhou pra ele com uma cara de “o que está esperando?”- Ok. Eu vou ao ministério cuidar disso. Quer algo mais?

- Sobre as armas, deixa que eu cuido.- disse Tonks.

Gui concordou com a cabeça e, depois de lançar um olhar inexpressivo à aurora, ele deixou a enfermaria. Tonks respirou fundo. Durante a primeira guerra, quando estava em Hogwarts ou segura em casa, ela sonhara em se tornar uma aurora. Apesar de seu jeito estabanado ela tivera sucesso e agora, ali estava ela, prestes a usar de seu agora influente nome em seu incansável trabalho.

Tonks caminhou calmamente até a sala da enfermeira, onde conseguiu pergaminho e pena. Escreveu uma carta rápida ao departamento e voltou então para o pé do leito de Draco Malfoy.

- É, garoto.- disse ela fitando-o.- Você consegui: está perdido!




****




- Hermione?

Hermione piscou e foi dar com Harry parado em sua frente. Sentiu-se ruborizar, estava em outro mundo.

- O que?

- Você está bem?- indagou Harry.

- Porque não estaria?- perguntou Hermione em resposta.

- Porque você está sentada aí faz horas com o olhar perdido.- disse Harry.

- Só estou cansada.- disse Hermione.

- Tem certeza?- indagou Harry parecendo não acreditar muito na garota. A verdade é que ele a conhecia a tempo suficiente para saber quando estava preocupada e mentindo para tentar esconder isso.

- Tenho sim.- disse Hermione antes de soltar um suspiro.- Draco sumiu.

- Eu sei.- disse Harry sorrindo de uma forma que não costumava sorrir, com crueldade.- Agora ele está perdido!

- Ele já reapareceu.- disse Hermione enquanto assistia uma expressão de decepção se formar no rosto de Harry.- Mas ninguém sabe por onde ele esteve.

- Tudo bem, mas de toda forma: porque acha que eu me importaria com isso, Mione?

- Eu não sei.- disse Hermione se levantando distraída.- Talvez porque é importante pra mim.

- Aonde vai?- indagou o rapaz.

- Eu também não sei.- disse Hermione deixando a sala de estar da casa dos Black.







Hermione deixou a lareira da cozinha da casa dos Tonks e limpou de qualquer jeito a fuligem da roupa. Sua cabeça doía tanto quanto se alguém estivesse tentando arrancar uma parte de seu cérebro fora.

Sem sequer se importar com a porta que levava ao porão, que hoje estava aberta, Hermione seguiu para seu quarto. Porém, mal alcançara o alto da escada quando ouviu um telefone tocar insistentemente. Parou.

O fato de um telefone estar tocando não a surpreendia nem um pouco. Estava acostumada a ouvir telefones tocando. Em sua casa, por exemplo, haviam seis aparelhos, instalados em diferentes cômodos, que tocavam centenas de vezes durante os verões que passara lá.

O que a paralisara no alto da escada, na realidade, era que um telefone estava tocando em uma casa de bruxos. Então uma idéia bizarra lhe passou pela cabeça e Hermione imaginou o Sr. Tonks usando magia indevidamente em um aparelho telefônico que agora não parava de tocar. Divertiu-se com a idéia até que ouviu passos atravessando algum cômodo lá em baixo, seguidos de uma voz masculina que atendia a um telefone.




****




- Residência dos Tonks.

- An? ALOU? ALOU, ALGUÉM ME ESCUTA?

- Não precisa gritar, Sr. Wulfric, aparelhos trouxas como telefones não exigem que o senhor gaste tanto a sua voz assim.

- Tonks?

- Sim?

- Como sei que é Tonks? Não posso vê-lo!

- Quem mais o chamaria de Wulfric, Aberforth?

- Meu irmão.

- Que foi morto, meses atrás.

Silêncio.

- Só me procuraria por um meio trouxa caso houvesse algo extremamente importante.

- E tenho algo.

- Informações... Coisas concretas...?

- Informações em forma de coisas concretas. Estava certo o tempo todo, Ted, ela queria a garota viva!

- Shiii. Nunca fale a respeito disso por meio de um aparelho telefônico. Irei a seu encontro até o fim da tarde.

- Só se for pra dar de cara com a sua filha.

- Os Aurores estão metendo o nariz em Hogsmead novamente?

- Fugi de madrugada com uma generosa quantia em meu nome num dos cofres de Gringotes.

- Andou se encrencando, Wulfric?

- Ela voltou. Trouxe um filho e mais tarde um sobrinho. O segundo talvez esteja morto a essa altura. Ela fugiu e mandou que eu fizesse o mesmo.

Silêncio. O homem que atendera ao telefone hesitou por um momento enquanto esticava o corpo pra frente e observava o cômodo ao lado, vazio para ele já que não percebera o vulto de uma garota no alto da escada.

- Procure Fletcher, ele saberá onde me encontrar.- E desligou.




****




Hermione, com a respiração afoita, encaminhou-se silenciosamente a seu quarto. Fechou a porta tentando não fazer barulho e encostou-se na mesma. Bichento saltou do parapeito da janela e veio se enroscar nas pernas da garota que repassava mentalmente tudo o que escutara

- Residência dos Tonks.

- An? ALOU? ALOU, ALGUÉM ME ESCUTA?

- Não precisa gritar, Sr. Wulfric, aparelhos trouxas como telefones não exigem que o senhor gaste tanto a sua voz assim.

-...

- Sim?

-...

- Quem mais o chamaria de Wulfric, Aberforth?

-...

- Que foi morto, meses atrás.

-...

- Só me procuraria por um meio trouxa caso houvesse algo extremamente importante.

-...

- Informações... Coisas concretas...?

-...

- Shiii. Nunca fale a respeito disso por meio de um aparelho telefônico. Irei a seu encontro até o fim da tarde.

-...

- Os Aurores estão metendo o nariz em Hogsmead novamente?

-...

- Andou se encrencando, Wulfric?

-...

Houve um silêncio maior em que o rosto do pai de Tonks apareceu por uma das portas que davam para a sala como se conferisse a presença demais alguém. Aparentemente ela não fora vista.

- Procure Fletcher, ele saberá onde me encontrar.

Era óbvio que não fora uma ligação normal que um homem nascido trouxa possa ter recebido. Não só Wulfric como também Aberforth eram nomes presentes na memória de Hermione, mesmo não lembrando onde os havia escutado antes.

A pior parte, porém, era que aparentemente a ação de aurores em Hogsmead não satisfazia o Sr. Tonks, mesmo sendo a filha dele uma Aurora. O tal Abeforth Wulfric parecia ter conseguido informações a que o Sr. Tonks queria muito e parecia estar sendo caçado por isso.

Mas havia ainda a terceira informação preocupante. “Procure Fletcher.” Aquele sim era um nome conhecido. Só havia um Fletcher no mundo, um ladrão de caldeirões que atendia também pelo nome de Mundungo e podia ser facilmente confundido com um monte de trapos ambulante.

A verdade, porém, é que aquilo tudo cheirava a intriga. E após conter o impulso primário de procurar alguém da Ordem e contar sobre o que ouvira, Hermione decidiu escrever a Harry e Gina perguntando se conheciam alguém chamado Abeforth Wulfric.




****




Tonks entrou em sua sala e foi assentar-se de costas para os pôsteres de Belatriz Lestrange. Gui, que já a esperava de pé a um canto, foi assentar-se defronte a bruxa de cabelos cor de chiclete.

- A resposta sobre o paradeiro das armas chegou.- informou Tonks

- E então?

- Em 1975, após o incidente com Lúcio Malfoy, o ministério fez uma batida nas propriedades da família do rapaz. Foram aprendidas dezenas de armas entre punhais, espadas, adagas e muitos outros derivados do tal metal. Seis anos depois, no primeiro ataque maciço de Comensais ao ministério, o arsenal desapareceu. Foi visto de novo cinco anos atrás. Um dos sombrios inquilinos da Travessa Trancoso as esteve escondendo pra alguém. O que importa é que a mente do homem foi alterada e ele não sabe por quem ele as escondeu. As armas estão em outro lugar agora.

- Cinco anos atrás.- murmurou Gui enquanto coçava o queixo pensativo.- Gina foi vítima de um artefato, pertencente a Você-Sabe-Quem. A lenda do Basilisco havia voltado à tona em Hogwarts, segundo me informaram. Mais uma vez Harry salvou o dia.

- Um episódio em que Hagrid chegou a ser preso e Dumbledore afastado?- indagou Tonks.

- Sim.- confirmou Gui.- Me lembro de ter ouvido que Harry acusou Lúcio Malfoy de fazer o artefato chegar à Gina. O que você acha?

- Que Lúcio Malfoy pegou as armas de volta depois de ter sua casa “revistada” cinco anos atrás.- disse Tonks monotonamente.

- Lestrange provavelmente deve levou as armas ao fugir dos domínios de Você-Sabe-quem.- concluiu Gui.

- Exceto que ela não fugiu de lá.- disse Tonks.

- Tem razão.- disse Gui.- Se essas armas tem valor, Você-Sabe-Quem não as deixaria sair de seus domínios...

- A menos que estivesse morto.- conclui Tonks arregalando um pouco os olhos.- Só que as ruínas da residência de Lúcio Malfoy foram minuciosamente vasculhadas e não havia nem cinzas de armas por lá.

- Eu sei. Mas será que entre o assassinar Dumbledore e Lupin ela não poderia ir até lá pegar as armas?- indagou Gui.

- Não daria tempo.- disse Tonks depois de pensar um pouco. Só se alguém estivesse lá, na hora da confusão para pegá-las. Alguém que soubesse onde encontra-las.

- Draco Malfoy?- arriscou Gui.

- Ele estava com Harry e os outros.- disse Tonks.- Apesar de ser o único provável.

Silêncio. Ambos considerava possibilidades durante algum tempo. Mas aquilo podia ficar para um pouco depois.

- Mas e sobre o pub?

- Abandonado.- informou Gui.- Provavelmente entre as quatro e seis da manhã. O dono pagou aos poucos funcionários o que os devia, despachou a todos e se mandou.

- Faz idéia do que o levou a fazer isso?- indagou Tonks.

- Tenho duas possibilidades. Ou alguém o pagou para fazer isso, ou ele está metido em alguma.- disse Gui.- E você sabe quem era o dono daquele lugar, não sabe?

- Sim. E sei também que Moody não vai gostar nem um pouco de saber que ele sumiu.- disse Tonks.




****




- É impressionante como Hermione sempre arruma “mistérios” para encher vossos verões, não acha?- comentou Gina após ler a carta da amiga.- Mas eu não faço a mínima idéia de quem seja Abeforth Wulfric.

- Moody me mostrou um Abeforth Dumbledore em uma foto da Ordem certa vez.- lembrou-se Harry.- E apesar de já ter ouvido o sobrenome Wulfric em algum lugar, não há como liga-lo ao irmão de Dumbledore.

- Não tenho muito que fazer além de tacar bombas de bosta no quarto dos gêmeos.- suspirou Gina.- Então vou passar a tarde na biblioteca e ver se descubro alguma coisa.

- Tudo bem.- disse Harry.- Vou fazer o mesmo, no fim do dia veremos o que encontramos e responderemos.




****




Hermione tomou um susto tão grande ao ouvir a campainha tocar que o livro que lia caiu no chão fazendo bichento assustar-se e sair correndo. Levantou-se pronta para descer e espionar, mas achou mais seguro não faze-lo.

Encaminhou-se então até seu malão, onde foi encontrar uma das velhas orelhas extensíveis de Fred e Jorge. Empurrou o cordão por baixo da porta e pôs-se a escutar.

-...É melhor entrar logo com isso.- disse uma voz, que ela reconheceu como a de Mundungo Fletcher, seguida pelo som de um objeto de peso considerável sendo arrastado e de uma porta sendo fechada.

- Não tive tempo de ler com atenção, mas o conteúdo parece interessante.- disse uma segunda voz a que Hermione não reconheceu.

- O que o leva a crer nisso, Wulfric?- indagou a voz que Hermione sabia ser do pai de Tonks.

- O rapaz passou uma tarde lendo isso. Quando ela chegou, ele estava pronto para ataca-la.- disse a voz de Wulfric.- Eles discutiram por algum tempo e então ela apareceu trazendo-o o desmaiado.

- Ela o atacou?- indagou a voz do pai de Tonks.

- Uma adaga na boca do estômago.- informou Wulfric.- Eu o deixei em Hogwarts e ela me deu uma boa quantia em galeões para que eu sumisse levando os baús.

- Eram mais de um?- indagou o pai de Tonks.

- Um deveria ser destruído e o outro entregue a ela em Paris dentro de quinze dias.- disse Wulfric.- O segundo está guardado na casa do lobisomem.

- Parece perfeito.- disse a voz do Sr. Tonks.

- Talvez essa seja a hora de você voltar a aparecer na ordem, Wulfric.- disse a voz de Mundungo.

- Não mesmo.- cortou o pai de Tonks.- Passarei todas as informações para Andrômeda e arquitetaremos uma emboscada para nossa querida Bela em Paris.

- É o que eu iria dizer.- concordou Wulfric.- Enquanto isso eu devo me esconder, afinal de contas sua filha está atrás de mim, Ted.

- Por coisas assim é que deveríamos levar tudo isso à Ordem.- insistiu Mundungo.

- Os pequenos acabariam sabendo.- disse Ted Tonks..- Inclusive a principal interessada, minha hóspede.

- Tem certeza de que ela não está em casa, Ted?- indagou Wulfric.

- Ela foi para a Ordem com Tonks ontem.- disse a voz do pai da própria.- De toda forma é melhor descermos.

Hermione ouviu os passos dos três homens atravessarem a casa, descerem uma escada e cessar. Puxou a orelha extensiva de volta e a jogou-a no malão. Sentia-se aliviada. O pai de Tonks não era um traidor e tampouco Wulfric parecia perigoso. De toda forma parecia que Draco chegara à Hogwarts ferido. Teve então vontade de voltar à ordem e procurar saber o que realmente ocorrera. Mas não queria, de maneira nenhuma, que percebessem que ela estava em casa. Passou o restante do dia em seu quarto, lendo.




****




- E então?- indagou Harry ao entrar na biblioteca e encontrar Gina ainda concentrada em livros.

- Grandes bruxos do século XIX.- leu Gina.- Hannah Wulfric, uma das primeiras bruxas a usarem uma penseira. Era casada e teve dois filhos. E você?

- Nada.- sorriu Harry meio sem jeito.- Procurou por Aberforth?

- Não há nada.- disse Gina.

- Estive pensando, talvez o cara seja trouxa...

- Com o sobrenome da inventora da penseira? ...Não mesmo.- disse Gina.- Procurei também sobre os filhos da tal Wulfric, talvez o nosso Wulfric pudesse ser neto dela, mas não há informações em lugar nenhum.

- Não poderia ser o próprio filho?- perguntou Harry mais por perguntar.

- Teria pelo menos uns cem anos.- disse Gina.- Podemos pedir a Moody para darmos umas olhadas nos livros dele.

- Ele tem livros aqui?- indagou Harry surpreso.

- Oras Harry, quanto tempo você já passou dentro dessa casa? Moody tem uma infinidade de livros amontoados em seu quarto.- disse Gina.

- Eu nem sei onde é o quarto de Moody.- disse Harry com simplicidade.

- Entrei lá uma vez. Fred e Jorge apostaram que eu não tinha coragem de deixar bombas de bosta por lá.- As orelhas de Gina de repente ficaram vermelhas.- Ganhei a aposta, mas Moody ficou tão irado que me obrigou a limpar tudo. Caso contrário lançaria maldições em mim.




****




- Tenho a poção, mas não acho que vá adiantar.- disse Snape.

- Porque não iria adiantar? Nada engana um bom Veritaserum.- disse Tonks.

- Convivi tempo suficiente com Belatriz Lestrange para saber que ela não abandonaria o garoto no castelo para conseguirmos obter informações dele.- disse Snape.- De toda forma não custa tentar.

- Quando poderemos usa-la nele?- indagou Gui.

- Madame Pronfey disse que ele já apresentou melhora suficiente.- disse Tonks.- Podemos fazer isso agora se quisermos.




****




- O que estão fazendo aqui?- rosnou uma voz vinda de uma sombra.

Os dois largaram os livros que seguravam e viraram-se para o dono da voz, envergonhados. Pelo tom da voz Harry concluiu que fora uma péssima idéia não pedir permissão para estar ali.

- Não andaram apostando novamente, andaram?- indagou a mesma voz, que pertencia a Moody.

- Estávamos...- começou Gina.

- Tentando descobrir algo sobre um tal Aberforth Wulfric.- despejou Harry antes de sentir o pé de Gina esmagando o seu.

Moody atravessou o aposento arrastando sua perna de pau até a janela, onde ficou observando a noite por algum tempo. Harry percebeu em seu rosto que ele além de conhecer o tal Wulfric, não tinha muita simpatia por ele.

- Aberforth Wulfric Brian Dumbledore.- murmurou Moody.- Onde aonde ouviram esse nome?

- Por aí.- atravessou Gina.

- Então não é importante.- concluiu Moody.- Agora, se puderem largar meus livros e darem o fora eu ficarei agradecido.

Harry e Gina se entreolharam e em seguida deixaram os livros por ali e saíram. Seguiram para o quarto de Harry.

- Você não devia ter falado.- disse Gina.- Eu ia inventar uma desculpa.

- Ao menos sabemos que o Aberforth de Hermione é o mesmo que eu já conhecia.- disse Harry.- Quer dizer, eu não o conheço, mas já o vi em uma fotografia, certa vez.

- O que será que ele fez?- indagou Gina.- Moody parece odiá-lo.

- Ele me disse que só o viu uma vez e que o achava esquisito.- lembrou-se Harry.- Mas não acho que o odiaria, ele pertencia à antiga Ordem.

- Uma vez na Ordem, sempre nela.- disse Gina.- Foi o que mamãe disse a Fred e Jorge certa vez para faze-los pensar melhor antes de quererem realmente participar.

- A menos que ele seja um traidor.- concluiu Harry.

- Já teríamos ouvido histórias.- disse Gina.

- Deve ser só certa antipatia, como Sirius tinha de Snape.

- Mas antipatia não vem à toa.- disse Gina.- E ele é irmão de Dumbledore, o mundo não pode simplesmente ignora-lo!

Harry raciocinou por um minuto. Gina tinha razão. Era praticamente impossível ser irmão de um dos maiores bruxos do mundo e passar a vida no anonimato.




****




Snape abriu um pequeno frasco e virou o seu conteúdo na boca do rapaz adormecido sobre um dos leitos da enfermaria. O rapaz tossiu após engolir o conteúdo do frasco, mas logo abriu os olhos e sorriu com uma expressão tranqüila. Snape olhou para Tonks que virou-se para Minerva, a última se aproximou da cama.

- Olá, Sr. Malfoy.- disse ela ajeitando os óculos quadrados.

Draco apenas sorriu em resposta. A enfermeira observava tudo com os olhos levemente arregalados. Gui permanecia afastado, os braços cruzados.

- Ficamos surpresos ao encontra-lo em nossos jardins na última manhã.- disse Minerva com a voz serena.- E também curiosos sobre o que o senhor estava fazendo aqui no meio do verão sendo que esperávamos que estivesse quieto em St. Mungus, com sua enferma mãe.

- Eu sei.- disse Draco sem emoção.- Eu não deveria ter saído. Mas eu tinha que ir lá conferir.

- Ir aonde? Conferir o que?- indagou Gui afoitamente. Minerva e Tonks lançaram olhares severos a ele por isso.

- Havia um cartão com o sangue do garoto, eu tinha que conhecer meu primo.- disse Draco.

- E conheceu?- indagou Minerva.

- Sim.- disse Draco sorrindo.- Eu cheguei lá, ele estava chorando sozinho, eu o segurei em meu colo e cantei para que dormisse.

- E que lugar é esse onde ele estava?- indagou Minerva calmamente.

- Eu não sei.

Minerva, Snape, Gui e Tonks se entreolharam.

- Tente se lembrar, Sr. Malfoy.- disse Snape.

- Eu não sei que lugar era aquele.- respondeu Draco.

- E como chegou até nosso jardim, o Sr. se lembra?- Indagou Minerva.

- Só me lembro de cair da cama.- respondeu Draco.- E de desmaiar.

- Quem lhe deu uma facada?

- Foi um punhal.- disse Draco.

- Fale mais sobre esse punhal.- Pediu Tonks.

- Vinte e três centímetros e o cabo em forma de cobra. Um dos que eu trouxe da casa do meu pai.- disse Draco.

- Quando você os trouxe, Sr. Malfoy?- indagou Minerva.

- No dia do incêndio.- disse Draco.

- Como você tirou as armas do seu pai de lá, Sr. Malfoy?- perguntou Tonks franzindo a testa.

- Eu as levei comigo simplesmente.- disse Draco.

- Havia mais pessoas com você, eu suponho.- atravessou Minerva.- Suponho também que elas tenham dito algo a respeito do seu “carregamento” de armas.

- Eles estavam preocupados demais com a Srta. Granger para se importarem comigo.- disse Draco.

- Mas eles viram você com as armas.- concluiu Minerva.

- Do contrário poderiam ser considerados um bando de cegos.- disse Draco.







- Como ele pode simplesmente não se lembrar?- indagou Gui desapontada.

- Não é obvio?- indagou Snape meio irritado.- A Comensal apagou partes de sua memória.

- O que não entendo é porque ninguém nos contou sobre as armas.- disse Tonks.

Gui concordou com a cabeça.

- Tonks, se eu não puder mais ser útil gostaria de voltar à Ordem para ter uma conversa com Gina, Harry e Hermione.

- Eu vou com você.- disse Tonks.- Mas antes preciso escrever aos aurores. Creio que fomos para a França tarde demais.

- Tonks.- interveio Snape.- Sobre a poção, acho que terei sucesso antes do fim do verão.

- Excelente.- disse Tonks antes de deixar a sala.




****




- Está uma delícia, mamãe.- disse Gina após provar da sopa de abóboras que a Sra. Weasley acabara de servir.

Harry, Fred e Jorge concordaram com a cabeça, as bocas cheias. A Sra. Weasley sorriu no momento em que a campainha tocou. Ela foi atender. Voltou alguns minutos depois com a cara trunfada e séria, acompanhada de Tonks e Gui, igualmente sérios.

- Fred e Jorge, venham comigo.- ordenou a Sra. Weasley.

- Pra...?- indagou Fred.

- Estamos jantando, mamãe.- disse Jorge.- Somos homens trabalhadores e precisamos de nos alimentar.

- O jantar pode esperar.- disse a Sra. Weasley mostrando que não estavam para brincadeira.

Fred e Jorge, reclamando, largaram da sopa e deixaram a cozinha. A Sra Weasley saiu logo em seguida, fechando a porta ao passar. Gina e Harry se entreolharam perguntando-se sobre o que estava acontecendo.

- Moody disse que estão atrás de Abeforth Dumbledore.- disse Gui sem rodeios.- Isso teria algo haver com o fato de não terem nos contado que Draco Malfoy levou as armas de sua família para a Comensal?

- O que?- foi o que Harry conseguiu responder.- Nós...- começou.

- Ouvimos o nome apenas.- atravessou Gina.- Fomos procurar informações sobre ele para tentar espantar o tédio. O verão parece não passar por aqui!

- Não venham com desculpas...

- Onde está Hermione?- atravessou Tonks.

- Foi pra casa pela manhã.- disse Harry.

- Porque não avisou a ninguém?- indagou Tonks.

- Vocês não estavam por aqui.- respondeu Harry.

- Ela disse que não estava passando bem.- interveio Gina.

- De toda forma ela estava desacordada, não poderia saber das armas.- disse Harry num impulso de defender Hermione de qualquer coisa que pudesse vir a seugir.

- E porque não disseram nada?- insistiu Gui.

Harry e Gina se entreolharam. Nenhum dos dois sabia o porque. Na realidade, Harry só se dera conta de que eles não falaram das armas agora. Mas o esquecimento do detalhe, de repente, o fez sentir-se culpado.

- Alguém foi morto por uma daquelas coisas?- perguntou.

- Draco Malfoy ganhou um rombo na boca do estômago.- disse Gui sem emoção.

- E-ele...- gaguejou Harry.- está bem?

- É o velho ditado, Harry.- disse Gui.- Vaso ruim não quebra.

- Mas ele resolveu contar algumas verdades e assim falou das armas.- concluiu Harry.

- Não exatamente.- disse Gui.

- Veritaserum.- informou Tonks.

- Então ele disse por onde andou.- sorriu Harry.

- Não necessariamente. E também não tentem desviar o assunto.- irritou-se Tonks.- Vocês ainda não apresentaram explicações.

- A única explicação é que estávamos muito atordoados para ligar pras armas.- disse Gina.- E não digam que não tínhamos motivos! Tínhamos acabado de provocar um incêndio, estávamos indevidamente fora da escola, carregávamos Hermione inconsciente, Harry sangrava sabe-se lá por onde e tínhamos acabado de receber socorro de uma Comensal da Morte!

- A verdade...- começou Harry ao concluir que não havia uma desculpa concreta praquilo.- É que nenhuma desculpa que dermos será convincente o suficiente simplesmente porque não existe um porque de não termos contado.

Harry sentiu um pisão de pé muito similar ao que sentira horas mais cedo no quarto de Moody. Começou a achar que teria que amputa-lo se continuassem naquele ritmo. Olhou para Gina, as orelhas da garota estavam muito vermelhos e ela parecia bem irritada.

- Eu sinto muito.- disse Harry.- O que vão fazer a respeito disso?

- Procurar as armas.- disse Gui.- E ver se há remédio para o esquecimento de vocês.

- Vou procurar mamãe e informar que você e Hermione não trabalham mais com ela.- disse Tonks de uma forma severa como Harry nunca vira antes.- Se não conseguem “viver livremente” sem meter o nariz nos assuntos da ordem é melhor que fiquem bem quietos debaixo de nossas asas. Isso quer dizer que passarão o restante do verão trancafiados aqui.

Gui concordou com a cabeça com a mesma expressão severa da outra. Harry e Gina nada disseram, não havia mais o quer dizer. Tonks respirou fundo e indicou a porta para Gui. Os dois seguiram na direção da mesma. Iam deixar a cozinha quando Tonks se virou novamente.

- Vou arrumar uma maneira de trazer Hermione para cá. E se acaso ela tiver “saído” até lá, vou saber que tem dedo de vocês dois nisso.- disse a bruxa.- E agora, já passou e muito da hora de vocês estarem na cama!




****




Hermione acordou assustada e se assentou na cama. Não se lembrava de quando se deitara em sua cama e adormecera, lembrava-se apenas que estivera lendo por horas a fio. Sua cabeça ainda doía. Talvez doesse mais do que naquela mesma manhã quando ela deixara a ordem e viera embora.

Já era noite, um vento fresco entrava pela única janela do quarto e fazia dançar a cortina amarelada que a emoldurava e à ausência de luz era apenas um corpo pálido e inquieto. Levou as mãos à nuca massageando-a a fim de aliviar uma dorzinha impertinente que a incomodava um pouco. Ouvia-se a respiração de Bichento em algum lugar.

Levantou-se e então notou, mesmo em meio à escuridão, que um novo baú fora colocado no quarto. Perguntou-se se aquele seria o mesmo baú que o tal Wulfric trouxera, mais cedo, ao pai de Tonks. Deu então um passo na direção do único candelabro que costumava iluminar o quarto, quando seus olhos recaíram sobre um outro par de olhos com um brilho alucinado que acompanhavam seus movimentos.

A primeira reação foi o pânico que lhe tomou todo o corpo. Seguido da racionalidade, que quase sempre a impedia de tomar atitudes precipitadas. Por último veio o instinto de sobrevivência que a levou a, com um movimento de mão, fazer sua varinha voar da cama até seu punho.

- Lumus!

A luz da varinha era muito fraca, mas naquele momento era suficiente para iluminar um homem de altura mediana, cabelos brancos e desgrenhados, roupas trouxas rotas (um suspensório só) e um ar desajeitado e genial que Hermione só vira antes em uma outra única pessoa no mundo.




****Continua****

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