A Visita de Rony



Virginia já estava irritada quando aparatou na entrada de sua casa, na tarde de segunda-feira. Uma encomenda que estava esperando ficou retida no Ministério e ela havia passado a última hora escrevendo corujas, tentando localizá-la. Ficara tentada a lidar com o assunto à sua própria maneira (um Cruciatus não seria má idéia, ou seria?), pois nada a enfurecia mais do que a ineficiência, mas tinha plena consciência de que tais impulsos quase sempre lhe causavam complicações.
No fim das contas, perdera um tempo precioso e estava quase escurecendo quando finalmente chegou em casa. Planejava dar uma tranqüila caminhada por entre as árvores para arejar a cabeça e acalmar os nervos antes de ter de lidar com Johnny.
Ficou parada por um instante, fazendo uma careta ao ver a motocicleta preta e cromada estacionada na frente da garagem.
Ronald. Seu irmão. Perfeito. Exatamente o que ela não precisava.
Luna, com passos silenciosos, foi se esfregar contra a roda traseira da moto que um dia havia sido de Sirius Black, depois de Harry Potter e por fim, tinha vindo parar nas mãos de Rony, depois da Batalha Final, quando Harry havia sucumbido.
- Que engraçadinha! - Virginia falou, num misto de aversão e ironia, enquanto batia a porta do carro. - Contanto que seja um homem, não é?
- Homens me trratam melhorrrr que mulherres. - resmungou Luna.
- Querida Gina e Luna, estou tão feliz em ver vocês. - Flucke as recebeu na porta da frente com os olhos espertos e a língua sempre pronta a agradar.
Luna, no entanto, passou direto por ele, ignorando-o.
- Não esquenta! Gatos são assim!
- Não, eu não ligo. Mas qualquer dia eu juro que ela vira ensopado de gato... – adicionou.
Virginia parou para afagar-lhe o pêlo antes de guardar a bolsa. Podia ouvir uma das músicas d’As Esquisitonas vindos do seu aparelho de som.
Encontrou Rony exatamente no lugar em que esperava vê-lo. Esparramado no sofá, com os pés em cima da mesinha de centro, tomando um cálice de vinho. Seu sorriso podia ser devastador para as mulheres normais, havia sido assim com Hermione Weasley.
Aliás, o destino foi muito duro com os dois. Ela perdera Harry Potter e ele perdera Hermione, que também havia falecido naquela fatídica batalha contra Voldemort no último ano de Hogwarts. Seu irmão nunca havia se recuperado totalmente. Nem ela, para falar a verdade. Achava que nunca mais iria amar alguém. Pelo menos até há alguns dias atrás.
- Gina, minha irmãzinha mais querida.
- Rony, não esqueça que eu sou a única. Fique a vontade, Roniquito... Como está a mamãe?
- Roniquito? Isso me lembra minha infância! Bem, com saudades de você. Diz que você tem que visitá-la mais vezes. O vinho está excelente. Quem fez? Você ou Parminda?
- Eu.
- Meus cumprimentos. Aqui está - Ele lhe entregou o copo de vinho. - Parece que você está precisando.
- Tive um dia terrível.
Ele sorriu.
- Eu sei.
Ela estava prestes a beber um gole, quando colocou novamente seu copo na mesinha.
- Você sabe que odeio quando espia a minha mente.
- Pois eu nem precisei. Está na sua cara!
Ao perceber que Virginia não iria beber o vinho, Ronald tornou a pegar o copo.
- Gina, nós não nos vemos desde a Festa de Celebração da Queda de Você Sabe Quem, há três meses. - Os olhos dele sorriram um sorriso sem emoção. - Não ficou com saudades de mim?
O pior era que ela havia sentido saudades, sim. Não importava o quanto Rony a provocasse e ele fazia isso desde a época em que ela ainda dormia num berço, Virginia gostava muito dele.
- Senti muitas saudades, mas ando tão ocupada.
- Foi o que me disseram. - Ele fez cócegas sob o queixo dela. - Fale-me sobre Johnny Varshall. Quem é ele? O que ele faz?
Um brilho de fúria lampejou nos olhos dela.
- Que droga, Ronald! É melhor manter os seus dedinhos mediúnicos bem longe do meu cérebro.
- Eu não espiei. Parminda me contou.
- Ah. Desculpe-me.
Ela sabia que, ao menos desde que atingira certa maturidade e controle, Ronald raramente invadia os pensamentos particulares das pessoas. A não ser que julgasse necessário. Mas, como o dela ele sempre tentava invadir, desde então ela estava tentando aprender como trancar a mente. Ainda não havia conseguido por completo.
- Bem - acrescentou - não há nada a dizer. Ele é um escritor.
- Eu sei disso. Pois não assisti no cinema todos os livros que ele escreveu? Quero saber qual é o assunto dele com você.
- Pesquisa. Ele quer escrever uma história sobre bruxas. Aliás, ele deve chegar aqui em duas horas para uma entrevista.
- Ótimo. Isso dará tempo de sobra para você me alimentar. - Ronald passou o braço amigavelmente nos ombros dela. Decidira que Virginia teria de expulsá-lo da casa, se quisesse que ele saísse antes de se encontrar com o escritor. - Conversei com tio Mitchell neste fim de semana.
- Por coruja?
Os olhos dele se arregalaram, chocados.
- E eu lá preciso de corujas para me comunicar com tio Mitchell?
- Está bem. Vou lhe dar o jantar e você pode me contar as novidades.
Virginia jamais conseguiria ficar zangada com ele. Afinal, era a sua família. Quando se é diferente, às vezes a família é tudo com que se pode contar.
Jantaram na cozinha, enquanto Ronald lhe contava sobre as últimas façanhas dos pais, de suas tias e tios.
Ao final de uma hora, Virginia se sentia completamente relaxada outra vez.
- Já se passaram anos, desde a última vez em que vi a Irlanda sob a luz da lua. - Virginia murmurou.
- Pois faça uma viagem. Tio Mitchell e tia Catherina iriam adorar ver você.
- Talvez eu vá, no verão.
- Poderíamos ir todos juntos. Você, Parminda e eu.
- Talvez. - Suspirando, ela empurrou o prato para o lado. - O problema é que o verão é a melhor época para meus negócios.
- Foi você mesma quem quis se tornar uma "pequena empresária".
Havia um belo pedaço de costeleta de porco no prato dela. Ronald pegou-o com o garfo e o comeu.
- Eu gosto do que faço, de verdade. Ter contato com pessoas. Embora algumas sejam bem esquisitas.
Ele encheu os copos de vinho.
- Por exemplo?
Virginia sorriu e apoiou os cotovelos na mesa.
- Houve um sujeito muito chato, que começou a aparecer na loja todos os dias. Insistia em dizer que me reconhecia de outra encarnação.
- Uma "cantada" patética.
- É mesmo. Felizmente ele estava errado, eu nunca o encontrei antes, em nenhuma vida. Certa noite, duas semanas atrás, ele chegou de repente quando eu estava fechando a loja e tentou me passar uma "cantada" muito melosa e direta.
- E... - Ronald acabou de comer o último pedaço de costeleta. Sabia muito bem que sua irmã podia cuidar de si mesma, mas isso não impedia que se sentisse irritado ao saber que algum pseudo-conquistador a considerasse uma conquista fácil. - O que você fez?
- Dei-lhe um soco no estômago. - Ela encolheu os ombros, quando Ronald começou a rir.
- Estilo Virginia. Não podia transformá-lo num sapo?
Ela endireitou-se na cadeira, muito digna.
- Sabe que eu não uso meus poderes dessa forma.
- E quanto a Draco Malfoy?
- Aquilo foi diferente... eu tinha apenas treze anos. - Virginia não conseguiu evitar um sorriso. - Além disso, logo depois o transformei de volta ao normal. Sinceramente, eu acho que se Severo Snape não tivesse chegado naquela hora, Draco iria ser um Lagarto-Sapo com orelhas de bode e verrugas pelo corpo para sempre.
- Só porque Parminda teve de implorar em favor dele. - Ronald fez um gesto com o garfo. - E você deixou as verrugas.
- Era o mínimo que eu podia fazer. - Virginia estendeu a mão e pegou a dele. - Diabos, Ronald, senti muito sua falta.
Ele lhe apertou a mão com força.
- Senti sua falta também.
Virginia pressentiu alguma coisa, o laço que os unia era antigo e profundo demais para que deixasse de perceber.
- O que foi?
- Nada que possamos mudar. - Ronald beijou-lhe os dedos de leve e os soltou. Não tivera intenção de pensar no assunto. - Não há nada com bastante chantilly nesta casa?
Mas ela balançou a cabeça. Havia captado a tristeza. E, embora Virginia não conseguisse ler pensamentos, sabia porque Ronald estava triste.
- É este caso em que você trabalhou, não é? Do menino que foi seqüestrado.
A dor foi súbita e aguda para Rony.
- Não conseguiram resgatá-lo a tempo. O Ministério da Magia fez tudo o que podia, mas os seqüestradores entraram em pânico. Ele tinha só oito anos.
- Sinto muito. - Uma onda de tristeza a envolveu. - Ah, Ronald, eu lamento muito.
- Não pode deixar que isso a afete. Será demais para você, se permitir ser atingida. Mas, que droga, eu estava tão perto do garoto... Quando algo assim acontece, você se pergunta por que recebeu este dom se não consegue usá-lo para ajudar as pessoas.
- Mas você consegue, Ronald. - Ela segurou-lhe o rosto entre as mãos. Seus olhos estavam úmidos, mas fortes. Nem sei quantas vezes você já conseguiu. Só que, desta vez, não era para ser.
- Dói muito. Tanto quanto quando Hermione e Harry morreram.
- Eu sei. - Delicadamente, ela afagou-lhe os cabelos. Tentou não pensar no assunto. - Fico contente por você ter me procurado.
Ronald abraçou-a com força, depois a soltou.
- Escute aqui, eu vim para jantar e dar umas boas risadas, não para deixá-la deprimida. Desculpe-me.
- Ora, não seja bobo.
- Tudo bem. Agora, se quiser que eu me sinta melhor, que tal aquele chantilly?
Virginia deu-lhe um sonoro beijo na testa.
- O que acha de sorvete com calda quente de chocolate?
- Minha heroína!
Ela se levantou e, conhecendo o apetite de Ronald, pegou uma tigela grande. Também sabia que o ajudaria mais se não dissesse mais nada sobre o caso. Ele lutaria para superar e então seguiria em frente, pois não havia outro jeito.
- Então, vai me dizer por que está ajudando o tal de Varshall nas pesquisas?
- Porque me interessa. - Ela aqueceu a calda de chocolate com uma só palavra: - Esquentus!
- Quer dizer que ele a interessa?
- De certa forma. - Virginia fez uma pequena montanha de sorvete de baunilha. - É claro que ele não acredita em nada mágico, apenas explora o assunto nos livros. Mas, na verdade, não tenho nenhum problema com isso. - Pensativa, lambeu o sorvete do dedo. - Com os livros, quero dizer. Eles são divertidos. Agora, a atitude dele... Bem, talvez eu tenha de mudá-la um pouco, antes de continuarmos.
- É um terreno perigoso, Gina
- Ora, Ronald, a vida é perigosa. - Despejou um rio de calda quente sobre a montanha de sorvete. – E podemos muito bem nos divertir com ela.
Para provar o que dizia, cobriu toda a paisagem que criara com uma pilha de nuvens de chantilly e colocou a tigela na frente de Ronald.
- Não tem castanhas?
Virginia bateu com a colher na mão dele.
- Não gosto de castanhas e nós vamos dividir. - Depois de sentar, mergulhou a colher no sorvete. - Acho que você vai gostar do Johnny. – disse com a boca cheia. - Possui uma imaginação abundante. É bom com animais, Flucke e Luna o adoraram. É um grande fã da mamãe, tem um bom senso de humor, é inteligente. E dirige um carro maravilhoso.
- Parece que Johnny Varshall conquistou você.


Trecho do próximo capítulo:

Em seu lugar embaixo da mesa, Flucke levantou a cabeça e emitiu um latido baixo.
- Ela está apaixonada, Rony, pode apostar!
- Flucke... – Virginia se assustou.
- Obrigada pela ajuda, Flucke.
- Comportem-se, voces dois. Estou falando sério.
- Não se preocupe comigo. Vá atender a porta. - A campainha tocou meio segundo depois. Rindo consigo mesmo, Ronald a viu sair em disparada.



Nota da Autora: O que voces acharam desse cap? Bjks.



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