SETAS DE PRATA



CAPÍTULO 32


SETAS DE PRATA



Após os primeiros lobisomens serem abatidos por Lupin e Bull, os outros astutamente trataram de desviar da torre em seus vôos, dirigindo-se de forma ordenada para o pátio interno do castelo, na clara intenção de invadir o interior da escola. Suas gigantescas montarias aladas planavam perigosamente, em rasantes letais, sobre a cabeça dos poucos bruxos que, sob a liderança de Flittwick, compunham as parcas defesas no pátio.

Harry, que com a ajuda de Ron, Neville e seu duplo patrono mantinha os dementadores longe da dupla de atiradores, viu com desânimo a migração das feras para fora do campo de alcance das setas e balas de prata. Lupin rosnou, exasperado, antes de partir em disparada para as escadas, seguido de perto por Bull e seu leal rifle.

- Nós temos que descer! Eles não podem entrar...

- Vão vocês! Nós manteremos os dementadores afastados enquanto pudermos.

Com efeito, a nuvem negra de criaturas descia sinistramente sobre eles, e os patronos dos rapazes já estavam enfraquecendo diante da parede de dementadores que enfrentavam.

Harry concentrou-se em seu feitiço, e prontamente tanto cervo quanto fênix ampliaram seu tamanho e brilho, voltando a afastar os seres nefastos. Como que inspirados pelos patronos de Harry, os de Neville e Ron também se fortaleceram. O urso roliço e prateado de Longbotton correu pelo alto, acertando vigorosas patadas nos andrajosos adversários, arrancando admiração de seus colegas.

- Caraca! – Comentou surdamente Ron, surpreso com a forma do feitiço do colega, que até ali havia manifestado-se apenas como uma nuvem prateada.

- É! Eu sei! – Respondeu o orgulhoso Neville.

Lentamente, os dementadores começaram a retroceder, reunindo-se em círculo a vários metros acima da torre. Satisfeitos em tê-los rechaçado, ainda que temporariamente, Harry e os dois amigos dobraram-se sobre o parapeito, buscando uma visão do que acontecia nos gramados internos da escola.

- Por Merlin, Harry!

- Eles não vão dar conta...

Harry vasculhou a mente com urgência, atrás de algum feitiço que pudesse ajudar a afastar as dezenas de aves negras que se abalavam sobre o castelo. Foi enquanto observava temeroso um dos lobisomens descer de sua montaria e acuar o baixinho Flittwick a um canto, e outros tantos continuarem tentando furar o cerco de defesa, que a memória de um confronto entre Dumbledore e Riddle aflorou em sua mente.

Erguendo a varinha, pediu silenciosamente para que desse certo.

Diante dos olhos incrédulos de bruxos, aves e feras peludas, uma larga faixa de água cristalina e gelada surgiu a alguns palmos das cabeças dos defensores, formando um “teto” para separá-los dos grandes pássaros negros, deixando apenas os lobisomens que já haviam desmontado para serem enfrentados pela pontaria de Lupin e Bull.

As aves ainda tentaram atravessar a barreira líquida, mas afastavam-se em seguida, soltando altos lamentos sofridos.

- De onde você tirou isso? – Quis saber Ron, dividido entre o espanto e a satisfação de ver as “galinhonas negras”, como as chamava, voltando para o céu aberto, apesar dos urgentes protestos rosnados por seus cavaleiros. – Voldemort?

- Não. – Respondeu, voltando-se novamente para os dementadores. – Dumbledore.

- Por que eles não conseguem tocar na água? – Neville ainda admirava a mágica realizada pelo colega.

- Está gelada e dá choques... – Harry resumiu em resposta, franzindo o cenho para o alto. – O que eles estão fazendo?

- Estão fugindo, oras! – Ron atiçou seu patrono novamente no encalço dos dementadores, e o mesmo fez Neville com seu belo e garboso urso.

- Nunca tão fácil ou tão rápido! Estão é armando alguma...

- Harry! Os lobisomens! Veja! – Alertou Neville, apontando para o outro lado da torre. – Estão se afastando também!

De fato, a frota de gigantescas aves reunira-se em bloco e rumava na mesma direção tomada pelos dementadores, a dos portões da escola. Harry desceu os olhos para a alameda que ligava o castelo à Hogsmead e foi então que seu estômago chocou-se contra suas costelas.

Um grupo de pessoas achava-se a alguns metros adiante dos portões e tentavam avançar pelo caminho de pedregulhos, mas estavam sendo rapidamente cercados pelos invasores.

- Mas que hora para o ministro e MacGonagall trazerem o pessoa da vila... – Resmungou Harry, correndo em direção às escadas, com os amigos em seus calcanhares. – Neville, eu e Ron vamos lá ajudá-los, você procura Lupin e diga para que mande auxílio assim que puder. - Orientou, sem diminuir o ritmo das passadas.

Os três separaram-se no fim dos degraus. Harry e Ron buscaram pela porta de entrada e dispararam pelos gramados, atentos sempre aos movimentos dos inimigos. Conforme se aproximavam, conseguiram distinguir a diretora e um bom tanto de bruxos, de costas uns para os outros, protegendo um círculo compacto de aterrorizados aldeões, em quem os efeitos da presença dos dementadores já causavam visível estrago.

- Eles precisam de tempo para chegar ao castelo. – Sentenciou Ron, entrecortadamente.

Harry estacou os passos, segurando o outro pelo braço. Ron viu o amigo fechar os olhos por alguns segundos, e depois voltar a abri-los, fixando-os de maneira esperançosa em algum ponto acima da Floresta Proibida.

- Usei legilimência para pedir ajuda, vamos ver se ela vem...

Logo depois, a figura imponente de um grande hipógrifo acinzentado planou sobre a floresta, e atrás dele vieram vários outros. A um grasnado de comando de Bicuço, os outros hipógrifos partiram de encontro às “galinhonas”, iniciando uma disputada batalha de garras e bicadas. Vários lobisomens caíram de suas montarias e outros tantos foram seqüestrados pelas poderosas garras dos companheiros de Bicuço, que os içavam a alturas espantosas, para então soltá-los, espatifando-os.

- Agora os dementadores... – Com um assobio alto e agudo, Harry requisitou a presença dos patronos. Mesmo os feitiços antidementadores dos amigos responderam a ele. Apontou para o grupo a frente. – Cerquem –os e os levem para o castelo!- Ordenou, antes de retomar a corrida.

Vários lobisomens a pé atacavam os bruxos, e MacGonagall encontrava-se perigosamente colocada entre dois deles, um pouco afastada do grupo maior. Harry sacou a espada das costas e segurou-a com força, aproximando-se de uma das feras que a cercavam e que estava de costas para ele. A diretora o viu achegar-se, mas nada demonstrou. Pôs-se a atirar feitiços ininterruptos na direção do bicho que, absorto pelo ataque, não pressentiu o perigo.

A espada de Gryffindor entrou com um golpe certeiro, de cima para baixo, pela nuca do lobisomem e viajou por sua coluna, ferindo-o de forma letal. Sem esperar pelo resultado de seu ataque, Harry mirou a outra fera, que desistira de MacGonagall e vinha em sua direção. Batendo com a varinha na própria cabeça, Harry desapareceu diante da criatura, em uma eficaz utilização da feitiço da desilusão. O bicho balançou-se de um lado a outro, irado e confuso pela súbita perda de seu alvo.

- “Incarcerous!” – Disparou Harry, e observou as grossas cordas envolverem totalmente o lobisomem. – “Uediósi!” – Arrematou, atirando de forma rápida e violenta o adversário contra uma secular árvore próxima.

Desfazendo o feitiço e pronto para novo ataque, voltou-se para os bruxos e viu com alívio que já se encontravam próximos ao castelo, com Ron, Rufus, MacGonagall e os aurores ainda ajudando os recém chegados Bull e Lupin a acertar os tantos lobisomens que estavam no caminho. Olhando para os céus, viu que Bicuço e sua turma haviam ganho a ajuda dos Testrálios, e levavam agora ligeira vantagem na disputa. Aos poucos afastavam as terríveis aves para longe da escola.

- Vamos Potter! Para dentro! – Chamou MacGonagall, atenta ao fato de que a pequena brecha que se formara na ofensiva das bestas não duraria muito.

Disparando aqui e ali, e cercados pelos patronos, os aterrados cidadãos de Hogsmead e seus protetores finalmente chegaram às portas da escola, correndo com alívio para dentro. Harry agarrou o braço de um bruxo idoso e encurvado, que tropeçava em seu estranho e comprido cachecol, e praticamente o carregou para dentro, enquanto Ron fazia o mesmo com uma jovem que equilibrava-se precariamente sobre estranhos e altíssimos sapatos.

Mal as portas se fecharam em suas costas, uma conhecida e bem vinda voz fez-se ouvir.

- Francamente! Aquilo são sapatos para uma fuga?...

- Hermione! – Ron não se importou com o punhado de testemunhas que assistiam à cena. Avançou para a garota, e tirando-a do chão a ergueu alto, para depois quebrar-lhe as costelas em um abraço bem “Weasley”. – Você está bem?

- Com uma assustadora dor de cabeça e esse hematoma, mas, nada mais que isso... Gina recebeu mais uma dose de poção para dormir, para que não sentisse tanto a presença dos dementadores, mas também já está melhor.

Ron soltou-a, e Hermione abraçou rapidamente Harry, antes de metralhá-los com perguntas, sem dar-lhes tempo para respostas.

- Que feitiço foi aquele com a água? E as feras? Como nos livraremos do resto deles? Quem chamou Bicuço? O que aconteceu depois que fui atingida? Como está Moody? Eu sei que ele foi ferido, mas não estava comigo e Gina na ala Hospitalar, e ninguém me conta...

Harry, que tentava por gestos silenciar a amiga, paralisou os movimentos. Hermione olhou dele para Ron, que havia suspirado alto enquanto esfregava a nuca. O semblante carregado dos dois foi o suficiente para a esperta Hermione concluir acertadamente.

- O gigante me acertou de raspão... – Começou ela, com voz embargada. – Moody me empurrou antes que me atingisse a segunda vez... E foi ele que...

- Hermione, haverá tempo para conversarmos sobre Moody, mas não será agora. Precisamos levantar nossa situação...

- A situação, Potter, graças em grande parte a você, Ronald, Lupin e Bull, está controlada aqui dentro. Aquela barreira d’água ainda mantém os invasores fora, e as feras que haviam conseguido descer no pátio foram alvejadas. – A diretora parecia alguns anos mais velha, o coque antes sempre impecável desmanchando-se. A seu lado vinha Lupin, que de passagem sorriu brevemente para os jovens, ainda empunhando o arco de Hagrid. – Porém, lá fora a coisa só tende a piorar... – Completou MacGonagall. – Concluo que está bem o suficiente para estar fora da cama, Srta. Granger?

Hermione assentiu, o olhar firme esclarecendo que não voltaria para a enfermaria sem uma boa briga.

- Ótimo! Sua ajuda é mais que bem vinda.

- Diretora, o que os trouxe de Hogsmead para cá no meio de um ataque de lobisomens e dementadores? – Harry perguntou de chofre. Os olhos de Minerva brilharam para ele.

- Um exército considerável de comensais, Potter, acompanhados de muitos mais dementadores e lobisomens, cada um tendo como fiel escudeiro um daqueles mortos vivos, inferis. Aliás, posso jurar que vi Rodolfo Lestrange entre eles...

Então este fora o castigo de Rodolfo... Riddle provavelmente havia poupado Bellatrix, já o marido não desfrutara da mesma complacência por parte de seu amo.

- Em quanto tempo eles estarão batendo na nossa porta? – Perguntou Ron, lançando um olhar preocupado pelas janelas térreas.

- Já devem estar nos portões. Presumo que se juntarão aos que estavam aqui e atacarão todos juntos.

Harry esfregou a cicatriz, que de tanto latejar parecia estar sendo marcada a ferro, infiltrando-se pelo crânio e chegando ao cérebro, e olhou para os bruxos postados no centro do hall de entrada, com os olhos arregalados de espanto, observando as paredes de pedra do castelo como se elas fossem atacá-los.

- Seria bom levá-los para os porões da Lufa Lufa também.. – Opinou, acenando para o velhinho que ajudara anteriormente, e que sorria de forma agradecida para o rapaz. – Não serão de grande ajuda apavorados assim.

- A professora Sprout cuidará deles. Vou me juntar a Rufus para tomarmos as decisões necessárias... – Os garotos não conseguiram ouvir o resto, pois a diretora já desaparecia rumo aos interiores da escola.

Harry foi subitamente suspenso pelos braços e sacudido com satisfação. Não precisou ouvir a sonora voz de barítono para saber de quem se tratava.

- Bom saber que está inteiro, amigo! – Alardeou Bull, o soltando. – Luta boa, não? – Indagou, escorando o rifle sobre o ombro.

- Vai ficar melhor! Como estamos de munição?

- Não muito bem, eu temo. Lupin foi agora mesmo arrancar algumas flechas de volta dos corpos daqueles... – O homenzarrão olhou constrangido para Hermione, queque retribuiu sorrindo.

- Não se preocupe, Bull! Eram lobisomens que estavam invadindo a escola. Só tiveram o que mereciam. – Sentenciou , massageando a mancha escura em seu rosto.

- Está doendo muito? – Ron aproximou-se e passou de leve a ponta dos dedos sobre o machucado.

- Até que não. – Reluziu Hermione de volta.

- Honestamente! Essa não é hora para certas coisas!...

Madame Pomfrey passou resmungando isso alto, enquanto levava ataduras e pomadas em direção ao dormitório da Lufa Lufa.

- Se Pomfrey está aqui, quem está com Gina? – Harry questionou com urgência, relanceando os olhos para a escada.

- Não se preocupe! Não há o que consiga tirar Dobby do lado dela, e Luna está lá também. A ruiva não vai a lugar algum sem que fiquemos sabendo. – Assegurou Hermione.

- Como foi que você se livrou de Dobby, falando nisso? – Ron havia sentado-se em um degrau da escada, parecendo bem cansado. Hermione corou tão violentamente que suas faces travaram acirradíssima disputa de vermelhidão com o cabelo do jovem Weasley.

- Eu o petrifiquei quando ele estava de costas. Luna ficou responsável por liberá-lo do feitiço depois que eu saísse...

- Ele não deve estar nada feliz! – Harry sorriu, imaginando a frustração do pequeno. Olhou em volta, depois de sentar-se ao lado do amigo. Os aldeões haviam sido retirados, e agora estavam por ali apenas os componentes da defesa. Harry cumprimentou Madame Rosmerta, e também o casal proprietário da Dedos de Mel, que achavam-se entre eles.

Rufus Scrimgeour atravessou o aposento com passadas largas e nervosas. Passou pelos jovens, subindo mais três degraus, e voltou-se para o grupo pedindo atenção. MacGonagall, a seu lado, nunca pareceu tão séria quanto nesse momento.

- A situação não é boa, e vocês sabem disso. – Começou o ministro, sem rodeios. – Lorde Voldemort nos mandou adversários perigosos e em grande número. Graças às habilidades de vocês... – Lançou um olhar agudo para Harry. – Até agora, nos viramos relativamente bem. A partir daqui faremos o seguinte: nosso principal objetivo é mantê-los fora do castelo, protegendo as pessoas que estão escondidas lá embaixo, bem como os segredos existentes aqui que jamais deverão cair em mãos de bruxos das trevas. Ah, Remo! Quanto sobrou de flechas?

- Não muitas. – Lupin soltou no chão uma dezena de setas manchadas de sangue. – Só consegui recolher as que estavam nos lobisomens que ficaram no pátio depois que Harry criou a barreira d’água... E que graças a Merlin não eram muitos.

- Entendo! Bem, conto novamente com você e Bull para derrubarem o máximo dessas feras que conseguirem. – Apontou o ministro, recebendo rápido assentimento de ambos como resposta. – Ainda temos alguns minutos, pessoal, enquanto nossos inimigos não chegam aos jardins do castelo. Sugiro que descansem... e façam suas orações.

- Venham, vamos ao primeiro andar... Esse silêncio de cemitério dá nos nervos! – Ron reclamou, galgando em seguida os degraus da grande escadaria. Os três deixaram para trás um grupo realmente silencioso de bruxos expectantes.

Os quadros do corredor andar de cima simbolizavam bem o clima no castelo. Todos os bruxos dos retratos escondiam-se como podiam em suas molduras. Apenas Sir Cadogan vociferava do alto de seu gordo pônei.

- Às armas companheiros! Enfrentemos os porcos das trevas malignas com valentia! Amontoados de excremento de dragão!

- Maluco... – Censurou Ron, baixinho.

Harry parou junto a uma janela e apoiou-se com as mãos espalmadas, encostando a testa no vitral frio, tentando obter algum alívio para a dor latente em sua cicatriz. Hermione percebeu, assim como Ron, apenas pela postura do amigo, que ele não estava nada bem.

- O que foi, Harry?

- Tem algo que está me escapando... Há algo no ar que eu não estou conseguindo entender...

- Fora o fato de haver dementadores, lobisomens, comensais e inferis marchando para cá nesse exato momento?

- Este é um dos problemas, Ron! Eles nos atacam, mas algo me diz que não somos o objetivo principal. Parecem estar... gastando nosso tempo!

Ron observou os jardins da escola e retesou-se, puxando o fôlego com força.

- Bom, Harry... Se eles estão apenas se distraindo com as nossas caras, aí vem um recreio e tanto!

Os amigos seguiram a direção do olhar de Ron, e por um momento apenas, Harry Potter permitiu-se desesperar.

A pouca luz do crepúsculo enchia de sombras fantasmagóricas o verdadeiro exército que avançava ameaçador pelos terrenos de Hogwarts. Jamais os três haviam imaginado tamanha constelação de seres das trevas reunidos. Os dementadores formavam a cobertura ideal para os bruxos encapuzados que caminhavam resolutos, ladeados de um lado pelas feras lobisomens, e de outro pelos apodrecidos inferis. No todo, eles ganhavam em número dos defensores do castelo de quatro para um, no mínimo.

- Aquela sua água fria viria bem a calhar, agora!

- Não posso, Ron... O pátio interno é um espaço muito menor que isso. – Mostrou com a mão os metros e metros tomados pelos adversários. – Não conseguirei criar algo grande o suficiente...

Hermione franziu as sobrancelhas, os olhos ansiosos pregados nos pústulas que se aproximavam.

- Harry, se eles chegarem até as paredes do castelo... Não haverá como impedir que entrem. Não todos eles!

- Eu sei! - Aprumando-se, retomou o ar concentrado dos últimos tempos. – Então, temos que mante-los longe, não é?...

Dito isso, dirigiu-se para as escadas, descendo-a de dois em dois degraus, com um “Sim!” entusiasmado de Ron repercutindo em seus ouvidos. Hermione vinha a seu lado, silenciosa por sua vez.

Eles encontraram Rufus e MacGonagall organizando aurores e bruxos para o embate que se aproximava. Harry não perdeu tempo com muitas palavras.

- Se apenas alguns deles conseguirem entrar, já será o suficiente para acabar com as chances do pessoal lá embaixo.

Rufus concordou.

- Jamais pensei que atacariam assim, de frente, todos de uma vez! Temos de sair e enfrentá-los, retardando o máximo sua chegada aqui.

Enquanto o ministro confabulava com seus aurores, MacGonagall pousou a mão sobre o ombro de Harry.

- Como está, Potter?

- Dentro das circunstâncias, bem.

A diretora lhe lançou um de seus penetrantes e avaliadores olhares, e por um momento pareceu ter algo mais a dizer. No entanto, limitou-se a apertar-lhe o ombro de leve, desejando discretamente, incluindo Ron e Hermione.

- Boa sorte! Tenham cuidado!

- A senhora também!

Quando todos já estavam no saguão, varinhas a postos, Neville e Hermione colocados entre Harry e Ron, com Bull e Lupin a apenas alguns passos, Rufus ampliou a voz magicamente e comandou.

- Todos em linha! Bull e Lupin, os lobisomens. Quem tiver um bom patrono, cuidem dos dementadores. Minerva e Flittwick, peguem alguns aurores e criem fogo o suficiente para deter os inferis. Os demais, tratem dos comensais da morte. Não hesitem em matar, se necessário, pois deles não haverá qualquer misericórdia para conosco. E que Merlin nos ajude!

Harry olhou para os dois irmãos que a vida lhe dera, e para Neville também, procurando passar-lhes alguma esperança. Ele mesmo, no entanto, não acreditava que tivessem grandes chances. Ron, muito pálido, girou a cabeça sobre os ombros de um lado para o outro, e segurou a varinha com mais firmeza. Neville tinha os olhos fixos na porta e tremia ligeiramente. Hermione encarava Harry de volta, as feições tensas demonstrando toda sua seriedade.

- Sabe que eles vem atrás de você, então, veja se toma cuidado!

Harry sorriu, apesar dos pesares, e com a espada em uma mão e a varinha na outra, respirou fundo, preparando-se.

- Fiquem juntos e tratem de se defender! Não se preocupem comigo...

Ron ergueu as sobrancelhas ironicamente.

- Ah, claro! Na verdade não estamos nem aí com você!

As portas abriram-se de par em par, tornando a fechar assim que o último bruxo atravessou seus limiares. Várias trancas mágicas puderam ser ouvidas, lacrando o castelo por dentro. Um ao lado do outro, os bruxos do bem foram recebidos pelo coro de imprecações e deboches dos comensais.

- Ora! Ora! Vejam a grande força defensora da poderosa Hogwarts! Meia dúzia de sangues ruins misturados a dois ou três bruxos de meia pataca!

A voz guinchante que sobrepôs-se às demais só podia pertencer a um indivíduo: Rabicho! O feitiço de Lupin o atingiu ainda em meio às risadas roucas dos comensais, e logo azarações, feitiços e contra feitiços voavam pelo ar, sem pausas. Após enviar seu duplo patrono contra os dementadores, Harry estuporou um comensal, e ergueu um lobisomem, deixando-o levitar de cabeça para baixo pelo ar, sem direção definida.

Tentando ficar com os três amigos, que já duelavam com comensais, sob suas vistas, viu também Lupin embrenhar-se em um duelo particular com Rabicho e outro meliante de Riddle. Pelas costas de Remo, um terceiro comensal aproximava-se sorrateiro, e Harry disparou contra ele. Esse momento desatento a sua própria defesa lhe custou um “abraço’ de um lobisomem, que esmagou suas costelas, enquanto o rapaz sentia as grandes garras da besta cravando-se em seus braços. A criatura abriu a boca, arreganhando as pontiagudas presas, e preparou-se para dilacerar-lhe a garganta. Harry girou a varinha na mão, tentando mirar a boca do lobo, e conjurou alto:

- Reducto!

Algo explodiu dentro da cabeça da fera, que largou-o, desaparecendo entre a batalha com angustiados ganidos de dor. Arfando, Harry viu o exército do mal derrubar vários bruxos, e alguns serem perseguidos pelos lobisomens em direção à Floresta Proibida. Sem alvo específico, empunhou a espada, disparando golpes para todos os lados. Havia perdido de vista Ron e Hermione, e buscava por eles quando uma mão metálica e gelada agarrou-lhe o pescoço.

- Olá, filho do famoso e perfeito Tiago! Nos encontramos novamente...

Rabicho sussurrou em seu ouvido, enquanto a mão postiça concedida por Riddle o sufocava.

- Meu Lorde vai ficar tão satisfeito... Vai rever seus perfeitos paizinhos queridos já, já, fedelho! Já paguei minha dívida com você... Já posso matá-lo...

Harry tentou se soltar com todas as forças, mas o aperto da mão prateada de Rabicho era descomunal. Quando o ar já não conseguia chegar aos seus pulmões e seu cérebro começava a embotar, Harry ouviu um estampido seco, que foi disparado a queima roupa contra a cabeça de Rabicho. Este ainda segurou Harry por alguns segundos, e então desabou os braços, soltando- o . O delator de Tiago e Lillian Potter caiu de joelhos, o sangue jorrando pelo buraco em sua testa, e então tombou para frente.

Bull engatilhou novamente o rifle, olhando com asco para a carcaça sem vida de Rabicho, e então voltou-se para Harry.

- Isto foi por seus pais!... E quanto a você, veja se cuida melhor da retaguarda! – Rindo, partiu em busca de novos alvos, retornando para a batalha.

Harry esfregou a garganta, retomando o fôlego. O caos ao redor lhe dizia que decididamente estavam levando a pior, apesar da briga estar ferrenha. Logo combatia com mais dois comensais, e outro juntou-se a eles. Não teve escrúpulos em usar até o que aprendera com Riddle para defender-se do ataque maciço. Depois de algum tempo, sua varinha vibrava entre seus dedos, tão quente que chegava a queimar, e o braço que empunhava a espada ameaçava ter cãibras. Para piorar, a escuridão da noite já os engolia, e Harry e seus companheiros tropeçavam em vultos desacordados, sem saber de que lado eram.

Um feitiço bem colocado o atingiu nas costas, e ele se viu jogado a alguns metros. Na queda, o cantil com sangue de dragão perdeu-se, e sua varinha voou de sua mão. Levantou-se, cambaleando, e quando a primeira seta de prata cortou o ar, atravessando em seguida o lobisomem diretamente a sua frente, pensou ser um delírio causado pela dor.

Mas outras se seguiram a esta, e o rapaz assistiu a uma ordenada fileira de centauros surgir de dentro da floresta proibida, acompanhados por Hagrid e Tonks. Mirando ao mesmo tempo, os centauros disparavam sob as ordens de Agouro, e suas setas certeiras não erravam os alvos. Depois deles, cerca de duas dezenas de unicórnios dispararam em direção aos inferis, e a magia pura que as belas criaturas irradiavam neutralizou o feitiço que os controlava, deixando-os inertes, como bonecos sem vida. A chegada dos reforços entusiasmou a brigada de defesa, e a luta voltou a intensificar-se.

A mão do tamanho de uma pá de Hagrid ajudou um ainda tonto Harry a ficar de pé de uma vez.

- Você está bem?... Vamos, pegue seus colegas e entre na escola. Nós assumimos daqui.

- De jeito nenhum. Ainda há muitos deles.

Recuperando sua varinha, partiu para o ataque, com Hagrid logo atrás, derrubando comensais a torto e a direita com socos indefensáveis. Lupin e Tonks ajudavam Rufus a duelar com seis comensais, e perto deles Ron e Hermione enfrentavam combate igualmente injusto. Foi para eles que Harry se dirigiu. Alguns feitiços depois, ele e os amigos amarravam os adversários quando Harry olhou na direção do castelo. Seu coração afundou até os pés.

Luna Lovegood estava parada na porta, claramente tentando chamar a atenção dos três, mas sem condições de dar mais um passo que fosse. Trazia nos braços o que os amigos suspeitaram ser o corpo desacordado de Dobby. Harry venceu a distância que os separava sem sentir o chão sob os pés.

- Luna! O que?...

- Harry... Gina!...

Ron tirou Dobby dos braços da garota, que ajoelhou-se, exausta e em soluços. Harry segurou-a pelos braços, sacudindo –a .

- O que aconteceu? Precisa falar!

- Ele levou... Gina... Ele ... e aquela... aquela...

- Quem Luna? Como? – Ron tinha os olhos chocados e Hermione olhava de Luna para a batalha que ainda se desenvolvia, e dela para Harry, claramente sem saber o que fazer. Harry entretanto, ao contrário do que seria de se esperar, pareceu acalmar-se, e a voz estava tão fria quanto seus olhos quando ele respondeu a Ron.

- Riddle. Tom Riddle está com Gina. A pegou para garantir que eu vá até ele.

- Não pode ser! Nós saberíamos se tivesse entrado na escola...

- Eu sei que ele está lá, Hermione, porque fui eu que o coloquei para dentro. Ele e Nagini. – Concluiu Harry, os olhos verdes tomados pelo ódio gelado que a simples lembrança de um velho tropeçando em seu próprio cachecol lhe provocava.













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