O visitante noturno



Gina não esqueceu facilmente aquele episódio da carta. E como poderia? Todas as vezes em que estava com Draco ele sempre estava despachando a coruja, queimando uma carta, escondendo algo depressa nas vestes. Quando ela o buscava com o olhar na mesa, lá estava ele recebendo uma carta. Ela notou como ele lia com desinteresse, como as vezes nem lia, e nunca mandava uma resposta. Se ele recebia noticias de casa, não deveria mandar noticias da sua vida escolar? Ela estava preocupada, mas todas as vezes que tentou puxar aquele assunto Draco arrumava os modos mais insólitos de fazer a conversa se desviar, e de faze-la esquecer das suas intenções iniciais. Mas com o passar dos dias, ela foi se acalmando e justificando para sí mesma as esquisitices daquela história. Acabou por não pensar mais no assunto.

"Graças aos deuses" Hermione nunca mais tinha dito nada a respeito de seu presente de dia dos namorados, de Harry ou de Draco. Ela estava ocupada demais estudando para ocupar-se da vida de Gina. Quem demorou a dar trégua foi Lenina...

- Mas ele não mandou mais nada?

- Nadinha... – Gina respondia sem entusiasmo

- D-U-V-I-D-O! – ela apoiou as mãos na cintura – Um garoto apaixonado o suficiente pra te comprar aquele vestido, não ia desistir assim!

- Sei lá, Leny! Talvez ele tenha mudado de idéia! – Gina disse um tanto quanto grossa. – Ah! Desculpe Leny! Eu não queria ser rude, é que...

- Tudo bem... – a amiga sorriu – Sabe o que eu acho? Que você sabe muito bem quem é o gatinho e esta escondendo o jogo...

Gina riu, dissimulando surpresa.

- Amiga, você tem cada idéia!

Novamente, tudo ia se ajeitando. Mas Gina não estava totalmente tranqüila. Mesmo com a alegre notícia do casamento de Gui no final do ano letivo (com uma garota francesa... Gina conhecia aquele nome de alguma lugar...) ela não se sentia tranqüila. Talvez por aquele ano estar sendo muito surpreendente, Gina estava sempre preparada para algo. Como se alguma coisa não estivesse bem... Estava tão sensível que até a leitura de mão da Prof. Sibila a assustava.

- Dias ruins se aproximam! Oh! Pobrezinha! Espere pelo sinal! – a voz soou etérea como sempre.

"Espere pelo sinal...Que coisa mais imbecil pra se dizer! Humf! Bela previsão!", ela resmungava após a aula, "Eu devia ter feito como a Mione e largado essa aula estúpida."

Mas numa noite de lua crescente, Gina recebeu um sinal...

***

Os pés gelados... "Eu deixei as janelas abertas?". Impossível, nas noites de frio os elfos domésticos fechavam as janelas dos quartos do castelo. Mas Gina se sentia gelada. Nos pés, subindo pelos tornozelos, nos joelhos, no quadril, na barriga... Tudo tão frio! Gelado! "Não, não...". os movimentos do corpo não obedeciam. Cada vez mais frio. A sensação desagradável atingiu a cabeça. Doía, doía... ela conhecia bem aquele processo. Ela sabia. Tinha sido assim quando ele usara seu corpo pra fazer coisas que ela não queria. Era desse jeito que ele sugava sua energia... "Não... Isso já acabou, vá embora!". Os olhos fechados lacrimejavam.

- Bom dia menina Virgínia!

Como se respondesse a uma ordem, Gina levantou imediatamente.

O quarto vazio. As camas arrumadas. As janelas abertas. Tom Riddle sentando no balcão da janela, balançando os pés no ar. Gina já tinha visto tudo aquilo antes. "Eu estou sonhando."

- Não é dia ainda, Tom...

Se sentia entorpecida, cansada. Se não fosse aquela estranha força que sentia no ar, ela achava que cairia desmaiada. Tom olhou para a Lua atrás de sí e sorriu.

- Observação inteligente!

- Vá embora... – Gina levou as mãos às têmporas, falando com muita dificuldade. Baixinho, como que reza. – Vá embora, vá embora...

Ele agiu como se não tivesse escutado o apelo. Deu um pequeno pulo para o chão, e sentou-se na beirada da cama de Gina.

- Aliás, você esta cada vez mais inteligente! – ele passou paternalmente a mão na cabeça de Gina (que ainda repetia as mesmas palavras) – Eu estou muito orgulhoso de você....

As mãos de Riddle sobre ela, davam nojo, davam medo. Gina quis reagir, quis livrar-se daquele castigo, mas algo a impedia. Ela começou a chorar copiosamente, escondendo o rosto com as mãos e soluçando alto. "Eu nunca vou me livrar disso...", ela não teve certeza se tinha falado ou se só estava pensado. Não fazia diferença.

- Não chora... – seu tom de voz era calmo, quase doce – Você esta tão bonita! Tão esperta! Vamos lá, você sabe que só os fracos choram... – sem alterar o tom de voz, ele ordenou – Pare.

As lágrimas pararam de fluir, como se tivessem se esgotado.

- Porque você não me deixa em paz? – disse num murmúrio muito baixo

- Porque eu sou seu amigo. – aquela convicção, aquele brilho insano nos olhos – Eu sou seu melhor amigo. E vim te dar os parabéns!

- Parabéns pelo que?

- Muito bom que você tenha finalmente desistido do Potter. – ele falava com intimidade, como um irmão mais velho. O tom de voz, o modo como ele gesticulava lentamente... Enfim, ele a torturava, mesmo que não fizesse nada. – Ele não era mesmo uma boa escolha. Muito magrinho... E, além disso, ele vai viver muito...

As frases se repetiam. Gina sentia como se já tivesse vivido aquela cena mais de cem vezes. Sentia-se presa naquele pesadelo a anos. "Talvez, se eu ficar bem quietinha, ele vá embora...", ela pensou desesperada, as lágrimas grossas querendo rolar pelo rosto, mas presas dentro dos olhos. A visão turva, os soluços reprimidos...

- O Malfoy é uma escolha muito melhor! Lúcio, não é esse o nome dele?

- Draco... – ela corrigiu – Lúcio é o pai.

- Bem, eu estou um pouco desatualizado, você sabe... – ele sorriu. Gina lembrou de como o tinha achado bonito da primeira vez que o viu sorrindo. Sentiu uma dor forte na cabeça, e náuseas. – Mas se é um Malfoy, é uma boa escolha. Eles tem estado do meu lado a décadas! Você mesma me disse isso, lembra?...

- Não! O Draco é diferente! Você não o conhece!

Ele ergueu as sobrancelhas surpreso.

- Eu não preciso! O sobrenome fala por ele. O que te faz pensar que ele vai fugir a regra? Não seja boba menina! – ele deu a sua gargalhada esganiçada, desagradável, cruel – Isso é pedir demais de você, não é?

Movida por uma enorme raiva, uma raiva doentia que só Tom Riddle podia provocar, ela se levantou, ficando em pé na cama.

- Vá embora! – Gina gritou com toda força de seus pulmões. Ele não moveu nem um músculo. – Você é um mentiroso! Você esta na minha cabeça! Você não é real!

- Eu vou... – ele assentiu tranqüilamente – Mas eu volto. Porque eu faço parte de você. Você tem razão, eu estou na sua cabeça... Então, - ele deu de ombros - eu volto.

Gina ficou paralisada de terror quando ele se levantou e se moveu sobre os lençóis, indo em sua direção.

- Bom dia menina!

Ele deu um beijo infantil, suave, carinhoso, na testa de Gina. Foi quase dor.

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