Quem é, realmente, Molly Weasl



Parminda se acomodou numa cadeira com um suspiro de contentamento.
- Quer me falar sobre isso?
- Não há nada para se falar. Ele é um irritante escritor com idéias preconcebidas sobre as bruxas, e não as muda.
- Ah... Aquele Johnny Varshall. – Distraída, Parminda pegou a taça quase cheia de Virginia e bebeu um gole do vinho. - O mesmo que escreveu aquele filme sangrento para o qual você e Ronald me arrastaram.
- Na verdade, o filme era bem inteligente e irônico.
- Humm... Não muito, mas era sangrento. - Parminda bebeu mais um gole. - Mas, de qualquer forma, você sempre gostou dessas coisas. Eu, sinceramente, acho uma baboseira sem tamanho, somos caricaturizadas em filmes assim.
- Os filmes dele para mim são comédias... Nunca vi algo tão fora da realidade. No entanto, o trabalho é bom.
- Pode ser. Mas ainda sim, eu prefiro assistir um show das Esquisitonas.
Automaticamente, Parminda foi examinar as plantas na janela de Virginia. Estavam um pouco murchas. Assim que Parminda botou as mãos nela, elas ficaram viçosas outra vez.
- Não pude evitar sentir uma certa tensão. – disse ainda examinando uma das plantas. - Você parecia prestes a transformá-lo num sapo, quando entrei.
- E ia mesmo se você não chegasse naquela hora. Provavelmente eu seria autuada pelo Ministério da Magia por lançar feitiços em um trouxa. Os obliviadores teriam que vir aqui e apagar a memória dele, seria um desastre. Mas aquele preconceito dele me deixa furiosa.
- Você se enfurece com muita facilidade. Disse que tentaria se controlar um pouco mais, não é, querida?
Emburrada, Virginia pegou a taça de Johnny.
- Ele saiu daqui andando com as duas pernas intactas, não foi?
Tomou um gole e, no mesmo instante, percebeu que foi um erro. Ele deixara muito de si no vinho, que era, na verdade, uma poção reveladora.
“Um homem poderoso” - ela pensou enquanto pousava a taça novamente na mesa. Apesar do sorriso fácil e da atitude descuidada, era um homem muito poderoso.
Talvez algo os estivesse aproximando, mas ela saberia lidar com isso. E lidaria com Johnny Varshall sem qualquer magia.

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Virginia adorava a paz das tardes de domingo. Para ela, era o melhor dia da semana. Sem trabalho, sem clientes, enfim, um dia só para si. Não que evitasse o trabalho, havia dedicado muito tempo e esforço para fazer com que a loja deslanchasse e começasse a dar lucros. Contou, é claro, com a ajuda dos irmãos, que já tinham a Gemialidades Weasley. Ainda assim, acreditava firmemente que a melhor recompensa para qualquer esforço era o descanso, e quando saía da loja, nem que fosse por apenas uma hora, esquecia completamente os negócios.
Ela ficava impressionada em saber que havia pessoas capazes de passar um dia lindo dentro de casa, roendo as unhas por causa da contabilidade. Ela não, pois contratou um contador para cuidar disso.
Não tinha empregada doméstica, mas também não gostava de ninguém mexendo em suas coisas. Ela, e somente ela, cuidava de tudo. Embora os jardins fossem extensos e há muito tempo tivesse aceitado o fato de que jamais teria o mesmo jeito com plantas que sua prima Parminda, ela própria cultivava as mudas. Achava que o ciclo de plantar, molhar, tirar as pragas e colher, era gratificante. E também tinha o Carvalho que ela própria havia plantado alguns anos antes. Tinha que recompensar a natureza por ser a responsável, mesmo que sem culpa, pela morte de um Carvalho centenário quando nasceu.
Aquele era um daqueles dias perfeitos, com o céu límpido e azul e o vento leve. Além dos muros baixos e das árvores protetoras na frente de sua propriedade, Virginia ouvia um ou outro carro passando, de turistas ou nativos, que desfrutavam o cenário.
Luna estava estendida ali perto, sob um raio de sol, com os olhos entreabertos, quase cerrados, a cauda balançando sempre que avistava um passarinho. Se Virginia não estivesse ali, ela bem que poderia ter tentado apanhar um deles, pois, apesar do tamanho, era ágil como um raio. Mas sua patroa tinha opinião bem firme quanto a tais hábitos.
- Nem pense, Luna...
- Pode deixarrrr, não vou comerrrr nenhum deles. Eu sei as rrregras!
Quando o cachorro se aproximou devagar, recostando a cabeça no colo de Virginia, Luna emitiu um resmungo de aversão e voltou a dormir. Os cães não tinham o menor orgulho.
Feliz da vida, Virginia se apoiou nos tornozelos e afagou o pêlo do cachorro, enquanto examinava o canteiro. Decididamente, tinha que pedir à Parminda para dar um jeito naquilo.
Por enquanto iria aproveitar o sol, erguendo o rosto para ele e deixando que seu calor e energia penetrassem em sua pele. Jamais conseguira ficar ali sem sentir a beleza do lugar. Embora tivesse viajado para muitos países, visitado diversos lugares mágicos, o seu lugar era ali, em Londres. Pois seria ali, conforme sabia desde muito tempo, que ela encontraria um amor pra toda vida e criaria seus filhos. Com um suspiro, Virginia fechou os olhos. Não sabia ao certo quando esse dia chegaria, Rony havia previsto, mas não havia lhe dito. Mas, na sua opinião, bem que poderia estar longe. Estava satisfeita com sua vida exatamente como era agora. E quando chegasse a hora de mudar, pretendia se manter totalmente no comando.
Quando o cachorro se levantou com um rosnado, Virginia nem se deu ao trabalho de olhar em volta. Sabia que era ele. Não precisava do seu Espelho Negro para lhe dizer. Nem mesmo diria que se tratava de clarividência, esse território pertencia mais ao seu irmão Rony. Bastava apenas ser mulher para saber.
Sentou-se, sorrindo, enquanto o cachorro emitia uma série de latidos pouco amigáveis. Queria só ver como Johnny Varshall se sairia desta. Queria ver como um homem reagiria quando a mulher a quem fora visitar estava sendo guardada por um monstro enorme daqueles.
Johnny limpou a garganta e depois deu um pulo de susto ao sentir alguma coisa roçando-lhe a perna. Olhou para baixo e reparou que Luna, pelo menos, decidira se mostrar mais amigável que o grandalhão.
- Belo cachorro você tem aqui. - ele disse, cauteloso. - Um belo e... grande cachorro.
Virginia se dignou a olhar por cima do ombro.
- Saiu para um passeio de domingo?
- Mais ou menos.
O cachorro passou a emitir novamente aqueles rosnados baixos e ameaçadores. Johnny sentiu um fio de suor escorrendo pelas costas enquanto a massa de músculos e dentes se aproximava para cheirar-lhe os sapatos.
- Eu... ahn... - O cão olhou para cima e Johnny foi atingido pelo brilho dos profundos olhos azuis contra o pêlo prateado.
- Meu Deus, mas você é mesmo bonito, não é? - Estendeu a mão, esperando sinceramente que o animal lhe permitisse continuar com ela. Depois de completamente cheirada, a mão foi recompensada com uma lambida.
Pressionando os lábios, Virginia ficou observando a cena.
Flucke jamais beliscara o tornozelo de ninguém, mas, tampouco era dado a fazer amizade tão rapidamente.
- Você tem jeito com animais.
Johnny já se ajoelhara a fim de coçar as costas do animal.
Durante toda sua infância havia desejado um cachorro e ficou surpreso ao perceber que ele ainda não desaparecera.
- Eles sabem que, no fundo, eu sou uma criança. Qual é a raça dele?
- Flucke? Digamos apenas que ele é um Weasley. O que posso fazer por você, Johnny?
Ele ergueu os olhos. Virginia estava ao sol, com os cabelos presos e os pés descalços. Nunca lhe ocorrera antes que pés descalços podiam ser tão sensuais.
Até agora.
- Terra chamando Johnny.
- Desculpe-me. Eu estava perdido em meus pensamentos.
- Por que não começa me contando como foi que me encontrou?
- Ora, ora, você sabe que é famosa. - Johnny se levantou-se e foi se sentar ao lado dela na grama. - Fui jantar no restaurante ao lado de sua loja e comecei a conversar com a garçonete.
- Aposto que sim.
Ele estendeu a mão, brincando com o amuleto que ela usava no pescoço. “Uma peça interessante”, pensou.
- De qualquer forma, ela se revelou uma verdadeira fonte de informações. Fascinada e assombrada. Você provoca este efeito em muitas pessoas?
- Multidões. - E aprendera a gostar disso. - Ela lhe disse que eu passeio sobre a baía, montada num cabo de vassoura, todas as noites de lua cheia?
- Foi quase isso. - Johnny soltou o amuleto. - Acho muito interessante a maneira como pessoas normalmente inteligentes e sensatas se permitem serem enganadas pelo sobrenatural.
- Mas não é assim que você ganha a vida?
- Exatamente. E, por falar nisso, estive pensando que você e eu começamos do jeito errado. Que tal reiniciarmos do zero?
Era difícil ficar zangada com um homem atraente num dia tão bonito.
- Sim, que tal?
Johnny pensou que seria mais seguro levar a conversa para onde queria se tentasse uma abordagem indireta.
- Você conhece bem flores e coisas assim?
- Um pouco. – disse pensando na matéria de Herbologia, feita em Hogwarts há alguns anos. – Parminda é melhor nesse ramo.
- Talvez ela possa me ensinar sobre as plantas do meu jardim e o que devo fazer com elas.
- Você pode falar com Parminda... Pode ser que ela encontre um tempinho para dar uma olhada.
- Eu agradeceria muito. - Johnny limpou uma mancha de terra no queixo dela. - Você realmente poderia me ajudar com o roteiro, Virginia. Não há problema algum em tirar as informações dos livros, qualquer um pode fazer isso. O que estou procurando é uma visão diferente, algo mais pessoal.
- Diga-me o que você quer, Johnny.
- Quero dar às pessoas duas horas de diversão. Saber que elas serão capazes de esquecer os problemas e a realidade quando entrarem no meu mundo.
Ele se calou, surpreso e embaraçado. Filosofar daquela maneira não combinava com sua imagem despreocupada.
- E, é claro, quero ganhar rios de dinheiro. - ele acrescentou, tentando sorrir. Sentia a cabeça leve, a pele quente demais.
- Não vejo porque um desejo tenha que excluir o outro. Têm havido contadores de histórias na minha família desde muito tempo atrás, até chegar em minha mãe. Nós compreendemos o valor das histórias.
Talvez fosse por isso que ela não o descartara logo a princípio. Ela respeitava o que ele fazia, isso também estava em seu sangue.
- Veja bem. Se eu concordar em ajudá-lo, não permitirei que você coloque as bruxas como sendo pessoas velhas, corcundas, com verrugas no nariz...
Ele sorriu.
- Então me convença do contrário.
- Cuidado com os desafios, Johnny Varshall. - ela murmurou, levantando-se. - Vamos para dentro. Estou com sede. – Podia muito bem ter conjurado a água, no entanto, o melhor era ser prudente.
Desde que já não estava mais preocupado em ser engolido pelo cão de guarda, que agora caminhava pacificamente ao seu lado, Johnny se demorou um pouco para admirar a casa.
Sabia que as residências de Londres eram belíssimas e exclusivas, pois ele próprio comprara uma. Mas a de Virginia continha ainda o encanto extra da idade e da graciosidade.
Era uma casa de três andares, revestida de pedras, com torres e balcões, bem ao gosto de uma feiticeira, ele pensou.
Porém, não tinha uma aparência gótica nem sombria. Janelas altas e graciosas refletiam a luz do sol e trepadeiras floridas agarravam-se às paredes, entrelaçando-se e se enroscando nas grades de ferro rendilhadas.
Satisfeita com o silêncio dele, Virginia o guiou até a lateral da casa. Atravessaram um pátio revestido de pedras; no formato de um pentagrama, em cuja ponta extrema havia uma estátua de bronze representando uma mulher. A água borbulhava num pequeno tanque aos seus pés.
- Quem é ela? - Johnny perguntou.
- Ela tem muitos nomes.
Foram à cozinha e Virginia encheu dois copos com gelo.
Ela lhe ofereceu o copo, depois se virou e caminhou para uma porta em arco, para fora da cozinha.
- Sabe, estou sempre tentando conter os meus impulsos menos encantadores. - Lançou-lhe um olhar. - Nem sempre dá certo.
Enquanto falava, Virginia levou-o por um largo corredor.
As paredes eram decoradas com tapeçarias antigas e quase apagadas representando lendas, como o cão de três cabeças da mitologia, castiçais ornamentados e pratos de prata e cobre gravados.
Ela optou pela saleta de estar. As paredes eram pintadas num tom de rosa acolhedor, que se repetia no padrão do tapete que cobria o piso de largas tábuas de carvalho. Uma linda estante de madeira entalhada contornava a lareira. Johnny pôde ver que não havia um pedaço de lenha disponível ali e isso era estranho.
Como na loja de Virginia, ali havia muitos cristais, encravados em pedras ou em forma de bastões e retratos de pessoas que pareciam piscar para Johnny. “Não, deve ter sido o reflexo do sol. Que bobagem!”.
- Que beleza. - Johnny deslizou a mão pelas cordas de uma harpa dourada. O som resultante foi suave e doce. - Você toca?
- Sim, aprendi assim que saí de Hogwarts. Quando estou com vontade toco um pouco.
- Hogwarts, onde fica? Nunca ouvi falar nessa escola.
“Claro, seu trouxa”. – a ânsia de externalizar seus pensamentos só não foi maior que o medo de colocar a sociedade bruxa em apuros.
- Na Escócia. Era um internato.
- Uma escola de bruxos creio? – perguntou.
- Mais ou menos isso.
De repente, antes que Virginia pudesse fazê-la desaparecer, Johnny deixou a taça onde estava, preferindo segurar um fino bastão de madeira com algumas pedras incrustradas e dizeres mágicos.
- É a sua varinha mágica?
Achou que falando a verdade se sairia melhor. Ele era um tolo que só visava o próprio umbigo, e isso não iria mudar agora.
- É claro. - ela disse, tirando o objeto delicadamente da mão dele.
Ele encolheu os ombros e se virou, sem ver a maneira como a varinha reluziu antes que Virginia a deixasse de lado.
- Também coleciono coisas deste tipo. Você gostaria de ver. Se algum dia quiser ir à minha casa, o convite já está feito. - Johnny se inclinou sobre uma bola de vidro e viu o próprio reflexo. - Comprei uma máscara de xamã num leilão no mês passado e um espelho mágico. Parece que temos algo em comum: o gosto pelas artes.
Ele sentou no braço do sofá, mas se levantou logo em seguida.
- E pela literatura. - Johnny examinava os livros na estante. - Lovecraft, JK Rowling, Paolini. Eu tenho esta edição do The Golden Dawn. Stephen King, Nora Roberts. Bram Stockler. Sempre esperei que ele aprovasse o meu "Sangue da Meia-Noite”. - Quando retornou o livro no lugar, outro chamou sua atenção. - "Quatro Bolas de Ouro". "O Reino Encantado". - Johnny passou o dedo sobre a estreita borda dos livros. - "Canção do Vento". Você tem a coleção inteira dela. - A inveja fervilhava em seu sangue. - E todos na primeira edição!
- Então, você deve gostar das obras de Molly?
- Está brincando? - Era como se estivesse reencontrando um velho amigo. Johnny tinha de tocar nos livros, olhá-los e até mesmo cheirá-los. - Li tudo o que ela escreveu, umas dez vezes. E quem pensa que ela escreve apenas para crianças só pode ser maluco. É como poesia, magia e ética reunidas numa única obra. E, é claro, as ilustrações são magníficas. Eu seria capaz de qualquer coisa para obter um dos desenhos originais, mas ela se recusa a vender.
Interessada, Virginia inclinou a cabeça.
- Você já perguntou?
- Enviei alguns pedidos através do agente dela. Sem chances. Ela mora numa casa em Ottery St. Catchpole e, provavelmente, usa os desenhos como papel de parede. Eu gostaria... - Virou-se ao ouvir o riso baixo de Virginia.
- Na verdade, ela guarda os desenhos em álbuns enormes, à espera dos netos que deseja ter. – Gina disse rindo.
- Weasley. Molly Weasley. Virginia Weasley. Ela é sua mãe!!


Trecho do próximo capítulo:

- Sua mãe acredita que você seja uma feiticeira?
“Como ele pode ser tão tolo? Será que ele acha que uma bruxa é retirada de dentro de um repolho?”
- Hum, não sei... Seria melhor perguntar a ela, não?
- Você está sendo evasiva de novo. - Johnny se acomodou confortavelmente no sofá ao lado dela. - Vamos colocar desta forma: sua família tem algum problema em aceitar as coisas pelas quais você se interessa?
“Cada vez mais tolo. Não tem jeito mesmo!!!”


Nota da Autora: Uau, quem diria que Molly Weasley é uma autora que escreve livros conhecidos mundialmente por trouxas como Johnny Varshall? E quem diria, que ele iria procurar justamente a filha dela...

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