Destino forjado

Destino forjado



Resumo do cap. anterior – Seis meses se passam desde que os exilados se instalam na casa de Mestre Lao. A troca de mensagens é permitida pela primeira vez. Mas Harry e Gina não escrevem cartas um para o outro, gerando um clima ruim. Gina fica abalada com a falta de notícias e mal presta atenção ao que acontece ao seu redor. Draco aproveita a situação e lança a maldição Imperius sobre a coruja da família Weasley. Enciumado, ele decide que irá interceptar a correspondência da garota, impedindo que o casal se reaproxime. Harry se sente tão desprezado que a fúria toma conta dele. Destrói o que encontra no caminho e se depara com a entrada da caverna do velho dragão. Ele consegue chegar até a criatura mágica e pede meios de localizar Belatrix. O dragão lhe fala do Labirinto e ilude o rapaz, fazendo-o crer que está diante de sua inimiga. O ódio de Harry o faz atacar a imagem de Belatrix, que se ri dele, intensificando o sentimento do rapaz. O que o bruxo não sabe é que seus golpes se refletem numa barreira encantada e o atingem. Ferido, desmaia. É salvo pelo dragão que o devolve aos amigos. McKinley e Lao têm uma conversa: além da aura de Harry estar maculada, algo o deprime fortemente e o torna mais suscetível à ação das trevas.










Gina entrou afobadamente em seu quarto. Fazia quase um ano que vivia melancólica devido ao silêncio que existia entre ela e Harry. De repente, do nada, sua mãe revelara algo importante que trouxe um grande alívio para seu espírito. Numa conversa sobre o curso de auror que começaria dali a alguns dias, a senhora Weasley comentara que isso a fazia lembrar do jovem bruxo. “Ah, minha querida, naquele dia em que ele se foi fiquei tão preocupada. Fiquei logo que vi o Harry subindo as escadas com a cara carregada. Ele estava tão transtornado que mal ouvi o McKinley contando o que aconteceu em Nephasta. O homem falava e falava e eu, longe. Pensando no que o Harry estava fazendo no quarto. E no final eram as malas”, suspirou, enquanto preparava o almoço. Quando captou o sentido dessas palavras, Gina deixou escapar dos dedos o folheto sobre o curso que estivera lendo. “Mãe, tem certeza do que acabou de dizer?”, perguntou, recolhendo o papel com o coração aos saltos. A senhora Weasley estranhou a questão, mas respondeu assim mesmo. “Tenho, claro. Lembro direitinho. O Harry tinha subido para o quarto na hora em que o seu professor passou a explicar tudo, como vocês chegaram até aquele lugar horrível, o que vocês fizeram... Ora, ora. Você acha que ele ainda não sabe dos detalhes? É bem capaz. Se o Rony não contou, o Harry não sabe”, acrescentou, com uma ruga na testa. A mulher, porém, deu de ombros e voltou sua atenção para uma fileira de legumes que picava com um toque da varinha.

- Errol! – chamou Gina, colocando a cabeça para fora da janela do seu quarto.

A coruja não tardou a surgir. Entrou voando pelo quarto e aterrissou sobre a escrivaninha, espalhando objetos e papéis. Isso não incomodou a garota. Descobrir que Harry não a tinha compreendido, afinal, acendia uma esperança em seu peito. “Lógico que ficou bravo com a história do pingente. Ele não sabia que eu tinha usado as mechas! Eu teria ficado doida no lugar dele”, pensava enquanto escrevia num pergaminho. “Que droga! Por que destruí os pingentes?! Sou uma besta mesmo”, recriminou-se, mordendo os lábios. Esclarecido o engano, imaginava, voltariam às boas. Era só nisso que sua cabeça se concentrava. Continou escrevendo sob o olhar curioso de Errol.

- Você vai levar uma carta para o Harry. Junte àquela que já te entreguei e que é para o Rony. Não tenho idéia de onde você guarda todas as mensagens, mas, por Merlin, não vai perder esta aqui, hein?! – disse, incisiva. - Nossa! Amanhã, o correio vai estar aberto. E amanhã ele faz 19 anos. Ah, Errol, leve logo as nossas cartas e depois traga as respostas. Eu queria tanto uma resposta... – divagou.

Errol deixou o quarto e pousou numa árvore por instantes. Piscou os olhos e alçou vôo de novo. Atravessou campos e cidades até que se aproximou de uma mansão instalada nas cercanias de Londres. Estava afastado dos vizinhos por um belo bosque. A coruja atravessou a copa das árvores, quebrando galhos e arrebentando algumas flores. Suas manobras desajeitadas foram logo percebidas por um rapaz de cabelos platinados que corria pelo bosque. Assobiou e Errol desceu sem pestanejar, caindo aos pés do jovem.

- Os Weasley bem podiam ter outra coruja – resmungou para si. Ergueu Errol e viu uma carta presa em suas patas. – Ah, muito bem, Errol. Cumpriu o seu papel. Aguarde aqui.

Draco quebrou o lacre do pergaminho. A visão da letra arredondada de Gina teve o poder de despertar seus ciúmes. Mas o conteúdo foi pior. “Oi, Harry. Como vai? Eu estou bem, dentro do possível. Mentira. Não estou nada bem. Sinto muito a sua falta. Muito, muito, muito. Gostaria de ter escrito antes, mas achei que você ainda deveria estar com raiva de mim. E te ver com raiva de mim me machuca muito. Harry, sei que fui dura com as palavras um ano atrás, mas é porque eu não entendia a sua braveza quando falei do pingente. Parecia que você estava me atacando sem motivo. Só que agora eu sei o que aconteceu. Houve um grande mal entendido. Meu pingente estava vazio! Eu usei as mechas para te encontrar. Foi isso. Hoje, conversando com minha mãe, descobri que você não estava na sala quando o McKinley contou isso. Pode confirmar com ele o que aconteceu. Eu fui boba de jogar o pingente. Não deveria ter feito isso. E nem ter acabado com tudo. É que eu estava tão chateada com aquilo e também triste com a sua raiva. Se eu soubesse desse nó, teria me segurado. Porque você já estava sofrendo com tudo e até acho compreensível que você tenha explodido naquela hora. Não foi justo comigo, mas tudo bem. Posso relevar agora. Também quero reforçar que nunca fiquei contra você. Nunca! O lance da Belatrix foi impulsivo. Como poderia ficar contra alguém que eu amo? A verdade é essa: eu ainda te amo. Não sei se faço bem em escrever estas coisas. Mas é que não agüento mais esse silêncio entre nós. Por favor, me escreva e me diga se finalmente me entendeu. Um beijo cheio de saudade. Sua Gina”.

- Maldição! – berrou. E amassou o pergaminho disparando ao mesmo tempo uma série de palavrões. – Eu bem que desconfiava que esses dois tiveram algo. Mas isso não vai ficar assim. O Potter vai ficar sem carta!

Draco reduziu a bolota amassada a cinzas e despachou Errol de volta para a Toca. “Se houver outra carta, não falhe. Traga-me aqui!”, espumava.




*****




Harry estendeu o braço, fazendo com que a ponta de sua espada branca tocasse o solo, coberto de folhas e flores das árvores dos arredores. Seus sentidos estavam aguçados. Olhava fixamente para sua oponente, aguardando por um movimento dela. Com 15 minutos de duelo, sua respiração estava acelerada. Não era um desafio qualquer. Tinha de diante de si a melhor esgrimista que vira em ação. Mei afastou uma mecha de cabelos do rosto com uma leve sacudida da cabeça. Ela também estava absolutamente concentrada. Acabara de desferir um golpe que fora repelido com uma energia fora do comum. Nem Rony, nem Jin seriam capazes de fazê-la saltar para trás como saltara devido ao impacto das forças contidas nas espadas. A garota não imaginara que o choque das lâminas iria produzir uma reação mágica tão violenta. E, no entanto, Harry permanecera no mesmo lugar. “É dele que vem essa energia. Ele a controla”, pensou, enquanto planejava o que fazer. Apertou os lábios. Era o momento.

Mei, que estava com a arma branca erguida numa linha reta, desceu a mão rapidamente para trás e depois para o lado, descrevendo um semicírculo. Com uma série de golpes fez as folhas se ergueram numa “tempestade” de cores difusas. Harry engoliu em seco. “Ela vai tentar me enganar, como da vez passada. Tenho de esquecer a visão”, disse para si. Rony tinha alertado o amigo que a garota gostava de criar efeitos de ilusão para distrair o adversário. Folhas e flores voavam com velocidade, porém de modo gracioso, como se acompanhassem um fio encantado. Não conseguia mais distinguir a figura esbelta de Mei. As roupas cinzentas se perderam no caleidoscópio colorido produzido pela magia da jovem chinesa. Harry fechou os olhos por um segundo. Para vencê-la, só se estivesse 100% alerta. Então, ouviu passos ligeiros esmagando folhas. Eram leves, mas o som foi suficiente para mostrar-lhe de onde vinham. Captou o ruído surdo de uma pisada mais forte. “Está saltando”, foi o que teve tempo de raciocinar. Num movimento cruzado do braço, desferiu um jato de luz com a espada contra o chão, dando-lhe o impulso necessário para executar uma cambalhota no ar, de costas. Jogou suas pernas para o alto, dobrando-as para escapar ao ataque de Mei. A garota surgiu do meio da folhagem e tentou atingi-lo na curva descendente que descrevia. Mas o pulo de Harry o afastou do perigo. O rapaz sentiu a lâmina passar perto de sua pele. Quando os dois tocaram os pés no solo, quase ao mesmo tempo, o bruxo foi mais ágil. Num giro do corpo, desarmou Mei com um golpe que atirou a espada da jovem para longe. E Harry tocou o queixo de sua adversária com a ponta de sua varinha transfigurada.

- Touché – murmurou, com a respiração entrecortada.

Mei abaixou os olhos, derrotada.

- Você me venceu, Harry. É o melhor de todos nós – disse, num tom humilde, mas com um sutil tremor na voz.

- Não, não sou. Você é a melhor espadachim de nós quatro. Disso eu não tenho dúvida. É que desta vez eu estava bastante atento – replicou Harry, colocando sua espada na bainha.

- Bravo! Foi um desafio incrível. E parabéns, Harry. Não lembro mais quantos desafios aconteceram entre a gente. Mas você precisou de um ano inteiro para conseguir bater a Mei. O que eu nunca vou conseguir – comentou Rony, aproximando-se com Jin.

- Eu também não tenho condições para isso. Por enquanto. Mas se passar mais tempo com você, Harry, pode ser que eu me aperfeiçoe só de ver seu progresso – brincou o jovem chinês.

Mestre Lao, que estava sentado sobre uma pedra, sorriu.

- Você já superou muitas coisas nesse período, Harry. E Mei não se lamente. Sua técnica é uma das melhores que já pude pressentir. Apenas recorde-se que você estava enfrentando um bruxo forte. Treine, Mei. Continue treinando.

- Sim, mestre – respondeu a garota e se afastou, sendo seguida por Jin.

O velho espadachim levantou-se ainda sorridente. “Ele está bem. Quase recuperado. Agora é com McKinley”, refletiu. Pegou seu cajado e começou a seguir os passos de seus discípulos. “Encontro vocês no jantar, rapazes”, declarou antes de descer a colina rumo à sua casa. Rony puxou da mochila uma garrafa de água e a ofereceu para o amigo, que a bebeu com vontade.

- Não é fantástico?! Você superou a Mei. Nunca pensei que esse dia fosse chegar.

- Devo isso em parte a você, Rony. Lembrei do que você disse sobre os truques de ilusão dela. Agucei meus sentidos, exatamente como você me orientou. Consegui perceber a hora que ela pulou e de que lado vinha. Isso foi incrível!

- Eu te avisei, cara. Todas as vezes que você perdeu foi porque confiou apenas num sentido. Já eu perdi sempre para ela porque não sou tão bom com a espada.

- Será que a Mei vai ficar muito chateada?

- Ela está um pouco triste porque a gente vai embora – disse Rony, olhando a garota, já um ponto distante, com a bela cabeleira negra balançando ao vento. – Tomara que o Jin a anime um pouco.

- Ele está se esforçando para atrair a atenção dela. Mas você é inesquecível – alfinetou Harry, devolvendo a garrafa e sentando-se no chão atapetado de folhas e flores. – Já são quantas as tentativas da Mei ficar com você? Três?

- Você não deveria brincar com esse tipo de coisa. Só porque você não se interessa por ninguém isso não te dá o direito de rir dos outros.

- Não estou rindo. Respeito todos aqueles que amam e não são correspondidos. Só quis tirar sarro da sua cara – respondeu com seriedade. Deitou-se na grama, olhando para o céu limpo. – Gostar de alguém e não ter perspectivas é horrível.

- Pode apostar – emendou Rony, colocando a mochila nas costas e imaginando o que Hermione faria naquele verão. – Vamos? Tenho de terminar as minhas cartas.

- Claro que você já escreveu a da Mione...

- Vai continuar me enchendo o saco com essa história?! Bom, já escrevi. E daí? E você? Quando vai escrever para alguém? Se você se apressar, dá tempo de terminar pelo menos uma mensagem antes do jantar.

- Já te disse. Não vou escrever. Você é o encarregado de relatar a nossa situação – afirmou, mantendo o olhar nas alturas, pensando na única pessoa para quem realmente desejava escrever. – Pode ir. Eu vou ficar aqui mais um pouco e curtir minha vitória.

Rony não esperou mais. Pegou o caminho para a fazenda, deixando o amigo deitado na grama, mirando o céu. Harry inspirou fundo. No dia seguinte, faria aniversário e completaria um ano de exílio. Aquele período com Mestre Lao o ajudara a colocar as emoções em ordem. Mas ainda assim sentia uma pontada no peito todas as vezes que lembrava de Gina. “Quando eu vou esquecer? Quando vou deixar de sentir dor?”

Harry permaneceu quieto por bons minutos, observando as nuvens tomando conta do espaço e as cores tingindo o céu. O sol se punha. Uma tristeza aguda invadiu seu peito. Terminava um ciclo, porém não tinha como voltar para casa. “Que casa? Eu não tenho nenhuma”, lamentou-se. Fechou as pálpebras. Queria deixar sua mente em branco para poder descansar. Aprendera com Mestre Lao a meditar, mas havia momentos em que isso era simplesmente impossível. Tentou relaxar. Inspirou fundo. E simplesmente adormeceu, cansado que estava dos treinamentos.

Em seu sonho, uma moça de cabelos ruivos parou diante dele. Surpreso, Harry levantou-se de um salto. Não sabia o que fazer com as mãos e nem o que dizer. Engoliu em seco. Ela abriu um sorriso maroto.

- Você tem algumas folhas presas na roupa e uma florzinha no cabelo. Ficou muito... fofo! – riu.

O rapaz bateu na roupa com as palmas das mãos. Tirou a flor e ajeitou os fios escuros. Empurrou os óculos para o alto do nariz. Mas não articulou palavra alguma. Um bolo estava formado na garganta. Gina avançou dois passos para ajeitar a gola da camisa de Harry. Depois, deslizou seus dedos pelo tecido, esticando o pano e acariciando levemente o peito do bruxo. Ele suspendeu a respiração brevemente e, então, segurou os dedos delicados, prendendo-os entre os seus.

- Faz tempo que eu não ligo para minha aparência – comentou, sentindo-se imediatamente idiota pela frase pronunciada.

Gina retirou a mão. Suas pupilas, entretanto, se mantinham atentas ao rosto do jovem. Harry teve a sensação de que o calor aumentava.

- Não precisa se preocupar com isso. Você está bem. Parece mais forte, mais alto, mais senhor de si. Mas seu olhar está tão mais triste. Por que isso? Você não triunfou sobre a Mei?! Harry, faz tempo que você queria...

- O que eu mais queria era te esquecer. Só que não dá. Ainda não superei o que aconteceu entre a gente.

- Superar significa me apagar de vez da sua memória?

- Significa não sentir mais dor quando pensar em você.

- E você precisa fazer isso? – perguntou a garota, fingindo que arrumava outra parte da camisa do rapaz, cujo nervosismo aumentou.

- Bom, você quis destruir os pingentes... – começou, com o estômago dando voltas. Gina estava perto demais, o que provocava seus sentidos e mexia com seu corpo.

- Quis porque você me deixou aturdida. Brigou comigo de um modo tão pesado. Foi uma reação... de defesa, quase. Depois da batalha, da intensidade da luta, das emoções todas, eu não estava preparada para sua raiva. Foi demais para mim – respondeu, afastando-se com uma expressão magoada.

Harry foi atrás da ruiva. Percebia que, de fato, exagerara na dose. Finalmente, se dava conta disso. Ela estivera o tempo todo do lado dele. Não devia ter sido tão virulento, mesmo ferido por dentro.

- Gina, eu não estava no meu melhor momento. Na verdade, eu não tinha cabeça para mais nada. E não tinha mais controle sobre minhas emoções. Por Merlin, me desculpe por ser tão cabeça-dura e orgulhoso.

A moça se virou para ele. Aparentava calma, porém o tremor do lábio inferior denunciou o que estava passando.

- Ok. Até compreendo e perdôo. Mas se fosse só isso. Você nem me escreveu. É para eu entender essa atitude como o fim de tudo mesmo, né?! Você não sente mais nada de bom por mim...

- Não! Eu não queria sentir mais porque isso me machuca. Você está longe e não se interessa mais por mim. E isso dói fundo, corta, sufoca. Só que eu não consegui diminuir nada do que está aqui, no meu peito. Não escrevi porque meu orgulho foi mais forte. Seis meses atrás eu ainda não estava bem – desabafou.

- E agora? – perguntou timidamente.

- Agora eu consigo perceber os erros. Não queria te magoar... – e afagou o rosto dela. Emocionado, aproximou-se mais dela. – Não quero mais te ferir. Perdão. Mais uma vez, perdão.

Gina sorriu e seus olhos brilharam. E Harry a beijou com carinho. Abraçaram-se e ficaram assim, por minutos, contemplando o fim do dia. Repentinamente, gotas de chuva atingiram o casal. O bruxo segurou o rosto da garota entre suas mãos.

- Reparou como vira e mexe a chuva nos pega no meio do caminho? – brincou, antes de trocarem um outro beijo.

As gotas engrossaram e despertaram Harry do sonho. Ergueu-se e secou a lente dos óculos. O coração estava leve. E as mãos quentes. Como se tivessem tocado, de fato, o rosto amado. “Gina”, murmurou com a voz rouca. Desceu a colina pouco ligando para o aguaceiro que caía do céu. Tinha uma carta para escrever.




*****




Draco Malfoy entrou em seu quarto e tratou logo de tirar a camisa italiana que estivera usando durante um jantar em Scottville, a vila dos bruxos em Londres. Estivera num jantar de famílias puro sangue em que o assunto mais debatido fora a morte de Lorde Voldemort. Fazia um ano que ele sucumbira ao poder de Harry Potter e ninguém sabia do paradeiro do bruxo. Também não se sabia por onde andava Belatrix Lestrange, a feiticeira mais caçada pelo Ministério da Magia. Uma senhora muito velha e coberta de jóias suspeitava que Harry tivesse sofrido uma grave seqüela já que sumira. “Depois de ele ter derrotado Você-Sabe-Quem não haveria quem não quisesse se aproximar dele. Harry Potter pode não ser puro sangue, mas sei que minha neta não se importaria com isso”, declarou entre um gole e outro de champanhe. “É isso que ele está evitando, minha querida. Não quer ser empurrado para o casamento, sendo tão jovem. É hoje o solteiro mais cobiçado do nosso mundo”, rebatera outra mulher, uma loura que assinava a coluna social do Profeta Diário. “Pois eu não sei por que você diz que ele é ‘o solteiro mais cobiçado’, Candy. Francamente, meu filho é muito mais bonito e elegante”, inchara Narcisa Malfoy. Àquela altura, Draco se afastara da roda de senhoras. Estava tão irritado que reagira mal quando Pansy Parkinson se aproximou para perguntar como ele estava. Rosnara qualquer coisa e se isolara num canto, bebendo sozinho. Por isso, assim que se viu em seus aposentos, despiu-se imediatamente como forma de apagar da memória aquela noite.

- Potter, é sempre o maldito Potter! Potter isso. Potter aquilo. Quero que ele morra.

Tinha colocado um roupão para tomar banho e levou um grande susto. Dois olhos redondos e brilhantes seguiam seus movimentos. Soltou um palavrão cabeludo.

- Errol! Seu cretino! O que faz aqui? – urrou. Então, viu um pacote de mensagens preso numa das patas da coruja da família Weasley. – Você trouxe alguma carta para a Gina? Deixe-me ver.

Com um gesto brusco, arrancou o pacote e viu duas cartas para Gina. Uma vinha de Rony e não falava nada demais. A outra era de Harry. Draco fez um esgar e engoliu a raiva para poder ler a mensagem antes de rasgá-la em mil pedaços. “Gina, minha adorada Gina, acabo de sonhar com você. E foi maravilhoso te reencontrar, mesmo que só na imaginação. Neste ano, vim tentando negar meus sentimentos. Estou sofrendo demais por causa do nosso afastamento. Só que eu, orgulhoso, não procurei entender o que tinha acontecido. Julgava-me o único ferido. Fechei-me e, egoísta, não quis te ouvir. A gente rompeu naquele dia por minha culpa. Acredito nisso agora. Eu estava transtornado e não consegui perceber o óbvio. Você fez tudo por mim. O melhor que você podia. Aquilo em que acreditava. Eu estava muito machucado por dentro e criei uma barreira para não ser mais machucado. Fui muito infantil. Atitude de moleque que pensa que o único ser importante no mundo é ele, e somente ele. Perdão por tudo isso. Não fui maduro o suficiente para controlar minhas emoções e olhar a situação de cima. Falhei, como falhei tantas vezes. Você não tem culpa de nada. Desculpe-me, por favor”. Draco bufou e pensou, com ódio, que ela jamais iria perdoar Harry simplesmente porque a garota não receberia o pergaminho. Amassou o papel, sem compreender o que deveria ser desculpado. Como não atinava com a resposta, prosseguiu a leitura. “Tem mais uma coisa que quero dizer. Gina, você está cravada em meu coração. Nunca conseguirei te tirar daqui, mesmo me esforçando bastante. É mais fácil derrotar Voldemort do que te esquecer. É isso. Ainda te amo. Ainda lembro do seu perfume, do seu jeito de andar, da sua voz, do seu sorriso, de cada uma das sardas que beijei, de cada pedacinho da sua pele que toquei. E ainda tenho os pingentes. Eu os resgatei do fogo. Não poderia ver algo tão simbólico para mim arder até o fim. O meu, eu carrego até hoje. O seu, se quiser eu o devolvo. Assim como gostaria de entregar o que te pertence eternamente: meu destino. Responda-me para saber o que faço da vida. Um beijo na boca que tanto adoro. Harry”.

- Você é um cão sarnento e piegas, Potter – resmungou, enquanto picava a carta e atirava os restos num cesto do quarto. – Seu destino? Ráá! Seu destino é o lixo. Pode ir, Errol. E não se esqueça. Nenhuma mensagem chega para a Gina sem passar por mim. E nenhum recadinho dela sai sem que eu leia antes!

Draco entrou debaixo do chuveiro, procurando se acalmar. Mas socou a parede, com fúria. “Por que eu tenho de gostar dessa garota?! Deve ser alguma maldição. Inferno! Só que eu não vou deixar o Potter ganhar desta vez. Ele não vai tirar a Gina de mim. Vou ficar com ela e vai ser a minha vitória mais importante. Já sei o que fazer”, maquinou. E sorriu com o plano que acabara de bolar.




*****




Antes de bater à porta do quarto de Rony, Mei ficou indecisa. Estava com suas malas prontas para voltar para sua cidade. Mas não queria sair de férias sem falar com o rapaz o que gostaria de dizer. Por outro lado, a garota sabia que suas chances eram reduzidas. Ele não parecia disposto a se envolver com ninguém mais que não fosse Hermione Granger. Ciente disso e mesmo se sentindo desiludida, tomou coragem.

Rony abriu a porta para Mei com um ar de espanto. A garota estava com os olhos baixos.

- Entre! Já é tarde, mas entre.

- Vim me despedir de você.

- Mas a despedida não é amanhã de manhã? Pensei que fôssemos tomar café juntos.

- Acho melhor ir embora antes que vocês se levantem. Não gosto de “adeus”. E deste eu vou gostar menos ainda.

O rapaz pigarreou. Entendia o que ela queria falar.

- Para mim também é difícil a despedida. Foi um ano muito importante na minha vida. Conhecer você, o Jin e o Mestre Lao foi fantástico. Eu me sinto um ser humano melhor. E um bruxo mais capacitado.

- É mais triste para mim porque eu te descobri e agora vou te deixar. E porque não consegui tomar o lugar dessa moça. Ela realmente te conquistou.

- Ei, quer chá? Biscoitos? – desconversou.

- Vim dizer que você precisa dizer para ela tudo o que sente. Não é justo que você não conte isso e a prive da felicidade.

Rony ficou vermelho.

- Escuta só. A Mione está bem. Na carta que ela me mandou, falou de como se saiu bem no primeiro ano do curso de medibruxaria. Foi tão bem que ganhou do namorado um anel “ma-ra-vi-lho-so”. Ela não precisa de mim para ser feliz. Já tem o Vitinho.

- Você fica nervoso porque gosta dela de verdade. Tem ciúmes e acho que foi isso que ela quis provocar. Não concordo com a tática. Mas deu certo. Você deveria ter contado o que sentiu – respondeu Mei, com o coração contraído.

- Não tem mais jeito, Mei. O correio fechou. A próxima carta só daqui a seis meses. E eu não quero me preocupar com isso. Mas por que estamos falando disso? Isso não é legal... – murmurou, constrangido de ver como a jovem estava branca.

- Não gosto de te ver sofrendo. E é uma maneira de treinar meu domínio sobre minhas emoções. Não quero fugir de fantasmas. Então, resolva-se com sua amiga. Se um dia você concluir que não há solução para vocês e que pode tentar a felicidade ao lado de outra pessoa, lembre-se de me procurar – sorriu.

- Você não existe, garota – disse Rony, abraçando-a por minutos. – Se o Harry tivesse a metade desse domínio que você tem, a vida seria mais fácil...

- Você brinca, mas ele melhorou bastante.

- Isso é verdade. Só que agora o sujeito está tão fechado quanto uma ostra. Eu não sei o que acontece com ele. Parece que levou uma pancada na cabeça. Não fala, não come, não treina.

- Talvez ele tenha ficado chateado com alguma das cartas.

- Imagina. Ele só recebeu da minha mãe e da Mione. E eu li as mensagens para ele. O cara não queria nem se dar ao trabalho de ler. Está o maior preguiçoso do universo. Não quer sair do quarto. Ok, eu sei que a gente vai embora daqui dentro de mais uma semana e vai para um lugar totalmente desconhecido. Só que isso não é o fim do mundo.

- É quase – replicou Mei, com os olhos marejados. – Rony, sei que vou sentir muito a sua falta. Você estará sempre no meu coração.

- Mei, se eu não tivesse alguém, teria agora. Não esquecerei de você – disse, também emocionado.

- Siga meu conselho. Adeus – despediu-se, apertando a mão do rapaz com força.

- Seguirei. Você é um anjo. Adeus – e fechou a porta, assim que soltou a mão da jovem. Rony se deitou pensando em como era curiosa a vida. Ele, apaixonado por uma garota do outro lado do mundo, quando poderia ter alguém apaixonado bem pertinho de si.




*****




Hermione Granger tinha acabado de aparatar no Beco Diagonal. Trazia nas vestes uma lista de ingredientes que precisava comprar para suas aulas em St. Mungus. Vinha se dedicando tanto ao curso para se graduar como medibruxa que esgotara o material que dispunha em casa. Aproveitava a ocasião para se encontrar com Gina. Olhou de um lado para o outro na rua onde estava instalada a loja de Fred e Jorge. Nada da garota ruiva. Resolveu entrar.

- Ora, ora. Se eu fosse o McKinley diria que quem é vivo sempre aparece.

- Olá, Fred.

- Jorge!

- Ah, um dia eu vou aprender...

- Brincadeira. Sou eu, o Fred. O Jorge está de folga hoje. A Alicia está querendo arrastá-lo para o altar e tem inventado as desculpas mais mirabolantes para precisar da ajuda dele. Acredita que ela disse sua casa foi invadida por fadas mordentes?

- Eu não sabia que o Jorge e a Alicia Spinnet estavam juntos – espantou-se Hermione.

- Faz tempo que a gente não se vê. A última vez foi no aniversário do Harry do ano passado. Lembra-se? – perguntou, com um sorriso debochado. – Falando nele, o cara é danado mesmo. Não escreve para ninguém!

- É. Nem para mim. Mas eu continuo escrevendo para ele mesmo assim. Ainda bem que o Rony avisou todo mundo que o Harry tomou essa decisão, senão a gente ia ficar com a cara no chão.

- Como será o trabalho do Rony, além de ficar escrevendo cartas em nome do Harry? Será que ele tem de limpar estábulos, lavar roupa, passar, lustrar varinhas?

- Não tire sarro dele. Sei que o Rony está dando duro como assistente do McKinley. Nas cartas que eu recebo dele, o que mais tem é “fiz isso, fiz aquilo”.

- Ele podia escrever coisas bem mais interessantes para você – interrompeu uma voz feminina.

Gina e Hermione se abraçaram. Fred pediu licença para atender um cliente e as duas resolveram sair para tomar um café. A ruiva estava animada com o início do curso de auror. Era excitante estudar em Londres. Era ótimo ser tratada como adulta. Hermione sorriu. Também se sentia nas alturas com suas aulas em St. Mungus. Como não podia deixar de ser, os pensamentos convergiram para a dupla que estava distante.

- Pelo que eu entendi da carta do Rony, eles devem mudar para outro lugar dentro de alguns dias. Se é que não mudaram já – observou Gina, um tanto pálida. “Páre de pensar nele, já! Esqueça! Esqueça”, repetiu em sua mente.

- É. Eu escrevi para o professor Dumbledore, naquelas de descobrir mais um pouco. Só deu para apurar que o McKinley tinha programado mudanças para diversos lugares para que o Harry e o Rony pudessem ser preparados em culturas diferentes. Deve ser bem legal isso – respondeu Hermione, num tom melancólico. E emendou. – Sinto falta deles.

Gina mexeu na xícara. “Pelo menos, você recebe cartas do Rony”, refletiu, amargurada. Disfarçou a tristeza.

- Um dia eles voltam. Quem sabe no dia em que a Belatrix for capturada pelos aurores. É nisso que tenho pensado ultimamente. Até conversei com a Tonks sobre isso.

- Você acha? Está tão difícil pegar essa mulher. Sinceramente, acredito que só o Harry...

- De jeito nenhum – cortou a ruiva, ligeiramente alterada. – Nem que seja eu a responsável pela captura dela. O Harry tem de ficar longe da Belatrix.

- Por que? A magia do Harry está cada dia mais poderosa. O Rony falou disso. Para ele, dentro de mais alguns anos, o Harry vai ser tão bom quanto o próprio Dumbledore. Tem noção do que isso representa?

- Não é isso. É só que... – atrapalhou-se, pensando na profecia de Cassandra.

- Tem algo que queira me contar, Gina? – inquiriu, com o olhar desconfiado.

- Nada. Era só um palpite. Intuição feminina. Ahn, é que eu... eu gostaria de ser a responsável pela prisão da Belatrix. Eu, mais ninguém. Confesso! – acrescentou, ficando vermelha.

- Entendi. Isso seria realmente muito bom para a sua carreira como auror, Gina. Não que você necessite de reconhecimento. Desde Nephasta, você ganhou a admiração de alguns bruxos do Ministério da Magia. Eu estou sabendo disso.

- Pois é. Também soube. Nem acreditei nisso quando o Draco me contou...

- Peraí. Você disse Draco? Draco Malfoy?

- Olha, Mione, antes que você começa a pensar em bobagem juro que não tenho nada com ele. É que o Draco tem sido um bom amigo. No primeiro dia do curso, quando eu saí do metrô...

- Metrô?

- Eu ainda não tenho autorização para aparatar. Quando fizer 18, estarei livre.

- Sei. Continue – afirmou, ainda estranhando a inclusão de Draco na conversa.

- Quando eu saí do metrô, encontrei o Draco. Ele falou que fazia questão de me acompanhar até a porta do Ministério. Claro que eu respondi que não precisava. Mas achei simpático da parte dele, sabendo que ingressar no curso de auror significa bastante para mim. Tudo bem. Não vou comentar a sua cara. Sei que ele mudou. Não é mais aquele sujeito nojentinho de Hogwarts. Pode continuar fazendo careta. Eu mesma não estava acreditando na transformação dele. Bom, o Draco me acompanhou até a porta e lá encontrou algumas pessoas que ele conhece. Quer dizer, o pai dele conhecia no passado. Daí, ele me apresentou para essas figuras, gente que está no Ministério há um tempão. E foi então que eu soube dessa história.

- Quem é essa gente, Gina?

- Diretores de departamentos que nem importam...

- É lógico que você lembra que o Lúcio Malfoy tinha informantes em vários lugares.

- Eu lembro. Mas eu conferi com meu pai. São diretores metidos. Querem ser mais do que são e por isso gostam de quem tem dinheiro e poder. Meu pai falou que são inofensivos.

- E seu pai sabe que foi o Draco Malfoy quem te apresentou?

- Uhum. Não tenho motivos para esconder. Já disse. Não tenho nada com ele. É só mais um amigo.

- Veremos – observou Hermione, intrigada.

- Agora me fale de você. Como vai seu namoro com o Vítor?

- Vai indo. Ele está numa fase que quer um compromisso... ahn... um compromisso...

- Ele quer casar? – arregalou os olhos.

- Não é bem isso... Quer dizer, eu tenho até medo... Casamento? – atrapalhou-se. – Eu sou bem nova. E ainda estou estudando...

- Mione! E... e é só isso que te impede? – perguntou Gina, pensando em Rony.

A moça derrubou a xícara vazia. Inspirou fundo.

- O que mais teria?

- Talvez seus sentimentos não estejam de acordo com o casamento – arriscou-se. – Caso eu esteja enganada, perdão.

- Eu não sei – disse, hesitante. – O que você acha que eu devo fazer?

- Se eu fosse você, escreveria para seus amigos e pediria um conselho.

- Estou falando com você e você é minha amiga – comentou, ainda perdida.

- Eu me referia ao Rony. E ao Harry, obviamente – corrigiu-se rapidamente. Quando pronunciou o segundo nome, sentiu um aperto no peito. “Aquele bruto insensível. Aquele idiota sem-coração”, pensou, agoniada. Mas se controlou – Experimente contar isso na próxima carta. E veja qual é a reação.

- Do jeito que o Harry está desligado do mundo, vai me dar parabéns – suspirou Hermione. – E o Rony? Ahn, você acha que ele vai responder alguma coisa... hummm... útil, talvez?

- Mione, qual a resposta que você gostaria de obter? – inquiriu Gina, cruzando os braços e lançando para a jovem um olhar decidido.

- Quero apenas uma resposta sincera.

- Então, seja sincera com você e exponha sua dúvida para o Rony. E diga com todas as letras que você quer sinceridade. Isso se você realmente abrir seu coração.

- Às vezes, Gina, você me assombra. Eu fico até pequenina perto da sua coragem – respondeu Hermione, olhando para o horizonte, sentindo que sua vida estava numa balança. O que pesaria mais, no final das contas?




*****




Harry dobrou a última camisa e fez com que a peça entrasse em sua mala. Com um estalo, poderia fazê-la se fechar. Deu de ombros. Estava sentado no chão, vendo suas roupas e seus objetos já guardados. Seu ânimo estava reduzido a zero. Sacou a carteira do bolso da calça jeans. Abriu um compartimento e de lá retirou uma fotografia. Olhou para ela. Passou delicadamente o polegar sobre um dos cantos. Viu pela enésima vez a garota ruiva correr a se esconder da lente indiscreta do fotógrafo. Tinha a impressão de que ela se escondia dele. “A falta de resposta é uma resposta”, murmurou. Arremessou a foto para o alto e com a ponta do dedo a guiou até se alojar num dos vãos da mala. “Melhor ficar aí. Não tenho motivos para te deixar na carteira. Não mais”, prosseguiu. Dobrou as pernas, apoiou a cabeça nos joelhos e ficou assim por longos minutos. Ao se levantar, os olhos já estavam secos. Podia enfrentar a sala. Fechou a mala e a arrastou por magia atrás de si.

- Ah, você está aí. Vou abrir um portal no alto da colina, meu jovem. Anotei neste papel as coordenadas para o nosso novo destino – declarou solenemente McKinley.

O velho professor vestia uma roupa esportiva trouxa e tênis. Harry estranhou a indumentária. McKinley tinha mania de andar aprumado. Nunca usava nada tão informal como aquilo.

- Esse visual tem a ver com o lugar para onde vamos?

- Muito bem, Harry. Um bom auror tem de se esforçar para entender todas as pistas que surgem.

- Sem desfazer do Harry, professor, não é preciso muito cérebro para isso. O senhor nunca usa tênis – interrompeu Rony, com as mãos enfiadas nos bolsos das calças.

- É verdade, Rony. Você também é muito perspicaz.

- Estão todos prontos? A caminhada será boa. A temperatura de hoje é uma das melhores dos últimos anos – comentou Mestre Lao, carregando consigo o cajado que o ajudava a subir a montanha.

Os quatro bruxos deixaram a casa. E os malões seguiram atrás. Pichi e Edwiges estavam em suas gaiolas. A caminhada foi silenciosa. Estavam próximos ao ponto onde iriam desaparatar no momento em que começou a subir ao céu uma coluna de fumaça branca. Rony foi o primeiro a notá-la.

- O que é aquela fumaceira?

Harry ajeitou os óculos, mas antes que respondesse o chinês se antecipou.

- É o velho dragão. Ele nos chama.

- Uau, mestre. Gostaria de saber como consegue fazer isso sem ter visão.

- Rony, você tem grande habilidade sensorial. Por isso, foi quem avistou a fumaça primeiro. No meu caso, eu sou conhecedor deste terreno. Então, deduzi que a região seria a da caverna – sorriu. – E, além disso, o velho dragão se comunicou comigo telepaticamente. Mas isso é um detalhe. Vamos, Harry. É com você que ele quer falar.

- Err, que droga! – soltou Rony. - Eu ficaria feliz se pudesse dar uma olhada nele. Paciência. Bom, professor, quer ensinar para seu humilde assistente aquele truque com as cartas de baralho trouxa?

Rony e McKinley ficaram para trás, enquanto Harry seguia os passos seguros de Mestre Lao. Era de se admirar a maneira segura como o velho caminhava. O rapaz ficou surpreso de vê-lo materializar, na entrada da caverna, uma pequena balsa para transpor o rio. O chinês subiu na embarcação e fez um gesto com a mão para que Harry fizesse o mesmo. Em seguida, ele estalou os dedos e a balsa começou a subir o leito. Perto da cascata, Lao ergueu as duas mãos para o alto e as águas se levantaram como um elevador, carregando-os para o poço. O dragão logo os viu e lançou fogo sobre tochas presas na parede, iluminando o ambiente. Harry estava espantado com a facilidade de chegar à moradia da criatura mágica.

- Mestre Lao, foi o dragão que te ensinou esse caminho? Ele desarmou as armadilhas? Viemos tão tranqüilos.

- Não. Ele não desarmou as armadilhas. Elas estão dispostas por toda a caverna, exceto no rio. Este caminho eu fiz na primeira vez que aqui entrei. O velho dragão me respeitou porque eu optei pela simplicidade, em vez de perder tempo enfrentando perigos, como a maioria dos jovens faz.

- Ah, claro – respondeu, sentindo-se envergonhado por ter feito exatamente o que os outros fariam.

A balsa estacionou numa margem e os dois homens saltaram da embarcação. Lao curvou-se respeitosamente e o dragão inclinou a cabeça em resposta. Confuso, Harry colocou sua mão no cabo da espada e tombou seu corpo ligeiramente para frente.

- “Então, você está de partida.”

- Estamos. Eu, meu orientador e meu amigo.

- “Já sabem para onde vão?”

- Tenho as coordenadas comigo, mas confesso que não sei o que elas significam. Ainda não sei fazer esse tipo de leitura.

- “Perguntaste a respeito do Labirinto?”

- Sim, só que não tive respostas completas. Não sei onde ele fica, por exemplo.

- “Posso te dar outra experiência. Melhor do que a anterior. Eu mostrarei a entrada do Labirinto e você poderá se orientar.”

Harry olhou com a atenção para as pupilas amarelas do dragão. Virou o rosto para encarar Mestre Lao, porém o homem aparentava estar alheio ao diálogo.

- “Ele não pode entender nossa conversa. Assim como você não entende a que estou tendo com ele neste momento.”

- Você, então, lê mesmo as mentes.

- “Não preciso disso. Eu interpreto as atitudes. Leio as entrelinhas. Vocês, humanos, se expressam por gestos e expressões, mesmo sem perceber. Voltando à pergunta anterior, quer a ilusão da entrada do Labirinto? Isso de alguma maneira poderia facilitar um encontro com Belatrix Lestrange.”

O rapaz apertou o cabo da espada.

- Obrigado, mas não. Eu não estou preparado para esse tipo de coisa. Ainda não atingi o equilíbrio. E num lugar desses o equilíbrio é absolutamente necessário.

O velho dragão expeliu fumaça pelas narinas. Semicerrou os olhos amarelos.

- “Tem certeza de que é isso que quer?”

- Sim. Total. Preciso me aprimorar no controle das minhas emoções. Não estou 100%. E tenho a impressão de que ainda falta muito para eu atingir esse nível. Aliás, quero me desculpar pela minha estupidez de seis meses atrás.

A criatura soltou algo parecido com uma bufada. Ergueu a cabeça e empertigou o corpo, quase tocando o teto.

- “Em razão de sua resposta, vou presenteá-lo com algo que você jamais sonharia. Coloque sua espada na balsa.”

Apesar de não entender as intenções do dragão, Harry obedeceu. Desembainhou a espada, fazendo surgir a lâmina branca. Depositou-a na balsa e com o pé afastou a embarcação. A criatura a atraiu e de repente despejou suas chamas sobre a arma. O fogo era prateado e não incendiou a balsa, no entanto, clareou toda a caverna. Os cabelos de Harry se arrepiaram e a barba de Lao se ergueu pelo efeito da magia. O animal fantástico fechou a enorme boca e fez com que a espada voltasse para Harry. O rapaz não esperou que ela se aproximasse da margem. Mergulhou as pernas no poço e a recolheu rapidamente. No exato instante em que apertou o cabo, uma onda de energia foi liberada. A caverna se iluminou intensamente mais uma vez e a cabeleira do jovem se eriçou.

- Por Merlin, ela está mais poderosa. O que eu fiz para merecer isto?

- “Você aprendeu uma dura lição e deu sinal disso. Reconhecer as próprias fraquezas é um importante passo na sua jornada. Sei que sua varinha, com esses poderes que conferi por meio dessa forja especial, será bastante útil nos dias que virão.”

- Não sei como agradecer...

- “Apenas faça o bem. E proteja quem tem de ser protegido. Vá em paz, Harry Potter.”

Mestre Lao curvou-se mais uma vez e Harry repetiu seu gesto. Os dois subiram na balsa que fez o caminho contrário. Antes de deixarem a caverna, ele se lembrou de algo.

- Ahn, eu... se puder... bom, meu amigo, o Rony, gostaria muito de te ver. Se fizer essa gentileza, serei eternamente grato – gritou.

Como não veio resposta, Harry tocou o ombro do velho chinês. “Acho que isso quer dizer ‘não’. Vamos, mestre. Os outros estão esperando”, disse, com gentileza. Andaram sem pressa e em silêncio. Rony enxergou a dupla rapidamente. Sem esperar que ficassem mais perto, o ruivo esbanjou a força de seus pulmões.

- O que aconteceu? Deu para sentir daqui um deslocamento de energia... – e se calou subitamente.

Harry olhou para trás e viu o velho dragão na entrada da caverna. Como ele se deslocara tão rápido, jamais saberia. Sua figura imponente fez o queixo de Rony cair.

- É... é... é um dragão lendário... Cara, meu irmão não vai acreditar. Você não tinha dito nada, Harry!!!

O jovem bruxo sorriu pela primeira vez em vários dias.

- Lendário? Pois para mim ele é bem real.

Lao deu uma risada sonora. Abraçou Harry com força. “Cuide-se, rapaz. Eu e o dragão estaremos torcendo por você”. Em seguida, despediu-se de Rony e de seu velho amigo.

- Sir McKinley, seus pupilos são extraordinários. Creia-me.

O professor agradeceu, apertou a mão do mestre das espadas e tocou a aba de seu chapéu para cumprimentar o dragão. Retirou das vestes um relógio de pulso e os jovens seguraram as pontas da pulseira. Num segundo, um clarão surgiu e os engoliu. Mestre Lao suspirou.

- “Foi um belo trabalho, Lao. Você conseguiu restaurar boa parte do equilíbrio do rapaz.”

- Boa parte. Não tudo. Agora é com ele. Pena que nem eu, nem McKinley conseguimos descobrir o que o deprime, o que fragiliza tanto sua alma. Mas até para isso Harry está mais forte. Felizmente. Enfim, resta-nos confiar no destino.

E dizendo isso, desceu a montanha.








Ufa! Vou tentar ser mais rápida no próximo. E, falando nele, vocês conhecerão o novo destino de Harry, Rony e McKinley. E saberão do plano do Draco. Obrigada pela leitura.

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