Anonimato



Capítulo 12


 


Anonimato


 


Caminhávamos para a sala do diretor como se fôssemos um cortejo. O silêncio chegava a incomodar, mas ninguém ousava dizer coisa alguma. Vez ou outra eu olhava para Severus, que parecia prestes a explodir de tanta raiva. Com a luz que havia naqueles corredores eu conseguia ver que ele continuava pálido, e os arranhões que eu notei em seu braço não eram de origem lupina. Remus não havia tocado nele, graças aos deuses.


Eu olhei apenas uma vez para Sirius Black. E a angústia que senti foi o bastante para não olhá-lo novamente.


Quando entramos na sala de Dumbledore, ficamos todos em pé enquanto o diretor dava a volta na mesa e nos encarava.


— Creio que todos aqui estão cientes do que poderia ter acontecido esta noite. — A voz de Dumbledore era baixa e séria; senti minha angústia aumentar.


— A culpa foi do Black, professor! — Severus adiantou-se, a raiva explodindo de vez. — Ele disse para eu ir até onde o Lupin estava! Esse idiota me mandou para um lobisomem!


Olhei para Black, mas ele não se defendeu. Pela primeira vez eu não via nem um décimo da arrogância que ele tanto exibia por essa escola. Essa reação me fez sentir pena dele.


— Senhor Snape, entendo sua revolta, mas, por favor, controle-se — o diretor disse. Em seguida, ele suspirou e enfim sentou-se em sua cadeira. — Senhorita Lakerdos, acho que você já viu que seu primo está bem. Pode seguir para seu dormitório.


— Hã? Ah, eu... — Sem saber como retorquir, decidi obedecer àquela ordem. — Está bem.


Eu desci as escadas, porém não segui para o salão comunal. Inquieta, esperei por meu primo.


Em poucos minutos, James Potter saiu. Sozinho.


— E Severus?


Ele se assustou quando eu o interpelei, segurando-o pelo braço.


— Dumbledore quer conversar com ele. Acho que para guardar o segredo do Remus.


Eu apenas meneei a cabeça, ao que Potter começou a se afastar.


— Não vai esperar pelo Black? — perguntei. Estranhei a irritação que, de repente, tomou a feição de Potter. Eu tinha certeza que era a primeira vez que ele mostrava estar com muita raiva de algum de seus amigos.


— Sirius sabe o caminho sozinho. Além disso, ficar sozinho é bom de vez em quando. Nos ajuda a pensar.


— E com certeza é o que ele está precisando no momento — completei com um pouco de raiva. Em seguida, suspirei. Apesar de tudo, sentir raiva de Black estava se tornando difícil para mim.


— É... — Mais uma vez, Potter virou-se para ir embora. Mordi os lábios, porém fiz logo o que eu queria fazer.


— Ei, Potter, outra coisa.


— Fala, Lakerdos — ele disse, cansado, virando-se para mim novamente..


— Obrigada. — Ele então me encarou com as sobrancelhas erguidas, como se me indagasse. Agradeci por aquele corredor estar levemente escuro para que ele não notasse minhas bochechas corando. — Obrigada por...por ter salvo Severus.


— Eu não fiz por ele — Potter falou, parecendo indiferente.


— Eu sei. Mesmo assim, obrigada. De verdade.


Potter pareceu pensar em algo antes de me falar diretamente:


— Ele é muito importante para você, não é?


— É claro — falei, óbvia.


— Então, Lakerdos, mantenha o Snape longe da gente. Vai ser melhor para todo mundo.


E sem dizer mais nada, Potter me deixou. E como minha distração havia ido embora, inquietei-me novamente. Talvez eu tenha esperado cerca de meia hora até Severus descer.


— Sev, você está bem?


— Estou ótimo.


— Algum problema? — perguntei.


— Não sei, Ariadne. — A voz dele estava cheia de sarcasmo. — Talvez, quem sabe? Ou você não acha que é errado esconder de mim que você sabia sobre o Lupin?


— Ele me pediu para guardar segredo. O que você queria que eu fizesse?


— Você deve lealdade a mim, não a eles! — Severus gritou. Apontando o dedo para mim, completou: — Você deveria honrar sua família! Você deveria ser leal comigo! Você deveria ter me contado tudo quando soube. Você sabia que eu estava atrás de alguma coisa sobre esses idiotas, mas, mesmo assim, não me disse nada! Nada, Ariadne!


— Espere aí — falei, tirando o dedo dele da minha frente. — Então, eu deveria ser desleal com um amigo simplesmente porque você está com tanta sede de vingança que não sabe nem o que faz? Vá se catar, Severus!


— Era isso sim! Escute aqui, Ariadne — a voz dele, baixa, era só ameaças —, se você está tão preocupada com seu amiguinho lobisomem, então fique com ele. Não te quero mais por perto. Não com tanta deslealdade.


— Tudo bem, então. Eu fico com meu lobisomem enquanto você fica com seus comensais.


Severus não retorquiu à minha provocação. Parecendo engolir algo difícil, ele saiu de perto de mim. E, naquele momento, eu não queria saber por que ele não estava indo em direção ao nosso salão comunal.


Eu também quis sair dali, contudo meu braço foi segurado. Pensei ser Severus vindo me pedir desculpas, mas me enganei.


— O que você quer, Black? — perguntei rispidamente e soltando-me dele.


— Ariadne, eu gostaria de te pedir desculpas.


Senti vontade de enforcar aquele imbecil à minha frente. Depois, senti vontade de me socar por estar percebendo que aquela situação toda me dava vontade de chorar. Eu não deveria estar tão triste por Sirius Black estar mais longe de mim a cada momento.


— Não é para mim que você deve desculpas, Black. É ao meu primo. E ao Remus.


— Eu sei que eu fui idiota, que agi sem pensar.


— Ou seja, foi você mesmo — o cortei.


— Isso não é verdade!


— O que é verdade então, Black? Que você quase matou meu primo? Que quase destruiu a vida de seu amigo? Você faz alguma ideia de como Remus se sentiria, caso esse seu planinho imbecil tivesse dado certo?


Ele não me respondeu nada. Novamente, o arrependimento o tomou. E minha angústia aumentou. Sem esperar nada, fui embora.


Os dias passaram e viraram semanas. Logo as provas finais chegaram e eu me vi, mais uma vez, prestes a voltar para casa.


Eu não havia conversado com Severus nesse meio tempo, assim como também não fora abordada por Sirius Black. Vez ou outra ele ainda tentava se aproximar de mim, contudo, minha feição irritada, misto à minha aparente indiferença o afugentava. Eu ainda não estava pronta para encará-lo.


Daquela situação, apenas quem sabia de algo, além daqueles que presenciaram, eram Clair e Lily. A primeira por ser namorada de Remus; a segunda por ser amiga tanto do casal quanto minha. E esse era o tipo de situação que não dava para esconder de Lily. Eu soube que ela dera um grande sermão em Black, e que ele não respondera nada por algum tempo. Porém, logo ele havia se irritado, mandado Lily caçar fadas mordentes e saído de seu salão comunal.


Depois desse dia, eu não soube mais de Black. E também nem quis saber. Eu o via de vez em quando, é verdade, mas não lhe dirigia mais que um olhar de poucos décimos de segundo.


— Eu não acredito que já estamos indo.


Olhei para Lily e sorri. Estávamos na estação de trem em Hogsmeade, prontas para embarcarmos. Clair havia se juntado a nós, deixando que Remus ficasse com os amigos.


— Vocês vão a algum lugar no verão? — Lily perguntou.


— Eu vou passar as férias nos Estados Unidos — Clair disse. — Tenho uma tia, lá.


— Eu ainda não sei se vou para a França, na casa da tia Françoise. Depende de Arktos.


Lily suspirou.


— Eu, com certeza, terei de encarar Petunia e aquele namorado dela.


— Cada um com sua cruz — sorri.


O som do apito do trem soou, obrigando-nos a embarcar.


Logo Clair se foi com Remus, que a levou para uma cabine que ele havia reservado. Fiquei com Lily em outra, junto de Alice e Frank. Fazia tempo que eu não os via, porém não estava a fim de conversa. Portanto, enquanto deixava para Lily a sociabilidade, abri um livro que havia lido várias vezes, mas que me ajudaria a passar o tempo.


Eu não prestava atenção à conversa deles, mas notei, depois de um tempo, quando um silêncio se prolongou tempo demais. Ergui os olhos do livro e vi quem era o responsável por aquele silêncio.


— Podemos conversar? — Severus perguntou, olhando diretamente para mim.


Dei de ombros e fechei meu livro devagar.


— Vamos dar privacidade a vocês — Frank disse, erguendo-se. Lily ainda me olhou antes de sair. Eu conhecia aquele olhar, por isso, meneei a cabeça. Sim, eu teria cautela. E, sim, eu até poderia dar outra chance para meu primo.


Severus entrou e fechou a porta, sentando-se à minha frente em seguida. Seus olhos foram para o livro que eu segurava em meu colo.


— De novo? — ele perguntou tentando sorrir. O sorriso até foi bom.


— Não estava a fim de conversa, hoje.


— Claro...


Ficamos em silêncio, então.


Por mais que eu quisesse fazer as pazes com Severus, que ele compreendesse que eu não guardava o segredo de Remus simplesmente para ir contra minha própria família, eu não me mostrei tão receptiva assim. Ele ainda estava errado, em minha opinião. Era ele quem devia começar. Eu não exigiria nada. Por isso mesmo que continuei olhando para ele, sem me importar em parecer uma sonsa estudando algo sem graça.


— Eu não gostei de você ter escondido de mim o fato do Lupin ser lobisomem, Ariadne.


Apenas ergui as sobrancelhas, um pouco arrogante. Severus fez uma careta com os lábios diante de minha reação.


— Mas não justifica eu ter te atacado daquela maneira. Afinal, você não tem que ser apenas minha amiga. Você tem seus amiguinhos da Gryffindor — ele falou, olhando pela janela.


— Eu gostar deles não me faz gostar menos de você, Severus.


— Eu sei. — Ele me encarou. — E então?


— Você não vai dizer?


— O que? Desculpas? Não diretamente. — Ele então sorriu.


Rolei os olhos, como se estivesse aborrecida, mas fique feliz por Severus ter tomado a iniciativa.


— Outra coisa.


— O quê? — perguntei, estranhando seu constrangimento.


— Àquele dia, que briguei com o Black. Você não tinha nada que ter se metido. Porém, também não justifica o que fiz.


— Pois é...


— E então — Severus falou depois de alguns segundos de silêncio —, você vai para a França esse verão?


— Talvez não. O Arktos está trabalhando muito. Recebi uma carta dele, mês passado. Esse verão não terá França.


— Certo. Posso aparecer na sua casa?


Eu finalmente sorri de verdade, feliz. Talvez as coisas entre Severus e eu nunca fossem certas, mas eu era a única família que ele tinha de verdade, e ele era um grande amigo – apesar de ser um pouco torto, às vezes.


— Claro que pode. Você sempre será bem-vindo, Sev.


Severus sorriu e finalmente saiu da cabine. Eu voltei para meu livro. Mal abri a página onde estava e lia a primeira linha, a porta se fechou. Pensei que fosse Lily, Alice e Frank, no entanto, quando ergui os olhos de maneira automática para verificar, assustei-me.


Certo, não era para tanto. Mas eu realmente me surpreendi ao ver Sirius Black em pé defronte a mim.


— Podemos conversar? — ele perguntou.


Sorri com a ironia da situação, embora minha vontade fosse dizer um sonoro “não” e mandá-lo embora dali.


— Essa sua felicidade se deve ao fato de você ter se acertado com seu primo?


— Sim.


Ele então se sentou e, como se fosse normal, começou a me encarar. Aquilo começou a me aborrecer. Eu não queria conversar com Black, pois ouvir qualquer coisa que viesse dele não me interessava! Eu não queria sequer conversar com ele. Que dizer, então, de estar no mesmo lugar que ele. Um lugar pequeno e de difícil fuga, se fosse necessária.


— Algum problema, Black?


— Claro que não! Muito pelo contrário.


— Então, pare de me olhar como se eu fosse o último feijãozinho de chocolate e diga o que quer.


Ele recostou-se melhor no banco. Ainda olhando através da janela, falou, sorrindo um pouco:


— O Remus me perdoou. O James também, embora que, para isso, ele tenha me chamado de imbecil várias vezes.


— Que bom.


— Eu sei que o que fiz foi errado, Ariadne. Foi impulsivo, imbecil e até crueldade. Admito meu erro.


— Que bom.


Percebi que ele me encarou, e me ver olhando para as páginas abertas de meu livro o irritou.


— Quer me ouvir direito, por favor? E olhar para mim?


Eu não consegui reagir a tempo de impedi-lo de me surrupiar o livro das mãos.


— Me devolva, Black! — falei, levantando-me.


— Não até você me ouvir direito e termos uma conversa decente.


— Eu não quero conversa alguma com você.


— E o que você quer que eu faça? — ele perguntou irritado. — Implore? Fique de joelhos?


— Seria interessante — disse cheia de ironia.


— Eu não vou fazer isso. — Ele ficou de costas para mim por um momento. Depois, encarou-me novamente. — Eu já disse que Remus me perdoou e agora estou pedindo desculpas a você.


— Que ótimo! — falei com felicidade sarcástica. Entretanto, continuei mais agressiva: — Agora você já pode fazer suas imbecilidades sem consciência pesada. Você quer que eu faça o quê? Dê flores pela boa ação? Vá se catar, Black!


— Eu quero que você desculpe o que eu fiz. A maneira como te atingi! É pedir demais?


— Desculpe-se com Severus, então! Foi a ele que você quase matou, não a mim.


— Eu só peço desculpas a ele quando ele pedir desculpas a Peter.


— Não me venha novamente com o Pettigrew. Vocês pensam que não, mas aquele garoto sabe se defender muito bem.


— A questão é que não sou apenas eu quem está errado. Seu primo também. Eu não vou pedir desculpas a ele. Além disso, já fiz na sala do Dumbledore.


— Que bom.


— Esse seu “que bom” está me irritando.


— Que bom — repeti sem considerar a feição irritada dele.


— Você me tira do sério, Ariadne!


— Que bom.


— Escute aqui — ele começou, segurando-me pelo braço um pouco agressivo, porém interrompi qualquer coisa que Black fosse dizer:


— O quê? Vai me mandar para um lobisomem também só por te tirar do sério? — rebati.


Entretanto, Black não disse nada. Eu pensei que ele fosse me soltar, mandar-me às favas e então sair daquela cabine. Mas ele fez algo inesperado. Bom, inesperado ao menos para o momento.


Antes que eu conseguisse reagir, ele já me prendia em um abraço e me beijava. Eu reagi contra esse beijo de imediato. Contudo, apenas nos três primeiros segundos. Pois, a partir do quarto, já retribuía.


Eu havia sentido falta daquilo. Por mais que eu fosse me xingar depois, ou até me bater, eu não poderia deixar de admitir – somente para mim mesma, obviamente – que nas semanas que Black nem sequer chegou perto de mim, eu me sentira estranhamente sozinha. Portanto, quando ele me apertou em seus braços, sua mão em minha cintura, ergui-me levemente na ponta dos pés, adorando o contato de nossos corpos.


Foi então que uma vozinha pareceu gritar “ERRADO!” em minha cabeça, e eu não sabia se agradecia ou se continuava a brigar com minha consciência. Optei pela primeira opção. Interrompi o beijo e livrei-me dos braços de Sirius Black, dando dois passos defensivos para trás.


— É melhor você ir, Black — falei. Minha voz estava fraca, mas eu não me importei. Era melhor ele sair. O fato de ele saber que eu estava muito afetada pelo beijo era algo que eu lidaria depois.


Para meu alívio, ele meneou, afirmativo. Antes de fechar a porta da cabine, entretanto, falou:


— Que bom que você me perdoou, Ariadne.


Eu não lhe respondi ou o olhei. No momento em que me vi sozinha, joguei-me no banco da cabine, maldizendo minha idiotice.


 


~*~*~*~*~*~*~*~*~


 


As férias de verão em minha casa sempre eram monotonamente agradáveis. Durante a manhã, eu me refugiava no jardim, aproveitando para ler debaixo de alguma árvore os romances que adorava; às tardes eram dedicadas a algum aperfeiçoamento. Eu não era uma estudiosa convicta, porém os livros de feitiços e de defesa contra magia negra que Arktos mantinha em nossa biblioteca eram interessantes demais para serem esquecidos.


Embora eu adorasse Elizabeth e sua companhia, ela me tratava como se fosse minha babá de tantas recomendações, do tipo: “Ariadne, não vai tomar café da manhã?”, “Ari, trouxe um lanche” ou então “Ari, não tome muito sol”. E a situação não mudava com a chegada de Arktos. E naquela noite não foi diferente.


Assim que meu irmão passou pela porta de casa, viu-me deitada no sofá lendo um livro de feitiços enquanto Elizabeth estava ao meu lado, parecendo irritada.


— Algum problema? — ele perguntou.


— Eu disse!


Rolei os olhos, mostrando irritação.


— E o que você disse, Lizzy?


— Nada de mais — falei. Obviamente, Elizabeth me contradisse.


— Eu disse a ela, Arktos, que você já estava chegando, e por isso devia tomar banho, pois o jantar já está pronto.


Arktos apenas meu olhou com as sobrancelhas erguidas. Retribuí o gesto. Ele então chegou perto do sofá e estendeu a mão, pedindo o livro. Bufei com irritação e praticamente enfiei o livro nas mãos dele.


— Feliz, Elizabeth? — perguntei irônica, já subindo as escadas.


Ainda ouvi Elizabeth dizendo que eu nunca teria jeito antes de desaparecer pelo corredor.


Arrumei-me rapidamente e, quando voltava para a cozinha, ouvi meu irmão e Elizabeth conversando. Pensei que ainda falavam de mim, então parei um pouco antes para ouvir: se eu ia me defender, deveria saber do que era acusada. Todavia o assunto não era eu.


— Jason está muito abalado. Provavelmente iremos embora.


— Sinto muito, Lizzy.


— O que houve com seu irmão, Eliza?


Arktos me olhou com censura pela interrupção e a evidente indiscrição por ouvir conversa alheia. Já Elizabeth apenas sorriu, parecendo condescendente.


— Nada que precise preocupar sua cabeça, querida. Agora, coma. Fiz aquele frango com legumes que você tanto gosta.


Abri a boca para dizer que eu não era nenhuma criança e que merecia uma resposta mais precisa. Porém Arktos fez com que eu me calasse. Olhei novamente para Elizabeth e então encarei meu irmão novamente com as sobrancelhas erguidas. Ele fez um gesto, dizendo que me explicaria depois. Portanto, com essa promessa, fingi estar satisfeita com a resposta de Elizabeth que, após nos servir, despediu-se, dizendo que tinha muita coisa para fazer em sua própria casa.


Assim que finalmente me vi sozinha com meu irmão, não fiz rodeios.


— O que está havendo?


Arktos suspirou.


— A vizinha de Jason morreu. — Ele me olhou. — Assassinada.


Parei o garfo a meio caminho de minha boca. Decidi voltá-lo para o prato.


— Como? E por que Jason ficou tão abalado?


— Foi a mando daquele bruxo das trevas. A que todos chamam de Voldemort.


— Mas por que ela?


— Ela era trouxa, casada com um bruxo. Ronald Perkins. Os seguidores de Voldemort foram até a casa deles, pois o Perkins é auror.


— E o Jason...


— Quando ele chegou em casa, ela estava toda desarrumada. Ou seja, depois de terem matado a mulher, foram até a casa de Jason. Você sabe, ele e Lizzy...


— São mestiços — interrompi meu irmão, quase sem perceber.


— Não sei que intenções eles tinham exatamente, mas...


Arktos não terminou de dizer, contudo minha mente completou como que naturalmente sua frase.


— Lizzy vai embora? — perguntei depois de alguns minutos calada.


— Talvez sim. O irmão dela está noivo. Eles estão com medo.


Durante o resto do jantar, eu apenas brinquei com a comida. Arktos, em contrapartida, parecia faminto, pois terminou sua refeição em alguns minutos. Quando ele se levantou e colocou os pratos na pia, eu me levantei. Porém, assim que cheguei à porta da cozinha, retrocedi.


— A situação está piorando, não está? — falei, minha voz fraca.


— Está.


Então minha angústia transformou-se em raiva.


— O que esse lunático pensa estar fazendo? Quem ele pensa que é? — Eu praticamente gritei, assustando Arktos. Meu irmão desviou sua atenção da louça que se lavava sozinha e me encarou.


— Lembra quando eu te falei sobre aquele governante alemão?


— Sei, o Nilton... Hilton...


— Hitler — Arktos me corrigiu, paciente.


— Sim, o que tem? O que ele tem a ver com o Voldemort?


— Hitler queria que sua raça se sobressaísse. Ele era uma pessoa que achava que era melhor do que outros. Sua raça era melhor, a raça ariana.


— Então o Voldemort...? — comecei, estimulando-o.


— Pelo visto, Voldemort, e todos que o seguem, quer a extinção de bruxos que não têm sangue puro. Como se fosse uma limpeza. Ou, simplesmente, colocar os mestiços ou nascidos trouxa em seus devidos lugares, que, na opinião deles, é o lugar mais indigno que se possa pensar.


— Mas isso é ridículo! — exasperei.


— Eu sei, Dina.


— E Perkins? O que aconteceu a ele?


— Como assim?


— Oras, a esposa dele morreu. O que ele fez? Com ele não aconteceu nada?


— Os seguidores de Voldemort o levaram.


Senti receio com a pergunta que se formou em minha mente. Contudo a verbalizei mesmo assim.


— Arktos, o que eles podem fazer com ele? Experiência, como o tal Hitler fazia?


— Não. Mas não acho que farão coisas boas, também.


Ele então voltou sua atenção à louça já limpa. Com outro aceno da varinha, organizou-a no armário.


Não consegui ficar sem pensar em Severus e o que significava para ele seguir esse maluco. Se Arktos sequer sonhasse o segredo que eu guardava de nosso primo, ele não me perdoaria. Arktos... Arktos era auror! E se meu irmão fosse pego por esse bruxo das trevas?


— O que foi, Dina? — Arktos interrompeu meus pensamentos, parecendo preocupado. Com certeza minha angústia estava estampada em meu rosto.


— Você está tomando cuidado, não está?


— Dina...


— Ark, esse cara é maluco e você o está caçando! Diga que você está tomando cuidado! — exigi.


— É claro que estou, Dina. Esqueceu que seu irmão é durão? — ele sorriu para mim. E eu conhecia aquele sorriso. Era o sorriso que ele usava para me acalmar. Minha angústia pareceu aumentar.


Então, fiz uma coisa que não era uma atitude tipicamente minha. Entretanto, não me importei. Eu não tinha reservas com Arktos.


Corri até ele e o abracei forte.


— Dina — ele retribuiu o abraço, sua voz mista de dúvida e pena.


— Prometa que vai tomar cuidado sempre, Ark. Eu não aguentaria se te perdesse também.


— Você não vai me perder, sua bobinha — ele disse, rindo. Apertou-me forte em seus braços. — Eu vou estar com você sempre, até quando você se enjoar de mim. Sou seu irmão mais velho. Minha obrigação é ralhar com você. — Ele fez com que eu o olhasse. — Imagina se eu deixaria esse privilégio para outra pessoa!


Sorri de maneira um pouco débil, porém me acalmei. Eu confiava em Arktos e em sua eficiência. Não seria qualquer bruxo que o pegaria desprevenido.


Porém, mesmo assim eu sonhei àquela noite de que havia perdido meu irmão. Quando acordei, percebi que já estava chorando. Sentei-me, sentindo-me impotente.


— Bem — falei para mim mesma —, ao menos só faltam doze meses para eu me juntar a Arktos. Então eu poderia ficar de olho nele. Isso. Assim que sair da escola, me tornarei auror.


E com essa certeza, deitei-me novamente. Contudo logo tive que me levantar, uma vez que uma coruja cinza começou a arranhar minha janela. Estranhei sua presença. Não conhecia aquela coruja, e sabia que não era de nenhuma de minhas amigas ou de Severus.


Quando abri a janela, a ave pousou ao lado de meu abajur, parecendo aliviada.


— Longa viagem? — perguntei, sorrindo. Ela, entretanto, não me deu atenção. Assim que retirei a carta presa à sua pata, voou sem esperar por um agrado. Dei de ombros e acendi a luz do abajur, pondo-me a ler a carta.


Como não reconheci a letra, fui logo para onde poderia estar a assinatura. Surpreendi-me por não vê-la assinada. Estranhei, mas a li mesmo assim.


 


Espero que suas férias estejam agradáveis. E que você também esteja bem. Dá última vez que a vi, parecia um pouco agitada, mas acho que já deve ter passado.


Te vejo em Hogwarts.


Até setembro.


 


Li a carta novamente, mas, mesmo assim, não consegui pensar em quem poderia ter mandado aquilo. Olhei pela janela, tentando vislumbrar a rua ou o céu, contudo nada encontrei. Bocejei, sentindo o sono me envolver novamente. Sem dar mais importância à carta, fechei a janela e voltei a dormir.


Nas três semanas que se seguiram, eram raras as noites que eu não recebia outra carta sem assinatura. Em todas elas diziam a mesma coisa: desejando que eu estivesse bem e que essa pessoa estava ansiosa para me ver em Hogwarts. Eu ainda não fazia ideia a quem as cartas e a coruja pertenciam. Depois de alguns dias, pensei em Sirius Black, mas logo descartei a possibilidade: a coruja dele era castanha. E Black nunca escreveria para mim, assim como eu não me interessaria por suas cartas, é claro.


Então, uma noite, foi outra coruja que apareceu. A cinza, pelo visto, havia perdido seu posto. Mas, mesmo assim, eu ainda ficava sem conhecer aquela ave meio amarelada. E a carta era um pouco diferente.


 


Oi, Ari. Ainda continua bem? Espero que sim.


Sabe o que aconteceu comigo hoje? Me mudei de casa! Pois é, agora estou morando em Gales. Não que eu tenha desgostado da minha casa antiga. Acho que enjoei dos que estavam ao meu redor. Sabe como é, não eram boa companhia.


Mas agora, com vizinhos mais agradáveis, sei que ficarei melhor.


E não se preocupe com a coruja, caso ela fique um pouco aí. Segundo meu vizinho, ela é do tipo que sempre espera uma resposta. Não que EU esteja esperando alguma resposta. Não quero te pressionar a nenhuma comunicação forçada. Eu escrevo porque quero. Você não escreve porque não quer. Simples assim.


Te vejo em Hogwarts.


P.S.: aprendi um feitiço novo. Talvez te ensine na escola. Quem sabe...


 


Olhei para a coruja, ocupada em coçar as próprias asas, e acabei sorrindo. Bem, se a coruja gostava de levar respostas, então eu não lhe tiraria esse prazer. Além disso, nessas quase quatro semanas de comunicação, pensei que meu interlocutor não deveria ser um lunático. Caso contrário, já teria invadido minha casa.


 


Caro Senhor Anônimo.


Sim, eu continuo bem, e agradeço sua preocupação.


Espero que você também esteja bem, uma vez que mudanças nunca são o tempo todo boas. Mas, se seus vizinhos cooperam, bem melhor.


Que tal você me dizer qual feitiço aprendeu? Talvez eu tenha algo sobre ele em minha biblioteca, uma vez que meu irmão é auror. E não, não digo que ele é auror só para te assustar (bem, talvez só um pouquinho).


Até outra carta.


A.L.


 


Sorri novamente, apreciando o conteúdo de minha carta, principalmente quando falei de Arktos. Melhor que ele já soubesse que meu irmão era auror e, se realmente fosse um maluco que estivesse me escrevendo, já ficava prevenido.


— Você leva a resposta para mim? — perguntei para a coruja, que piou parecendo animada. Quando terminei de amarrar-lhe a carta, ela foi embora.


Fiquei olhando pela janela até ela desaparecer no céu escuro. Pela primeira vez, eu ansiava outra carta de meu amigo anônimo.


 


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N/B: Aff, o Severus me dá engulhos. Sério. Ô homenzinho (nesse caso, rapaz) nojento!!! Mas nem ele merecia o que o Sirius fez, portanto o gelo e todas as broncas que ele levou foram merecidas. E ele mereceu também o beijo da Ari. Tá, eu sei que foi roubado, mas... Eu acho que sei quem é o remetente misterioso!!! Não vejo a hora de ler o próximo para confirmar minhas suspeitas. Um grande beijo, Liv. Parabéns.


 


N/A: Sim, o casal está desencantando! E a Ari percebendo o que sente pelo Sirius. E aos apressadinhos, se acalmem. E saibam que o próximo capítulo promete..hihi..


Espero que tenham gostado!


Um beijo a todos que favoritaram e acompanham.


E um beijo enorme à Pri, que sempre tem seu tempo para mim. Te amo, mana!


Até o próximo,


Lívia


 

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