ÁFRICA



- Essa sua mão dourada me dava náuseas. Lembrava muito Voldemort – O dono da voz grave e fria que dizia essas palavras estava em pé em frente a um homúnculo de cabelos cinzentos que chorava e ofegava baixinho segurando o toco sangrento do braço direito de onde a sua mão dourada havia sido decepada segundos antes por Harry Potter. A mão jazia esquecida num canto, para onde o garoto a chutara com desprezo.

Dois anos atrás, Pedro Pettigrew, o animago que traiu seus pais e foi responsável pela prisão injusta do seu padrinho Sirius Black, havia matado o colega de Harry, Cedrico Digory, a mando de Voldemort e havia dado sua mão direita para realizar o feitiço que trouxe de volta à vida o bruxo das trevas. O traidor ganhara do seu amo uma mão mágica prateada, a mesma que Harry lhe havia subtraído nesse momento. Três anos antes, Sirius Black e Remo Luppin pretendiam matar o animago, também conhecido como Rabicho, mas Harry não havia permitido. Poucas vezes se arrependera tanto de uma decisão.

- Eu quero saber onde está Voldemort - disse Harry, insensível ao choro e à agonia do bruxo mais velho - Se você me disser, talvez eu o mate de maneira rápida. Eu não permitirei que você sangre até a morte... por enquanto, pelo menos. E você também não vai desmaiar de dor ou se transformar num rato. Eu não permitirei.

Muito pálido, o animago lançou ao garoto um olhar demente:

- Eu sabia, Tiago, que um dia você iria se vingar de mim! Eu disse que não era corajoso como você, o Sirius, o Remo...

- Cale a boca, seu idiota! – gritou Harry, as paredes frágeis da casa em ruínas tremendo ao som da sua voz – Eu não sou meu pai, aquele a quem você traiu, não se faça de demente!

- Eu estou pronto para morrer agora – ofegou – Como um verdadeiro grifinório!

Harry olhou espantado para a sua possível vítima. O olhar insano do outro e sua mente confusa investigada pelo “DOM” não deixavam dúvidas. Estava completamente louco. Por algum motivo havia sido abandonado por Voldemort e de nada lhe valia agora. O bruxo das trevas não dava sinais de vida há três meses. Os ataques de Harry pareciam tê-lo intimidado. Mas ele sabia que não haveria paz e ninguém estaria seguro enquanto Voldemort vivesse. Ele iria até os confins da Terra, se preciso fosse atrás do bruxo das trevas.

- Me mate, Tiago, eu quero morrer como um grifinório! – berrava entre lágrimas, Pettigrew.

Os outros comensais que Harry havia matado estavam espreitando seus amigos ou haviam praticado alguma atrocidade. Rabicho não. Estava insano, ele podia sentir. Estraçalhado pela culpa e pelo abandono. Deixá-lo vivo seria o castigo merecido para a sua traição, seria o castigo por ter deixado Sirius apodrecer inocente na prisão. Harry deu alguns passos em direção à porta do aposento imundo, fazendo menção de deixar o outro com os seus fantasmas.

- Tiago – chamou o animago – O Lorde foi para a África. Ele está com muito medo. Eu disse, não sou só eu que tenho medo! – Você conseguiu assustar o Mestre. África – repetia Rabicho, agora rindo tresloucado e arrastando-se com dificuldade até o seu carrasco. Vamos, me mate – sussurrou – Deixe-me ao menos morrer como um homem!

Sem recorrer a nenhum feitiço, Harry Potter caminhou dois passos até o traidor e quebrou o seu pescoço com seus braços potentes. Rabicho morreu com um sorriso estúpido no rosto, enquanto nauseado, o filho de Tiago Potter se afastava daquele lugar maldito.







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Quatro anos. Aos vinte anos de idade Harry Potter já tinha se convertido numa lenda no continente africano. Havia matado mais bruxos das trevas do que todos os aurores dos confusos ministérios da magia do continente. Usava inúmeros disfarces.Alguns juravam que o terrível vingador era um negro de um país de língua portuguesa, outros diziam que era um árabe da região do Magreb, diziam também que era um branco sul-africano. Muitos sussurravam nas sombras que o matador dos bruxos do mal era o famoso Harry Potter. Tal como as pessoas temiam na Inglaterra pronunciar o nome de Voldemort, muitos malfeitores de todos os lugares temiam pronunciar o nome do jovem bruxo. Diziam que voava no vento e seu espírito era atraído por delinqüentes que pronunciavam seu nome. Não haviam chegado a um acordo se o terrível vingador era Harry Potter ou qualquer outro bruxo ou um conjunto deles.

Nessa época começaram os cultos a Harry Potter em várias partes do mundo bruxo como a um deus. Diziam que falava com as cobras e com os hipogrifos. Juravam que imitava o canto da fênix. Os elfos domésticos veneravam-no como o seu protetor. Diziam que andava com um elfo doméstico e o tratava como igual. Assombrados, falavam de sua capacidade de fazer mágica sem varinha, de como lançava feitiços demolidores apenas gesticulando.

Dobby contava ao rapaz, aparentemente se divertindo muito, as várias histórias reais e fantasiosas a seu respeito. Harry tinha desenvolvido extraordinariamente o seu poder. Era capaz de aparatar de um continente a outro, seus feitiços tinham uma força jamais vista, principalmente porque usava apenas as mãos, dispensando varinhas. Constava que apenas Merlin teve tal poder. Criara músculos com horas de exercícios físicos e tinha desenvolvido, provavelmente com ajuda da magia que inundava o seu corpo, uma força descomunal. E sim, era capaz não só de imitar o canto da fênix, mas o de qualquer ave, cortesia das surpreendentes habilidades do “DOM”, além de poder falar com elas. Continuava sendo um ofidiglota (poder de falar com as cobras), o que era muito útil para perseguir bruxos das trevas por regiões mágicas entre florestas e desertos. Mas entendia-se bem também com os hipogrifos. No sul do continente havia imensos hipogrifos vermelhos e ferozes, que aparentemente só ele conseguia montá-los.

E caçava Voldemort.

Estava sempre atento aos fatos da Europa, onde aparentemente apavorados demais com as mortes ocorridas anos antes, os seguidores do Lorde das Trevas tinham desaparecido. Como Pettigrew havia dito antes de morrer, Voldemort realmente havia se estabelecido na África. Tentando aproveitar o caos dos ministérios mágicos da região e as fontes inesgotáveis de poder do continente, o bruxo buscou adeptos para os seus sinistros planos de conquista, no que vinha sendo sistematicamente prejudicado por Harry. Mesmo os piores bruxos cruéis e ambiciosos temiam se associar ao Lorde com medo do desconhecido vingador. Perguntavam-se se o vingador seria o legendário Harry Potter. E numa inversão curiosa de papéis em relação à boa parte da vida do rapaz, agora era Voldemort que se escondia de Harry.

Voando sobre um grande hipogrifo vermelho, um jovem bruxo de longos cabelos negros aterrisou na encosta de um ponto distante e inacessível aos trouxas entre as montanhas do Quênia. Diferentemente da maior parte do continente o lugar era frio. Vasculhando informações por espeluncas mal-frequentadas, onde trouxas maléficos e bruxos mal-intencionados vagavam atrás de bebidas fortes, emoções baratas e substâncias ilegais de ambos os mundos, Harry deparou-se constantemente com um nome: Amos Okosha. Era chamado o “Voldemort Africano” e diziam que tudo de ilegal do mundo bruxo ou trouxa no continente passava por ele.

Estranhamente há três dias uma ave mágica imensa e cinzenta (africanos não usam corujas) encontrou Harry num pequeno hotel do Cairo, que era a base das suas operações (ou dos seus ataques), com uma mensagem dizendo que Okosha queria encontrá-lo. Dizia apenas: “Vingador, sei quem você procura e sei onde está. A) Amos Okosha”. Após lido o bilhete transformou-se num mapa que dava as orientações do lugar, um planalto entre as montanhas quenianas, certamente inacessível aos trouxas. Era possível sentir a magia negra em cada palmo de terra, em cada sopro da brisa fria que uivava de maneira fantasmagórica. Dobby segurava-se tranqüilo na garupa do hipogrifo.

- Você já sabe, meu amigo – disse o jovem bruxo ao elfo – Se eu morrer, você deve incinerar o meu corpo e avisar os Weasleys.

- E dar todo o dinheiro que o mestre tirou dos bruxos das trevas para o Hospital St. Mungus aos cuidados de Hermione Granger – repetiu monotonamente Dobby. Todas as vezes que Harry corria perigo recitava o mesmo discurso. E Dobby sempre lhe dizia: - O mestre não vai morrer hoje. Não é um bom dia para isso.

- O que foi, meu amigo? – perguntou Harry para o hipogrifo que se agitava.

- Algum ser das trevas? – as orelhas grandes do elfo vibraram tentando escutar em volta.

- Nada demais – tranqüilizou-o Harry - Só dois basiliscos e alguns bruxos mal-intencionados logo abaixo de nós. Afaste-se com o nosso amigo e siga as instruções de sempre.

Uma passagem de forma retangular abriu-se ao pé da montanha em frente como se fosse a entrada de uma caverna. Era uma armadilha, é claro. Mas Harry não iria retroceder agora. Precisava saber se Okosha realmente sabia algo sobre Voldemort ou se os dois bruxos tinham se aliado. Um caminho como uma rampa inclinada para baixo delineou-se sob os pés do rapaz. A escuridão era tão densa que uma pessoa normal não enxergaria um centímetro a frente. Aguçando seus sentidos ampliados pelo “DOM”, ele percebeu que dois corpos gigantescos arrastavam-se na sua direção.

Harry Potter sorriu na escuridão. Um truque engenhoso. Quem preparou a armadilha esperava que ele iluminasse magicamente a sala e seria morto assim que um dos répteis olhasse para ele. O olhar do basilisco era tão mortal quanto o seu veneno. Quando tinha doze anos ele havia matado um monstro como esse com a espada de Gryffindor. Mas naquela época, Fawkes, a fênix do Professor Dumbledore havia cegado o réptil.

- Eu não quero matá-los, irmãos – sibilou o jovem bruxo na língua das serpentes, uma vez que falava com dois seres considerados soberanos dessa espécie.

- Você é muito presunçoso, humano – sibilou de volta o maior deles – Já que fala a nossa língua deveria implorar por clemência. Não que fôssemos atendê-lo, mas isso nos divertiria e talvez você tivesse um ou dois momentos a mais na sua vida.

- Eu entendo que vocês odeiem os humanos que os aprisionaram aqui, mas eu não tenho culpa. Procuro o homem que montou essa armadilha. Apenas ele.

Durante todo o diálogo Harry manteve os olhos cerrados e todos os outros sentidos atentos. Ele sabia que era inútil negociar com animais que estavam furiosos e famintos e podia sentir a excitação das feras farejando o seu sangue. Queria apenas ganhar tempo para examinar o lugar. Havia seis pessoas escondidas pelas grossas paredes de pedra. Logo saberia se elas estavam ali para atacá-lo ou para apreciar o espetáculo.

Ignorando a última tentativa de negociação do rapaz os monstros esgueiraram-se pelos cantos a fim de cercá-lo. Moviam-se com uma velocidade insuspeitada para o seu tamanho gigantesco. Quando estavam a poucos passos de sua presa aparentemente indefesa um canto de galo ecoou pelo ambiente. O canto do galo era uma das poucas coisas que matava aquelas serpentes amaldiçoadas. Não havia sido uma boa idéia montar uma armadilha com tais seres contra alguém que podia imitar o canto das aves.

Com os olhos agora abertos, o “garoto que sobreviveu” iluminou o ambiente com um gesto discreto e um estalar de dedos. Estava numa caverna que havia sido esculpida como um gigantesco anfiteatro de pedra. Ao fundo, a vários metros do rapaz, uma parede se abriu revelando um homem que se sentava calmamente numa poltrona alta, ajeitada acima do solo como se fosse um trono. Cinco homens grandes e musculosos, cajados em punho, caminhavam em direção a Harry, contornando os imensos répteis mortos.

Bruxos africanos, sobretudo os imponentes e presunçosos, usam cajados ao invés de varinha. Harry nunca entendeu aquilo, uma vez que são mais incômodos para carregar e não aumentam o efeito dos feitiços. Vasculhando a mente dos homens (quatro negros e um branco) percebeu que não haveria conversa ou negociação. Atacariam de maneira mais selvagem dos que os basiliscos e pôde sentir que a vida deles dependia disso. Um poderoso feitiço das trevas compelia-os a atacá-lo. Eram homens cruéis. Dava para sentir que o feitiço apenas aumentava algo que já carregavam. Melhor assim, pelo menos não haveria (muito) remorso pelo que teria que fazer.

Apenas cinco minutos se passaram e Harry marchava decidido em direção ao “trono” do homem que assistiu impassível o rapaz massacrar os cinco homens com feitiços cortantes e certeiros. Limpou o sangue das vestes e apontou o braço direito em posição de seta para o bruxo que o admirava tranqüilamente com um meio sorriso nos lábios.

- Me dê um único bom motivo para não matá-lo, seja lá você quem for – ofegou Harry entre dentes, a voz raivosa ecoando no vazio.

- Você não pode matar quem já está morto, Harry Potter – disse tranqüilamente o imponente bruxo negro sem se levantar ou demonstrar qualquer preocupação em seu semblante. Quando sorriu, brilhantes dentes de ouro refletiram a luz de dezenas de castiçais que ele havia conjurado – A sua fama não faz justiça aos seus poderes, meu jovem. Estou impressionado. E, saiba você que Amos Okosha não se deixa impressionar com facilidade.









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