A VIDA E A MORTE



Rony Weasley tinha um apartamento em cima da filial da loja de logros e brincadeiras de seus irmãos em Hogsmeade. Ali também havia um escritório e um laboratório onde testava suas invenções, principalmente novas versões de xadrez bruxo. Esse jogo era a única coisa em que se saía melhor do que Harry e Hermione nos tempos de Hogwarts.Várias vezes os amigos ficavam até tarde jogando ou conversando em volta do tabuleiro. Harry Potter, o herói, Hermione Granger, a garota inteligente, melhor aluna da escola. E Rony Weasley, o panaca. O pobretão, como dizia Malfoy.

O pior é que ele sabia que estava agindo como um idiota mais uma vez. Quando Harry desmaiou depois das coisas horríveis que disse ao antigo companheiro, seus irmãos olharam para ele como se ele fosse um verme. Hermione nem sequer o olhara e Gina, bem, Gina lhe acertara um soco no olho, que ainda estava roxo, dois dias depois.Como socavam bem esses Weasleys! Sem outra alternativa, havia se refugiado no pequeno apartamento, lendo nos jornais do mundo mágico as manchetes sensacionalistas sobre a volta e a agonia do “garoto que sobreviveu”, ou do “homem que derrotou as trevas”.

Tudo indicava que a internação de Harry no St. Mungus não pôde ser feita sem chamar a atenção. Segundo os jornais a Dra. Granger estava cuidando do caso e se recusava a dar maiores informações. Ótimo, pensou Rony. Se o amigo morresse, ele poderia comprar uma passagem para fora do universo. Não apenas sua noiva e sua família o matariam. Ele mesmo não conseguiria suportar a si próprio. Perdido nesses devaneios ouviu a campainha que ficava no térreo tocar. Como se tratava de uma campainha mágica, a parede da sala mostrava a pessoa que estava à porta. Invenção dos gêmeos.

Parada em frente à porta e parecendo muito nervosa estava Patrícia, a garota negra que Harry apresentara como irmã. A menina vestia um casaco trouxa de inverno e tinha um chapéu de lã sobre a cabeça. Rony ficou imaginando se ela não estaria ali para estuporá-lo ou usar o “DOM” contra ele.

Depois de alguma hesitação ele desceu o lance de escadas e abriu a porta. Os olhos verdes da garota repousaram por um instante sobre ele e pôde sentir a dor e a tristeza que emanavam dela. Através do “DOM” o sentimento que ela nutria por Harry atravessou Rony como se fosse uma lança em brasa. Sem que ela pudesse se controlar, sentiu também a tristeza, a confusão e a amargura do ruivo. Antes que pudesse dizer qualquer coisa, xingá-lo ou amalidçoá-lo, o sentimento que os unia falou mais alto e Patrícia, mesmo sem querer, mesmo sem ter planejado (na verdade planejava estuporá-lo), abraçou-se ao rapaz, chorando convulsivamente.


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Hermione Granger olhou pela milésima vez os pergaminhos à sua frente. Segurou as têmporas que pareciam prestes a explodir e fechou os olhos, colocando a cabeça entre as mãos. Quando levantou a cabeça e abriu os olhos novamente, segundos depois, havia uma caneca de chá sobre a mesa e Draco Malfoy estava sentado em frente a ela, tenso como poucas vezes ela o havia visto.

- Melhor ir para casa, Hermione – falou o loiro – Você não vai ajudar muito o Potter se morrer de estafa.

Hermione sorriu tristemente. Nas últimas quarenta e oito e horas tentaram de tudo para reanimar seu amigo. O máximo que conseguiram foi deixá-lo vivo, usando uma mistura de feitiços, remédios trouxas e poções. Consultaram quase todas as autoridades em magia medicinal, poções e feitiços de cura. Ninguém sabia ao certo como lidar com a enfermidade de Harry. Ela mesma, uma das mais respeitadas curandeira do Reino Unido, não fazia a menor idéia como tratar o amigo.

O fato é que Harry tinha um tumor cerebral. Tentar extraí-lo por mágica ou medicina trouxa poderia matá-lo ou fazer dele um vegetal até o fim dos seus dias. E o problema é que seus extraordinários e estranhos poderes reagiam contra qualquer feitiço ou medicamento.Aparentemente, os mesmos poderes que haviam possibilitado que sobrevivesse às piores maldições, estavam impedindo a eficácia dos tratamentos. E o paradoxo é que se eles encontrassem uma forma de neutralizar esses mesmos poderes, poderiam matá-lo.

- Resumindo, Srta. Granger – dissera Armíneo Phelps, um idoso médico e alquimista irlandês, que fora trazido às pressas até Londres para dar o seu parecer sobre o estado de Harry – Seu amigo tem mais poderes do que um ser humano pode suportar. Esses poderes foram uma benção e agora se transformaram numa maldição.

Hermione amaldiçoou silenciosamente o ancião. Ela mesma havia chegado às mesmas conclusões. E ela e Draco passaram os dois dias esquivando-se dos jornalistas e procurando manter afastados os malucos que ofereciam curas mirabolantes. Se ela pusesse as mãos nos cretinos que alertaram a imprensa sobre Harry!

Hermione levantou-se, zonza de cansaço. Harry iria morrer e ela não poderia fazer nada para impedir! Escorou-se na parede, vencida pela exaustão e pela dor da possibilidade de perder alguém que havia sido mais do que um irmão para ela. Quando Draco, preocupado, amparou a chefe, ela encostou a cabeça no seu peito e começou a chorar.

- Calma, garota – tentou confortá-la o ex-sonserino – O seu amigo já fez coisas impossíveis antes. – Claramente o loiro tentava convencer a si mesmo da capacidade do “garoto que sobreviveu” – Por que você não procura o tonto do seu noivo...

- Nunca! – interrompeu Hermione, indignada – Nunca mais quero olhar a cara daquele... daquele... daquele... – ela não encontrava as palavras certas para xingar Rony.

- Hermione, querida, quem você está tentando enganar? – brincou Draco enquanto afagava as costas da jovem – Você precisa colocar a cabeça no ombro de quem você ama nesse momento. Eu continuo achando o Weasley um idiota completo, ainda acho que você merece coisa melhor. Mas o importante é o que você acha. E nós sabemos que você ama o cara e, cá entre nós, no momento ele deve estar se remoendo de remorso. E nós sabemos também que a crise do Potter não teve necessariamente a ver com a idiotice do Weasley. Ele já estava mal. Nós não devíamos tê-lo deixado ficar saracoteando por aí. Mas, quem consegue deter o cara que deu cabo do Lorde das Trevas, não é mesmo? A propósito: lembre-me de não enfurecer aquela sua amiga ruiva. Que soco!


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Rony havia preparado um chá para Patrícia. Não sabia se, no lugar de Gina, não teria ciúme daquela adolescente bonita e que tinha olhos verdes brilhantes como os de Harry. A garota, acomodada numa poltrona na sala de estar de Rony, sorvia o conteúdo da xícara em silêncio.

- Você tem inveja dos olhos do Harry... – disse a garota, com seu peculiar sotaque francês.

- Você pode ser a irmã do Harry e tudo, mas pare de ler a minha mente! – disse Rony, bastante contrariado.

- A mente humana...

- Sei – interrompeu Rony – Não é um livro que pode ser lido. Snape vivia dizendo isso pro Harry. Mas, de qualquer jeito, pare seja lá o que for.

Droga, ele sempre teve inveja dos olhos verdes de Harry! Nunca havia dito isso para ninguém e era muito desagradável ter isso jogado na sua cara por uma adolescente com poderes malucos.

- Emoções como as suas são difíceis de não serem percebidas. Harry tem a capacidade de “desligar” os sentidos. Eu nem sempre consigo. O que é uma invasão à privacidade das pessoas, é claro. E eu sei que você está desconfortável com a minha presença. Mas eu vim para lhe entregar uma carta. Ah, e Harry gostaria de ter os seus olhos azuis.

Rony ainda estava surpreso com a pequena revelação, quando Patrícia tirou do bolso do seu casaco e lhe estendeu um envelope que tinha o seu nome, escrito com a letra de Harry. Você conhece a letra de uma pessoa que estudou por cinco anos na sua classe.

- Harry escreveu cartas para todos vocês. Ele me pediu para entregar se... bem, se acontecesse alguma coisa. – A garota tinha os olhos brilhantes depois de dizer isso.

Rony assustou-se com a informação: - Você quer dizer que o Harry está...

- Não, ele está vivo. A srta. Granger e o Sr. Malfoy estão fazendo de tudo para recuperá-lo. Ele... – sua voz falhou por um momento, depois recuperou o controle – Ele não reage, entende? – Novamente lágrimas correram pela sua face. Rony aproximou-se para consolá-la, abraçando-a pelos ombros.

- Eu pude sentir a sua confusão lá na Toca – retomou Patrícia, depois de alguns segundos – Espero que essa carta ajude a entender o Harry e as decisões que ele tomou. Espero também que ele um dia possa explicar tudo pessoalmente.

Por algum tempo Rony ficou olhando o envelope, agora na sua mão. Depois apenas perguntou para a garota:

- Há algo que eu possa fazer?

- Há – disse a irmã de Harry, levantando-se e se dirigindo para a escada que conduzia à porta da rua – Você pode rezar por ele, se você acreditar em algum deus. E deixar de ser idiota. Harry sempre amou você como um irmão. A sua atitude deve tê-lo machucado mais do que a doença ou as maldições imperdoáveis que o atingiram na África.

Patrícia virou-se e saiu, deixando Rony Weasley mais só do que jamais havia se sentido na vida.

“Caro Rony:

Espero que você não tenha nunca que ler essa carta. Espero poder dizer tudo isso para você pessoalmente. Talvez você esteja decepcionado comigo ou me odiando muito por não ter conversado com você sobre as decisões que tomei nove anos atrás. Sim, como grandes amigos que sempre fomos deveríamos ter conversado. O problema é que você tentaria me convencer a tomar um outro caminho, diferente daquele que tomei. E o pior: talvez você me convencesse. Acho que não precisaria de muito para ter me convencido. Por isso eu não poderia correr o risco.

Nesses nove anos fiz coisas que não julgava ser capaz de fazer e não me orgulho disso. Matei, torturei, mutilei e usei meus poderes de maneira arbitrária e arrogante. Quem sabe a morte não seria um pagamento justo por tudo aquilo que fiz? Não, não estou tentando se melodramático. Ás vezes me pergunto se é justo um indivíduo atingir o nível de poder que eu atingi e se foi justa a maneira que eu usei tal poder. Varri os Comensais da Morte de Voldemort do mundo, mas temo ter perdido a própria humanidade.

Depois daquela tarde em Hogsmeade tive um medo terrível de perder todos vocês. A minha atitude daí para frente foi um reflexo daquela tarde sangrenta. Você não sabe o que senti vendo Dino morto por um Comensal de Voldemort. Não consigo imaginar o que teria feito naquele dia se tivesse presenciado a sua morte, a de Hermione ou de Gina. Precisava acabar com aquela insanidade. Mesmo que para isso tivesse que ser mais insano do que todos. Queria que vocês sobrevivessem e levassem uma vida normal. Seria muita arrogância minha ter me afastado de todos e ter empurrado para longe de vocês toda aquela loucura? Deveria ter conversado com você, meu amigo. Deveria ter explicado que eu nunca quis ser algum tipo de herói ou santo do mundo mágico. Apenas quis o melhor para as pessoas que amava. Havia perdido meus pais, Sirius e não suportava perder mais gente. Não pense que eu não confiava em você. Eu confiaria a minha vida a você. Você foi o primeiro amigo que eu tive. Você me apresentou à única família que eu tive, a sua própria. Você é o irmão da garota que eu amava e ainda amo. A única mulher da minha vida até hoje.

Eu espero que nós possamos voltar a ser amigos novamente, que você não me julgue de maneira muito severa pelas decisões tomadas naqueles dias sombrios, que você me perdoe por ter invadido o seu sonho ao invés de ter uma conversa franca. Espero acima de tudo que você entenda as minhas razões e que nossa amizade, se esse for o desígnio, sobreviva à minha morte.

Do seu amigo

Harry Potter

P.S: Às goles que virão e aos balaços que rebateremos!”



Depois de ler pela terceira vez a carta, Rony cobriu o rosto com suas mãos grandes. Havia decidido que não iria chorar, mas foi inútil. Ainda tinha lágrimas nos olhos quando desaparatou de seu apartamento, aparatando em seguida em frente ao Hospital St. Mungus.





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