LEMBRANÇAS DE UMA OUTRA VIDA



Dino Thomas era um garoto de família trouxa que gostava de futebol e torcia pelo modesto time do West Ham. Era também bom desenhista e no primeiro ano de Harry em Hogwarts havia desenhado um leão (símbolo de Grifinória) e estendido uma faixa com os dizeres “Potter para presidente” numa partida de quadribol. Agora estava morto. Foi uma das vítimas do massacre de Hogsmeade. Tarde da noite, no cemitério vazio, Harry realizaria a derradeira homenagem ao antigo companheiro de quarto. Transfigurou uma camiseta comum numa réplica da camisa do time de futebol da preferência do amigo e estendeu-a sobre o túmulo. A camisa indestrutível do West Ham sobre o túmulo de Dino Thomas seria mais um dos mistérios em torno dos episódios extraordinários que se seguiram ao “Massacre de Hogsmeade” e ao posterior sumiço de Harry Potter.

Depois da homenagem a Dino, Harry aparatou em Hogwarts, dentro da sala comunal de Grifinória. Na noite anterior aos eventos de Hogsmeade ele e Roni fizeram planos para o futuro bem ali, próximos à lareira. Depois de terminarem a escola eles se formariam aurores, se casariam, ele com Gina, Roni com Hermione e ensinariam os respectivos filhos a jogar quadribol. O filho (ou filha) de Harry jogaria como apanhador, como o pai, enquanto o de Roni também seria goleiro. Sabendo que seria sábado no dia seguinte, os dois garotos tomaram alguns copos de rum de groselha, uma bebida bruxa bem mais forte do que a tradicional cerveja amanteigada, enviada secretamente pelos gêmeos Fred e Jorge para celebrar a continuidade da rebeldia que sempre praticaram como estudantes. Decididamente não gostavam de beber, mas aquela havia sido uma semana difícil e tinham muito para comemorar: tiraram (surpreendentemente) uma boa nota na prova de Poções do detestável Prof. Snape, haviam derrotado Corvinal numa partida sensacional de quadribol e Harry finalmente havia começado a namorar Gina Weasley.

- Às goles que virão! – brindou Rony, já um pouco alterado, numa popular saudação de quadribol.

- Aos balaços que rebateremos! – respondeu Harry, um pouco mais sóbrio do que o amigo, mas já um pouco mais feliz do que o normal.

“Falamos de um futuro que talvez nunca exista”, pensou Harry sobre tudo o que haveria de perder. Lembrou-se dos momentos felizes que havia passado naquele lugar. A dor que o atingiu foi pior do que a maldição cruciatus que Voldemort lançara sobre ele no dia em que Cedrico havia morrido. Em pé, próximo à mesma lareira onde um dia falara com seu padrinho Sirius Black, o “garoto que sobreviveu” começou a chorar silenciosamente.

- Ás goles que virão – murmurou entrecortado por soluços.

- E aos balaços que rebateremos – disse às suas costas, Hermione Granger. Harry virou-se surpreso. A emoção havia nublado o “DOM” e não sentiu a aproximação da amiga.

Dias atrás ela e Gina ficaram escondidas, rindo dos planos e dos brindes de Harry e de Roni. Embora não aprovasse bebidas alcoólicas, concordava que eles mereciam relaxar um pouco. Ela e sua amiga estavam muito felizes por fazerem parte dos planos futuros dos dois. Aquela descontração e aquela alegria inocente pareciam fazer parte de uma outra vida. Uma vida que havia se desenrolado antes do massacre de inocentes em Hogsmeade, antes da morte de Dino, antes dos estranhos poderes de Harry. De repente todos haviam perdido a adolescência. E ali à sua frente estava o garoto que parecia ter envelhecido séculos em poucos dias.

E ela nunca tinha visto Harry chorar. Nem quando mataram Cedrico na sua frente, nem quando tiraram dele Sirius Black, o mais próximo que o garoto teve de um pai. Hermione o abraçou, o garoto que ela amava como um irmão. Palavras não eram necessárias. Ela sabia o que ele faria e esperava que um outro garoto, que ela também amava com todas as suas forças, compreendesse.

Quando se separaram, Harry estendeu-lhe a mão, onde havia um pingente de prata. “Você sabe para quem entregar isso”, ele disse. Então se curvou, beijou suavemente a face de Hermione e desaparatou. Se os seus sentidos aguçados estivessem menos entorpecidos pela dor, teria percebido um certo rapaz ruivo parado no alto da escada que levava aos dormitórios masculinos.

Roni Weasley, que até então tinha esperanças que tudo voltasse a ser como antes, voltou para o seu quarto e começou naquela noite mesmo a afogar o vazio que sentiu naquele momento com o rum que havia sobrado de uma outra vida.





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