Ultimato



A manhã parecia ter durado uma vida inteira.
            Alice Prewett e Frank Longbottom não foram vistos depois do café da manhã e segundo sugeria o comentário da “rádio-corredor”, os dois tinham sido liberados por Minerva McGonagall para o funeral do irmão da menina.
            Ninguém também viu Rachel Clearwater na aula de Herbologia, que seria com o pessoal da Grifinória, nem Edgar Bones no campo de Quadribol, onde deveria treinar junto aos seus colegas de casa sua caçada ao pomo de ouro. Parecia que ambos também tinham sido liberados, se não para deixarem Hogwarts, ao menos dispensados das aulas e afazeres do dia.
            Sirius Black juntou-se aos amigos meia hora depois da primeira aula ter começado. James Potter lhe empurrou um pedaço de pergaminho discretamente.


 Que houve lá?


             O amigo leu, suspirando como se estivesse cansado. Escreveu apenas uma palavra.


 Depois



             James engoliu sua curiosidade e fechou a cara, esperando ansiosamente até a hora do almoço.
            Remus Lupin estava começando a ficar incomodado com Emmeline Vance. A menina loira parecia desconfortável durante todas as aulas. Ele tinha o pensamento de que era devido à morte do irmão de Alice Prewett, mas algo lhe dizia que não era só isso.
           Quando finalmente o intervalo do almoço foi anunciado, todos saíram num silêncio sepulcral. A comida parecia não ter nenhum gosto para ninguém. Depois de terem almoçado, o Diretor pediu a atenção dos alunos.
          - Caríssimos – Albus Dumbledore falou, a voz mostrava um respeito incrível. – Hoje nós tivemos uma perda muito grande, de um ex-aluno nosso. O Sr Prewett sempre foi um exímio representante de sua casa, Grifinória, tendo defendido com honra ao mérito o nome de seu fundador, seja nas suas atitudes nobres, seja no Quadribol, onde era realmente um dos melhores artilheiros dos últimos tempos, seja no respeito aos seus próximos e na posição de respeito que tinha sendo monitor chefe.
          Corvinos, Lufanos e Grifos que conheceram Edward Prewett balançaram suas cabeças, concordando com o homem. Sonserinos tinha ar de tédio ao ouvirem o discurso. Os alunos veteranos comentavam sobre o rapaz com os primeiranistas e as meninas suspiravam olhando para a foto de tal rapaz tão lindo, morto injustamente. Os alunos também perceberam que Minerva McGonagall secava discretamente os olhos. Ela estava abatida, o rapaz era um de seus alunos preferidos.
         - Eu sei que estamos vivendo tempos difíceis – Dumbledore continuou, cortando qualquer conversa paralela que tinha se formado. – Mas gostaria que vocês não se deixassem abater, aquele que perde um bem, perde muito; quem perde um amigo, perde muito mais. Mas quem perde a coragem, perde tudo. Vamos lembrar-nos de Edward Prewett como ele sempre fora, o grande e divertido amigo.


O descanso depois do almoço foi momento de reflexão para a maioria dos alunos. Para Remus, no entanto, foi tempo de ultimato.
        - Remus, vem comigo – Emmeline falou, o chamando com o dedo indicador, quando deixavam o Salão Principal.
        O rapaz a seguiu, desconfiado. Ela caminhou até os jardins, onde naquele horário quase ninguém ficava. Para a sorte deles, havia apenas meia dúzia de alunos espalhados. Ela parou num canto onde estavam praticamente invisíveis atrás de uma grande árvore. Ele parou a sua frente. Os olhos azuis da menina pareciam tremeluzir, com uma sombra de dúvida e ao mesmo tempo de revelação. Remus sentiu aquele tipo de aperto no coração, típico de quem vai ser submetido a algum tipo de tortura. Ela tomou um grande fôlego antes de falar.
       - Eu preciso saber de uma coisa, Remus – disse.
       - Sim? – ele arqueou uma sobrancelha.
       - Você confia em mim? – perguntou Emmeline.
       Ele não respondeu imediatamente. Ao invés disso, deixou os ombros caírem e fechou os olhos.
       - O que você quer dizer, Emme?
       - Não ofenda minha inteligência, Remus! – os olhos dela se encheram de lágrimas. Remus sentiu-se um fracassado ao reparar isso. – Eu quis dizer exatamente o que você ouviu!
       Os dois se olhavam atentamente. Ele queria dizer sinto muito, queria pedir desculpas, revelar-se. Mas alguma espécie de força oculta o proibia. Depois de um breve silêncio e após um suspiro indignado dela, ele afinal falou novamente.
       - Eu confio em você, Emme. Eu não minto quando digo que sou apaixonado por você.
       Ela riu sem humor. Passou as palmas das mãos pelos olhos, secando as lágrimas que ali se acumulavam ameaçando caírem.
       - Se você confia em mim, se é apaixonado por mim, Remus, por que não me conta o seu segredo?
       Remus sentiu-se de repente vertiginoso. Ela não o esperou falar. Deu dois passos, se aproximando dele.
       - Durante dois anos eu tenho acompanhado suas ações, Remus Lupin – ela falou, num tom baixo e contido. – E não houve uma só Lua Cheia que você não tenha sumido, ao menos no primeiro dia do ciclo. Depois, reaparece com cicatrizes e um cansaço incomum, uma apatia que dura mais uns dois dias.
       O garoto loiro queria gritar, chorar, correr. Mas só ficou olhando desoladamente para a menina à sua frente, que expunha seus segredos de forma tão serena. Era a garota da sua vida, ele se odiou por não tê-la contado, mas o que pensaria ela sobre ele, sendo o monstro que era. Emmeline aguardou, mas ao ver aquela expressão constrangida do namorado, como se a estivesse pedindo desculpas apenas com seu olhar, fechou os olhos e permitiu suas lágrimas rolarem. Era inútil esconder sua decepção. Ela esperava que ele mesmo sentisse-se à vontade para contá-la aquilo.
       - Você é um lobisomem – Emmeline não perguntou, e sim afirmou.
       Remus não alterou sua face, mas uma lágrima rolou pela sua bochecha.
       - Você está certa, Emme – disse ele, num murmúrio tão baixo que ela quase teve que ler seus lábios para entender. – Eu sou um lobisomem.
       Emmeline começou a soluçar.
       - Eu ia te contar – continuou ele, desesperado agora por causar dor naquela que amava. – Eu ia! Mas... Emme...o que você pensaria quando soubesse que eu era esse monstro?
       - Eu ia pensar o que sempre pensei de você! – rebateu ela, com certa irritação. – Eu já sabia, Remus! Eu só esperava que você mesmo me contasse, não que eu tivesse que te colocar na parede para me contar!
       O rapaz franziu o cenho por um momento.
       - Se você já sabia, por que aceitou me namorar? – perguntou, confuso.
       Ela sentiu-se ainda mais irritada com a pergunta descabida.
       - Porque eu te amo, droga! – gritou, não se importando com quem pudesse ouvi-la. – Por que você sempre foi tudo o que eu quis pra mim!
       - Mesmo... – ele estava tão incrédulo que se perdeu no pensamento. – Mas...? Você não está com medo de mim?
       - Medo? – a pergunta dele parecia absurda para ela. – Claro que não! Por favor, por que demônios eu teria medo de você?
       -Hã... por que eu me transformo numa criatura das Trevas sedenta de sangue nas noites de lua cheia? – ele falou com um quê de ironia.
       Ela deu de ombros, secando novamente os olhos.
       - E daí?
       Remus ficou perplexo.
       - Emmeline, me ensina a entender sua mente?
       - Pensei que loiros pensassem igual, não é o que todos dizem?
       - Não, não é verdade isso. Eu não consigo entender seu desprezo pelo perigo.
       - Remus, você não é um monstro – ela se aproximou mais dele, de modo a tocar seu rosto. Agora ela dava um sorriso fraco. – Você é o meu amor. Não me importa o que aconteceu com você ou que tipo de problema tenha. Eu só queria que você contasse comigo.
       - Então...? Não se importa com o fato de ser um lobisomem? – perguntou ele, ainda não acreditando naquilo.
        - Não. Minha lua preferida é a crescente mesmo.
        - Não mesmo? – insistiu. – Não está com medo de mim?
        - Eu só tenho medo de uma coisa, Remus Lupin – ela jogou seus braços ao redor dele. – De te perder, de pensar que você está enfrentando tudo isso sem meu apoio. Eu quero estar com você sempre, ser sua confidente, ser os braços e o colo para onde você sempre vai poder voltar, independente dos pesadelos que tenha. Para sempre.
       Remus se permitiu abrir um sorriso. Seus olhos ficaram mareados de lágrimas. Ele deslizou sua mão pelo rosto dela, que fechou os olhos e inclinou um pouco a cabeça, curtindo o carinho.
       - Eu te amo, Emme – falou ele. – Você é perfeita, eu nem sei o que fiz para te merecer.
       Os dois se abraçaram demoradamente, selando aquele momento de revelação com um apaixonado e longo beijo. O coração de Remus parecia bater com menos dificuldade agora, que tinha compartilhado de seu segredo com aquela que escolhera para ser sua namorada e mais ainda pelo fato dela não se importar com nada, exceto com seu sentimento por ele. Então, havia mesmo a possibilidade de um monstro horrível como ele ser feliz, era seu pensamento naquele momento, junto com uma prece mental, agradecendo pela garota incrível que o destino havia colocado em sua vida.

Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.