As cartas de ninguem



----CAPITULO QUATRO----

As cartas de ninguém

Kyo não saia de seu quarto já fazia vários dias, Harry não viera visitá-lo e nem sua mãe viera tentar consola-lo, ele passava o dia olhando para o teto, sua vida não tinha graça, ele queria voltar para a escola, onde tinha alguma coisa para fazer, por alguma infeliz coincidência não tivera deveres de férias para fazer.

Era quase hora do jantar, Kyo sentia seu estomago doer de fome, ele aguardava ansiosamente o pacote de biscoitos que seu pai lhe dava pela manha, na hora do almoço e na do jantar. Kyo sabia que seu pai não deixava sua mãe levar a sua "refeição" por que ela levaria muito mais do que apenas biscoitos. De repente a porta se abriu, era seu pai:

-Venha. -disse ele rispidamente.

-Já posso ir ao banheiro. -o garoto só ia ao banheiro depois das dez da noite.

-Não, você vai jantar conosco a mesa.

Kyo estranhou a atitude de seu pai, que pareceu reparar em sua reação:

-Sua mãe me obrigou.

Eles desceram as escadas lentamente, Kyo evitava movimentos repentinos, sabia que seu pai se assustava com muita facilidade e se irritaria se ele o assustasse. Quando chegaram a sala de jantar a Sra. Hunter servia o jantar, seus irmãos, Kyo reparou, fizeram uma careta quando o viram entrar.

-Com fome querido? -perguntou a Sra. Hunter.

-Muita.

Kyo se sentou entre Amanda e Junior, o pior lugar possível, mas para quem não tinha uma refeição descente há dois dias era ótimo. Sua mãe pôs a mesa batata assada coxas de galinha purê de batata, coisas que Kyo adorava, mas nunca tinha a oportunidade de comer, sempre comia depois de todo mundo, pois odiava fazer as refeições ao lado de seus irmãos ou seu pai, e estes sempre comiam muito mais do que seus estômagos agüentavam, Kyo desconfiava que aquilo era só para impedi-lo de saborear os melhores pratos de sua mãe.

Mal a Sra. Hunter se sentara os seus irmãos passaram a lhe chutar por debaixo da mesa, Kyo tentava ignora-los, o que era muito difícil, a tentação de chutar um deles era muito grande. O garoto comeu o mínimo que sua fome permitira, sabia que se comesse demais seu pai não perderia a chance de chamá-lo de fominha e dizer que o garoto só servia para devorar o fruto do suor dele, suor esse que Kyo desconhecia, pois o pai passava o dia sentado numa poltrona macia em um escritório grande e fresco.

Quando ia subindo para seu quarto, logo após a sobremesa, sundae de chocolate, seu pai o chamou:

-Você não vai assistir ao filme de hoje conosco?

O queixo de Kyo caiu, seu pai o chamava para assistir a um filme com ele. O garoto voltou para a sala lentamente, temia que seu pai tentasse ataca-lo com alguma arma.

Quando se sentou no sofá, ao lado de sua mãe Kyo reparou que seu pai forçava um sorriso, Kyo teve que fazer um esforço enorme para segurar o riso. Os irmãos de Kyo subiram para dormir, Amanda tinha uma careta de revolta ao pisar na escada.

Kyo mal começou a assistir ao filme e dormira, talvez a fome tivesse lhe tirado só sono, mas agora que tinha comido seu sono reaparecera com força total, sua cabeça pendeu para o lado, ele se perguntava o por que de tanta gentileza por parte de seu pai, nem mesmo sua mãe, com todo o seu charme era capaz de convencer seu pai a ser bom com o garoto, talvez ele tivesse bebido umas a mais, "é talvez seja isso" pensou ele "ele adora ficar bebericando aquelas coisas que ele tem naquele bar, talvez tenha perdido a noção do quanto bebera...", ele não pensou mais, mergulhou num sono pesado e, de inicio, sem sonhos.

Kyo estava tendo um sonho estranho, estava deitado no chão de um quarto que lembrava muito o seu, a não ser pelos enfeites de bebe, olhava para um lado e para o outro tentando entender o que estava fazendo ali, de repente apareceu pela porta uma criatura que de inicio ele não reconheceu, depois ele percebeu que era um rato. Um rato cinzento e gordo, mas sem vários tufos de pelo, era muito mais nojento do que um rato normal, ele avançava lentamente em sua direção, Kyo tentou se levantar, mas não conseguia, não sabia como, tentou gritar e tudo que saiu foi um barulho de engasgo, de repente o rato começou a se erguer e crescer, os pelos estavam desaparecendo e roupas negras surgiam do nada, agora no lugar do rato havia um homem baixo e gorducho, meio careca e com um ar ratinhento, o homem olhou para ele com uma certa pena, mas o pegou no colo, sem conseguir se controlar Kyo começou a chorar e então percebeu o que estava acontecendo: era um bebe e estava sendo seqüestrado. De repente tudo ficou escuro e tudo que ele escutou foi uma fria gargalhada acompanhada por uma luz verde ofuscante.

Kyo acordou suando frio, estava deitado no sofá da sala de estar de sua casa, seus olhos arderam ao se encontrarem com a luz do sol que invadia a sala pela janela. Kyo se sentou e olhou a volta, um barulho de talheres vinha da cozinha, cocou os olhos e vestiu seus tênis, apesar de não se lembrar de tirá-los, se ergueu e se dirigiu a cozinha.

Toda sua família tomava o café da manha, ao vê-lo entrar na cozinha a mãe do garoto se levantou e foi na direção do fogão:

-Bom dia querido, espera um pouco que eu já vou te servir.

-Tudo bem... -disse Kyo se sentado à mesa ao lado de seu pai.

-Bom dia. -disse seu pai, sem tirar os olhos do jornal.

-Bom dia.

A mãe do garoto pôs um prato com bacon e ovos a sua frente, Kyo olhou para seus irmãos que se serviam da segunda remessa de bacon, "como podem ser tão porcos e esfomeados?" se perguntou o garoto, ele baixou seus olhos para seu prato, quando cortou o primeiro pedaço de bacon sua mãe chamou sua atenção:

-Kyo, se lembra daquele bilhete que sua professora me mandou?

-Lembro, por quê?

-Era sobre sua visão, ela acha que você tem miopia.

-Eu vou precisar de óculos?

-Acho que sim, por isso vamos ao oftalmologista, depois do café.

-Tá certo, talvez eu possa dar uma volta lá no centro.

-Nada disso. -seu pai interviu -Você vai e volta com sua mãe.

-Por quê? O senhor nunca me proibiu de ir no centro!

-Não que eu não queira que você vá, mas eu fiquei sabendo que ocorreram alguns assaltos por lá.

Kyo não acreditou. Ou estava ficando maluco ou o que sentira na voz de seu pai fora uma nota de preocupação, pela primeira vez na vida sentira que seu pai estava preocupado com seu bem estar. Ele olhou para sua mãe que parecia tão surpresa quanto ele.

-Tá certo... -murmurou o garoto, sua voz parecia meio incerta.

Às oito horas em ponto o carro dos Hunter saia da garagem e ia em direção ao centro. Kyo olhava pela janela, mal se lembrava da ultima vez que andara de carro por aquelas ruas, desde os oito anos ia para a escola sozinho, de repente um grupo de motoqueiros passou rasgando pelo lado do carro.

-Esses motoqueiros, pensam que são os donos da rua, passam rasgando sem se preocupar com o resto do trafego!

O Sr. Hunter adorava reclamar enquanto dirigia, reclamava do transito, reclamava do trabalho, do governo, do banco, de Kyo, o banco e Kyo eram seus assuntos preferidos, mas hoje ele ainda não pegara no pe do garoto.

-... e aquelas taxas de juros, Marta, eles pensam que as pessoas só trabalham para pagar essas malditas taxas!

-O banco é uma instituição injusta... -disse Kyo.

-O que? -seu pai se virara para escutar melhor.

-O banco, é injusto. -repetiu o garoto.

-É, eu sei disso.

-Então, as pessoas no banco só te emprestam dinheiro diante de alguma prova de que você não precisa dele.

O Sr. Hunter encarou Kyo, Kyo se preparou para a bronca.

-Sabe que você está certo, isso é uma bela verdade, agora eu tenho uma piadinha para a roda de amigos...

Kyo se impressionou, seu pai estava concordando com ele, alguma coisa estava muito errada. Kyo passou mais da metade da viagem quieto, estava achando estranho o comportamento do pai. Quando lembrou de seu sonho achou que seria bom comentar com a mãe:

-Eu tive um sonho estranho...

-Que sonho, querido? -perguntou sua mãe.

-Um rato, eu estava deitado no chão e ele veio pra cima de mim e de repente ele virou um homem...

-RATOS NÃO VIRAM HOMENS!!! -rugiu o Sr. Hunter.

Kyo se esquecera que seu pai detestava coisas que fugissem a realidade, sentiu que seria punido severamente por isso:

-Kyo, -começou -desculpe, é que eu detesto essas coisas estranhas, você sabe...

Kyo agora realmente se assustara, seu pai lhe pedira desculpas. Kyo sentiu sua mãe se fechar involuntariamente de susto.

Ao chegarem ao centro da cidade o Sr. Hunter os deixou em frente ao oftalmologista e foi para a firma, ao verem o carro do Sr. Hunter virar a esquina Kyo olhou para sua:

-O que você deu pra ele?

-Nada, só pedi para ele moderar.

-Você deve ter enfeitiçado ele...

A Sra. Hunter pareceu indignada ao escutar aquilo, Kyo achou melhor não comentar mais nada, eles entraram no consultório em silencio, a Sra. Hunter parecia outra mulher.

Kyo ficou sentado na sala de espera enquanto a Sra. Hunter revia a marcação da consulta com a recepcionista, uma moça muito bonita com cabelos castanho-escuros e lanzudos presos num apertado coque na nuca e olhos muito verdes realçados pela maquiagem, Kyo sentiu uma leve contração no baixo ventre quando a moça veio em sua direção, o que em lugar nenhum era comum.

-Kyo Hunter? -perguntou ela.

Kyo não respondeu, apenas sacudiu a cabeça em sinal positivo, a moça abriu um largo sorriso e lhe estendeu a mão:

-Prazer, Letícia Longbotton.

-Hã... O prazer é meu...

Kyo apertou a mão da moça, meio hesitante, a moça pareceu perceber por isso sentou-se ao lado dele:

-Eu sou assim mesmo, quando vejo alguém de quem gosto tenho que conhece-la.

Kyo fez que sim com a cabeça em sinal de que entendera, a moça se ergueu e voltou-se a Sra. Hunter, que a encarava estranhamente, elas conversaram um pouco, a Sra. Hunter fazia muitos sinais com as mãos.

-Muito bem, é só esperar um pouco. -disse a Sra. Hunter quando voltou.

Kyo pegou uma das revistas que estavam numa mesinha de centro e folheou, a maior parte eram propagandas, mas no meio ele encontrou uma reportagem estranha:

"Nove pessoas encontradas abandonadas dentro de um terreno baldio em Londres, sete delas estavam mortas, sendo que os peritos não conseguiram determinar o motivo da morte, quase como se a essência da vida deles tivesse sido tirada deles, os sobreviventes disseram que tudo o que se lembravam era de estarem pendurados a dez metros do chão e de luzes verdes e gargalhadas a distancia, um deles disse se lembrar de um rato gorducho que andava em cima dele e de um homem baixinho e também gorducho que o vigiara durante metade da noite..."

Kyo parou de ler a revista, em seu sonho vira um homem gorducho, um ratinho gorducho, escutara uma gargalhada fria e cruel e vira uma luz verde e ofuscante, seria coincidência? Ele lembrava de ter lido uma reportagem sobre pessoas que captavam os sonhos e lembranças dos outros, podia ser o que estava acontecendo com ele, mas estavam a quilômetros de Londres, seria capaz que ele captara uma lembrança de tão longe? Ou será...

-Kyo, vamos. -a voz de sua mãe interrompera seus pensamentos.

-Oi?

-Vamos, o doutor está chamando.

O garoto se levantou, meio fora de sintonia, estava confuso, seus pensamentos fugiam a toda hora para aquela reportagem. Quando entrou no consultório aqueles pensamentos desapareceram de sua cabeça, aquele era um lugar muito interessante, muitas figuras estranhas estavam espalhadas por ali, olhos que eram tão bem feitos que pareciam ter sido rançados de pessoas de verdade, modelos de cérebros em tamanho real, fotos de paisagens incríveis de tão belas, Kyo parou em frente a uma passou a observa-la.

-Incríveis, não? -disse uma voz rouca as suas costas.

-Hã?

Kyo virou-se e deparou com um senhor alto e meio careca, o cabelo que lhe restava era prateado, seus olhos era negros como besouro, ele usava uma capa branca e ossinhos em forma de casco de tartaruga.

-As fotos, são lindas. -repetiu o senhor.

-É, realmente são, foi o senhor quem as tirou?

-Foi, são de um lugar incrível, já foi ao Brasil?

-Não, nunca sai do país, mas por essas fotos deve ser um lugar incrível.

-E como é, mas você poderá ver melhor se usar óculos.

-Mas eu não sei se preciso...

-Aposto que sim, e pelo seu modo de olhar uns dois graus.

Kyo olhou para o homem que sorria abertamente, Kyo não pode deixar de sorrir também, o homem tinha um jeito de sorrir engraçado.

-Dr. Israel, o senhor realmente acha que ele precisa de óculos?

-Sra... Hunter? Acho que sim, ele aperta levemente os olhos quando tenta olhar alguma coisa mais longe ou menor.

Kyo se espantou com o dito pelo doutor, ele devia ser muito experiente para tirar uma conclusão apenas pelo modo de olhar do garoto.

-Bem, Kyo -disse ele olhando a ficha -vamos dar uma olhada nestes olhos?

Uma hora e meia depois eles estavam na óptica esperando pelos óculos de Kyo, o garoto escolhera um modelo que a mãe dele achou esquisito, as lentes eram ovais e a armação pegava apenas a metade de cima destas.

-Kyo, você não acha que fica esquisito com esses óculos? -disse a mãe do garoto quando eles pagaram os óculos e saíram da loja com estes.

-Que nada, mãe ficou legal. -disse o garoto apertando os olhos, estranhando os óculos que estavam sendo usados pela primeira vez.

-Se você acha, mas eu acho que você ficou melhor com aqueles óculos redondos.

-Eu tava muito parecido com o Harry!

-Mas você sempre adorou parecer com Harry.

-Mãe, eu vou fazer quinze anos!

-Tá bom, tá bom, não precisa se alterar.

Kyo se lembrou de que Harry tinha cicatriz na testa exatamente igual a sua, mas achou melhor não comentar, sua mãe podia achar aquilo alguma besteira, ou até mesmo achar que Harry fora o causador de sua cicatriz.

Eles andaram pelo centro da cidade por algum tempo, a Sra. Hunter parando em quase toda loja ou boutique pela qual passavam, Kyo preferia as bancas de jornal, adorava ler as revistas ou os informativos que eram vendidos, isso por influencia de Harry que sempre levava revistas para eles lerem.

Quando chegaram em casa eram mais de sete horas, a Sra. Hunter resolveu entrar numa loja de jóias para ver as pecas que havia ali, ela ficara escutando o vendedor por horas sem se cansar, sob o pretexto de que seu aniversario de vinte anos de casada se aproximava, Kyo apenas olhava a enorme variedade de jóias belas que havia ali, reparara que o segurança da loja não tirara os olhos dele.

-Kyo, da pra levantar esses óculos? -disse a Sra. Hunter quando abriu a porta de casa.

-Tá bom, mamãe... -ele ajeitou os óculos na altura dos olhos.

Quando pisaram em casa Kyo foi recebido por gargalhadas, seus irmãos riam da cara dele com os novos óculos, Kyo lançou um sorriso malicioso para eles, apesar de terem a proteção de seu pai, os dois sabiam Kyo sempre tinha cartas na manga para burlar a vigilância de seu pai. Kyo não viu seu pai, por isso presumiu que ele ainda não chegara, mas estava errado.

-Marta? É você? Venha a cozinha, por favor. -gritou ele da cozinha, sua voz parecia urgente.

A Sra. Hunter obedeceu e foi em direção a cozinha, Kyo reparou na urgência da voz do pai e correu atrás, seus irmãos em seus calcanhares. Quando chegou a cozinha viu que seu pai tinha em suas mãos uma carta de um papel grosso e amarelado, um outro papel que continha um tipo de lista estava sobre a mesa ao lado de um envelope do mesmo papel que os outros dois papeis, Kyo leu o que havia escrito no envelope:

Kyo Hunter,

Rua dos alfeneiros numero 4

Little Winging,

O primeiro quarto após as escadas,

Surrey.

-Hei, esta carta é minha! -gritou o garoto, indo em direção a mesa.

-Saia! -gritou seu pai.

-A carta é minha, eu quero ler!

-Eu quero ler! -gritou Amanda, pulando pra cima do pai.

-Pai, me dá! -disse Junior, puxando a calça do pai.

-Saiam daqui! -gritou o Sr. Hunter -Os três!

O Sr. Hunter, de alguma maneira que Kyo não entendeu, agarrou os três e os jogou no corredor, Kyo travou com seus irmãos uma guerra silenciosa para ver quem olharia pelo buraco da fechadura, seus irmãos apesar de pequenos eram fortes e estava em maior numero, podendo atacar pela frente e por trás, Junior deixou que Amanda olhasse pelo buraco e ficou esperando, Kyo ficou com a brecha entre o chão e a porta.

Kyo viu os sapatos lustrosos do pai caminhando de um lado para o outro e sua mãe batendo o pe:

-O que foi Mattew? -perguntou a Sra. Hunter.

-Eles estão atrás dele Marta, eles já começaram.

-Eles quem?

-Eles Marta!

O Sr. Hunter parou em frente à esposa, esta ficou quieta por alguns instantes e depois soltou um gritinho abafado.

-Mattew, será que eles vão toma-lo de nos?

-Eu não vou deixar, ele não vai!

-Mas e se ele quiser ir? Ele disse que não poderíamos impedir.

-Ele só vai querer ir se ficar sabendo, vamos obedecer ao que disseram, não vamos contar nada.

-E se Harry já tiver contado?

-Não, ele não contou, o velho não deixaria.

-Será Mattew?

-Eu tenho certeza, o velho é caduco, mas nem tanto.

-Mas eles sabem onde moramos!

-O velho já veio aqui.

-Mas como ele sabe do quarto dele.

-Não sei.

-Será que estão no observando.

-Observando, vigiando, até nos seguindo!

O Sr. hunter se dirigiu à porta, Kyo se levantou o mais rápido que pode e correu para o começo do corredor. O Sr. Hunter apareceu à porta e olhou severamente para Amanda e Junior, depois para Kyo, que estava encostado à parede.

-Para seu quarto! -disse ele.

-Vai. -disse Amanda, com um sorriso malicioso.

-Os três! -disse o Sr. Hunter rispidamente.

-Mas pai... -começou Amanda.

-Agora. -sua voz estava em seu tom ais letal.

Amanda sabia era melhor obedecer, apesar de nunca ter ouvido aquele tom de voz se dirigindo a ela, pôs o braço no ombro de Junior e o conduziu a escada. Kyo não se moveu.

-Você não ouviu? Vai pro seu quarto. -disse o Sr. Hunter, sem olhar para o garoto.

-Quero minha carta.

-Não era pra você, foi um engano.

-Não foi engano, o endereço estava claro.

-Eu disse que foi um engano.

-Eles sabiam qual era o meu quarto!

-Era um engano, droga!!!

O Sr. Hunter olhou para o garoto de uma maneira assustadora, mas Kyo manteve seu olhar firme, até seu pai resolver se mover e passar por ele.

-Se eu voltar e você estiver ai eu não iria querer estar na sua pele.

Kyo foi para o seu quarto em silencio, se deitou em sua cama e ficou encarando o teto sem pensar em mais nada alem daquela carta, sem perceber acabou adormecendo, ainda de óculos.

Na manha seguinte Kyo desceu para tomar café pensando que ainda ontem daria tudo para poder descer normalmente, mas hoje preferiria estar preso em seu quarto com aquela carta. Quando entrou na cozinha seus irmãos riram de sua cara, que estava marcada pelos óculos.

-Bom dia. -disse Kyo.

Nem seu pai nem sua mãe responderam, o garoto sentiu um certo peso. Sua mãe o serviu e ele comeu em silencio, até seu pai lhe dirigir a palavra:

-Você vai para Smeltings.

-Por quê?

-Porque eu quero que você vá!

-Mas eu não quero.

-Até semana passada você queria.

-Tá bom, eu vou...

Kyo continuou a comer, se perguntando se seria bom estudar em Smeltings, até que Amanda cutucou suas costelas:

-Ouvi dizer que eles enfiam a cabeça dos alunos novos na privada no primeiro dia de aula.

-Que legal...

De repente a campainha tocou.

-Kyo, vá atender.

-Você quer ir lá em cima treinar? -perguntou Amanda.

-Não, acho que a pobre da privada não agüentaria algo tão podre quanto sua cabeça. -disse Kyo saindo correndo antes que Amanda se tocasse.

Ao chegar a porta o garoto encontrou a correspondência caída no chão, havia um postal, algo que parecia uma conta e uma carta para ele, uma carta no mesmo material que a que seu pai não deixara ler na véspera. O garoto voltou para a cozinha observando a carta e a abrindo lentamente, entregou a conta e o postal para seu pai e sentou em seu lugar.

-Hum, o Sr. Dursley está doente, -exclamou o Sr. Hunter -comeu um bolo estragado, ainda não aprendeu a controlar o estomago... Outra conta, estou ficando cheio...

-Pai, o Kyo está com uma carta igual aquela de ontem! -exclamou Amanda, Kyo tacou um pedaço de bacon nela.

-Me de isso aqui!

O Sr. Hunter tomou a carta da mão do garoto antes que ele pudesse fugir com ela, Kyo ainda tentou recupera-la, mas o Sr. Hunter já usara a boca do fogão para tocar fogo na carta.

-Não! -gritou Kyo, ainda tentava tomar a carta da mão do pai, na esperança de que ainda houvesse o que ler.

-Você não vai ler essas baboseiras! -exclamou o Sr. Hunter, jogando no lixo um pedaço da carta, ainda em chamas.

-Mas eu quero ler!

-Você não vai ler!

Kyo saiu do quarto arrastando o pe, sem sequer tocar em seu café da manha, subiu para o quarto e bateu a porta ao passar. Ficou o resto do dia lá dentro, sem sair nem mesmo para comer.

O despertador tocou as quinze para as seis da manha, Kyo o desligou rapidamente para não acordar ninguém, se trocou, pôs os óculos no rosto e calçou os tênis, tinha planejado descer antes que todos acordassem e pegar com o carteiro todas as cartas endereçadas ao numero quatro. Desceu as escadas o mais silenciosamente que pode, mas quando chegou ao pe da escada pisou em alguma coisa mole.

-Ahh!!!!! -gritou Kyo e, por incrível que pareça, a coisa gritou também.

A coisa estava viva, Kyo deu um passo para trás, tropeçou no tapete e caiu sentado na escada. Kyo viu a coisa se erguer na escuridão e acender a luz. Ela tinha cabelos negros e rebeldes e um cavanhaque bem cortado. Era seu pai.

-O que você está fazendo aqui? -rugiu ele.

-Eu... Err... Eu estava saindo para me exercitar um pouco. -mentiu Kyo, dando uns pulinhos.

Sua mãe e seus irmãos apareceram no patamar da escada, sua mãe parecia meio atordoada, mas seus irmãos sabiam exatamente o que estava acontecendo, principalmente Amanda, que ria abertamente.

-Vá para a cozinha! -gritou o Sr. Hunter -Me faça um chá!

Kyo obedeceu e foi na direção da cozinha, sua vontade era de socar seu pai. Quando voltou o carteiro já havia entregado a correspondência e seu pai queimava umas cinco cartas de um papel pesado.

Aquele dia o Sr. Hunter não foi ao trabalho, passou a tarde pregando, ou pelo menos tentando, pregar uma madeira na portinhola do correio. Ele cantava:

-Vamos dar as mãos um, dois, três, quem errar o passo perde a vez...

Kyo passou mais uma vez o dia no quarto.

No dia seguinte chegaram nada menos do que trinta cartas, algumas na caixa de ovos que o padeiro confuso entregou pela janela, outras vieram embaixo das caixas de leite e até foram empurradas pela janela do banheiro do térreo. Mais uma vez o Sr. Hunter não foi ao trabalho, passou o dia fechando cada uma das frestas que haviam na casa.

Na manha seguinte como era de costume no domingo, os Hunter tomaram o café da manha na sala de estar. O Sr. Hunter, apesar de parecer exausto parecia muito contente:

-Hoje é um grande dia!
>Ninguém falou nada.

-Hoje realmente é um grande dia!

O silencio continuou.

-Hoje é um grande dia, e vocês sabem o por que?

-Por que hoje é domingo? -perguntou Kyo.

-Isso mesmo, e domingo não tem correio...

Mal ele terminara de falar a lareira emitiu um enorme estalo e dela irromperam dezenas de cartas, talvez centenas, que dispararam certeiras na nuca do Sr. Hunter, que estava de costas para a lareira. Kyo de pronto pulou e agarrou uma carta no ar, depois saiu correndo em direção ao corredor antes que seu pai pudesse segura-lo. O garoto correu na direção do próprio quarto, entrando e trancando a porta, só escutou seu pai batendo com força, gritando para o garoto abrir. Kyo olhou bem a carta, o envelope era grosso e pesado feito de pergaminho amarelo e endereçado com tinta verde-esmeralda. Não havia selo.

Quando virou o envelope, com a mão tremula, Kyo viu um lacre de cera púrpura com um brasão; um leão, uma águia, um texugo e uma cobra circulando um grande "H". Ele rasgou o lacre, puxou a carta e leu:

Escola de Magia e Bruxaria Hogwarts

Diretor: Alvo Dumbleodore

(Ordem de Merlin, Primeira Classe, Grande Feiticeiro, Bruxo Chefe,

Cacique Supremo, Confederação Internacional de Bruxos)

Prezado Sr. Hunter,

Temos o prazer de informar que V.Sa. tem uma vaga na Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts. Estamos anexando uma lista dos livros e equipamentos necessários.

O ano letivo começa em 1 º de setembro. Aguardamos sua coruja até 31 de julho, no mais tardar.

Atenciosamente,

Minerva McGonagall

Diretora Substituta.

----CAPITULO QUATRO----

As cartas de ninguém

Kyo não saia de seu quarto já fazia vários dias, Harry não viera visitá-lo e nem sua mãe viera tentar consola-lo, ele passava o dia olhando para o teto, sua vida não tinha graça, ele queria voltar para a escola, onde tinha alguma coisa para fazer, por alguma infeliz coincidência não tivera deveres de férias para fazer.

Era quase hora do jantar, Kyo sentia seu estomago doer de fome, ele aguardava ansiosamente o pacote de biscoitos que seu pai lhe dava pela manha, na hora do almoço e na do jantar. Kyo sabia que seu pai não deixava sua mãe levar a sua "refeição" por que ela levaria muito mais do que apenas biscoitos. De repente a porta se abriu, era seu pai:

-Venha. -disse ele rispidamente.

-Já posso ir ao banheiro. -o garoto só ia ao banheiro depois das dez da noite.

-Não, você vai jantar conosco a mesa.

Kyo estranhou a atitude de seu pai, que pareceu reparar em sua reação:

-Sua mãe me obrigou.

Eles desceram as escadas lentamente, Kyo evitava movimentos repentinos, sabia que seu pai se assustava com muita facilidade e se irritaria se ele o assustasse. Quando chegaram a sala de jantar a Sra. Hunter servia o jantar, seus irmãos, Kyo reparou, fizeram uma careta quando o viram entrar.

-Com fome querido? -perguntou a Sra. Hunter.

-Muita.

Kyo se sentou entre Amanda e Junior, o pior lugar possível, mas para quem não tinha uma refeição descente há dois dias era ótimo. Sua mãe pôs a mesa batata assada coxas de galinha purê de batata, coisas que Kyo adorava, mas nunca tinha a oportunidade de comer, sempre comia depois de todo mundo, pois odiava fazer as refeições ao lado de seus irmãos ou seu pai, e estes sempre comiam muito mais do que seus estômagos agüentavam, Kyo desconfiava que aquilo era só para impedi-lo de saborear os melhores pratos de sua mãe.

Mal a Sra. Hunter se sentara os seus irmãos passaram a lhe chutar por debaixo da mesa, Kyo tentava ignora-los, o que era muito difícil, a tentação de chutar um deles era muito grande. O garoto comeu o mínimo que sua fome permitira, sabia que se comesse demais seu pai não perderia a chance de chamá-lo de fominha e dizer que o garoto só servia para devorar o fruto do suor dele, suor esse que Kyo desconhecia, pois o pai passava o dia sentado numa poltrona macia em um escritório grande e fresco.

Quando ia subindo para seu quarto, logo após a sobremesa, sundae de chocolate, seu pai o chamou:

-Você não vai assistir ao filme de hoje conosco?

O queixo de Kyo caiu, seu pai o chamava para assistir a um filme com ele. O garoto voltou para a sala lentamente, temia que seu pai tentasse ataca-lo com alguma arma.

Quando se sentou no sofá, ao lado de sua mãe Kyo reparou que seu pai forçava um sorriso, Kyo teve que fazer um esforço enorme para segurar o riso. Os irmãos de Kyo subiram para dormir, Amanda tinha uma careta de revolta ao pisar na escada.

Kyo mal começou a assistir ao filme e dormira, talvez a fome tivesse lhe tirado só sono, mas agora que tinha comido seu sono reaparecera com força total, sua cabeça pendeu para o lado, ele se perguntava o por que de tanta gentileza por parte de seu pai, nem mesmo sua mãe, com todo o seu charme era capaz de convencer seu pai a ser bom com o garoto, talvez ele tivesse bebido umas a mais, "é talvez seja isso" pensou ele "ele adora ficar bebericando aquelas coisas que ele tem naquele bar, talvez tenha perdido a noção do quanto bebera...", ele não pensou mais, mergulhou num sono pesado e, de inicio, sem sonhos.

Kyo estava tendo um sonho estranho, estava deitado no chão de um quarto que lembrava muito o seu, a não ser pelos enfeites de bebe, olhava para um lado e para o outro tentando entender o que estava fazendo ali, de repente apareceu pela porta uma criatura que de inicio ele não reconheceu, depois ele percebeu que era um rato. Um rato cinzento e gordo, mas sem vários tufos de pelo, era muito mais nojento do que um rato normal, ele avançava lentamente em sua direção, Kyo tentou se levantar, mas não conseguia, não sabia como, tentou gritar e tudo que saiu foi um barulho de engasgo, de repente o rato começou a se erguer e crescer, os pelos estavam desaparecendo e roupas negras surgiam do nada, agora no lugar do rato havia um homem baixo e gorducho, meio careca e com um ar ratinhento, o homem olhou para ele com uma certa pena, mas o pegou no colo, sem conseguir se controlar Kyo começou a chorar e então percebeu o que estava acontecendo: era um bebe e estava sendo seqüestrado. De repente tudo ficou escuro e tudo que ele escutou foi uma fria gargalhada acompanhada por uma luz verde ofuscante.

Kyo acordou suando frio, estava deitado no sofá da sala de estar de sua casa, seus olhos arderam ao se encontrarem com a luz do sol que invadia a sala pela janela. Kyo se sentou e olhou a volta, um barulho de talheres vinha da cozinha, cocou os olhos e vestiu seus tênis, apesar de não se lembrar de tirá-los, se ergueu e se dirigiu a cozinha.

Toda sua família tomava o café da manha, ao vê-lo entrar na cozinha a mãe do garoto se levantou e foi na direção do fogão:

-Bom dia querido, espera um pouco que eu já vou te servir.

-Tudo bem... -disse Kyo se sentado à mesa ao lado de seu pai.

-Bom dia. -disse seu pai, sem tirar os olhos do jornal.

-Bom dia.

A mãe do garoto pôs um prato com bacon e ovos a sua frente, Kyo olhou para seus irmãos que se serviam da segunda remessa de bacon, "como podem ser tão porcos e esfomeados?" se perguntou o garoto, ele baixou seus olhos para seu prato, quando cortou o primeiro pedaço de bacon sua mãe chamou sua atenção:

-Kyo, se lembra daquele bilhete que sua professora me mandou?

-Lembro, por quê?

-Era sobre sua visão, ela acha que você tem miopia.

-Eu vou precisar de óculos?

-Acho que sim, por isso vamos ao oftalmologista, depois do café.

-Tá certo, talvez eu possa dar uma volta lá no centro.

-Nada disso. -seu pai interviu -Você vai e volta com sua mãe.

-Por quê? O senhor nunca me proibiu de ir no centro!

-Não que eu não queira que você vá, mas eu fiquei sabendo que ocorreram alguns assaltos por lá.

Kyo não acreditou. Ou estava ficando maluco ou o que sentira na voz de seu pai fora uma nota de preocupação, pela primeira vez na vida sentira que seu pai estava preocupado com seu bem estar. Ele olhou para sua mãe que parecia tão surpresa quanto ele.

-Tá certo... -murmurou o garoto, sua voz parecia meio incerta.

Às oito horas em ponto o carro dos Hunter saia da garagem e ia em direção ao centro. Kyo olhava pela janela, mal se lembrava da ultima vez que andara de carro por aquelas ruas, desde os oito anos ia para a escola sozinho, de repente um grupo de motoqueiros passou rasgando pelo lado do carro.

-Esses motoqueiros, pensam que são os donos da rua, passam rasgando sem se preocupar com o resto do trafego!

O Sr. Hunter adorava reclamar enquanto dirigia, reclamava do transito, reclamava do trabalho, do governo, do banco, de Kyo, o banco e Kyo eram seus assuntos preferidos, mas hoje ele ainda não pegara no pe do garoto.

-... e aquelas taxas de juros, Marta, eles pensam que as pessoas só trabalham para pagar essas malditas taxas!

-O banco é uma instituição injusta... -disse Kyo.

-O que? -seu pai se virara para escutar melhor.

-O banco, é injusto. -repetiu o garoto.

-É, eu sei disso.

-Então, as pessoas no banco só te emprestam dinheiro diante de alguma prova de que você não precisa dele.

O Sr. Hunter encarou Kyo, Kyo se preparou para a bronca.

-Sabe que você está certo, isso é uma bela verdade, agora eu tenho uma piadinha para a roda de amigos...

Kyo se impressionou, seu pai estava concordando com ele, alguma coisa estava muito errada. Kyo passou mais da metade da viagem quieto, estava achando estranho o comportamento do pai. Quando lembrou de seu sonho achou que seria bom comentar com a mãe:

-Eu tive um sonho estranho...

-Que sonho, querido? -perguntou sua mãe.

-Um rato, eu estava deitado no chão e ele veio pra cima de mim e de repente ele virou um homem...

-RATOS NÃO VIRAM HOMENS!!! -rugiu o Sr. Hunter.

Kyo se esquecera que seu pai detestava coisas que fugissem a realidade, sentiu que seria punido severamente por isso:

-Kyo, -começou -desculpe, é que eu detesto essas coisas estranhas, você sabe...

Kyo agora realmente se assustara, seu pai lhe pedira desculpas. Kyo sentiu sua mãe se fechar involuntariamente de susto.

Ao chegarem ao centro da cidade o Sr. Hunter os deixou em frente ao oftalmologista e foi para a firma, ao verem o carro do Sr. Hunter virar a esquina Kyo olhou para sua:

-O que você deu pra ele?

-Nada, só pedi para ele moderar.

-Você deve ter enfeitiçado ele...

A Sra. Hunter pareceu indignada ao escutar aquilo, Kyo achou melhor não comentar mais nada, eles entraram no consultório em silencio, a Sra. Hunter parecia outra mulher.

Kyo ficou sentado na sala de espera enquanto a Sra. Hunter revia a marcação da consulta com a recepcionista, uma moça muito bonita com cabelos castanho-escuros e lanzudos presos num apertado coque na nuca e olhos muito verdes realçados pela maquiagem, Kyo sentiu uma leve contração no baixo ventre quando a moça veio em sua direção, o que em lugar nenhum era comum.

-Kyo Hunter? -perguntou ela.

Kyo não respondeu, apenas sacudiu a cabeça em sinal positivo, a moça abriu um largo sorriso e lhe estendeu a mão:

-Prazer, Letícia Longbotton.

-Hã... O prazer é meu...

Kyo apertou a mão da moça, meio hesitante, a moça pareceu perceber por isso sentou-se ao lado dele:

-Eu sou assim mesmo, quando vejo alguém de quem gosto tenho que conhece-la.

Kyo fez que sim com a cabeça em sinal de que entendera, a moça se ergueu e voltou-se a Sra. Hunter, que a encarava estranhamente, elas conversaram um pouco, a Sra. Hunter fazia muitos sinais com as mãos.

-Muito bem, é só esperar um pouco. -disse a Sra. Hunter quando voltou.

Kyo pegou uma das revistas que estavam numa mesinha de centro e folheou, a maior parte eram propagandas, mas no meio ele encontrou uma reportagem estranha:

"Nove pessoas encontradas abandonadas dentro de um terreno baldio em Londres, sete delas estavam mortas, sendo que os peritos não conseguiram determinar o motivo da morte, quase como se a essência da vida deles tivesse sido tirada deles, os sobreviventes disseram que tudo o que se lembravam era de estarem pendurados a dez metros do chão e de luzes verdes e gargalhadas a distancia, um deles disse se lembrar de um rato gorducho que andava em cima dele e de um homem baixinho e também gorducho que o vigiara durante metade da noite..."

Kyo parou de ler a revista, em seu sonho vira um homem gorducho, um ratinho gorducho, escutara uma gargalhada fria e cruel e vira uma luz verde e ofuscante, seria coincidência? Ele lembrava de ter lido uma reportagem sobre pessoas que captavam os sonhos e lembranças dos outros, podia ser o que estava acontecendo com ele, mas estavam a quilômetros de Londres, seria capaz que ele captara uma lembrança de tão longe? Ou será...

-Kyo, vamos. -a voz de sua mãe interrompera seus pensamentos.

-Oi?

-Vamos, o doutor está chamando.

O garoto se levantou, meio fora de sintonia, estava confuso, seus pensamentos fugiam a toda hora para aquela reportagem. Quando entrou no consultório aqueles pensamentos desapareceram de sua cabeça, aquele era um lugar muito interessante, muitas figuras estranhas estavam espalhadas por ali, olhos que eram tão bem feitos que pareciam ter sido rançados de pessoas de verdade, modelos de cérebros em tamanho real, fotos de paisagens incríveis de tão belas, Kyo parou em frente a uma passou a observa-la.

-Incríveis, não? -disse uma voz rouca as suas costas.

-Hã?

Kyo virou-se e deparou com um senhor alto e meio careca, o cabelo que lhe restava era prateado, seus olhos era negros como besouro, ele usava uma capa branca e ossinhos em forma de casco de tartaruga.

-As fotos, são lindas. -repetiu o senhor.

-É, realmente são, foi o senhor quem as tirou?

-Foi, são de um lugar incrível, já foi ao Brasil?

-Não, nunca sai do país, mas por essas fotos deve ser um lugar incrível.

-E como é, mas você poderá ver melhor se usar óculos.

-Mas eu não sei se preciso...

-Aposto que sim, e pelo seu modo de olhar uns dois graus.

Kyo olhou para o homem que sorria abertamente, Kyo não pode deixar de sorrir também, o homem tinha um jeito de sorrir engraçado.

-Dr. Israel, o senhor realmente acha que ele precisa de óculos?

-Sra... Hunter? Acho que sim, ele aperta levemente os olhos quando tenta olhar alguma coisa mais longe ou menor.

Kyo se espantou com o dito pelo doutor, ele devia ser muito experiente para tirar uma conclusão apenas pelo modo de olhar do garoto.

-Bem, Kyo -disse ele olhando a ficha -vamos dar uma olhada nestes olhos?

Uma hora e meia depois eles estavam na óptica esperando pelos óculos de Kyo, o garoto escolhera um modelo que a mãe dele achou esquisito, as lentes eram ovais e a armação pegava apenas a metade de cima destas.

-Kyo, você não acha que fica esquisito com esses óculos? -disse a mãe do garoto quando eles pagaram os óculos e saíram da loja com estes.

-Que nada, mãe ficou legal. -disse o garoto apertando os olhos, estranhando os óculos que estavam sendo usados pela primeira vez.

-Se você acha, mas eu acho que você ficou melhor com aqueles óculos redondos.

-Eu tava muito parecido com o Harry!

-Mas você sempre adorou parecer com Harry.

-Mãe, eu vou fazer quinze anos!

-Tá bom, tá bom, não precisa se alterar.

Kyo se lembrou de que Harry tinha cicatriz na testa exatamente igual a sua, mas achou melhor não comentar, sua mãe podia achar aquilo alguma besteira, ou até mesmo achar que Harry fora o causador de sua cicatriz.

Eles andaram pelo centro da cidade por algum tempo, a Sra. Hunter parando em quase toda loja ou boutique pela qual passavam, Kyo preferia as bancas de jornal, adorava ler as revistas ou os informativos que eram vendidos, isso por influencia de Harry que sempre levava revistas para eles lerem.

Quando chegaram em casa eram mais de sete horas, a Sra. Hunter resolveu entrar numa loja de jóias para ver as pecas que havia ali, ela ficara escutando o vendedor por horas sem se cansar, sob o pretexto de que seu aniversario de vinte anos de casada se aproximava, Kyo apenas olhava a enorme variedade de jóias belas que havia ali, reparara que o segurança da loja não tirara os olhos dele.

-Kyo, da pra levantar esses óculos? -disse a Sra. Hunter quando abriu a porta de casa.

-Tá bom, mamãe... -ele ajeitou os óculos na altura dos olhos.

Quando pisaram em casa Kyo foi recebido por gargalhadas, seus irmãos riam da cara dele com os novos óculos, Kyo lançou um sorriso malicioso para eles, apesar de terem a proteção de seu pai, os dois sabiam Kyo sempre tinha cartas na manga para burlar a vigilância de seu pai. Kyo não viu seu pai, por isso presumiu que ele ainda não chegara, mas estava errado.

-Marta? É você? Venha a cozinha, por favor. -gritou ele da cozinha, sua voz parecia urgente.

A Sra. Hunter obedeceu e foi em direção a cozinha, Kyo reparou na urgência da voz do pai e correu atrás, seus irmãos em seus calcanhares. Quando chegou a cozinha viu que seu pai tinha em suas mãos uma carta de um papel grosso e amarelado, um outro papel que continha um tipo de lista estava sobre a mesa ao lado de um envelope do mesmo papel que os outros dois papeis, Kyo leu o que havia escrito no envelope:

Kyo Hunter,

Rua dos alfeneiros numero 4

Little Winging,

O primeiro quarto após as escadas,

Surrey.

-Hei, esta carta é minha! -gritou o garoto, indo em direção a mesa.

-Saia! -gritou seu pai.

-A carta é minha, eu quero ler!

-Eu quero ler! -gritou Amanda, pulando pra cima do pai.

-Pai, me dá! -disse Junior, puxando a calça do pai.

-Saiam daqui! -gritou o Sr. Hunter -Os três!

O Sr. Hunter, de alguma maneira que Kyo não entendeu, agarrou os três e os jogou no corredor, Kyo travou com seus irmãos uma guerra silenciosa para ver quem olharia pelo buraco da fechadura, seus irmãos apesar de pequenos eram fortes e estava em maior numero, podendo atacar pela frente e por trás, Junior deixou que Amanda olhasse pelo buraco e ficou esperando, Kyo ficou com a brecha entre o chão e a porta.

Kyo viu os sapatos lustrosos do pai caminhando de um lado para o outro e sua mãe batendo o pe:

-O que foi Mattew? -perguntou a Sra. Hunter.

-Eles estão atrás dele Marta, eles já começaram.

-Eles quem?

-Eles Marta!

O Sr. Hunter parou em frente à esposa, esta ficou quieta por alguns instantes e depois soltou um gritinho abafado.

-Mattew, será que eles vão toma-lo de nos?

-Eu não vou deixar, ele não vai!

-Mas e se ele quiser ir? Ele disse que não poderíamos impedir.

-Ele só vai querer ir se ficar sabendo, vamos obedecer ao que disseram, não vamos contar nada.

-E se Harry já tiver contado?

-Não, ele não contou, o velho não deixaria.

-Será Mattew?

-Eu tenho certeza, o velho é caduco, mas nem tanto.

-Mas eles sabem onde moramos!

-O velho já veio aqui.

-Mas como ele sabe do quarto dele.

-Não sei.

-Será que estão no observando.

-Observando, vigiando, até nos seguindo!

O Sr. hunter se dirigiu à porta, Kyo se levantou o mais rápido que pode e correu para o começo do corredor. O Sr. Hunter apareceu à porta e olhou severamente para Amanda e Junior, depois para Kyo, que estava encostado à parede.

-Para seu quarto! -disse ele.

-Vai. -disse Amanda, com um sorriso malicioso.

-Os três! -disse o Sr. Hunter rispidamente.

-Mas pai... -começou Amanda.

-Agora. -sua voz estava em seu tom ais letal.

Amanda sabia era melhor obedecer, apesar de nunca ter ouvido aquele tom de voz se dirigindo a ela, pôs o braço no ombro de Junior e o conduziu a escada. Kyo não se moveu.

-Você não ouviu? Vai pro seu quarto. -disse o Sr. Hunter, sem olhar para o garoto.

-Quero minha carta.

-Não era pra você, foi um engano.

-Não foi engano, o endereço estava claro.

-Eu disse que foi um engano.

-Eles sabiam qual era o meu quarto!

-Era um engano, droga!!!

O Sr. Hunter olhou para o garoto de uma maneira assustadora, mas Kyo manteve seu olhar firme, até seu pai resolver se mover e passar por ele.

-Se eu voltar e você estiver ai eu não iria querer estar na sua pele.

Kyo foi para o seu quarto em silencio, se deitou em sua cama e ficou encarando o teto sem pensar em mais nada alem daquela carta, sem perceber acabou adormecendo, ainda de óculos.

Na manha seguinte Kyo desceu para tomar café pensando que ainda ontem daria tudo para poder descer normalmente, mas hoje preferiria estar preso em seu quarto com aquela carta. Quando entrou na cozinha seus irmãos riram de sua cara, que estava marcada pelos óculos.

-Bom dia. -disse Kyo.

Nem seu pai nem sua mãe responderam, o garoto sentiu um certo peso. Sua mãe o serviu e ele comeu em silencio, até seu pai lhe dirigir a palavra:

-Você vai para Smeltings.

-Por quê?

-Porque eu quero que você vá!

-Mas eu não quero.

-Até semana passada você queria.

-Tá bom, eu vou...

Kyo continuou a comer, se perguntando se seria bom estudar em Smeltings, até que Amanda cutucou suas costelas:

-Ouvi dizer que eles enfiam a cabeça dos alunos novos na privada no primeiro dia de aula.

-Que legal...

De repente a campainha tocou.

-Kyo, vá atender.

-Você quer ir lá em cima treinar? -perguntou Amanda.

-Não, acho que a pobre da privada não agüentaria algo tão podre quanto sua cabeça. -disse Kyo saindo correndo antes que Amanda se tocasse.

Ao chegar a porta o garoto encontrou a correspondência caída no chão, havia um postal, algo que parecia uma conta e uma carta para ele, uma carta no mesmo material que a que seu pai não deixara ler na véspera. O garoto voltou para a cozinha observando a carta e a abrindo lentamente, entregou a conta e o postal para seu pai e sentou em seu lugar.

-Hum, o Sr. Dursley está doente, -exclamou o Sr. Hunter -comeu um bolo estragado, ainda não aprendeu a controlar o estomago... Outra conta, estou ficando cheio...

-Pai, o Kyo está com uma carta igual aquela de ontem! -exclamou Amanda, Kyo tacou um pedaço de bacon nela.

-Me de isso aqui!

O Sr. Hunter tomou a carta da mão do garoto antes que ele pudesse fugir com ela, Kyo ainda tentou recupera-la, mas o Sr. Hunter já usara a boca do fogão para tocar fogo na carta.

-Não! -gritou Kyo, ainda tentava tomar a carta da mão do pai, na esperança de que ainda houvesse o que ler.

-Você não vai ler essas baboseiras! -exclamou o Sr. Hunter, jogando no lixo um pedaço da carta, ainda em chamas.

-Mas eu quero ler!

-Você não vai ler!

Kyo saiu do quarto arrastando o pe, sem sequer tocar em seu café da manha, subiu para o quarto e bateu a porta ao passar. Ficou o resto do dia lá dentro, sem sair nem mesmo para comer.

O despertador tocou as quinze para as seis da manha, Kyo o desligou rapidamente para não acordar ninguém, se trocou, pôs os óculos no rosto e calçou os tênis, tinha planejado descer antes que todos acordassem e pegar com o carteiro todas as cartas endereçadas ao numero quatro. Desceu as escadas o mais silenciosamente que pode, mas quando chegou ao pe da escada pisou em alguma coisa mole.

-Ahh!!!!! -gritou Kyo e, por incrível que pareça, a coisa gritou também.

A coisa estava viva, Kyo deu um passo para trás, tropeçou no tapete e caiu sentado na escada. Kyo viu a coisa se erguer na escuridão e acender a luz. Ela tinha cabelos negros e rebeldes e um cavanhaque bem cortado. Era seu pai.

-O que você está fazendo aqui? -rugiu ele.

-Eu... Err... Eu estava saindo para me exercitar um pouco. -mentiu Kyo, dando uns pulinhos.

Sua mãe e seus irmãos apareceram no patamar da escada, sua mãe parecia meio atordoada, mas seus irmãos sabiam exatamente o que estava acontecendo, principalmente Amanda, que ria abertamente.

-Vá para a cozinha! -gritou o Sr. Hunter -Me faça um chá!

Kyo obedeceu e foi na direção da cozinha, sua vontade era de socar seu pai. Quando voltou o carteiro já havia entregado a correspondência e seu pai queimava umas cinco cartas de um papel pesado.

Aquele dia o Sr. Hunter não foi ao trabalho, passou a tarde pregando, ou pelo menos tentando, pregar uma madeira na portinhola do correio. Ele cantava:

-Vamos dar as mãos um, dois, três, quem errar o passo perde a vez...

Kyo passou mais uma vez o dia no quarto.

No dia seguinte chegaram nada menos do que trinta cartas, algumas na caixa de ovos que o padeiro confuso entregou pela janela, outras vieram embaixo das caixas de leite e até foram empurradas pela janela do banheiro do térreo. Mais uma vez o Sr. Hunter não foi ao trabalho, passou o dia fechando cada uma das frestas que haviam na casa.

Na manha seguinte como era de costume no domingo, os Hunter tomaram o café da manha na sala de estar. O Sr. Hunter, apesar de parecer exausto parecia muito contente:

-Hoje é um grande dia!
>Ninguém falou nada.

-Hoje realmente é um grande dia!

O silencio continuou.

-Hoje é um grande dia, e vocês sabem o por que?

-Por que hoje é domingo? -perguntou Kyo.

-Isso mesmo, e domingo não tem correio...

Mal ele terminara de falar a lareira emitiu um enorme estalo e dela irromperam dezenas de cartas, talvez centenas, que dispararam certeiras na nuca do Sr. Hunter, que estava de costas para a lareira. Kyo de pronto pulou e agarrou uma carta no ar, depois saiu correndo em direção ao corredor antes que seu pai pudesse segura-lo. O garoto correu na direção do próprio quarto, entrando e trancando a porta, só escutou seu pai batendo com força, gritando para o garoto abrir. Kyo olhou bem a carta, o envelope era grosso e pesado feito de pergaminho amarelo e endereçado com tinta verde-esmeralda. Não havia selo.

Quando virou o envelope, com a mão tremula, Kyo viu um lacre de cera púrpura com um brasão; um leão, uma águia, um texugo e uma cobra circulando um grande "H". Ele rasgou o lacre, puxou a carta e leu:

Escola de Magia e Bruxaria Hogwarts

Diretor: Alvo Dumbleodore

(Ordem de Merlin, Primeira Classe, Grande Feiticeiro, Bruxo Chefe,

Cacique Supremo, Confederação Internacional de Bruxos)

Prezado Sr. Hunter,

Temos o prazer de informar que V.Sa. tem uma vaga na Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts. Estamos anexando uma lista dos livros e equipamentos necessários.

O ano letivo começa em 1 º de setembro. Aguardamos sua coruja até 31 de julho, no mais tardar.

Atenciosamente,

Minerva McGonagall

Diretora Substituta.

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