Golpe Baixo



Capítulo 27


 Golpe baixo


 


Praticamente joguei o caderno para o lado, colocando os pés em cima do banco e abraçando as pernas. O sol já estava se pondo, mostrando que logo Alexey chegaria. Eu estava sentada ali há muito tempo, no entanto não conseguira escrever uma linha sequer. Mandar uma carta não estava nos meus planos para aquele dia, mas diante da perspectiva de ter que ficar sozinha por horas, a papelaria daquela cidade trouxa me pareceu a entrada certa. Além disso, a última carta que eu enviara já datava de quase quatro meses, na qual felicitei, também com atraso, Lily e James pelo casamento.


Desde que deixara Londres, minhas preocupações tornaram-se outras, embora algumas continuassem em minha mente como se tivessem sido cravadas a fogo. Eu não conseguia esquecer meus amigos que ficaram para trás com uma guerra para impedir, ou suas preocupações em não saberem onde eu estava exatamente, se estava segura e se voltaria. Eu tentava esquecer-me disso; alguns dias nem mesmo a feição preocupada de Lily ou a ausência de Sirius eram percebidas. Contudo, havia dias em que eu não conseguia deixá-los guardados no canto de minha mente. E este era um dia assim.


Fazia mais de um ano que eu havia partido. Procurei por Sebastian em todos os cantos que consegui imaginar, seguindo as poucas orientações que haviam no diário de tio Timoh, ou o que tia Françoise tinha me dado. Mas nada me levara para perto dele. Nem mesmo na moradia de Sebastian, ao sul da Romênia, eu o encontrei. Era como se o vampiro tivesse desaparecido da face da terra. Então, depois de tanto tempo, decidi ir atrás de Alexey.


Meu primo também foi difícil de encontrar. Ele raramente ficava em casa, pois sempre viajava “a negócios”, como ele frisava. E eram exatamente seus negócios que me interessavam.


De acordo com meu irmão, Alexey gostava de tudo que lhe rendesse bom dinheiro, independentemente da origem ou moralidade. Na semana passada, ele me mostrara um pedaço de osso de galinha que com as misturas corretas se transformaria em uma falange de Merlin. Mas também já vendera uma relíquia rara da mesma época do mago. Portanto, procurar por Alexey foi minha melhor escolha. Ele tinha contatos, conhecia pessoas e mundos que eu nunca imaginaria adentrar. Ele saberia como me auxiliar para me livrar de Sebastian. No entanto, o tempo passara e nada que valesse à pena aparecia.


Suspirando, peguei novamente o caderno. Se eu continuasse pensando em tudo aquilo, com certeza escrever para Lily seria mais difícil ainda. Na última carta, ela me pedira para voltar, ou que estipulasse uma data de quando isso aconteceria. Ou ao menos dissesse onde raios eu estava. Mas eu não tinha datas. E não poderia dar minha localização, pois sabia que, assim, ela apareceria para me forçar a retornar. E eu não poderia voltar para Londres enquanto não descobrisse uma maneira de me livrar de Sebastian.


Portanto, como nas outras cartas, eu apenas disse que estava bem, que ela não se preocupasse. E finalizei com o desejo de que o bebê deles nascesse com saúde, e que fosse uma menina para tornar a vida de James ainda mais complicada. Embora sorrisse enquanto lia o que havia escrito, também senti meu coração se apertar. Lily havia me enviado duas fotos: uma de seu casamento, na qual ela e James eram abraçados por Sirius, que sorria abertamente, e outra com ela e James sorrindo enquanto ele lhe beijava a barriga já grande. Senti uma forte vontade de atirar as fotografias no fogo assim que as vi, pois eu entendia o propósito de Lily ao me enviá-las. Mais uma maneira de forçar minha volta. Contudo, as fotografias continuavam seguras em minha mochila.


Destaquei a folha do caderno e a dobrei, colocando no bolso da calça. Assim que voltasse para o hotel, despacharia a coruja. Levantei-me do banco, sentindo as pernas doerem. Sim, eu ficara demasiado tempo sentada naquela praça. Olhei para os lados, mas não havia sinal de Alexey. Eu ainda teria alguns minutos, então caminhei um pouco.


Eu não me lembrava do nome da cidade da Lituânia em que estávamos, mas eu gostava dali. Era uma cidade pequena, onde os trouxas que ali viviam pareciam não estranhar as situações curiosas que aconteciam vez ou outra. Se eles desconfiavam da existência da magia, lidavam muito bem com isso.


Fechei mais meu casaco enquanto caminhava. O sol já havia se posto e o frio do norte se acentuava, mesmo estando no verão. Olhei novamente para os lados, perguntando-me por que Alexey demorava. Havíamos combinado, como nos dias anteriores, de que ele me encontraria na praça quando o sol começasse a se pôr. Não queríamos ficar fora do hotel durante a noite. Alexey tinha uma política interessante a respeito da noite: era quando você poderia ser seguido e espionado sem se dar conta. E facilitar a vida dos outros era algo que meu primo nunca gostara de fazer. Pensei em voltar para o hotel, mas logo desisti. E não me arrependi da decisão, pois poucos minutos depois vi Alexey vindo em minha direção.


Ele estava quase correndo e parecia preocupado. Esperei que ele se aproximasse para questioná-lo, mas Alexey não parou de andar, puxando-me pelo braço para que saíssemos da praça. Eu quase corria para acompanhá-lo quando finalmente entramos no hotel.


— Tenho duas notícias para você — Alexey disse assim que fechou a porta do quarto. — Uma ruim e outra... Bem, digamos que a outra é boa.


Senti meu coração disparar, ansiosa.


— Onde ele está? — perguntei.


— E esta é a ruim. — Alexey sentou-se na cama. — Eu preferiria começar com a que classifiquei como boa.


— Onde, Alexey? — perguntei entredentes.


Ele me olhou como se desculpasse.


— A pessoa que encontrei hoje me disse que ouviu boatos. De um homem que passou os últimos meses viajando pelo Egito em busca de algo que está desparecido há séculos. E parece que ele está perto de encontrar o que precisa.


— Este homem...


— Sim, é Sebastian. Praticamente cem por cento de certeza.


— E o que ele procura?


— Algo que pertenceu aos Primeiros. — Alexey suspirou. Antes que eu o questionasse sobre o que eram os Primeiros, ele continuou. — Os Primeiros Vampiros. Filhos de Belial.


— Mas o que o Egito tem a ver com isso?


— Ariadne, nós mudamos de nome e de lugar, apenas isso. Há os que fugiram para o Chile, Brasil, Egito... Há os que hoje se chamam Catcher e vivem em Somerset, como eu. E os que escolheram Londres para morar, como seu pai.


— Mas eu pensei que fôssemos os últimos.


— Não, não somos. Os que estão longe não nos interessam e nem eles se interessam por nós. Preferimos assim.


— E o que Sebastian está procurando?


— A Arma de Belial. Um punhal que o demônio utilizou no primeiro Vrykolakes para transformá-lo em imortal.


— E ele quer usar isto em mim.


— Você me perguntou uma vez o motivo de você não ter sido amaldiçoada totalmente. Por que você não tem a alma cruel, como era a intenção do ritual que o Sebastian fez quando você ainda era um bebê. — Alexey falou devagar como se não quisesse me assustar, o que não estava funcionando muito bem. — Por algum motivo, você não foi totalmente atingida pela maldição. Talvez nunca saibamos o motivo, mas... O que quer que tenha barrado a maldição, com o punhal não será a mesma coisa. É uma arma forjada pelo próprio demônio. Ele tirará toda a sua humanidade.


— E então eu serei exatamente o que Sebastian quer.


Alexey apenas balançou a cabeça, confirmando. Levantei-me da cama – onde nem sequer reparara que havia me sentado – e fui até a janela. Eu precisava de ar. Sentia-me sufocar diante da possibilidade de tudo aquilo acontecer. Sebastian estava perto de me destruir e estava disposto a tudo para não falhar. O ar gelado me acalmou um pouco, o bastante para me lembrar de que Alexey tinha outra notícia.


— E a boa?


— O quê?


— A notícia boa que você tinha para mim — falei, olhando-o.


— Ah, sim... — Ele se levantou e ficou ao meu lado, olhando para a lua cheia. — A notícia boa é que Sebastian não te procurará enquanto não tiver o que precisa. E não estou muito certo que ele encontrará logo o punhal.


— E como você pode ter essa certeza?


— Porque sou eu quem o tem.


Surpreendida, olhei para Alexey e depois para o embrulho aberto que ele tinha em suas mãos, mostrando seu conteúdo: um punhal com a lâmina negra retorcida. Fiquei tentada em pegá-lo, mas recuei.


— E você achou mais interessante me falar toda aquela porcaria antes? — perguntei irritada.


— Foi você quem pediu a notícia ruim primeiro.


Abri a boca para argumentar, mas nada além de ofensas parecia querer sair de mim.


— Arktos tinha razão. Você é um completo maluco.


— Tenho minhas qualidades, e você sabe disso — Alexey sorriu, afastando-se para guardar o punhal em sua mochila.


— O que você está fazendo? Temos que destruir isso.


— Não há como fazê-lo — ele falou sem me olhar.


Sempre há um meio. Dê-me, vou tentar.


— E que tipo de feitiço você vai usar, posso saber?


Não me importei com o tom sarcástico em sua voz. Peguei o embrulho de sua mão e o coloquei dentro de uma bacia, no chão. Alexey sentou-se na cama e cruzou pernas e braços, me observando.


— Cuidado para não nos matar.


A despeito do conselho em tom provocador de Alexey, murmurei “Incendio”, que foi o primeiro feitiço que me veio à mente. E depois Diffindo, seguido de uma série de feitiços que eu conseguia me lembrar. No entanto, nenhum conseguiu destruí-lo, apenas o tecido que o envolvia que foi danificado. Depois de muitos minutos, frustrada e irritada, aproximei-me da lâmina, que não sofrera nenhum arranhão.


— Isso é impossível!


— Eu disse a você, Dina.


Olhei para Alexey, que havia deitado na cama.


— E o que vamos fazer com ele?


— Qual o único lugar onde Sebastian não conseguiria entrar?


Não levei mais do que dois segundos para responder:


— Minha casa. Mas não podemos ficar lá por muito tempo.


— Sei disso. Você não quer se encontrar com ele, não é? O homem dos seus sonhos...


Respirei fundo, tentando controlar minha irritação que só aumentava. Vez ou outra eu havia tido sonhos com Sirius. Alguns envolviam sua morte, outros não. Alexey me ouvira resmungar algumas vezes, e a pouca explicação que lhe dei foi o bastante para entender o que se passava entre nós – além, claro, da ajuda de Aimèe, que havia sido minha confidente depois que deixei a escola. Eu não entendia essa animação por fofocas que minha prima tinha.


— Você é tão covarde, Ariadne... — Alexey bocejou, enfiando-se embaixo das cobertas.


— Vá para o inferno, Lex — resmunguei, enfiando o punhal dentro de minha bolsa e indo para o banheiro tomar banho. Alexey ainda ria quando fechei a porta.


 


XXX


 


Chegamos em Londres no fim da manhã. Alexey e eu aparatamos a uma rua de distância da minha casa, em um terreno baldio. Entramos rapidamente, sem dar atenção aos vizinhos.


— Vou ao sótão. Lá ele ficará mais seguro — disse, subindo as escadas.


Assim que entrei no sótão, procurei uma caixa onde pudesse guardar o punhal. Tão logo a encontrei, lacrei com magia, colocando-a atrás de uma estante com parafernálias que pertenceram ao meu pai. Havia de tudo, ali. Roupas de meus pais, um espelho antigo quebrado, um berço que Arktos dissera ter pertencido a ele e depois a mim, cujo móbile estava também quebrado, alguns pertences de Arktos que ele achara valioso demais para jogar fora, mas ao mesmo tempo inútil para se manter em seu quarto... Perdi um tempo olhando para os seus livros antigos de escola e um caldeirão enferrujado. Eu ainda não entendia a serventia de tudo daquilo, no entanto eu não tive coragem de jogá-los fora quando voltei de Hogwarts definitivamente. Desfazer-me das coisas de minha família era o mesmo que desfazer-me de lembranças.


Quando voltei para a sala, Alexey já se acomodara no sofá.


— Vamos embora.


— Tem certeza? — ele perguntou, mal me olhando. — Não quer ficar mais uns dias?


— Não. Ainda temos que descobrir como matar Sebastian.


— Não tem nada disso no diário?


— Se tivesse, eu teria encontrado. 


Eu havia perdido a conta de quantas vezes lera as anotações que eu conseguira acumular. A cada relida eu ainda esperava encontrar um detalhe que pudesse ter passado despercebido, mas eu já estava me cansando das mesmas palavras, dos mesmos feitiços e rituais. E das grandes lacunas.


— Quantas vezes você já o leu? — ele perguntou.


— Todos os dias, desde que o peguei.


— Sério? Eu não a vi lendo o diário nos últimos dias.


 — Alexey...


— Só acho que a informação está lá, você que não percebeu.


Com agressividade, abri minha mochila e retirei o diário de lá, jogando-lhe em cima.


— Fique à vontade.


Finalmente Alexey abriu os olhos, olhando-me.


— Às vezes você se comporta como uma adolescente mimada, sabe? Uma completa chata.


— Pelo menos eu não finjo querer ajudar, quando na verdade tenho vontade de apenas ficar deitado vendo o mundo explodir.


— Um ano e meio — Alexey rosnou, levantando-se com raiva. — Estou te ajudando há um ano e meio, garota. Não vejo Aimèe há três meses. Isso é querer que o mundo se exploda? É querer que você se exploda?


— Não encontramos nada para matá-lo! Nada! Isso tudo está sendo tão... inútil! — completei, frustrada.


— Saber que ele está procurando o punhal não foi inútil, muito pelo contrário. E ter o punhal conosco se mostra uma tremenda vantagem. Sebastian nunca o terá.


— E quando ele descobrir que está conosco? Você sabe o que ele fará, Alexey. E é por isso que eu tenho que matá-lo antes que ele vá atrás das pessoas que eu amo. Que você ama! Ou por acaso você pensa que ele deixará Aimèe de lado se desconfiar que temos o punhal?


— Eu sei disso, não sou imbecil.


— Eu sei que não! — retruquei, já gritando. Sentei no sofá, o rosto entre minhas mãos e respirei fundo, subitamente envergonhada. Eu precisava me acalmar. — Desculpe. — Olhei-o. — Você tem sido um grande amigo, Lex. Desculpe. Não foi justo o que eu disse.


Ele se sentou também e pegou o diário, começando a folheá-lo. Durante um tempo ficamos apenas com o som das páginas sendo viradas ou dos poucos carros do lado de fora para quebrar o silêncio.


— Tem uma coisa que eu percebi. — Alexey finalmente falou, olhando para as últimas páginas do diário. — Eu fui um dos poucos que nasceu com a linhagem completa dos Vrykolakes. Minha mãe foi uma Vrykolakes que foi morta pelo meu pai quando descobriu o que ela era. Ele me criou até ficar doente e morrer, deixando apenas uma herança para mim: uma corrente de prata — ele falou, me olhando. — Eu nunca a usei, e sabe por quê? A dor é insuportável. Corrói minha pele de tal maneira que parece que é um ferro em brasa.


— E Sebastian é igual a você?


— De certa maneira... Ele também é um Vrykolakes legítimo.


— E em quê, exatamente, isso nos ajuda?


— Prata nos machuca ou pode até nos matar.


— Achei que isso fosse coisa de lobisomem...


— Ignorantes em magia que limitam esse tipo de coisa — desdenhou Alexey.


— Então só precisamos fazer uma estaca e pronto?


— Não sei... Como eu te disse, não somos como esses vampiros que os comuns ou os bruxos acreditam existir. De acordo com eles, o sol poderia nos matar e deveríamos viver em sótãos encarquilhados. Mas cá está sua casa, provando o contrário.


Alexey franziu o cenho, raciocinando.


— O que foi? — perguntei.


— Algo que ouvi, anos atrás. Uma conversa entre seu pai e Timoh. Eu não acho que isso seja a única anotação que sobrou acerca de nossos ancestrais — Alexey indicou o diário.


— Você acha que tia Françoise está escondendo algo?


— Ela não teria motivos, pois acredita que foi Sebastian quem matou seu marido. Mas não custa perguntar.


— Então vamos.


Abaixei para pegar minha mochila, mas alguém bateu na porta. Estaquei, olhando para Alexey. Ficamos quietos, esperando que a pessoa fosse embora. Eu sabia que era alguém conhecido, pois só alguém que eu autorizara previamente poderia passar pelos portões. A pessoa bateu novamente, dessa vez mais forte. Fui até a janela, abrindo a cortina o mínimo possível. Lily estava parada em frente a porta, os braços cruzados sobre a imensa barriga, enquanto na calçada, de costas para o portão e vigiando a rua de maneira inquieta, estava James Potter.


— Droga — murmurei. Levei os dedos aos lábios, pedindo silêncio para Alexey, enquanto caminhava para a porta. Como resposta, ele deitou-se novamente no sofá.


A última coisa que eu queria era ver Lily. Eu tinha certeza que ela preparara um discurso para mim, algo que eu não poderia refutar, que tornaria minha volta a Londres definitiva. Mas eu ainda tinha muito o que fazer. Precisava conversar com tia Françoise, descobrir se ela sabia algo mais sobre Sebastian e como destruí-lo.


— Sei que você está aí, Ariadne! — ela gritou, parecendo irritada. Não pude deixar de sorrir; fazia tanto tempo que eu não ouvia a voz de Lily que, mesmo sabendo que ela devia estar soltando fogo pelas orelhas, era muito bom ouvi-la novamente. — Fiz questão de colocar um feitiço no seu portão, para o caso de alguém abri-lo. Claro que só poderia ser você. Então, faça-me um favor, sim? Abra esta porta!


Seguiu-se um silêncio de quase três minutos. Ela mexeu na maçaneta, mas a porta não abriu. Tentou um feitiço em seguida, também sem resultado.


— Lily, não há ninguém aí — ouvi James gritar.


— Tem sim! — ela gritou de volta. — Ah, Ariadne — sua voz soou mais baixa, triste, cansada. — Eu imagino por que fugiu. Sei que você precisa resolver seus problemas, mas... E nós? Os que você ama? Temos que esquecê-la também enquanto você nos esquece? Sirius está um caco, mesmo tentando mostrar o contrário. Clair sente sua falta, e eu também sinto. — Ouvi Lily suspirar. Saudade e angústia pareciam apertar meu peito. — Meu bebê vai nascer daqui dois meses e tudo pode mudar. Eu quero tanto que você o conheça e... Oh, meu Deus!


— Lily? — James a chamou, preocupado.


— Não. Não, não, não. — Lily gritou. — James!


— Lily, o que houve?


— A bolsa... A bolsa estourou.


Lily gritou novamente. Um grito de dor. James gritou seu nome desesperado, mas eu sabia que ele não poderia transpassar o portão, e caso ele tentasse, não importasse como, seria lançado para trás em todas as vezes.


— Lily, você consegue andar?


— Eu não... AH!


Quando abri a porta de minha casa, imaginei que, pelos gritos, Lily estaria caída no chão e James louco de desespero na calçada. No entanto, o que vi foi uma mulher inteiramente saudável sorrindo para mim de orelha a orelha enquanto seu marido estava calmo, de braços cruzados, olhando o espetáculo que ela com certeza havia dado.


— Eu sabia que você estava aí dentro — ela falou, entrando.


Olhei de Lily para James, depois a olhei novamente, vendo minha amiga se ajeitar como podia na poltrona.


— Ah, sim, ela te pegou direitinho — James gritou do portão, também sorrindo.


Eu ainda fiquei parada na porta, desacreditando que havia caído no truque de Lily. Então, de pasma, minha reação passou para irritação. Abri completamente a porta e por pouco não apontei minha varinha para uma mulher grávida.


— Saia da minha casa agora — falei entredentes.


— Não. Você pode me passar uma almofada, por favor? Obrigada. — Lily pegou uma das almofadas que Alexey usava como travesseiro. Colocou-a nas costas, fazendo uma careta que depois se suavizou. — Sete meses. Minhas costas estão me matando, sabe? Sorte que os pés estão menos inchados.


— Lily...


— Meus pais viajaram, um tour pelo leste Europeu. O sonho de viagem deles há tanto tempo... Clair tem me auxiliado no que preciso, afinal minha irmã não quer me ver nem pintada de ouro, você sabe como ela é. Estou muito indisposta nas últimas semanas e não posso me alterar. — Ela me olhou. — Então, não me irrite, Ariadne.


— Você é incrível! Faz o maior show na porta da minha casa e diz para EU não irritá-la?


— Sim.


— Eu não conhecia esse seu lado cínico. Quero dizer, eu conhecia sim. Só não sabia que ele poderia se acentuar.


— Dizem que são os hormônios — Lily retorquiu calmamente. — E, por favor, deixe James entrar. Aposto que ele está parindo gatos, lá fora, de tanta curiosidade.


— Que tenha uma ninhada! — retruquei. — Eu não vou ficar em Londres, Lily. Na verdade, estamos de saída.


— E para onde vão?


— Não interessa.


— O que eu preciso fazer para você não sair por aí, viajando?


Olhei para Lily. Eu sabia que minha amiga queria apenas o meu bem, e vê-la sentada em meu sofá com sua barriga imensa e o olhar apreensivo me fez suspirar. Sentei-me no sofá de Alexey, ficando de frente para ela, decidida a dar ao menos uma pequena explicação sobre o que acontecia. E uma vez que Lily sabia de meus segredos, eu não precisaria mentir.


— Estou quase de volta, Lily. Falta pouco.


— Já descobriu como matá-lo?


— Não. Alexey e eu precisamos verificar mais algumas coisas. 


— Não entendo como é tão difícil! — ela se alterou. — Pensei que vocês o conhecessem melhor.


— Não é tão fácil assim matar demônios, sabe? — Alexey disse. Ele continuava deitado, os olhos fechados e as mãos cruzadas sob a cabeça.


Meneei a cabeça, pedindo para Lily fingir não ter ouvido o que meu primo dissera.


— Quero você aqui no Natal — ela falou, segurando minhas mãos nas dela. Seus dedos estavam frios.


— Lily...


— Não posso pensar em você sozinha por aí, em uma época que deveria estar com pessoas que se importam com você.


— Sim, pois eu sou um completo estranho sem sentimentos.


Novamente fingimos que Alexey não dissera nada.


— Prometa, Ari.


— Não posso.


— Prometa.


— Lily...


Prometa.


Não sei se foi o olhar quase desesperado de Lily, sua voz quebrada ou as mãos frias que se apertaram nas minhas como se buscasse abrigo. Como eu previra no momento em que ela quase derrubou minha porta, ela tinha todo um discurso para me manter – ou me fazer voltar – em Londres. No fim, percebi que não havia nenhuma saída, a não ser fazer sua vontade.


— Te vejo no Natal. 


 


XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX


 


N/A: Eu nem sabia que fazia três meses que não atualizava! Quero tanto terminar essa fic para iniciar outros projetos, mas ela só sai quando quer... Inspiração que não me encontra trabalhando. Triste...


Espero que todos que ainda estão lendo tenham gostado.


Meu obrigada especial, como sempre, à Priscila Louredo. Amo você, mana!


E Duda, não que eu vou parar de escrever. É que, como eu disse na NA, estou com outros projetos em mente – um já em desenvolvimento. Não sei o que será dele, mas, que ele entrará ao menos na blogosfera, isso é fato. =D Beijos, e obrigada sempre pelos elogios!


Até o próximo! – que não demorará... pois já está nas mãos da beta (sim, meu fim de semana rendeu)!


Lívia.


 

Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.