Detenção





- Hermione!- chamou Harry enquanto caminhava apressado para alcançá-la.

Eles já estavam próximos à cerca da cabana de Hagrid agora. Hermione parou ali e se apoiou na cerca. Sentia ódio, muito ódio. Ódio dela própria, dos Sonserinos e do resto do mundo.

- Hermione!- repetiu Harry assim que alcançou a garota.

- O que foi?- perguntou ela irritada.

- Você...- começou Harry. Na verdade não sabia bem o que dizer. Não sabia sequer porque tinha ido atrás dela.- Eu...

Hermione se virou para Harry e o fitou com curiosidade. Ele parecia estar querendo dizer algo importante. Na realidade ele estava mesmo querendo dizer algo só que quando nem você mesmo sabe o que quer, fica praticamente impossível traduzir aquilo em palavras.

Harry e Hermione se olharam durante um minuto. Ele estava confuso e ela, apesar de irritada, se divertia com aquela estranheza de Harry. Não que aquilo fosse engraçado, mas garotos confusos geralmente fazem garotas nervosas rirem.

- Achei que você iria bater no Malfoy novamente.- disse Harry, finalmente, a fim de findar o silêncio.

- É, eu quase bati!- disse Hermione com simplicidade, estava mais calma agora.- Mas não cairia bem, sabe.

- Eu já estava pronto para segurá-la.- disse Harry.

- Por que?- perguntou Hermione. A pergunta não era a melhor a se fazer. Aliás, o momento não pedia pergunta alguma. Mas a possível resposta era algo tentador. Era algo que o ponto mais profundo do coração de Hermione precisava ouvir para ter coragem de se mostrar.

- Não sei.- mentiu Harry, sabia bem a verdade sobre porque ele iria segurá-la.- Acho que isto seria o certo a se fazer, não é mesmo?

- Você sabe bem que o Malfoy não é o tipo de cara que revida o tapa de uma garota com outro tapa.- disse Hermione com um sorriso amarelo.

- Você sabe bem que na verdade eu não queria vê-lo lhe beijando novamente.- disse Harry sentindo-se ruborizar.

- Eu sei?- perguntou Hermione sorrindo por dentro ao ouvir a resposta do jeito que ansiava ouvir.

- Sim.- Disse Harry.

Era algo definitivamente estranho estar parado próximo à cabana de Hagrid tendo conversas enigmáticas com Hermione, falando de algo que nem ele próprio sabia que existia. Na verdade ele até sabia, o difícil era admitir.

Se ele olhasse para o espelho de Ojesed naquele momento, veria Hermione dizendo: “Harry, você gosta de mim e eu gosto de você...”, mas como ele não tinha um espelho que lhe mostrasse a verdade sobre o seu mais íntimo desejo ele limitou-se a traduzir todas as suas dúvidas e medos em uma só pergunta tola.

- Você sempre sabe o que eu sinto, não é mesmo?

- Às vezes.- disse Hermione.- Agora mesmo eu não tenho certeza do que você está sentindo.

- Pergunte.- sugeriu Harry.

- Você sente ciúmes de mim, Harry?- perguntou Hermione fitando-o séria.

- Essa é uma das coisas que você sabe que eu sinto.- disse Harry decepcionado por aquela não ser a pergunta que ele esperava.

- Você não tem medo?- perguntou Hermione.- Digo: medo de eu saber que você sente mais do que eu deveria saber.

- Não.- disse Harry.- Eu confio em você.

- Então porque não me conta aquilo que vem escondendo desde o início do verão?- perguntou Hermione.

Harry desviou o olhar. Aquela pergunta estava mesmo demorando a ressurgir, ele devia ter notado. Talvez a solução mais simples para todos os problemas de seu coração fosse se abrir com Hermione. Mas sentia que aquele não era o momento. Aquele não era o lugar.

- Ah! Aí estão vocês!- disse Rony que vinha na direção dos dois.

- Vamos para aula de Hagrid.- disse Harry aliviado pela interrupção.

Rony olhou de Harry para Hermione e então concordou com a cabeça. Os três seguiram calados e logo se juntaram à turma de Sonserinos e Grifinorianos.

A aula sobre trasgos seguiu no ritmo normal de uma aula com Hagrid. O Gigante havia conseguido dois trasgos de mais de três metros de altura e levado a turma para vê-los em espécies de gaiolas na orla da floresta.

- Não são criaturas fascinantes?- disse ele.

Hermione olhou, no alto, a pequena cabeça do trasgo. Com um estranho frio na barriga ela se lembrou de seu encontro acidental com um trasgo, no banheiro feminino, no primeiro ano. Harry e Rony a haviam salvado.

Na verdade ela não conseguia enxergar nada de fascinante. A única coisa que sentia no momento era mal-estar pelo cheiro horrível que desprendia daquelas criaturas.

Ela desviou os olhos da cabecinha do trasgo para o outro lado do círculo que cercava a grande gaiola. Seus olhos acidentalmente encontraram com os de Malfoy, ele indicou os trasgos com os olhos e ele e Hermione fizeram idênticas caras de nojo.

No final das contas a única coisa a mais na aula foi o fato e que Malfoy não provocara de maneira alguma nenhum dos Grifinorianos.

- Ele está com medo!- disse Rony quando ele, Harry e Hermione seguiam de volta para o castelo.

- Não, Rony!- disse Hermione.- Pelo contrário. Ele só não é o tipo de garoto que sai por aí brigando com todo mundo.

- Vai defender o Malfoy agora, Mione?- perguntou Rony.- Quem vê você falando assim pensa que você esqueceu de todas as provocações que ele já nos fez.

- Você não entendeu o que eu quis dizer, Rony.- disse Hermione.- Você sabe qual é a coisa que o Malfoy mais quer nesse momento?

- Que todos nós explodamos?- arriscou Rony.

- Ele quer ser chefe dos monitores, Rony.- disse Hermione.- E ele sabe, tanto como eu, que para isso ele deve ter uma conduta exemplar.

- Como você pode ter certeza disso?- perguntou Rony.

- Ter uma conduta exemplar.- disse Hermione.- É o que eu estou tentando fazer. Foi por isso que dei as costas para a confusão antes da aula.

- Ainda acho que ele é um covarde!- disse Rony.

- Como você pode ser tão obsessivo?- perguntou Hermione acelerando o passo e logo sumindo de vista.

- Se eu sou obsessiva ela está louca!- disse Rony.- Ela está defendendo o Malfoy.

- Acho que ela só está querendo evitar que nós comecemos uma briga.- disse Harry assim que eles alcançaram a escada do saguão de entrada.

- Você contou a ela?- perguntou Rony.

- O que?

Rony olhou à volta como se verificasse que ninguém podia escutá-lo.

- Sobre a profecia.- disse quase que num sussurro.

- Não.

- Porque?- perguntou Rony.- O que ficaram fazendo lá por todo aquele tempo?

- Conversando.- disse Harry evasivamente.

- Resolveu se declarar pra ela?- perguntou Rony com um sorriso brejeiro no rosto.

- Já disse que eu não gosto dela.- disse Harry já sem a firmeza de antes.

Rony deu ombros.

- Quando será a sua detenção?- perguntou Harry para mudar o assunto.

- Hoje à noite.- disse Rony.- Na sala de troféus, e a sua?

- Estranho.- disse Harry.- A minha será amanhã.

Logo eles alcançaram o salão principal. Hermione não apareceu durante o almoço. Depois do mesmo, Harry e Rony foram à biblioteca procurá-la, mas ela não estava ali e nem no salão comunal.

Na verdade ela havia tomado o rumo de algum lugar onde ninguém a encontrasse. Precisava pensar. Que lugar era esse ela não sabia. Na verdade qualquer lugar servia e ela acabou entrando no banheiro da Murta-Que-Geme.

Ela gostava de Harry, agora ela enxergava isso perfeitamente. Na verdade ela descobrira isso graças aos trasgos. É que quando ela olhou a pequena cabeça do bicho ela sentiu novamente aquilo que sentira, fazia cinco anos, ao assumir a culpa do incidente com o Trasgo Montanhês para livrar a pele de Harry e Rony. Era aquela ânsia de protegê-lo.

Logo que descobriu que tinha os poderes de uma bruxa ela ouvira falar daquele garoto. “Ele existe!”, diziam as pessoas no beco diagonal no dia em que ela fora comprar seu material para o primeiro ano. “E a cicatriz está mesmo ali!”.

Ela passara o restante do verão pensando sobre como seria o tal garoto. Havia lido várias coisas sobre ele. Imaginava um garoto metido com uma horrenda cicatriz em forma de raio na testa que entrava bizarramente em contraste com o verde dos olhos que ele herdara da mãe.

Mas quando ela conhecera no trem, após saber quem ele era, ela logo descobriu que ele não era metido e tão pouco possuía uma horrenda cicatriz. Ele havia, logo de cara, despertado um sentimento maternal nela. Ela sempre descobria, sem querer, que ele e Rony iriam descumprir algum regulamento e quase se remoia de preocupações. E era por isso que ela chorava naquele dia das bruxas. Harry fora a única pessoa com a qual ela se identificara no primeiro momento em Hogwarts, e até então ele não dera a mínima para ela.

Só que agora ela sabia que aquilo já não era mais um simples sentimento maternal. As coisas haviam ficado mais sérias. Há bastante tempo, na verdade. O que antes eram inocentes fugidas da cama durante a madrugada acabou se tornando passeios por Hogsmead sem autorização.

Ela lembrava-se perfeitamente do juramento que havia feito durante a última tarefa no quarto ano. Quando o labirinto se silenciou, quando ela notou que havia algo errado ali ela prometera que se algo de errado ocorresse com Harry, se ele morresse, ela morreria também.

Agora ela sentia-se apenas idiota por não ter notado aquilo antes. Por ter perdido tanto tempo acreditando naquela coisa de que os opostos se atraem e de que ela e Rony eram duas metades, pois não eram.

Harry estava sentindo ciúmes dela, isso era claro para todos, mas será que era mero ciúme de amigo ou ele também havia percebido gostar dela?

Ela recapturou mentalmente os últimos acontecimentos. O brilho nos olhos de Harry durante a conversa próxima à cerca. Por um momento ela achou que ele se declararia.

- Como você é burra, Hermione Granger!- disse para si mesma se perguntando porque tinha que tocar naquele assunto. Mas pensando por outro lado sentia que não seria capaz de falar livremente com Harry sobre os seus sentimentos enquanto houvesse algo a esconder entre os dois.

- Veio tripudiar de mim?- perguntou uma voz esganiçada.

Hermione, que estava assentada a um canto do banheiro, ergueu os olhos e viu o fantasma da Murta- que- geme surgir por entre os boxes.

- Eu não queria incomodar.- disse Hermione com simplicidade.

No primeiro momento ela achou que Murta começaria um escândalo, mas a fantasma simplesmente desapareceu.

Mas, para complicar ainda mais tudo aquilo, havia uma coisa estranha, como um ímã, que parecia estar tentando atraí-la para Malfoy. Desvia-la de Harry a qualquer custo.

Tinha detenção àquela tarde, e ela sabia muito bem com quem seria.

“Uma detenção junto com Draco Malfoy!” Murmurou uma voz em sua cabeça. “Isso dará matérias para o Seminário das Bruxas durante um mês!”

Talvez devesse procurar McGonagall e dizer que ela não podia fazer uma detenção com Draco Malfoy, mas a professora perguntaria o porque e ela teria que responder: “É que eu estou me sentindo atraída por ele, mas gosto do Harry, não seria legal eu cair em tentação”, mas isso não era, definitivamente, a coisa certa para se dizer a uma professora.

Talvez Rony ajudasse. Talvez ele poderia fingir uma crise de ciúmes e procurar a professora para pedir que trocassem as duplas para a detenção, mas pedir isso pra Rony seria admitir que ela havia errado no veredicto sobre seus sentimentos. E por mais que Rony não gostasse dela, como ele dizia, ela não achava justo fazer isso com ele.

Mas tinha Gina, ela podia tentar.

Hermione sentiu alguma coisa molhada tocar sua perna. Ela se agachou assustada e olhou à volta. Murta-Que-Geme acabara de alagar o banheiro. Irritada ela se levantou e deixou o lugar. Logo estava seguindo para aula de poções, solitária.

- Hermione?!- chamou Harry ao vê-la se aproximar. Ele e Rony estavam esperando a sineta tocar na porta da masmorra de Snape.- Onde você estava?

- Por aí.- disse ela.

- Porque suas vestes estão molhadas?- perguntou Rony fitando-a curioso.

- Foi um acidente.- disse ela.- Vamos entrar?

Os garotos concordaram com a cabeça e a acompanharam masmorra a dentro. Logo os Sonserinos começaram a chegar e Hermione se concentrou em algum ponto perdido longe deles. Não queria se flagrar olhando para Malfoy.

E foi isso. Por causa de seu esforço para não olhar para Malfoy, Hermione acabou se distraindo mais que deveria e no fim das contas sua poção da juventude acabou ficando laranja ao invés de cor de rosa.

- Srta. Granger.- chamou Snape ao fim da aula.- Venha aqui, por favor.

Hermione ergueu as sobrancelhas em surpresa, mas obedeceu ao professor.

- Você viu a cor que ficou a sua poção final?- perguntou Snape crispando a boca.

- Sim senhor.- disse Hermione baixando o rosto.

- O que está acontecendo?- perguntou Snape.- Resolveu desonrar o nome dos Grifinorianos em poções de vez?

- Não senhor.- disse Hermione.- É que eu não estou me sentindo muito bem, sabe.

- Não quero saber.- cortou Snape.- Quero poções excelentes como sempre foram. Agora vá, creio que ainda têm aulas e uma detenção a cumprir.

Hermione concordou e deixou a masmorra seguindo para a sala de transfigurações o mais rápido que pôde.

- Professora McGonagall.- chamou Harry ao fim da aula.

- Diga, Potter.- ordenou a professora.

- É sobre as detenções.- disse ele.- Será que a Sra. Poderia trocar a minha para hoje à noite?

- De maneira alguma Potter.- disse a professora severamente.- Além de horários de detenções não serem algo negociável o Sr. tem oclumência daqui a uma hora com a professora Tonks.

É mesmo. Disse Harry para si mesmo antes de deixar a sala. Havia se esquecido disso. Ele desceu para o jantar e se reuniu a Gina, Rony e Hermione.

- McGonagall não quis trocar a minha detenção.- disse Harry desanimado ao se assentar.

- É, a minha também não.- completou Rony.

- Trocar?- perguntou Gina.- Por que?

- Para livrar Hermione de fazer detenção com Malfoy.- disse Rony.

- Que história é essa?- perguntou Hermione. Não sabia porque estava brigando, havia desejado inverter os horários de detenção, mas admitir isso seria admitir que Malfoy a atingira.

Harry olhou para Rony buscando uma idéia para explicação.

- É que não queremos ver você exposta ao Malfoy, Mione.- disse Rony.

- Vocês são ridículos!- disse Hermione se levantando e fitando os dois.- Pensam que eu sou o que? Aliás, quem? Posso muito bem me defender sozinha!

Harry olhou novamente para Rony buscando uma explicação mais convincente que a anterior. Este, por sua vez, fez sinal para que Harry explicasse.

Harry ergueu os olhos para Hermione. Sentia-se extremamente irritado com tudo o que vinha acontecendo. Os olhos dos dois se encontraram e mais uma vez ele encontrou aquele estranho vazio por trás do brilho selvagem nos olhos da garota.

Mas dessa vez ele descobriu algo sobre aquele vazio. Descobriu que o vazio tinha o exato tamanho dele próprio, Harry.

Ele tinha a boca semi-aberta, mas a fala simplesmente não saiu e ele a fechou novamente.

Hermione soltou um suspiro e deixou a mesa. Harry se levantou.

- Aonde você vai?- perguntou Gina.

- Vou atrás dela.- disse Harry.

- Não mesmo!- disse Gina.- Você tem oclumência, Harry. Deixa que Hermione sabe bem como se cuidar sozinha.

Harry olhou para o vulto de Hermione deixando o salão principal para o rosto de Gina e então para Rony. O último sorriu.

- Vocês precisam admitir que se amam logo!- disse ele.

Harry deu ombros. Sabia que Gina o observava, mas nem ligou. Tentou engolir alguma coisa e em seguida subiu para a sala de Tonks.


- Quero que a poeira dos livros da biblioteca desapareça antes das onze da noite!- disse Tonks por trás de sua mesa.- Sem o uso de Mágica.

- Isso é serviço para Elfos.- resmungou Malfoy que estava parado, a um canto da sala, de braços cruzados.

- Talvez você prefira ir lustrar troféus como as Srtas. Weasley e Parkinson, ou limpar os lustres das masmorras como o Weasley e Zambini.- disse Tonks.

Draco soltou um muxoxo de desprezo. Alguém bateu na porta.

- Entre.- disse a mulher.

Hermione se virou para ver o recém chegado e sentiu um frio na barriga ao ver Harry entrar.

- Vocês podem ir para a detenção agora.- disse Tonks.

Hermione concordou com a cabeça e se levantou. Malfoy segurou a porta para que ela passasse, mas ela simplesmente não conseguiu se mover.

Harry a olhava com uma cara de quem pede “não vá”. E ela realmente não queria ir.

- Eu não tenho a noite toda, Granger.- disse Malfoy.

Hermione de repente voltou a si e deixou a sala.

- Você tem certeza de que não há uma maneira de mudar essa detenção?- perguntou Harry assim que a porta se fechou.

- E porque eu a mudaria?- perguntou Tonks séria.

- Não parece muito lógico.- disse Harry.- Eles estão cumprindo detenção por causa da confusão causada pelo beijo que Malfoy deu na Mione. Eles estão cumprindo detenção juntos.

- Hermione sabe se defender melhor do que você pensa, Harry.- disse Tonks.- Mas o que acha de começarmos a oclumência? Você tem praticado?

- Sim.- respondeu Harry evasivamente.

- Então esvazie sua mente e me avise quando pudermos começar.- disse Tonks se levantando.

Harry, que ainda estava de pé mais ou menos no centro da sala, a observou caminhar até um quadro novo na sala. Então, com uma leve surpresa, ele percebeu que aquilo era o mapa do maroto.


****


- O que eu fiz pra merecer isso?- perguntou Draco quando Madame Pince deixou-os a sós na biblioteca com espanadores de pó nas mãos.

- Nasceu?- arriscou Hermione enquanto se dirigia à primeira carreira de livros.

- Oh! Que engraçado.- disse Draco em tom de sarcasmo enquanto tirava a gravata do uniforme e se dirigia para o fundo da biblioteca.

Na realidade ele queria manter certa distância de Hermione. O ato de beija-la, que antes fora uma brincadeira ou provocação, agora era uma tentação. E ele era Draco Malfoy, e um Malfoy não sente vontade de beijar uma sangue ruim.


****


- Podemos começar?- perguntou Tonks se virando.

Harry piscou assustado. Havia se distraído.

- Po- podemos.- disse ele tirando a varinha do bolso e tentando se concentrar.

Tonks se posicionou diante dele que espremeu os olhos tentando esvaziar a cabeça. Mas isso não foi fácil. O que ele mais queria naquele momento era ficar grudado no mapa do maroto, observando atentamente os movimentos na biblioteca.

- Legilimens!

Harry observou uma garota entrando pela cabine do trem. Ela tinha os cabelos castanhos muito cheios e os dentes da frente levemente maiores que o normal. Mas de repente ela sumiu e no lugar dela surgiu outra garota, entrando pela porta da mesma cabine. Esta era mais velha, uns cinco anos ao menos, e estava mais bonita.

Harry agora via Hermione parada ao lado da cerca da cabana de Hagrid conversando com ele. Mas sabia que tinha que voltar. Tinha que fechar sua mente. Ele se concentrou ao máximo. Tinha que expulsar Hermione dali. Como, não sabia, mas tinha que conseguir!

- Protego!- ele sussurrou e Hermione sumiu dando lugar a um rapaz de cabelos longos e ruivos. Ele vinha caminhando até uma garota de cabelos lilás e os dois começavam a dançar. Tocava um sucesso antigo das Esquisitonas.

- Chega!- disse Tonks.

Harry abriu os olhos e viu que estava de volta na sala da professora. Tonks parecia levemente desconcertada.

- Aquele era Gui Weasley!- riu Harry.

- Aquela era Hermione Granger!- retrucou Tonks, mas ela não ria.- Pensei que tivesse praticado.

- Eu pratiquei!- disse Harry.- É que não deu tempo de esvaziar a cabeça. Deixe-me tentar novamente!

Tonks consentiu com a cabeça e se virou novamente para o mapa.


****


- Malfoy!- Chamou Hermione.

Draco que limpava a mesma prateleira que Hermione, porém alguns metros à frente, ergueu o rosto para ela.

- O que você tanto quer com um Elfo?- perguntou ela.

- Exatamente aquilo que você imagina.- respondeu ele sem sorrir antes de voltar sua atenção para os livros.- Porque está me perguntando isso?

- Nada.- disse Hermione enquanto voltava a espanar os livros também.- Jogando conversa fora.

Seguiu-se um curto minuto de silêncio em que Malfoy lutou com todas as suas forças para não fazer aquilo que queria fazer.

- Você tem namorado, Granger?- perguntou Draco.

- Não.- disse Hermione estranhando a pergunta.- Porque?

- Jogando conversa fora.- respondeu Malfoy.


****


- Vamos lá.- disse Tonks.

Harry se preparou.

- Legilimens!

Harry não fez o feitiço escudo, mas talvez por sua mente estar realmente fechada, talvez por um motivo desconhecido, o feitiço de Tonks o atingiu e voltou violentamente contra ela própria que foi atirada contra a parede.

- Tonks!- disse Harry enquanto corria até a mulher caída no chão.

- Eu estou bem, Harry.- disse ela no meio de uma careta. Havia um filete de sangue escorrendo de seu cabelo.- Como você fez isso?

- Eu não sei.- disse Harry enquanto a ajudava a levantar-se.- O feitiço veio e voltou.

Tonks tentou soltar Harry, mas pareceu sentir certa dor que a impedia de ficar em pé sozinha.

- Acho que quebrei alguma coisa.- disse Tonks.

- Vamos para a Ala Hospitalar.- disse Harry guardando sua varinha no bolso e ajudando Tonks a caminhar até a porta.


****


Hermione limpava agora a última prateleira. Pelo canto dos olhos ela via, mais à frente, Draco Malfoy cuidando de seu trabalho. Era uma figura bonita, sobretudo.

Draco de repente se virou para olhar Hermione. Ela desviou o olhar, mas nem por isso ele deixou de fitá-la. Era uma figura bonita, sobretudo.


****


- Duas costelas quebradas.- informou Madame Pronfey.

- Eu realmente sinto muito.- disse Harry sem graça.

- Acalme-se, Potter.- disse a enfermeira enquanto se distanciava.- Acidentes como esse acontecem.

- Eu realmente não sei como fiz aquilo.- disse ele para Tonks, que estava assentada em um dos leitos da Ala Hospitalar.

- Aposto que não foi a primeira vez.- disse Tonks amavelmente.- Você é um grande bruxo, Harry, é muito mais poderoso do que imagina. Pessoas como você às vezes se descontrolam.

Harry pensou por um momento. Já havia feito mágica involuntariamente antes. Quando tinha treze anos, por exemplo, ele inflara a Tia Guida até ela quase explodir, mas naquela ocasião ele fizera isso por estar nervoso.

- Realmente não é a primeira vez.- disse finalmente.- Mas da outra vez eu fiz mágica involuntariamente por estar nervoso.

- Mas hoje você estava nervoso.- disse Tonks.

- Não, eu não estava.- disse Harry com firmeza.

- Tem certeza?- perguntou Tonks.- Tem certeza de que nada o aflige profundamente nesse momento?

Harry não respondeu.

- Ela sai da biblioteca em dez minutos.- disse Tonks piscando para o garoto.

- Acho que você pode ir pra cama, Potter.- disse a enfermeira que estava de volta.

- Era exatamente o que eu estava dizendo a ele.- disse Tonks.

Harry se levantou calado e saiu da enfermaria. Era isso mesmo que iria fazer. Seguir para a biblioteca e encontrar Hermione.


****


- Acabamos.- disse Hermione largando o espanador de pó sobre a mesa. As luzes da biblioteca se apagaram repentinamente como se isso fosse um aviso para que eles fossem para suas respectivas casas.

- Ainda acho que isso seja trabalho para Elfos.- resmungou Draco enquanto depositava seu espanador, também, sobre a mesa.

- Como você é fresco!- disse Hermione enquanto apanhava sua varinha e a guardava.

Draco fez cara de pouco caso e continuou a dar um novo laço em sua gravata.

- Pode me passar a minha varinha, Granger?- perguntou ele em tom arrogante.

Hermione apanhou a varinha do garoto sobre o balcão da biblioteca e a esticou, mas foi uma daquelas situações em que a pessoa que entrega o objeto o solta antes que a pessoa que iria receber consiga segura-lo.

Draco observou a varinha bater no chão com um baque surdo.

- Oh! Obrigado!- disse Malfoy.

Hermione, meio sem graça, se abaixou e apanhou a varinha. Quando se ergueu novamente acabou encontrando o rosto de Malfoy muito mais perto do que deveria estar.

- Aqui está.- disse posicionando a varinha entre o seu próprio rosto e o de Draco.

- Esqueça a varinha.- disse ele antes de arranca-la da mão de Hermione e a jogar novamente no chão.

Silêncio.

Por alguma razão inexplicável os dois permaneceram imóveis. Hermione e Draco tinham mais ou menos a mesma altura, por isso, com a ajuda da luz da lua que entrava pela janela, Hermione podia ver os olhos cinzas de Draco muito de perto.

Devem ter se passado cerca de cinco minutos e nenhum dos dois se mexeu. Ao jogar sua varinha novamente no chão, Draco pretendia beijar a garota novamente, achou que ela tivesse entendido isso, mas como ela não deu sinal ele mudou de idéia.

Hermione por sua vez havia, sim, notado a pretensão de Draco. Mas como não podia cair em tentação e nem queria sair dali ela ficara quieta. Sentia um formigamento estranho nas mãos como se quisesse puxa-lo para mais perto pela gravata com o nó tão bem dado. Mas não ia faze-lo. Não podia. Lembrou-se de Harry e da conversa entre os dois pela manhã. Ele não queria vê-la sendo beijada por Malfoy novamente. Mas ele não apareceria ali, estava treinando oclumência na sala de Tonks.

Finalmente Draco desviou e se abaixou para apanhar a varinha novamente, mas quando se ergueu foi a sua vez de encontrar Hermione ainda mais perto do que deveria. Sem pensar duas vezes ele a puxou pela cintura e a beijou.

Novamente Hermione sentiu aquela espécie de choque percorrer todo seu corpo, seu sangue parecia circular tão depressa nas veias que de alguma forma seus joelhos ameaçaram ceder. Isso parou o beijo.

Draco olhou atento pra ela, mas ela sorriu.

Talvez Hermione devesse parar, mas aquilo era bom. Ela olhou pra trás e viu um pedaço de parede vazio ao lado da porta da biblioteca. Ela puxou Draco pelas vestes até ali e no segundo seguinte os dois estavam novamente grudados pelos lábios.


****


Harry alcançou a porta da biblioteca e estranhou ao encontra-la aberta e com tudo escuro lá dentro. No primeiro momento ele imaginou que algo de errado havia acontecido. Por isso ele sacou a varinha e entrou.

Estava tudo vazio e mal iluminado pelo luar. Mas então ele ouviu um barulho de coisa molhada. De sobressalto olhou pro lado.


****


Eles se beijaram ali, encostados na parede da biblioteca, durante vários minutos. Havia se esquecido de quem eram, do que gostavam e não gostavam, aliás, de quem gostavam e não gostavam e de tudo o mais. Só queriam ficar ali, se beijando daquela maneira.

Mas então, sem querer, Hermione piscou um dos olhos. Isso foi o suficiente para identificar alguém que não devia estar ali.

- Harry!- murmurou ela.

Draco parou o beijo de sobressalto. E olhou para o lado. Não havia ninguém ali.

- Harry!- repetiu Hermione antes de empurrar Malfoy para longe e sair correndo.


****


Harry deu as costas para os dois e saiu disparado pelo corredor. Ele devia ter imaginado. Porque ela fazia aquilo com ele?

Ele olhou pra trás e viu que Hermione vinha correndo atrás dele. O quadro da mulher gorda logo surgiu a sua frente.

- Chifre de unicórnio!- disse Harry.

- Que pressa é essa garoto?- perguntou a Mulher Gorda.

- Chifre de unicórnio!- repetiu Harry e em seguida ele atravessou o buraco do retrato.

Sentia vontade de atirar coisas contra a parede. Era isso que faria. Ele olhou por todo o salão à procura de algo que fosse quebrar estrondosamente, mas a única coisa, ou melhor, a única pessoa que havia ali era Gina.

Harry viu o buraco do retrato se abrir novamente.

- Harry?- perguntou Gina que a poucos minutos havia chegado de sua detenção.- O que aconteceu?

Mas Harry não respondeu. Ao invés disso ele correu até Gina e a beijou.

Hermione assistiu a cena parada ao lado do buraco do retrato. O que antes era uma ânsia de alcançar Harry e explicar que a cena que ele acabara de presenciar não significava nada pra ela, se transformou em uma raiva aguda e uma vontade de atirar o garoto pela janela.

Hermione deu as costas para os dois e ganhou novamente os corredores desertos. Mal o buraco do retrato se fechara e Gina empurrou Harry pra longe.

- Porque você fez isso?- perguntou ela ruborizando violentamente.

- Você não gostou?- perguntou Harry.

- Eu...- Gina parou.- Harry! Você sabe muito bem que eu estou com o Dino Thomas.

- E...?

- E você não fez isso por vontade própria.- disse Gina.

- Quem garante?- perguntou Harry.

- Todos sabem que você gosta da Mione!- disse Gina.

- Eu nunca disse isso!- disse Harry ficando irritado.

- Tem coisas que não precisam ser ditas!- disse Gina.- Qualquer pessoa que conheça vocês dois é capaz de notar que um gosta do outro! Agora me responda: Porque você fez isso?

Harry perdeu a fala. Limitou-se a fitar Gina. Um horrendo sentimento de culpa tomou conta dele.

- Me desculpe.- disse Harry se assentando cabisbaixo.

- Me conte.- disse Gina.- O que aconteceu de tão grave entre você e a Mione?

Harry respirou fundo e ergueu o rosto. Os olhos castanhos de Gina eram doces e amigáveis. Talvez ele precisasse ouvir conselhos de uma outra garota. Principalmente se tratando de conselhos de uma amiga de Hermione. Acabou narrando o flagra para Gina.


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