A Grande Revelação
Virginia abrira as portas da Boticário pela primeira vez cinco anos e alguns meses antes daquele dia em que Johnny as atravessara em busca de uma feiticeira. O sucesso da loja devia-se à insistência de Virginia em fornecer produtos interessantes, à sua disposição de trabalhar duro, ao seu sincero prazer pelo jogo do comércio e, inegavelmente, à ajuda dos irmãos gêmeos.
Virginia poderia ter se dedicado a uma série de empreendimentos fúteis. Sua decisão de se tornar uma mulher de negócios foi bem rápida. Ela era ambiciosa o bastante e orgulhosa o suficiente para desejar ganhar o próprio sustento.
A escolha por uma loja como aquela foi atraente à Virginia porque lhe permitiria se cercar de objetos dos quais gostava. Além disso, desde a sua primeira venda, ela descobrira o prazer que sentia em passar estes objetos para outras pessoas que também os apreciavam.
Havia claras vantagens em se possuir o próprio negócio. Um senso de realização, o orgulho básico de ser a proprietária, a constante variedade de pessoas que entravam e saíam de sua vida. Mas sempre onde existe um lado bom, existe também o ruim. Se a proprietária for abençoada com um mínimo de senso de responsabilidade, é impossível simplesmente fechar as portas e janelas quando estiver com vontade de ficar sozinha. E dentre os muitos dons de Virginia, havia um inegável senso de responsabilidade.
Naquele momento, desejava que seus pais tivessem permitido que ela se tornasse uma mulher frívola, displicente e egoísta. Se o trabalho deles em criá-la não tivesse sido tão bem-feito, Virginia realmente teria trancado a porta, pulado em seu carro e dirigido para longe, até que aquela terrível melancolia melhorasse. Não estava acostumada a se sentir transtornada. E, certamente, não gostava da idéia de que aquela sensação havia sido provocada por um homem. Por tanto tempo quanto conseguia se lembrar, Virginia havia sido capaz de lidar com todos os integrantes do sexo masculino. Mesmo quando criança, fazia gato e sapato de seu pai, dos irmãos e dos seus tios, conseguindo tudo o que queria graças a uma combinação de charme, culpa e obstinação. Rony era o único que não se deixava dobrar tão facilmente.
Quando chegou à adolescência, aprendeu bem depressa como lidar com os rapazes. Que técnicas utilizaria para demonstrar que estava interessada ou as que usaria para mostrar que não estava. Com o passar dos anos, tudo se tornou uma simples questão de aplicar as mesmas técnicas aos homens adultos. Até agora. Até Johnny aparecer.
Quando havia começado a vacilar? Virginia se perguntou enquanto embrulhava um longo e fino frasco de óleo de banho de ginseng para uma cliente. Quando foi que ela seguiu aquele pequeno impulso de seu sexto sentido e cruzara aquela mesma sala para falar com ele pela primeira vez? Quando havia cedido ao lampejo de curiosidade e atração, que a levou a beijá-lo?
Talvez tivesse dado seu primeiro e mais sério passo em falso na noite anterior. Jamais havia levado outro homem para lá. E nunca mais levaria novamente. Ao menos, refletiu, ela quase poderia acreditar que foram o lugar e a noite que a fizeram pensar que estava apaixonada.
Não queria aceitar que uma coisa dessas pudesse lhe acontecer tão depressa ou deixá-la com tão poucas opções. Gina se recusaria a aceitar e colocaria um ponto final naquilo imediatamente.
Virginia quase conseguiu ouvir os fantasmas rindo. Ignorando a sensação, foi até o balcão atender outra cliente.
Durante toda a manhã o movimento foi lento, mas constante. Virginia não sabia se preferia aqueles dias em que os fregueses entravam sem parar ou quando ela e Luna ficavam sozinhas na loja.
- Acho que deveria culpar você por tudo isso. - Virginia apoiou os braços na mesa e se inclinou até ficar frente a frente com a gata. - Se você não tivesse se mostrado tão amigável, eu não teria presumido que ele era inofensivo.
- Virrrginia, dê uma chance a si mesma!!! Miau! Luna mexeu a cauda e fitou-a com uma expressão inteligente.
- Mas ele não é nem um pouco inofensivo.- Virginia continuou. sem dar ouvidos à gata. - E agora é tarde demais para voltar atrás. Ah, é claro eu podia dizer a ele que nosso acordo está encerrado, inventar desculpas para não vê-lo mais. Isso se eu quisesse admitir que sou uma covarde. - Respirou fundo e recostou a testa na cabeça do animal. - Não sou covarde. - Luna ergueu a pata e roçou-a no rosto dela. - Não tente fazer as pazes. Se este caso fugir ainda mais do meu controle, a culpa é toda sua.
- Clarrro que você não é covarrrde, só está agindo como se fosse... – disse. antes de virar para o lado e fingir que dormia.
Virginia olhou para cima quando a porta da loja se abriu. Esboçou um sorriso de alívio, ao ver que era Emily.
- Olá! Já são duas horas?
- Quase. - Emily guardou a bolsa atrás do balcão. - Então, como vão as coisas?
- Razoáveis.
- Estou vendo que você vendeu aquela peça grande de quartzo rosa.
- Há mais ou menos uma hora. Ela irá para um bom lar, foi um jovem casal de Boston que comprou. Está lá nos fundos, pronta para ser despachada.
- Quer que eu cuide disto agora?
- Não, para falar a verdade estou precisando de uma folga aqui do balcão. Eu faço isso, enquanto você atende os clientes.
- Tudo bem. Você parece um pouco deprimida, Virginia.
Ela arqueou a sobrancelha.
- Acha mesmo?
- Acho. Venha aqui, deixe a Madame Emily dar uma olhada. - Pegando a mão de Virginia. - Ah, não tenho dúvidas. Problemas com um homem.
Apesar da exatidão da afirmação, uma exatidão muito irritante, Virginia sorriu.
- Detesto duvidar da sua perícia na leitura de mão, Madame Emily, mas você sempre diz que o meu problema é com um homem.
- Eu jogo com as probabilidades. - Emily salientou. - Você ficaria surpresa em saber quantas pessoas estendem a mão em minha direção, só porque trabalho com uma bruxa.
Intrigada, Virginia inclinou a cabeça.
- Imagino que ficaria, sim.
- Bem, muitas delas têm receio de abordá-la, ao passo que eu não represento um perigo real.
Pela primeira vez em horas, Virginia teve vontade de rir.
- Entendi. Mas suponho que ficariam desapontadas ao saber que eu não leio as mãos.
- Por mim é que não vão saber. - Emily pegou um espelho enfeitado de jade e prata e checou a aparência. - Mas vou lhe dizer uma coisa, querida, não preciso ser uma cartomante para ver um homem alto, loiro, musculoso e com um olhar de matar. - Ajeitou um cachinho de cabelo no meio da testa, antes de se voltar para Virginia. - Ele está lhe dando trabalho?
- Não. Nada com que eu não possa lidar.
- Eles são fáceis de lidar. - Depois de guardar o espelho, Emily desembrulhou um tablete de goma de mascar. - Até a hora em que se tornam realmente importantes. - acrescentou e depois lançou um sorriso para Virginia. - Quer alguma ajuda?
Virginia deu um tapinha no ombro de Emily, com um sorriso divertido.
- Não, obrigada. Prefiro fazer do meu jeito.
Sentindo-se um pouco mais animada, Virginia foi para a sala dos fundos. Ora, pensou, por que estava tão preocupada? Ela podia mesmo lidar com aquilo. E o faria. Afinal, não conhecia Johnny o suficiente para que ele fosse realmente importante.
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Ele tinha muito com que se ocupar. Estava deitado no sofá enorme, com almofadas fofas que comprara numa loja de móveis usados. Havia livros espalhados em seu colo e amontoados no chão. Uma garrafa de refrigerante permanecia de plantão na mesinha de centro atulhada.
No cômodo ao lado, seu computador sobre a mesa parecia mergulhado em depressão profunda, pela falta de atenção. Johnny achou que quase podia ouvi-lo gemer de tristeza.
Mas Johnny estava trabalhando. Com gestos lentos e preguiçosos, ele arrancou uma folha de um bloco e começou a dobrá-la. Podia estar deitado no sofá, podia ter passado a maior parte da manhã olhando para o vazio, mas estava pensando. Talvez estivesse com alguma dificuldade em escrever a sinopse. Apenas precisava deixar as idéias "cozinharem" por algum tempo.
Fazendo a última dobra no papel, estreitou os olhos e atirou o aviãozinho no ar. Para se animar, acrescentou efeitos sonoros enquanto o avião de papel vacilava no espaço e caía no chão, sobre uma pilha de outros modelos semelhantes.
- Isso é sabotagem. - ele resmungou. - Deve haver um espião na linha de montagem. - Virando-se numa posição mais confortável, começou a construir outro aviãozinho, enquanto a mente divagava.
Praguejando, Johnny atirou para o alto o aviãozinho, que imediatamente caiu de ponta no chão. “O que eu estou fazendo?”, perguntou-se. Inventando histórias sobre ela. Não podia mais ficar só pensando nela. Afinal, precisava trabalhar, não precisava?
Determinado a fazer exatamente isso, Johnny se virou no sofá, derrubando os livros no chão. Desligou a tevê com o controle remoto e depois pegou o que restava de seu bloco. Apertou o botão do gravador. Levou menos de cinco segundos para perceber seu erro e tornou a desligar. Não estava em condições de ouvir a voz de Virginia.
Levantou-se, espalhando os livros no piso, e se desviou deles. Sim, ele estava pensando. Estava pensando que tinha de sair daquela casa. E sabia exatamente para onde queria ir.
A escolha era sua, assegurou-se enquanto pegava a chave do carro. Estava tomando uma decisão consciente. Quando se tem uma coceira, é melhor coçar logo de uma vez.
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O humor de Virginia havia melhorado tanto que ela começou a cantarolar a música do rádio, que ligara bem baixinho. Era isso mesmo que precisava, pensou. Uma xícara do calmante chá de camomila, uma hora de solidão e uma tarefa agradável e construtiva. Depois de empacotar a peça de quartzo e etiquetá-la para ser enviada pelo correio coruja, pegou o livro de estoque. Poderia passar a tarde inteira bem satisfeita, bebericando o chá, ouvindo a música e examinando seu estoque. E tinha certeza de que era o que faria, se não tivesse sido interrompida.
Se estivesse sintonizada, talvez tivesse se preparado para ver Johnny entrar pela porta. Mas a verdade era que qualquer planejamento prévio. de nada adiantaria, no instante em que ele parou ao lado da escrivaninha, a fez levantar-se e plantou um longo e firme beijo em sua boca surpresa.
- Isso - ele falou quando Virginia fez uma pausa para respirar - foi idéia minha.
Com a sensibilidade aguçada, Virginia conseguiu assentir a cabeça.
- Estou vendo.
Johnny deslizou as mãos até os quadris dela, mantendo-a presa contra si.
- E gostei muito.
- Que bom que gostou. - Virginia espiou por sobre o ombro e reparou que Emily estava parada na porta, com um sorrisinho malicioso no rosto. - Posso cuidar disso, Emily.
- Ah, tenho certeza que sim. - Com uma rápida piscadela, Emily saiu e fechou a porta.
- Bem, agora... - Tentando se recompor, Virginia pousou as mãos no peito dele, afastando-o. Preferia que ele não detectasse o fato de que seu coração disparava e seus ossos pareciam prestes a quebrar. Não havia como manter o controle, naquele caso. - Há mais alguma coisa?
- Acho que há muita coisa. - Com os olhos fixos nos dela, Johnny empurrou-a contra a escrivaninha. - Quando quer começar?
Virginia teve de sorrir.
- Puxa, isso sim é ir direto ao ponto.
- Pode chamar como quiser. Eu acho que é assim. Como Virginia estava usando sapatos de salto alto, os dois ficavam da mesma altura, Johnny precisou apenas se inclinar um pouco para morder de leve o lábio dela.
- Quero você e não sei como vou conseguir pensar direito novamente, a não ser que passemos muitas noites fazendo amor.
Um arrepio de excitação começou levemente e foi se espalhando por ela. Virginia teve que se agarrar à beirada da escrivaninha para manter o equilíbrio. Porém, quando falou, a voz era baixa e confiante.
- Pois eu posso afirmar que, depois que fizermos amor, nunca mais você vai conseguir pensar direito.
Ele lhe tomou o rosto entre as mãos e roçou os lábios nos dela.
- Vou correr este risco.
- Pode ser. - Virginia teve de respirar fundo, para recuperar o fôlego. - Mas eu ainda não decidi se quero me arriscar.
Os lábios de Johnny se curvaram sobre os dela. Ele sentiu um rápido tremor, em reação.
- Viva perigosamente, Virginia.
- Eu vivo. - Por um instante, ela se permitiu desfrutar do que ele lhe oferecia. - O que você diria se eu lhe garantisse que ainda não é a hora certa? E que nós dois saberemos, quando este momento chegar?
As mãos dele deslizaram para cima, de forma que os dedos acariciavam a curva de seus seios.
- Eu diria que você está evitando encarar a situação.
- Pois está errado. - Encantada, pois a carícia era incrivelmente suave, ela pressionou o rosto no dele. - Acredite em mim, Johnny, você está errado.
- Para o inferno com a hora certa. Venha para casa comigo, Virginia.
Ela suspirou, enquanto se afastava.
- Está bem, eu vou. - Balançou a cabeça, quando o olhar dele ficou mais profundo. - Mas para ajudá-lo com seu trabalho e não para dormir com você. Hoje não.
Sorrindo, Johnny se inclinou mais e mordiscou-lhe a orelha.
- Isso me dará bastante chance de fazê-la mudar de idéia.
Os olhos dela estavam calmos, quase tristes, quando se afastou.
- Talvez seja você quem mude de idéia, antes que tudo se acabe. Vou dizer a Emily que cuide da loja pelo resto do dia.
Virginia insistiu em ir com o próprio carro, seguindo logo atrás dele com Luna enroscada no assento do passageiro. Ela lhe daria duas horas, prometeu a si mesma. Somente duas horas. Antes de ir embora, faria o melhor possível para clarear-lhe a mente, para que ele pudesse trabalhar.
Gostou da casa dele, com a grama crescida demais, clamando por um jardineiro, a construção com janelas em forma de arco e as telhas vermelhas. Ficava mais perto do mar do que a dela, então a música das ondas podia ser ouvida a todo volume. No jardim lateral, havia um par de ciprestes inclinados, tão próximos que pareciam dois amantes se buscando.
Combinava com ele, pensou enquanto saía do carro e atravessava o gramado que ia até a altura de seus tornozelos.
- Há quanto tempo está morando aqui? - perguntou.
- Uns dois meses. - Ele olhou em volta do jardim. - Preciso comprar um cortador de grama.
- Precisa mesmo.
- Mas acho que gosto desta aparência natural.
- Você é preguiçoso.
Enquanto prestava atenção no jardim, encaminhou-se para a porta da frente, com Luna seguindo-a majestosamente.
- Preciso ficar mais motivado. - ele disse, abrindo a porta. - Sempre morei em apartamentos ou em condomínios. Esta é a primeira casa que tenho.
Virginia olhou em volta.
- Pelo menos escolheu bem. Onde você trabalha?
- Por aí.
- Humm...
Ela seguiu lentamente pelo corredor e espiou pela primeira porta em arco. Era uma sala ampla e desarrumada, com grandes janelas sem cortinas e o piso de madeira sem nenhum tapete. Sinais de alguém que ainda não decidira se iria realmente se instalar. Os móveis não combinavam uns com os outros e estavam repletos de livros, papéis, roupas e pratos sujos que há muito tempo deviam estar esquecidos ali. E havia brinquedos, ela reparou.
- Você lê as cartas? – Johnny perguntou de repente.
- Depende.
- Humm. Tenho um Tarô aqui.
- Deixe-me ver.
Virginia se limitou a sorrir e pegou as cartas.
- Já que as cadeiras estão todas ocupadas, vamos nos sentar no chão.
Ajoelhou-se, fazendo um gesto para que ele a acompanhasse. Depois de jogar os cabelos para trás, tirou do maço de cartas uma Cruz Celta.
- Você está preocupado. Mas sua criatividade não se esgotou, nem está bloqueada. Mudanças vão ocorrer. - Talvez sejam as mudanças mais importantes de sua vida e não serão fáceis de aceitar. Você precisa ter em mente que algumas coisas são passadas através do sangue e outras são perdidas. Não somos sempre o todo das pessoas que nos conceberam. E você não está tão sozinho quanto pensa. Nunca esteve.
Johnny não podia levar na brincadeira algo que se aproximava tanto da verdade. Em vez disso, evitou completamente o assunto, pegando-lhe a mão e levando-a aos lábios.
- Eu não trouxe você aqui para ler minha sorte.
- Sei porque você me convidou e isso não vai acontecer. Ainda. - Com uma pontada de tristeza, ela retirou a mão. - E não estou lendo sua sorte, estou falando do presente. - Com calma, juntou novamente as cartas. - Irei ajudá-lo se puder, e da maneira que posso. Fale-me sobre a dificuldade que está encontrando em sua história.
- Além do fato de que fico pensando em você quando deveria estar criando um roteiro?
- Sim. - Virginia encolheu as pernas sob o corpo. - Além disso. Agora vamos falar de nós! Eu começo!
- Tudo bem...
- Certa vez, quando eu era bem pequena, algumas mães proibiram que suas filhas brincassem comigo. Eu era uma má influência. Era estranha, diferente. O fato de não ser parte de um todo me deixava muito magoada.
Johnny assentiu, compreendendo.
- Pois eu era sempre aquele garoto que acaba de chegar no bairro. Nunca ficava num lugar por tempo suficiente para ser aceito pelos outros meninos. Alguém sempre estava querendo bancar o "valentão" com o garoto recém-chegado. Com as mudanças constantes, eu acabava me sentindo deslocado, atrasado na escola, desejando ter idade bastante para poder ir embora. - Irritado consigo mesmo, ele se interrompeu.
- Como você suportou? - Virginia sempre tivera Parminda, Rony, seus pais e tios, e um profundo senso de pertencer a uma família.
Com um movimento inquieto dos ombros, Johnny estendeu a mão e tocou o amuleto dela.
- Eu fugia. E, desde que em nove de cada dez vezes eu acabava levando um chute no traseiro, aprendi a fugir para lugares seguros. Assim que tive idade suficiente, arrumei um emprego num cinema, vendendo ingressos. Desta forma, recebia um salário e ainda via filmes de graça. Quando as lembranças perturbadoras se afastaram de seus olhos, ele sorriu. - Eu adoro cinema. Simplesmente adoro.
Virginia também sorriu.
- Então, agora, você é pago para escrever os livros.
- Exato! E nem ao menos consigo escrever esse roteiro com a sua história. O que eu preciso é de inspiração. - murmurou, puxando-a para um beijo.
- O que você precisa - ela disse - é de concentração.
- Estou me concentrando. - Ele tocou-lhe os lábios mordendo-os de leve, - Acredite, Virginia, estou me concentrando. Você não quer ser responsável por tolher a criatividade de um gênio, não é?
- Claro que não. - Estava na hora, ela decidiu, de Johnny entender exatamente em que estava se metendo. Decidiu que aquela era a hora de revelar o que era. E talvez isso também o ajudasse a abrir a mente para a história. - Inspiração - disse, deslizando as mãos em torno do pescoço dele..
E eles também chegaram. Quando seus lábios se encontraram, Virginia fez com que seus corpos se elevassem a quinze centímetros do chão. Johnny estava ocupado demais em desfrutar do beijo para perceber. Colando-se a ele, Virginia também se esqueceu de si mesma por tempo o bastante para se perder no calor do momento. Quando interrompeu o beijo, estavam flutuando a meio caminho do teto.
- Acho melhor pararmos.
Ele beijou-lhe a nuca.
- Por quê?
Ela olhou para baixo de propósito.
- Esqueci de perguntar se você tem medo de altura.
Virginia desejou poder capturar a expressão do rosto dele quando seguiu seu olhar, os olhos comicamente arregalados e a boca aberta. E a torrente de blasfêmias que se seguiu. Enquanto Johnny as enunciava, Virginia os levou suavemente para baixo.
Os joelhos dele vacilaram, antes que conseguisse recuperar o controle. Pálido, ele a agarrou pelos ombros.
- Como diabos você conseguiu fazer isso?
- Eu lhe disse que era uma bruxa. E esse é um truque de criança. Bem bobo!
Bem devagar e com muita segurança ele balançou a cabeça de um lado para outro. Mas os dedos nos ombros dela tremiam levemente.
- Isso é besteira.
Virginia exalou um suspiro.
- Johnny Varshall, como sua mente pode ser tão fechada. Me explique? Tudo bem. Deixe-me pensar... Algo simples, mas refinado.
Gina olhou para o que queria. E naquele exato momento, a garrafa de cristal que estava do outro lado da mesinha, veio parar em sua mão.
- Pare com isso. - ordenou com voz trêmula, desabando numa cadeira.
Virginia abaixou os braços, abriu os olhos. Como ela esperava, Johnny a encarava como se ela tivesse três cabeças.
- Acho que exagerei um pouco. - ela concedeu.
- Eu... Você... - Johnny lutava para ter controle da própria fala. - O que foi que você fez?
- Eu queria a garrafa e nada mais justo que ela viesse até mim. Ou você acha que eu ia buscá-la ?
Johnny não estava mais tão pálido, mas os olhos ainda pareciam grandes demais para o restante do rosto.
- Não pretendia assustá-lo.
- Você não está me assustando. Está me deixando desnorteado, isso sim. - ele admitiu.
Sacudiu-se inteiro, como um cachorro molhado, e ordenou ao cérebro que começasse a funcionar. Se tivesse visto o que viu, deveria haver uma explicação. Virginia não teria como entrar na casa dele e preparar o truque com antecedência. Tinha de haver uma explicação.
Johnny se levantou da cadeira e começou a vasculhar a sala.
- Ok, Virginia, como foi que realizou o truque? Foi ótimo, e eu aceito as brincadeiras como qualquer outra pessoa, mas gosto de saber do segredo do truque. Pode me contar...
- Johnny. - A voz dela era baixa e extremamente sedutora. - Páre. Olhe para mim.
Ele se virou, olhou e soube. Embora não fosse possível, não fosse racional, ele sabia. Exalou um longo e cauteloso suspiro.
- Meu Deus, é de verdade. Não é?
- Sim. Não quer se sentar?
Trecho do próximo capítulo:
Virginia se sentou no terraço ensolarado da casa de Parminda, invejando e admirando o jardim maravilhosamente arquitetado pela prima. Daquele ponto em Londres conseguia avistar as águas intensamente azuis da baía.
Ali estava bem escondida dos roteiros turísticos, parecendo a um mundo de distância do burburinho de Londres e, principalmente, dele. Ele precisava de algum tempo para digerir aquilo tudo.
Ela entendia porque Parminda morava ali. Naquela montanha, moravam a serenidade e o isolamento tão necessários à sua prima mais nova. Virginia sempre ia pra lá quando seu coração se tumultuava. O local era muito parecido com Parminda. Adorável, acolhedor, sem nenhuma malícia ou maldade.
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