Na Barraca



Praticamente atravessar o país em menos de doze horas usando ferrovias trouxas. De um trem para o outro. E por fim tomar um ônibus até uma última cidade. Por cerca de uma hora os três garotos aguardaram assentados em um banco de ferro na estação rodoviária de Monmouth. Devia ser quase três da tarde quando Hermione, Gina e Luna voltaram com as mochilas recarregadas de comida.

- E agora?- perguntou Harry fitando Draco.

- Seguiremos para a floresta, onde montaremos um acampamento no qual passaremos a noite. Quando o dia raiar vamos espionar.

- E vamos... a pé?- perguntou Harry.

- Algum problema em gastar os sapatos, Potter?- perguntou Draco sorrindo.- Ou talvez você queira que a população da cidade pense que somos mais que um grupo de adolescentes trouxas indo acampar na floresta.

Harry calou-se. O grupo seguiu a pé até a saída da cidade, tomaram o acostamento da estrada, andaram ali por mais de uma hora até uma estrada de terra que levava para dentro da floresta. Seguiram por esta por mais duas horas e o dia já começava a se pôr por sobre as altíssimas copas das árvores quando eles deixaram a estrada e tomaram o mato fechado.

Logo eles sacaram as varinhas, que foram acesas. Harry desejou ter vestido alguma roupa mais propícia para caminhadas do que o uniforme de Hogwarts. Apesar da noite fresca ele sentia muito calor. Não demorou muito e o nó da gravata foi afrouxado.

Eram exatas oito e meia da noite quando eles pararam em uma clareira e Draco jogou sua mochila no chão.

- Ficaremos aqui.- disse ele se assentando.

Os demais fizeram o mesmo.

- A essa altura eles já devem ter sentido a nossa falta.- disse Gina pensativa.

- Hoje é sábado.- murmurou Hermione.- Eles não vão se preocupar até que a segunda feira raie.

- E quando ela raiar provavelmente já teremos partido daqui, o que tornará a caçada mais difícil, ou até impossível.- disse Draco sorrindo.

Blás Zambini, que até então permanecera calado se ergueu.

- Creio que temos de montar algo parecido com um acampamento, não?- sugeriu ele.

- Precisamos de fogo.- disse Hermione se erguendo também.

- Montemos as barracas e então providenciaremos o restante.- disse Blás para ela que concordou com a cabeça.

Hermione e Blás tiraram as barracas de Luna de uma das mochilas e estudavam as instruções quando Draco se levantou e foi até eles com a varinha em punho.

- Vocês não acham que estamos brincando de trouxas, ou acham?- indagou antes de, com um toque de varinha, fazer as barracas se erguerem.- Agora vamos comer.

- Achei que não podíamos fazer feitiços fora da escola!- disse Hermione indo atrás dele.

- Não podemos.- disse Draco.- Mas você não acha que o ministério virá verificar que feitiço de montar barracas ilegal está sendo feito próximo à casa de Lúcio Malfoy, ou acha?

Hermione parou por um minuto. Ele tinha razão. Acabou se limitando a desviar os olhos e ir apanhar a mochila com a comida.

Entre sanduíches calóricos de uma multinacional trouxa, e sucos em caixas eles fizeram o jantar do dia. No fim do mesmo Luna fez uma pergunta que talvez devesse ter sido feita antes.

- Quem dormirá com quem?- perguntou ela.

Os demais se entreolharam. Hermione tentou pensar. Duas garotas em uma barraca, dois garotas em outra e na terceira um casal. Se Rony ali estivesse não deixaria Gina dormir com o namorado em uma barraca. E também não seria uma boa idéia Harry e Draco possivelmente dividirem uma. Ao pensar na solução ela sentiu-se incomodada. Não queria ficar a sós com Harry. Só de pensar nisso já lhe doía o coração.

- Hermione e Luna dividem aquela.- disse Blás.- Potter e Draco esta...

- Você e Gina não dividirão uma barraca!- interrompeu Harry.

- Muito menos você e a Granger!- retrucou Blás.

- Eu não disse que o faria!- disse Harry se levantando.

Blás se levantou também, mas antes de mais nada Hermione começou a falar.

- Gina e Luna ficam naquela.- disse ela apontando a mais distante.- Draco e Zambini na do meio. Harry nesta.

- E você?- perguntou Draco fitando-a.

- Vou ficar de vigia.- informou.

Por um momento Harry esteve pronto para perguntar porque ela insistia tanto em fugir dele. Mas se conformou apenas em lançar um olhar angustiado para Hermione que se levantou.

- Vou procurar algo para acendermos uma fogueira.- informou antes de ir sumir por entre as árvores.

- Tem mais uma coisa que eu gostaria de dizer.- disse Harry vendo-a se afastar.

Draco encarou-o.

- Vejo você engolir Hermione com os olhos.- começou Harry.- Não posso lhe impedir de fazer isso. Mas exijo respeito com as garotas enquanto formarmos um grupo.

- Acha que vou sair agarrando-as por aí, Potter?- perguntou Draco sorrindo.

- Não duvido nada.- murmurou Harry.

- O que você não sabe é que garotas só são agarradas quando se deixam agarrar.- retrucou Draco.

Harry por um momento se perguntou sobre o que ele tentava insinuar, mas no fim descobriu que não queria realmente saber e que, é claro, tudo podia não passar de insinuações maldosas.

- Pois exijo que trate a todas pelo sobrenome.- continuou ele.- Weasley, Lovegood e...- Ele olhou por um momento o vulto de Hermione ao longe.- Está tudo bem por você?

Draco encarou-o por um longo minuto. Então jogou os ombros para trás e sorriu.

- Eu vou me comportar, Potter.




****




Hermione se juntara à Zambini, alguns minutos mais tarde, para montar uma fogueira. Luna e Harry conversavam a um canto. Gina estava assentada sobre um tronco caído e fitava o nada.

- Pensando na vida?- perguntou Draco enquanto se assentava ao lado dela.

Ela virou-se e olhou-o por algum tempo.

- Pensando no meu irmão.- murmurou ela tristonha.

- Para quê pensar nos mortos?- indagou Draco.- Flores arrancadas jamais renascerão. Ele se foi, Weasley. Para sempre!

- Me chame de Gina.

- O Potter me mataria.

- Estou pouco me importando para o Harry!- disse Gina de forma aguda.

- Ele só está tentando lhe proteger.- disse Draco com certa simplicidade.

- Não creio que você é tão mau como o pintam.- disse Gina francamente.

- O Potter é tão bondoso como é pintado.

- Vocês não podem ser comparados.- justificou Gina.- São muito diferentes.- completou enfatizando a palavra muito.

- Somos os dois lados de uma mesma moeda.- Murmurou Draco aéreo.- Lados opostos...

- Por isso toda essa história vai dar certo.- disse Gina sorrindo amigavelmente para Draco de modo que ninguém nunca havia sorrido antes.- Inimigos que se unem!

- Só estamos aqui por haver um objeto de disputa entre nós.- disse Draco.

- Não confunda pessoas com objetos.- disse Gina.- Nunca pense simplesmente em você quando se trata de mais alguém capaz de pensar e sentir talvez mais profundamente do que você próprio é capaz.

- Está dizendo para eu deixar Hermione para o Potter?- perguntou Draco.

- Estou tentando lhe fazer enxergar o que é melhor para ela.- disse Gina quando Blás surgiu por trás e a abraçou. Hermione estava ao lado dele e ela e Draco se olharam por algum tempo até que Blás falou.

- Potter disse estar se sentindo mal. Foi se deitar. Lovegood continua lendo aquela revista.

- Acho que vou me deitar também.- disse Draco.- Estou exausto.

Hermione o observou sumir barraca à dentro. Se assentou onde antes estivera o outro. Blás e Gina observaram-na por um momento.

- Se quiser dormir, Granger.- disse o rapaz.- Eu monto guarda esta noite.

- Não precisa.- disse Hermione sem olhar para ele.- É bom passar a noite em claro às vezes.

De alguma forma Blás concordou com a cabeça. Em seguida ele e Gina se levantaram e seguiram cada qual para sua barraca. Hermione ficou ali. Como se estivesse em uma badalada festa e de repente a música parasse e ela percebesse que tudo tinha se ido.

Aquela foi, sem sombra de dúvidas, a pior noite da vida de Hermione. Quando a lua, minguante, atingiu o ponto mais alto do céu, um inexplicável vento frio tomou todo o lugar. Hermione se levantou e deixou-se cair próxima à fogueira. Tudo estava silenciosamente calmo. As luzes das barracas apagadas e todos, aparentemente, mergulhados em bons sonhos.

E ela ali. A varinha entre os dedos frouxos. Os cabelos soltos. As vestes um pouco sujas de terra. E uma crescente vontade de deixar o seu corpo para, por alguns ilusórios segundos, diminuir a solidão. Porém, de alguma forma ela temia muito fazer aquilo. Sabendo-se tão próxima ao covil dos comensais aquilo se tornava quase que uma ameaça de morte.

Por um momento ela considerou a possibilidade do surgimento de Comensais. O que faria? Talvez mandasse alguns feitiços simples; talvez apelasse para alguma magia avançada que ela sequer tivera tempo de praticar. Mas no momento a possibilidade mais provável seria deixar o seu corpo e atacar pela mente. Como fazer isso? Vá se saber. Mas se Belatriz Lestrange era capaz, porque ela não haveria de ser?

A algumas milhas dali, em uma sacada obscura, também varrida pelo vento a própria Rosa Negra fitava o nada. Caso se concentrasse veria através do mar de árvores aquela que não tardaria a se tornar a sua maior inimiga, aquela que mais cedo ou mais tarde findaria o crescimento, cessaria suas dúvidas e conflitos e olharia em frente, olharia para ela.

- Bela.

Belatriz Lestrange saltou da mureta da varanda e voltou-se para o interior do aposento. Foi curvar-se ao chão em seguida tendo em frente um homem esbelto, de rosto da cor de cera. Fendas no lugar dos narizes, um risco como boca e os olhos destemidos e vermelhos como duas pequenas brasas na escuridão. Qualquer outra pessoa se sentiria como na presença de um Dementador esfomeado ao topar com aquele homem, mas toda aquela energia negativa simplesmente não a atingia.

- Noite, Mi Lorde.- disse ela de olhos baixos.

- Bela.- repetiu o homem enquanto sorria.- Há quanto tempo!

Belatriz mantinha-se ainda curvada, o rosto baixo e barrava com certa facilidade as tentativas de invasão de mente.

- Vejo que já está recuperada de Azkaban.- disse o homem.

- Sim Mi Lorde.- disse Belatriz.- Estou quase completamente recuperada.

- Oh! Levante-se Bela.- disse ele.- Não precisa de tamanha humilhação perante a minha pessoa!

Belatriz obedeceu. Minutos depois os dois estavam assentados. Ele em uma espécie de trono, ela em uma poltrona bem mais simples.

- Li nos jornais a notícia da morte do rapazola.- disse ele mais rapidamente do que ela esperava. Como ela não se manifestou ele prosseguiu.- Aquilo me cheirou à você.

Belatriz sorriu.

- Espero ao menos que tenha conseguido informações valiosas com ele.

- E como, Mi Lorde.- disse mantendo o sorriso.- E como.

- Algo que nos ajude a ter Potter?

- Algo sobre a profecia.- disse Belatriz.

Os olhos vermelhos de Lord Voldemort faiscaram.

- E porque não veio antes?- perguntou ele.

- Tinha que me livrar do garoto primeiro.- disse Belatriz.- Acabei criando uma ligação entre nós, um pouco mais firme do que esperava. Isso poderia ser perigoso.

- Queima de arquivos.- murmurou Voldemort.- E o que dizia a tão lembrada profecia?

- Se me permite, Mi Lorde.- disparou Belatriz baixando os olhos novamente. Voldemort consentiu a interrupção com um gesto de cabeça.- Notícias de Rodolfo?

- Ainda tem esperanças, Bela?- perguntou Voldemort sorrindo amargamente.- Não temos notícias. Se ele ainda estiver vivo não sobreviverá muito.

- E meu cunhado?- perguntou Belatriz.

- Tem quase perdido a cabeça em um plano para tirar o filho de Lúcio de Hogwarts.- murmurou Voldemort com certa impaciência.

- Pobre Draco.- disse Belatriz.- Como os jovens têm a capacidade de fazer bobagens!- murmurou.

- Sei que muito estimas o rapaz.- disse Voldemort.- Mas assim que ele fugir à proteção de Dumbledore será aniquilado.

Belatriz nada disse. Ajeitou-se na poltrona. Uma de suas mãos acidentalmente foi-se chocar contra o ventre. Pensou em Draco, em algum ponto daquela floresta. Pensou nela própria e então no marido. Por último na tão desejada profecia. Se aquilo lhe desse tempo e oportunidades ela não hesitaria em delatar.




****




A noite já começava, parcialmente, a clarear quando Hermione ouviu algum sinal de vida em local próximo. Imediatamente ela se ergueu esfregando os olhos. A fogueira já quase se extinguira totalmente. Pensando se poderia ser mais que o ruído de algum animal, ela caminhou até a barraca das garotas e foi dar com os enormes olhos de Luna.

- Algum problema?- indagou a mesma.

- Acho que ouvi alguma coisa.- disse ela.- Fique aqui fora enquanto faço uma ronda.

Luna se ergueu e saltou para fora da barraca, já com a varinha em punho.

- Se eu demorar muito acorde os outros e mande que Harry volte, imediatamente, para Hogwarts.- disse Hermione antes de ir embrenhar-se no mato.

Deve ter andado num raio de trinta metros em torno do acampamento, mas nada encontrou. Acabou voltando para a clareira. Luna se encontrava de pé no centro da mesma. Hermione se aproximou bocejando.




- Vá dormir.- disse Luna.- Eu fico aqui até os outros acordarem.

Hermione olhou para a cabana de Harry por um instante. Luna sorriu.

- O meu lugar está vago.- disse a garota arregalando seus olhos.

Mal a cabeça de Hermione tocou o travesseiro conjurado e ela pegou no sono. Quanto tempo dormiu ela não soube. A sua única certeza foi de ter dormido mais do que deveria. Quando acordou escutou uma música triste que tomava o ar. Uma música vinda de algum tipo de gaita e que de alguma formo era capaz de triplicar o seu desânimo e a sua tristeza.

Hermione colocou o rosto para fora e observou Luna, que tocava a gaita, Harry estava assentado do outro lado da clareira. Ela se ergueu e deixou a barraca e foi apanhar algo para comer.

- Não sabia que tocava.- murmurou ao se assentar ao lado da garota.

- Nem tudo que é ouro fulgura.- murmurou a outra em resposta.

- Pois é.- disse Hermione em meio a um bocejo.- Onde estão os outros?

- “Espionando.”- disse a garota parando a música.

Hermione mordiscou o sanduíche e olhou o relógio. Eram três e meia da tarde.

- Você comeu, Harry?- perguntou ela sem olhar para o mesmo.

- Sim.- respondeu o garoto evasivamente.

- Que bom.- disse Hermione colocando um canudo na caixinha de suco.- Saco vazio não para em pé.

- Coração vazio também não.- respondeu ele ao passo que Hermione sentia seu estômago dar uma horrenda reviravolta. No momento seguinte mais vozes encheram o lugar. O trio estava de volta.

Falavam animados. Logo se reuniram entre as barracas e contaram tudo o que havia “espionado”. O caminho estava inexplicavelmente limpo - Hermione se perguntou se de alguma forma aquilo não tinha um dedo de Belatriz Lestrange - os comensais que normalmente faziam uma impecável vigília estavam todos em alguma missão e a entrada para os subterrâneos da vila estava completamente à mercê de quem passasse.

Falaram e comeram bastante naquele entardecer. Todos tentavam de alguma forma desviar o nervosismo que naturalmente sentiam. Todos deram mais uma estudada no mapa e escutaram as instruções de como controlar o fogo, dadas por Hermione.

Quando a noite finalmente caiu, Hermione resolveu ir buscar mais lenha. Na realidade aquilo fora uma desculpa para se fingir ocupada. Esta noite estava livre da vigília e sabia o que isso significava. Queria, então, ir deitar-se quando Harry já estivesse adormecido. Para evitar conversas. Para evitar a dor.




****




Hermione se virou assustada ao ouvir passos e viu Draco. Ele se aproximou dela em silêncio e ela sentiu que novamente aquela inacreditável química ocorreria.

Estavam frente a frente agora e ao sentir os braços de Draco em torno da própria cintura Hermione deixou os galhos que carregava caírem. Ele começou a beijar-lhe, mas ela na correspondeu. Ele a soltou e abaixou-se para apanhar e lenha.

Hermione permanecia imóvel. Não podia fazer aquilo para o resto da vida e talvez essa fosse a hora certa para resistir, para parar. Draco estendeu a lenha para ela que a apanhou.

- Quer conversar?- perguntou ele.

Hermione concordou com a cabeça e olhou à volta. Iria começar evitando ficar sozinha com ele.

- Vamos levar a lenha para que Gina e Zambini montem uma nova fogueira.- disse ela dando as costas a Draco e seguindo em frente.

Hermione entregou a lenha para os dois e foi se assentar com Draco. Luna estava na porta de sua barraca, aérea. Harry permanecia trancado na sua própria, alegou aos demais não querer conversa.

Na realidade o primeiro e único problema até agora surgira na hora de montar as barracas. Problema este que se tornava maior para Harry, que vira Hermione desperdiçar uma noite de sono para evitar a companhia dele próprio.

- Você sabe que eu e o Harry não estamos mais juntos, Draco.- começou Hermione.

- Sei, mas acho que não compreendo.- disse Draco.- Como ele também parece não compreender.

- Eu sei que é difícil, mas é que...- fez Hermione.- Não acho justo estar com ele enquanto corro o risco de cair em tentação.

- Cair em tentação?- perguntou Draco em tom divertido.

- Sim.- disse ela.- Foi por isso que por muito tempo eu tentei me manter longe de você. Você é um grande amigo para mim, Draco, mas nunca poderá ser mais que isso.

- Deve haver um motivo, um porque!- disse Draco fitando-a.

- Eu amo o Harry!- disse Hermione com simplicidade.

- E porque?- perguntou Draco baixando de leve o rosto.

- Porque o que?- perguntou a garota.- Porque eu o amo?

- Uhum.- fez Draco.

Por um momento Hermione parou. Gina e Blás haviam acabado de acender a nova fogueira. Apesar de a noite ser quente era bom haver alguma fonte segura de luz. Luna havia entrado para sua barraca e a de Harry continuava como antes.

- “Se me perguntassem porque eu o amava, sinto que a minha única resposta seria: porque era ele, porque era eu.”- murmurou Hermione aérea.

- Algum poeta trouxa?- perguntou Draco fitado-a.

- Deve ser.- respondeu a garota evasivamente.

Silêncio. Seguiu-se um minuto em que Hermione e Draco apenas fitaram o pequeno acampamento montado por eles. Gina e Blás estavam assentados, abraçados, defronte a uma pequena fogueira. A barraca que ela e Luna dividiam já estava apagada. A de Harry estava acesa e por sua sombra podia-se ver que ele aparentemente lia.

- É estranho estar assim...- disse Draco finalmente enquanto espreguiçava.- Em liberdade.

Hermione nada disse.

- De alguma forma eu sei porque as coisas, entre vocês, dois não fluíram.- continuou o rapaz louro.- Você é muito certinha, o Potter, de qualquer forma, também. Ele nunca sairia agarrando-a no meio de Hogwarts, e nem você deixaria que ele o fizesse.

Hermione pensou por um momento, era verdade.

- Eu só obtive algum sucesso contigo por ser atrevido.- sorriu Draco.- Mas acho que chegou a hora de eu entender que a perdi e fazer alguma coisa para lhe deixar feliz.

Hermione olhou para ele.

- Não estamos em Hogwarts.- disse Draco.- Não há ninguém capaz de julgar suas atitudes aqui. Creio que chegou a hora de você mostrar ao Potter que você o quer tanto quanto ele lhe quer.

- Do que está falando?- perguntou Hermione sentindo-se ruborizar um pouco.

- Não estou falando em grego.- disse o garoto.- Você me entendeu muito bem. Vou me deitar. O dia, amanhã, será longo.

Ele se levantou e beijou a testa de Hermione. Em seguida atravessou a clareira e entrou na única barraca que até então estava vazia.

Hermione manteve seu olhar vago durante alguns minutos. Não demorou muito e Gina se dirigiu à barraca que dividia com Luna e Blás à de Draco. E agora ela estava só.

Lembrou-se de Rony, lembrou-se da última noite que passara, lembrou-se de seus pais, de Peter, de sua infância e então se levantou.

Ela não passaria mais aquela noite se sentindo um nada. Não se lançaria mais uma vez naquele abismo interno para se afogar em lágrimas. Ela não se culparia por mais nada. Ela não mais sentiria a morte de Rony. Ela não mais agiria como uma adolescente fútil, mesmo porque as pessoas crescem e deixam de ser o que eram antes. E ela, antes uma garotinha, mesmo que negasse o passar do tempo, agora seria uma mulher.

Mal sabia ela que aquilo a colocaria no alto de um pedestal, a faria pronta para posteriormente desafiar aquela que lhe tirou mais que um amigo. Aquela que lhe tirou um irmão.




****




Harry observou a última sombra de gente se deslocar lá fora. Ele sabia a quem pertencia aquela sombra. Em suas mãos estava um velho recorte de revista. Uma fotografia, publicada em uma revista de fofocas, dele e de Hermione em seu quarto ano. Por um momento ele se distraiu no rosto da garota e quando a mesma adentrou a barraca ele escondeu o recorte rapidamente.

- O que estava fazendo?- perguntou ela se assentando ao lado oposto de Harry.

- Nada.- respondeu Harry evasivamente.

- Quando o olhei lá de fora pensei que estava lendo ou algo assim.- disse Hermione de pernas cruzadas.

- É, eu...- começou Harry.- Eu pensava em você.

Hermione sorriu por dentro. Era bom saber que depois de semanas, sentindo pela ausência dela, ele continuava ali. Como ela o deixou. Os olhos da garota recaíram sobre algo atrás de Harry. Ela arredou até ali e apanhou, sem relutância do outro, o recorte de jornal. Sorriu ao ver sua fotografia ao lado de Harry.

- Todos pensávamos que estávamos juntos naquela época, não é mesmo?- comentou.

- Até eu já me iludi com essa coisa de estar junto a você.- disse ele.- Dias me perguntando o que tem acontecido. O que foi que eu fiz...

- Você não fez nada, Harry.- disse Hermione.- Na verdade fui eu quem fez... Fui eu quem deixou que fizessem.

- O que aconteceu?- perguntou Harry.- Porque não me conta? Esqueceu-se que antes de ser o cara que mais te ama nesse mundo eu sou o seu melhor amigo?

- Contar-lhe e perder-lhe?- perguntou Hermione.- Preferi abrir mão.

- Nada que você possa ter feito pode ser tão grave assim.- murmurou Harry encarando-a.

Hermione baixou o rosto.

- No dia em que o Rony apareceu.- Começou ela.- O Draco veio me entregar as passagens e...

- Ele lhe agarrou?- perguntou Harry sentindo algo ruim, como raiva, lhe subir à cabeça.

- Sim...- disse Hermione.- Não. É como dizem quando um não quer dois não fazem algo... mas na verdade eu não queria, mas acabei cedendo e...

- Achou que não era justo comigo.- completou Harry baixando o rosto também.

- Foi exatamente isso.- disse Hermione.

Seguiu-se um longo e constrangedor silêncio. Harry tentava clarear as idéias. Sentia-se magoado, logicamente, por saber daquilo tudo. Mas de alguma forma ele não queria culpar Hermione. Se o fizesse a perderia de vez. Talvez ele devesse ter dúvidas do que ela sentia por ele, mas de alguma forma ele sabia que ao mesmo tempo em que quem ama faz tudo para deixar a outra pessoa feliz, quem ama renúncia visando a mesma coisa. E, sobretudo, quem ama também perdoa.

- Hermione...- começou Harry erguendo o rosto. A garota fez o mesmo.- Eu acho que...

Os olhos dos dois estavam agora um dentro do outro. Harry sentiu, dessa vez, uma coisa boa lhe subir à cabeça. Junto com isso ele foi se erguendo, Hermione também. Os dois estavam agora de joelhos um defronte ao outro.

- Eu amo você.- murmurou ele antes de beija-la.




Do lado de fora Draco acabara de deixar sua barraca e se recostara em uma árvore para fumar. Não tinha sono e aquela brincadeira de “ser nobre” o estava deixando mau. Para que ele fora aconselhar Hermione, era a sua única pergunta. Na única barraca ainda acesa ele podia ver as sombras das pessoas lá dentro. Por um momento ele desejou estar lá, ao invés de Harry.




As mãos de Harry passeavam pelas costas de Hermione e as da garota perdiam-se nos cabelos da nuca de Harry. Algo crescente surgia dentro dos dois. Algo quase que incontrolável. Algo que lhes faziam arrepiar-se a cada toque. Algo que aumentava o desejo de ter um ao outro mais do que de alguma forma já tinham.

E então eles pararam. Se olharam por um longo tempo e então sorriram.

- Se algo der errado amanhã quero que de alguma forma eu tenha a certeza de que você foi minha.- murmurou Harry.

- Eu sou sua desde a primeira vez que botei os olhos sobre você, Harry.- disse Hermione enquanto tirava os óculos de Harry e depositava-os a um canto.

Harry sorriu e apenas isto. Segui-se mais um minuto de silêncio, dessa vez sem um pingo de constrangimento, pelo contrário. Em seguida Harry abraçou Hermione novamente e começou a beijar-lhe o pescoço enquanto a garota sacava a própria varinha e a de Harry e as jogava junto aos óculos.

Eles se beijaram longamente daquela forma. As mãos de Harry agora passeavam por sob as costas da camisa de Hermione, metade dos botões já desabotoados, enquanto as dela buscavam os botões da camisa de Hogwarts que o garoto ainda trajava.

Quando a camisa foi finalmente despida os dois novamente pararam e se encararam com um olhar que chegava a ser, além de apaixonado, selvagem. Hermione deixou-se cair deitada por ali. Harry a olhou longamente. Como era linda!

Ele passeou os olhos por todo o corpo da garota até que alcançou aqueles olhos castanhos e ela sorriu. Harry se deitou também e foi cobrir a boca de Hermione com a sua.

Do lado de fora da barraca Draco desejou profundamente que eles apagassem a luz, enquanto ele acendia um cigarro trouxa que comprara em uma das estações. Ele deu uma ou duas tragadas até que aquilo, o sussurro das vozes e os ruídos, tudo começou a lhe incomodar profundamente.

Draco se levantou, jogou o cigarro pela metade no chão e apagou-o com o pé. Em seguida foi se deitar. Se alguém deveria manter vigília durante a noite ele não queria nem saber. Ao se deitar descobriu que estava bem mais cansado do que imaginara. Não demorou a pegar no sono e quando acordou, assim que o sol raiou, e escutou vozes lá fora ele desejou ter morrido durante o sono.




***continua***

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