Hoje



CAPÍTULO 14


- HOJE -


Sem querer mais alongar o assunto “Rose Weasley”, Scorpius desejou boa noite a Mary e subiu as escadas. Antes, porém, de entrar no próprio quarto, ele passou no quarto de Luísa ao ver que a luz ainda estava acesa.


- Filha, você não disse que ia dormir? – perguntou, ao vê-la já devidamente de pijama e segurando um cachorrinho de pelúcia. Sempre dormia com um bichinho. Ela estava olhando para o quadro de fotos de Rose e de Scorpius. O mesmo que, um dia, ele fizera aparecer na Sala Precisa.


- Estou pensando na mamãe. – explicou a loirinha, aproximando-se da foto maior, a da valsa. – Ela é mais bonita do que nas fotos. Papai, por que ela voltou e foi embora? – quis saber, olhando para o pai em expectativa.


- Sua mãe tem serviço para fazer. – disse Scorpius, evasivamente, pegando a filha no colo e levando-a para a cama.


- Você acha que ela gostou de mim? – perguntou Luísa, preocupada, quando o pai a cobriu com o cobertor.


- Claro que gostou, Luísa. – disse Scorpius, convicto, sentando-se no chão ao lado da cama. – É impossível não gostar de você. – acrescentou, lembrando-se da expressão ao mesmo tempo surpresa e lisonjeada de Rose quando a loirinha pulou no seu colo, chamando-a de mamãe.


- Papai, por que ela não ficou com a gente? Você disse que um dia ela voltaria para morar com a gente. Depois que resolvesse uns problemas. Mas ela veio e foi embora. – insistiu Luísa, inconformada.


- Luísa, isso não é assunto para crianças. – disse Scorpius, sem saber o que dizer. – E ela ainda não acabou de ajeitar os problemas.


- Eu sei que vocês brigaram. Escutei vocês gritando. Mas brigar é feio, papai. – continuou, voltando os olhinhos azul-claros para o pai.


- Filha, sua mãe e eu nos desentendemos. Só isso.


- Mas eu não sei o que é isso. – falou, com uma carinha confusa.


- Não se preocupe com essas coisas, meu anjinho. Sua mãe gostou muito de você. – assegurou Scorpius, fazendo cafuné na filha.


- Ela me disse que gosta muito de você. – contou Luísa, aconchegando-se embaixo do cobertor.


- Verdade? – quis saber o loiro, curioso.


- Verdade. – confirmou a menina, ficando insegura em seguida. – Mas eu não entendo. Se você gosta dela e ela gosta de você, por que não são casados? Como os pais da Lynn?


- Tem pais que só namoram, sem casar. – disse Scorpius, evasivamente.


- Igual aos pais do Terry. Mas também tem pais separados, com os da Monica. Papai, você e a mamãe são separados? – quis saber Luísa, curiosa.


- Não, filha, nunca nos casamos. – respondeu Scorpius.


- Vocês são namorados?


- Luísa, isso não é conversa de criança. – disse, por fim, autoritariamente. – Sua mãe e eu temos muita coisa a resolver. Mas você não precisa se preocupar com isso. Nós dois amamos muito você e agora somos seus pais. E é isso que importa. – acrescentou, lembrando-se do olhar terno e amoroso com que Rose fitou Luísa depois de ser chamada de “mãe”.


- Sabe, papai, a mamãe estava chorando quando eu fui levar o chocolate para ela. – contou Luísa. – Por quê?


Scorpius se assustou com a informação. Teria magoado Rose com as palavras ásperas que dissera? Se sim, talvez fosse um bom sinal. Ela ainda sentia alguma coisa. E o preço de ele saber disso era magoá-la. Seria um preço justo?


- Eu não sei, filha. – disse Scorpius, contando parte da verdade. Não sabia, mas imaginava. – Talvez ela estivesse triste por algum motivo. E chorar pode ser bom. Alivia a tristeza. – comentou, falando por experiência própria.


- Sério? – fez a menina, incrédula.


- Sério. Algum dia, você vai entender.


- Tá bom. Aposto que isso vai ser quando eu for grande, porque tudo é assim. – disse Luísa, por fim.


- Nem tudo. – disse o loiro, sorrindo com a constatação dela. – Boa noite, filha. Dorme com os anjos. – disse Scorpius, beijando a bochecha da menina. Em seguida, saiu do quarto e apagou a luz. Luísa disse, no escuro:


- Eu amo você, papai!


- Eu amo você também, Lu. – disse, sincero.


Scorpius caminhou para o próprio quarto, absorto em pensamentos. Com um peso no coração, olhou a cama de casal que havia ali. Tinha construído a casa pensando em Rose e em Luísa. Planejando que os três formassem uma família. Mas por mais que amasse a ruiva, achava errado simplesmente aceitá-la de volta como se nada tivesse acontecido. Isto é, se é que ela queria voltar para ele. Tampouco a pediria que voltasse. Afinal, por mais que a amasse, ainda tinha amor-próprio e vergonha na cara.


Scorpius vestiu o pijama e se enfiou debaixo das cobertas. Sabia que custaria a dormir naquela noite, então resolveu fazer um balanço de sua vida.


Rose fez uma escolha. Disse que seria terrível se o perdesse se um namoro desse errado. Que não conseguiria viver com aquele medo. Que não era imaginável uma vida da qual ele tivesse que sair. E, apesar disso, escolhera não ser namorada dele. Escolhera ficar longe dele. E, afinal, que tipo de pessoa já começa a namorar pensando no dia que o namoro pode terminar?


Era ridículo. Rose não tinha falado coisa com coisa. O mais sensato teria sido presumir que ela não gostava dele, que tudo tinha sido por causa da aposta, e continuar seguindo a vida, sem se importar com as tentativas da ruiva de visitá-lo ou a mania irritante de escrever cartas que ele nunca abriu. Mania que logo foi abandonada. Mas Scorpius nunca tinha, de fato, conseguido seguir a vida. Não a vida amorosa.


Ignorando os protestos dos pais, tinha resolvido voltar para Durmstrang. Seria menos doloroso se não tivesse que ver Rose todos os dias. Depois, em vez de seguir uma carreira bruxa, escolhera estudar medicina, para frustração enorme do avô paterno. Tinha vontade de ajudar bruxos que tinham câncer, igual ele tivera. E trouxas também. Porque era uma doença sofrida.


Estudou em Oxford. E dedicou-se com afinco. Draco e Astoria não se importavam em ajudá-lo a pagar a faculdade. E ele tinha bolsa, então os pais não precisavam pagar o valor integral das mensalidades.


Scorpius logo se afeiçoou a um professor velhinho, Drew, especialista em oncologia infantil. Cansado, o professor lhe dissera que pensava em se aposentar, mas precisava deixar alguém de confiança cuidando das crianças do hospital. Não podia ser qualquer um. E Scorpius, interessado, disse que queria conhecer o trabalho dele. No minuto em que pisou no hospital, e viu o professor cuidar das crianças e ver o afeto e o carinho com que elas retribuíam os cuidados que recebiam – tão sinceramente –, Scorpius apaixonou-se pelo serviço.


Três anos depois, Luísa chegou. Tinha sido abandonada em frente a um orfanato, junto a uma certidão de nascimento que dizia apenas seu primeiro nome, o dia e o local onde nascera – Escócia. A diretora do orfanato, vendo que a menina era fraquinha e vivia sempre doente, levou-a ao hospital, onde Drew a diagnosticou com câncer. Tinha um ano então.


Scorpius logo se afeiçoou a ela. Drew o incumbira de cuidar da loirinha. Era a primeira paciente de quem Scorpius não era apenas um enfermeiro – Drew lhe dava tarefas próprias de oncologista. Luísa foi o fator determinante para que Scorpius se formasse em medicina depois de apenas quatro anos de faculdade, iniciando imediatamente a residência de oncologia pediátrica. Queria ser o melhor médico possível. Queria cuidar da menina. E lhe devolver a chance de ter uma vida longa e saudável.


Como trabalhava com Drew desde o primeiro mês de faculdade, Scorpius não era visto por ninguém como médico residente. Era Dr. Scorpius Malfoy, oncologista. Era o médico responsável por cuidar de Luísa e de outra dúzia de crianças. Era médico considerado um dos melhores de sua especialidade em todo o país. Operou Luísa, sob a supervisão de Drew. Mais tarde, cuidou dela durante as sessões de quimioterapia necessárias. Só terminou a residência quando a garotinha estava prestes a completar quatro anos, com o tratamento se aproximando do fim. Drew se aposentou, com a consciência tranquila. A chefia do Departamento de Oncologia Infantil foi imediatamente passada para Scorpius, que também foi incumbido de ser o responsável por dois médicos residentes. 


Como de praxe, no dia do aniversário de quatro anos de Luísa – 18 de maio –, Scorpius organizou uma festinha de aniversário na ala de oncologia infantil do hospital, reunindo todas as crianças que estavam em tratamento. Eram cerca de quarenta, que se revezavam no hospital em horários e dias diferentes, quando não precisavam de ser internadas.


Luísa soprou as velinhas do bolo de aniversário, brincou na piscina de bolinhas e na cama elástica com as outras crianças, acompanhou as enfermeiras contarem historinhas e fez vários desenhos. Ao fim da festinha, porém, estava estranhamente triste. Estava sentada sozinha a uma mesinha de plástico colorido. As outras crianças já tinham ido embora com os pais. As enfermeiras voltaram-se para cuidar das crianças que estavam internadas, em observação. E o motorista do orfanato não havia chegado ainda.


- E então, Luísa, gostou da festinha? – quis saber Scorpius, sentando-se ao lado dela no chão.


- Gostei. – respondeu, com tristeza.


- Agora você não precisa vir para o hospital mais. Está curada, sabia? – disse Scorpius, fingindo animação. Cortava o coração saber que se afastaria de Luísa.


- Sabia. A Nat me falou ontem. – respondeu, referindo-se a uma das enfermeiras.


- Por que você está triste, então, Luísa? – quis saber o loiro, curioso.


- Eu não quero ficar no orfanato. Todas as meninas estão saindo de lá. E eu continuo. Porque eu sou feia. Não tenho cabelo como elas. – disse a menina, com os olhinhos azuis marejados.


Scorpius a pegou no colo e a abraçou com força.


- Luísa, você é linda. Você não tem cabelo porque estava dodói. Mas agora vai ficar boa e seu cabelo vai crescer um tanto. – disse ele, acariciando a cabecinha da menina.


- Todo mundo aqui tem pai e mãe. Eu não. As meninas do orfanato ganham pai e eu não. – ia dizendo Luísa, chorando contra o peito de Scorpius. – Eu quero continuar aqui porque eu tenho você.


O coração de Scorpius enterneceu ao ouvir aquilo. Mas como explicar a ela que não podia continuar ali por causa das regras estabelecidas pelo NHS, o serviço de saúde britânico?


- Você também vai ter um pai e uma mãe, Luísa. – disse, automaticamente. Queria que ela parasse de chorar. Cortava o coração vê-la daquele jeito.


- E se ninguém me buscar no orfanato? – disse, entre lágrimas.


Uma ideia perpassou pela cabeça de Scorpius na mesma hora.


- E que tal se eu te buscar no orfanato? – sugeriu.


O rostinho de Luísa se iluminou e ela parou de chorar na mesma hora. Voltou os olhinhos para o rosto de Scorpius, em expectativa.


- Você vai me trazer para cá?


- Não. Eu vou te buscar para ser seu pai. – explicou, sorrindo. – O que acha?


Luísa sorriu, contente.


- Eu vou ter um pai! – disse, pulando para abraçar Scorpius.


- Claro que vai, Luísa. – confirmou, alegre por vê-la tão feliz.


- Eu posso te chamar de papai? – quis saber a menina, afastando-se.


- Pode. – respondeu Scorpius, com um sorriso enorme no rosto.


O motorista do orfanato chegou. Scorpius pediu que Luísa fosse com ele. Dali a alguns dias, buscaria a menina no orfanato. Antes de ir, ela deixou com ele um dos desenhos que fizera – tinha desenhado a si mesma com cabelos compridos ao lado de um homem vestido de branco e de cabelos loiros.


E assim foi feito. Scorpius comprou uma casa e a arrumou e reformou em tempo recorde. Pediu a Mary Hopkins, bruxa abortada, que se demitisse do emprego de faxineira do hospital para ajudá-lo com Luísa. E ela aceitou. O salário que o loiro lhe ofereceu era bem melhor.


Scorpius teve especial cuidado ao arrumar o quarto de Luísa. Comprou vários vestidinhos e roupinhas de criança. Comprou vários bichinhos de pelúcia, porque sabia que a garotinha os adorava: cachorros, gatos, ursos. Mas também dragões, unicórnios e hipogrifos. Desconfiava que Luísa fosse bruxa, embora nunca tivesse tido oportunidade de presenciar um dos “episódios estranhos” a que o motorista do orfanato se referira certa vez. Um deles incluía Luísa cair do 2º andar e chegar ao chão como se flutuasse pelo ar. Scorpius ainda conseguiu autorização na Justiça trouxa para adotar a menina. Era o registro de nascimento que ela tinha até então. Ela agora era Luísa Weasley Malfoy, filha de Scorpius Malfoy e Rose Weasley, que viviam em “união estável”.


Era mentira e Scorpius sabia disso. Nunca existira união estável nenhuma. Mas a lei de adoção exigia que a criança tivesse um pai e uma mãe. Scorpius colocara a parte de “união estável” porque era mais fácil conseguir adotar uma criança se os pais morassem juntos ou fossem casados. E escolhera Rose porque ela era diferente de todas as mulheres com quem convivera depois de voltar para Durmstrang. Rose era sincera. Afetuosa. Generosa. Doce. Terna. Tinha senso de responsabilidade e de disciplina. Caráter bem formado. Tinha tudo para ser uma ótima mãe. E a intuição de Scorpius lhe dizia que Rose não buscaria apenas o direito a pensões alimentícias ou recusaria veementemente a incumbência de ajudar a cuidar de uma criança sob o argumento de “quem pariu Mateus que o embale”. Ele sabia que ela se interessaria. Procuraria conhecer a menina, antes de mais nada.


E, apesar disso, Scorpius nunca tivera coragem de ir atrás dela e lhe contar o que tinha feito. Tinha-lhe dado uma filha sem saber se quereria a menina. Achava que Rose nunca saberia. E não se importava tanto. Tinha se conformado em fazer Luísa conhecer a mãe por meio de fotografias. E também não tinha interesse em arranjar uma namorada ou uma esposa que quisesse esse papel. Primeiro porque era algo muito difícil. Segundo, as outras mulheres não lhe interessavam tanto quanto Rose. Eram superficiais demais. Ou muito burras. Muito insensíveis. Ou feias. Não tinham o encanto de Rose. Não lhe entendiam como Rose o entendia. O toque delas não lhe provocava a menor reação, como os de Rose. Mas Rose talvez nem se lembrasse dele. Rose estava seguindo a vida dela. Saía com dúzias de caras diferentes. Era o que contavam as colunas de fofoca do “Profeta Diário”. Depois, envolvera-se com o tal John. E agora devia estar tão abarrotada de serviços que não se lembraria da existência dele. E, de um dia para o outro, Rose bate à porta dele para ser sua defensora em processo perante a Suprema Corte!


Scorpius se perguntava o que seria isso. Destino, talvez? 


Não sabia. Só tinha certeza de que Rose voltara para a sua vida. Definitivamente. Não teria como afastá-la, nem que quisesse. Tinha Luísa. Ela com certeza iria querer ver Rose novamente, agora que a tinha conhecido.


Scorpius se perguntava o que aconteceria se fosse preso. O que seria de Luísa?


Mas, obviamente, Rose não deixaria que fosse preso. Ou deixaria? Talvez estivesse ficado muitíssimo chateada com a declaração mesquinha que Scorpius fizera a respeito do tal John e sobre ela ser a culpada da morte dele. Scorpius se lembrava perfeitamente da máscara de infelicidade e sofrimento que era o rosto dela ao gritar “EU NÃO ADMITO QUE VOCÊ DIGA NADA CONTRA O JOHN! VOCÊ NÃO O CONHECEU! VOCÊ NÃO SABE O QUE EU PASSEI QUANDO ELE MORREU!”. Teria sido John um namorado? Teria ele significado algo mais para ela?


Scorpius tinha que admitir que sentia ciúmes de John. Ok, ele tinha morrido há algum tempo, mas mesmo assim. Parecia significar muito para a ruiva. Scorpius queria significar muito para ela também. Assim como ela significava para ele. E queria que ela admitisse isso. Para ele, já estava mais que óbvio que Rose sabia dos sentimentos que ele nutria por ela. Desejava que ela se sentisse da mesma forma – que o amasse. Não como amigo. Como homem. Como marido.


Talvez fosse impressão. Ou Scorpius tivesse enxergado o que queria. Mas Rose estava mais bonita. Os olhos assustadoramente azuis. Os cabelos ruivos caindo em cachos perfeitos pelas costas. O corpo esbelto, feminino. E uma expressão adulta no rosto. De quem já passara por vários momentos de sofrimento e provações. Mas os olhos ainda conservavam o ar ingênuo e sem maldade que sempre tiveram.


Em meio a pensamentos que iam e vinham, todos sobre Rose, Scorpius adormeceu.


*


- Rosita, você voltou! – gritou Hugo, correndo para a irmã e abraçando-a com força, rodopiando-a no ar.


- Ai, Hugo, você vai quebrar minhas costelas desse jeito! – reclamou Rose, embora estivesse feliz por estar em casa novamente.


- E aí, você veio para ficar ou para passar uns dias só? – quis saber o rapaz, sorrindo de orelha a orelha ao colocar a irmã no chão.


- Vou ficar. – disse a ruiva, lançando um olhar de esguelha para os pais, que tomavam café da manhã à mesa da cozinha. – Até eu me casar. – acrescentou. – Senta aí, estou terminando de assar uns cookies.


Hugo respondeu com um olhar surpreso, enquanto se sentava.


- Você vai se casar? Quando? – quis saber, servindo-se de leite. – Não soube que estava noiva.


- E não estou. – disse Rose, abrindo o forno e tirando de dentro dele uma fôrma repleta de cookies, que pousou na mesa enquanto se sentava. – Mas vou ficar.


- E como você sabe que vai ficar noiva? – quis saber Hugo, confuso. – Está lendo os pensamentos do namorado?     


- Claro que não, Hugo. Não tenho namorado. – disse Rose, passando geleia em algumas torradas.


Ron abafou uma risadinha. Hermione observava a conversa dos filhos, curiosa. Hugo parou a mão a meio caminho de pegar o cereal.


- Então... como é que...? – começou, sem coragem de terminar a pergunta. Temia que a irmã o xingasse, perguntando se achava que ela tinha vocação para titia.


- Simples. Eu vou fazer o pedido de casamento. – respondeu Rose, sorrindo docemente para o irmão.


- VOCÊ O QUÊ? – fez ele, surpreso, derrubando a caixa de cereal no chão, com estrondo.


- Hugo, você sujou o chão limpinho! – disse Hermione, fingindo-se brava com o filho. Ele não se importou. Virou-se para o pai, que abafava risadinhas com as costas da mão.


- Papai, você ouviu isso? A Rose vai pedir um cara em casamento!  


- Eu já sabia. – declarou Ron. – Rose e eu conversamos bastante ontem à noite. Hermione se juntos a nós quando chegou do Ministério. Mas como você tinha saído com a Alice, a Lily e o Ben, é óbvio que não ficaria sabendo. – contou, com naturalidade.


- Mas... nenhuma mulher da família nunca pediu um homem em casamento! – protestou Hugo.


- E o que tem de mais nisso? – quis saber Hermione, erguendo uma sobrancelha. – Sua irmã pode ser a primeira.


- Pode não, mamãe. Eu serei a primeira. – corrigiu Rose, convicta.


- E o que você vai fazer? Comprar uma aliança de brilhantes para o cara? E se ele não aceitar? – continuou Hugo, incrédulo e estupefato.


- Claro que vou comprar uma aliança de brilhantes. Para mim. E ele vai aceitar. – respondeu, calmamente.


- Rose, eu sei que você é linda, mas e se ele NÃO aceitar? – repetiu, dando ênfase à palavra.


- Ele VAI aceitar. – disse, também enfatizando a palavra. – Confie em mim, Huguito. Eu tenho meus métodos.


- Prefiro nem saber quais são. – resmungou, limpando a bagunça que fizera com um aceno de varinha.


- E, a propósito, amanhã eu vou trazer sua primeira sobrinha aqui em casa. – continuou Rose, em tom de conversa.


Ron ajeitou-se na cadeira, fitando o filho para saber qual seria a reação dele. Hermione mandou às favas as tentativas de fingir que não se interessava tanto pelo assunto e apoiou o rosto em uma das mãos, olhando para Rose e Hugo atenciosamente.


- Por que a Desirée vem para cá? – quis saber Hugo, servindo-se de cookies, parecendo confuso. – Você nunca foi muito ligada a ela. Além disso, sua afilhada não é a Paola?


- Sua primeira sobrinha, Hugo, sem considerar os filhos de nossos primos. – explicou Rose, sorrindo. Ele fez menção de abrir a boca, mas a irmã prosseguiu: – Amanhã você vai conhecer minha filha.


A fôrma de cookies foi parar no chão. Hugo também. E Ron, finalmente, caiu na gargalhada.


*


O telefone tocou, estridente. Domingo. Era o dia de folga de Mary Hopkins, e Scorpius desceu as escadas correndo.


- Alô? – disse, ao atendê-lo.


- Dr. Malfoy, aqui é Natalie, enfermeira do hospital de oncologia. – identificou-se a mulher, do outro lado da linha.


- Algum problema com as crianças, Natalie? – quis saber Scorpius, preocupado, sentando-se no sofá mais próximo.


- Nenhum, senhor. O senhor sabe que domingo só o notificamos das emergências infantis, mas hoje está tudo muito tranquilo. Só temos recebido algumas crianças que apresentaram efeitos colaterais das sessões de quimioterapia e radioterapia. – disse Natalie, profissionalmente, acrescentando em seguida: – Mas não é por isso que estou ligando para o senhor. É para falar sobre ontem.


- Ontem de manhã eu estive aí, Natalie. – comentou Scorpius, sem saber aonde ela queria chegar. – E ninguém me chamou para emergências à tarde ou à noite.


- Eu sei. Mas o senhor não esteve aqui à tarde, como disse. E... bem... uma moça esteve aqui te procurando. Fez várias perguntas sobre o senhor. Gravou entrevistas. Disse que era sua advogada. Chama-se Srta. Weasley. – contou Natalie, em tom hesitante.


Rose.


- Por que não me avisou antes, Natalie? – quis saber Scorpius. Depois de fazer a pergunta, percebeu que não devia tê-la feito. Natalie com certeza pensaria que estava cogitando demiti-la, por ser a enfermeira-chefe do departamento.


- Me desculpe, senhor. – respondeu, imediatamente, sem dar tempo para o loiro voltar atrás. – Mas o plantão de ontem à tarde não era meu, e as outras enfermeiras não conseguiram me localizar porque fui para uma fazenda com meu marido e não levamos celular. Só soube há pouco. – havia temor na voz dela.


- Tudo bem, Natalie. E como era essa moça? – perguntou Scorpius, dividido entre a pena que sentia por ter assustado Natalie e a curiosidade de saber mais sobre Rose.


- Greg e Thomas me disseram que era bonita e jovem, senhor. Estava bem vestida, com aquelas roupas formais que advogadas geralmente usam. – disse a mulher, irritando o rapaz um pouco. Não queria saber de detalhes miúdos. Tampouco saber que os enfermeiros a haviam achado bonita. Ciúmes? – Tinha os cabelos ruivos, cacheados. E olhos azuis.


- E quem a recebeu quando chegou aí?


- Greg e Thomas. – contou Natalie, fazendo Scorpius se irritar de vez. Greg e Thomas eram ótimos enfermeiros, ele tinha que admitir. Mas tinham um fraco muito grande por mulheres bonitas. E estavam sempre comentando, às escondidas, os “atributos” das mães das crianças que atendiam.


- O que ela queria saber, Natalie? – perguntou, tentando afastar a súbita irritação que sentira.


- Eles me disseram que ela entrevistou os enfermeiros que trabalham com o senhor, o Dr. Drew, alguns médicos de outros departamentos, as mães e os pais das crianças que estavam aqui ontem e as próprias crianças. Queria saber mais sobre o seu trabalho como médico.


Scorpius fechou os olhos, pensativo. Não quisera discutir “estratégias de defesa” com Rose. E ela fora atrás da defesa dele. Sem comunicá-lo. Parecia, de fato, disposta a livrá-lo de qualquer acusação que houvesse contra ele. Não importava que motivos tivesse.


- Natalie, você me disse que ela os entrevistou? E que o Dr. Drew esteve aí? – continuou, depois de alguns segundos de silêncio.


- Sim, senhor. Ela pediu autorização para gravar as respostas com uma filmadora. E Dr. Drew veio aqui só para pegar uns papéis para provar a aposentadoria dele para alguma coisa que não sei bem o que é.


Rose estava realmente disposta.


- Senhor... não tem problema, tem? Pelo que me disseram, todos concordaram em conceder entrevistas para essa moça. – comentou Natalie, de novo com um tom hesitante na voz.


- Não, Natalie. Não tem problema algum. Pode ficar tranquila. – assegurou Scorpius, reabrindo os olhos. Teve a impressão de ouvir a mulher suspirar aliviada com a resposta.


- Dr. Malfoy, o senhor está enfrentando algum tipo de processo? Se estiver, sabe que pode contar com nossa ajuda. – comentou. Scorpius sabia que Natalie não o estava bajulando. Não era o tipinho que tanto o irritava, o que tinha sido determinante para escolhê-la como enfermeira-chefe.


- Obrigado, Natalie, mas acho que já devem ter ajudado o suficiente. E não é exatamente um processo, é só... – ele hesitou, considerando o que deveria falar. – Bem, uma investigação a respeito de um médico. Parece que me confundiram com ele. Mas o engano será desfeito. – mentiu o loiro. Não podia, obviamente, contar a trouxas os problemas que enfrentava no mundo bruxo.


- Está certo, senhor.


- Só quero lhe pedir que não comente nada com ninguém. O processo está em segredo de justiça. – acrescentou Scorpius. – E, por favor, carregue o celular com você em todas as ocasiões possíveis a partir de agora. Se a Srta. Weasley aparecer no hospital de novo e eu não estiver, me avise imediatamente.


- Sim, senhor. Tenha um bom dia. – finalizou Natalie.


- Bom dia, Natalie. – disse Scorpius, recolocando o telefone no gancho. Antes, porém, que pudesse pensar em qualquer coisa, Luísa desceu as escadas correndo:


- Papai! – chamou, pulando para o colo de Scorpius. – Quem te ligou?


- A Natalie, lá do hospital. – respondeu.


- Pensei que podia ser a mamãe. – disse a loirinha, tristemente. Parecia achar que Rose não ligava para ela, mesmo tendo passado apenas dois dias desde que fora lá pela primeira vez.


- Mas sua mãe disse que te veria de novo, não disse?


- Disse.


- Então ela virá. Sua mãe cumpre as coisas que diz. – disse Scorpius, com convicção. – E quanto a você, mocinha, já te disse várias vezes para não descer as escadas correndo. – comentou, em tom de censura. – E se você cair e se machucar?


- Não vou me machucar. Uma vez eu caí da escada no orfanato e caí no chão em pé. Não machuquei nadinha. – disse Luísa, contando a Scorpius a história que o motorista lhe contara certa vez. História que fazia ele suspeitar que a menina fosse bruxa. Apesar de que ela tinha três anos apenas na época. Geralmente, os bruxos manifestavam aptidão para a magia aos seis ou sete anos. O que dava a Scorpius algum tempo com o benefício da dúvida. Ou malefício.


- E se você se machucar? – quis saber Scorpius, curioso.


- Você cuida de mim. – respondeu Luísa.


- Ah, é? Você anda muito engraçadinha, Luísa. Já disse que não é para descer as escadas correndo e ponto. Da próxima vez que a vir fazendo isso, vai ficar de castigo, entendeu? – disse ele, severamente.


- Entendi, papai. – disse a menina, obedientemente. A campainha tocou.


- Vai atender, Luísa. Devem ser seus avós. – comentou Scorpius, colocando-a no chão.


Obedientemente, a loirinha correu para a porta de entrada, no hall. Ficando na pontinha dos pés, puxou a maçaneta.


- Mamãe! – gritou, contente.


Impelido pela curiosidade, Scorpius levantou-se na mesma hora e foi para o hall, surpreendendo-se ao ver Rose abraçando Luísa ternamente.


- E então, filha, como você está?


- Estou bem, mamãe. – respondeu a menina, enquanto Rose a colocava no chão.


- Vai ficar parada na soleira da porta, Weasley? Está bem frio. – comentou Scorpius, da porta da sala de estar.


- Posso entrar? – perguntou a ruiva, parecendo surpresa pela reação do loiro.


- A não ser que queira morrer congelada. – rebateu, com um sorriso irônico no rosto. Ainda estava magoado o suficiente com Rose para não se dar ao trabalho de ser educado com ela. Inconscientemente, tentava afastá-la de si mesmo mais uma vez, somente para que ela tomasse a iniciativa de quebrar a barreira invisível que os separava. Seria uma prova para saber se ela ainda se importava.


Sem responder ao loiro, Rose fechou a porta atrás de si, com cuidado, segurando uma das mãos de Luísa.


- Que bons ventos trazem você aqui, Weasley? – quis saber Scorpius, sem sair do lugar em que estava.


- Vim saber se a Luísa pode passar o dia comigo. Para conhecer os avós e o tio. – disse Rose, encarando-o com firmeza.


- Eu tenho um tio? – quis saber a menina, olhando para a mãe em expectativa.


- Tem, sim, meu anjo. O irmão da mamãe. O tio Hugo. – contou Rose, olhando para baixo.


- Eu vou ter mais dois avós também? – continuou, claramente feliz.


- É, sim. A vovó Hermione e o vovô Ronald. – disse Rose, surpreendendo Scorpius.


- Vovô Ronald? – disse ele, sem acreditar no que ouvira.


- Isso mesmo. Ele não vê a hora de conhecer a Luísa. – respondeu, encarando-o como se o desafiasse a dizer qualquer coisa contra o pai dela. – Você me dá permissão para levar a Luísa comigo? Deixo ela aqui à noite, no horário que você achar mais conveniente.


- Posso ir, papai? – pediu Luísa, segurando a mão de Rose com força. – Por favor.


- Luísa, o vovô Draco e a vovó Astoria vem aqui daqui a pouco. – comentou Scorpius, hesitando.


- Ah, papai... – lamentou, tristemente.


- Só para lembrar, Scorpius...


- Malfoy. – interrompeu.


- Só para lembrar, Scorpius – repetiu Rose, enfatizando o nome dele –, eu sou mãe da Luísa. – finalizou, com tom de voz inflexível e olhar significativo.


- Ela pode ir, então. – concordou, cedendo aos significados que o olhar da ruiva carregava sem pensar duas vezes. – Desde que você a traga de volta às oito. Ela dorme às oito e meia. – explicou.


Luísa sorriu, exultante.


- Vamos trocar de roupa, Luísa? Para vestir uma roupa bem bonita para conhecer a família da mamãe? – sugeriu Scorpius.


- Não precisa, a mamãe me ajuda, não é, mamãe? – perguntou a menina, olhando para cima.


- Claro que ajudo, Luísa. Se você quiser.


Scorpius engoliu em seco. Rose subiria ao quarto de Luísa e veria a montagem com as fotos que havia lá em cima. Não haveria como evitar. Não tinha desculpas convincentes para Rose não ir até lá.


- Tudo bem, Scorpius? – perguntou a ruiva, hesitando em acompanhar a filha.


Ele deu de ombros. Foi a deixa para que Luísa puxasse Rose pela mão escada acima. A campainha tocou novamente, enquanto Scorpius ouvia a vozinha animada da filha conversando com a mãe no quarto.


Abriu a porta e não se surpreendeu ao ver os próprios pais ali.


- Oi, meu filho. – disse Astoria, aproximando-se para abraçá-lo.


- E aí, Scorpius? – falou Draco, bagunçando o cabelo do filho com uma das mãos.


- E a Luísa, onde está? – quis saber Astoria, assim que largou Scorpius, observando-o fechar a porta.


- Está lá no quarto. Ela não vai ficar com a gente hoje, mamãe. – comentou, pegando os casacos dos pais para pendurá-los.


- Por que não? – continuou a loira, curiosa.


- Luísa vai passar o dia com a mãe dela. – respondeu Scorpius, despretensiosamente.


Astoria boquiabriu-se na mesmo minuto. Draco fez uma expressão confusa e começou, hesitante:


- Scorpius, quando você disse mãe... você estava... bem... referindo-se a Rose?


- Exatamente. – confirmou, acompanhando os pais até a cozinha.


- Mas como...? – começou Draco.


- Depois eu explico, papai. Prometo que conto todos os detalhes. – disse, sentando-se à mesa.


- Filho, você e a Rose estão de juntos de novo? – quis saber Astoria, com o rosto iluminado de esperança.


- Mamãe, Rose e eu nunca estivemos juntos de verdade. Não como namorados, e você sabe disso. – disse ele, em tom cansado, fitando as próprias mãos.


- Você a procurou? Ou ela procurou você? – quis saber Draco, curioso, sentando-se defronte ao filho.


- Depois, papai. Depois que ela sair com a Luísa, eu explico tudo. E respondo todas as perguntas. – disse Scorpius, em tom definitivo.


- Posso subir? – perguntou Astoria, ansiosa. – Queria tanto ver a Rose!


- Finja que está em sua casa, mamãe. – suspirou Scorpius. Sabia que a mãe já tinha começado a pensar na festa de casamento dele com Rose. A loira nunca tinha concordado com as escolhas que o filho fizera. E tinha em Rose o protótipo de nora perfeita.


- Rose! – ia chamando Astoria, quase tropeçando nos próprios pés.


Draco olhou para Scorpius com um ar de riso no rosto.


- Ela voltou. E deve ter reagido bem à Luísa, não é? Se vai levar a menina para passear...


Scorpius não respondeu. Estava cansado de tentar dar explicações a respeito de Rose. Levantou-se e serviu um copo de água, para ter o que fazer.


- Isso, Scorpius, me ignore. – disse Draco, tamborilando os dedos na mesa. – Com certeza você não quer saber, mas acho que sua mãe tem razão. Você foi muito insensível com a Rose. Sabe, não é qualquer mulher que aceita bem o fato de um cara que não vê há anos criar uma filha dizendo que é a tal mulher a mãe. Só uma pessoa com um coração enorme faria isso. É um encargo muito pesado, sabia?


- Ou alguém que estivesse disposto a qualquer coisa para reconquistar um homem. – retrucou Scorpius, sentando-se à mesa e evitando, deliberadamente, encarar o pai.


- Sim, porque uma mulher desse tipo arriscaria o pescoço e a vida toda pela frente por qualquer criança só para poder dormir com um homem todas as noites. – concordou Draco, com sarcasmo. Scorpius lhe lançou um olhar gélido. – E até parece que você precisa ser reconquistado. Rose já te conquistou uma vez e isso é mais do que suficiente. O amor que você tem por ela é o bastante para toda uma vida.


Mais uma vez, Scorpius nada disse. No íntimo, sabia que Draco tinha razão. Mas não admitiria isso em voz alta. De jeito nenhum.  


- Você disse que ela está no quarto da Luísa. Aquele quadro de fotos continua lá? – continuou Draco, espezinhando o filho.


- Continua. – respondeu, secamente.


- E você não vê problema nisso? – quis saber Draco, fitando o filho com atenção, como se o avaliasse.


- Não sei. – retrucou. Draco ergueu uma sobrancelha, pensativo.


Minutos depois, Luísa entrou na cozinha correndo e pulou para o colo de Scorpius, claramente feliz, apontando para o cabelo loiro curtinho.


- Olha, papai! A mamãe arrumou um lacinho para pôr no cabelo! Meu cabelo já está ficando mais grandinho! – Scorpius olhou com atenção. Era um tic-tac com um lacinho preto.


- Ficou linda, filha. – respondeu, colocando a menina no chão. – Agora, seja educada e cumprimente seu avô. Você não pode se esquecer dele.


Luísa pulou no colo de Draco e deu um beijo na bochecha dele.


- Oi, vovô!


- Oi, florzinha, que saudades de você.


Scorpius ouviu as vozes de Rose e de Astoria se aproximando, como se estivessem descendo as escadas. Não conseguia distinguir bem o que conversavam, tampouco prestava atenção no que Draco conversava com Luísa. Observava a filha atentamente. De fato, Rose tivera muito bom gosto ao vesti-la. Luísa usava um suéter de lã vermelho de gola alta, uma saia com pregas e meia-calça preta, grossa. Botas marrons de cano baixo. E um sobretudo preto, com bolinhas azuis.


- Vamos, Luísa? – chamou Rose, da porta da cozinha. Scorpius voltou o olhar para ela. Astoria aproximou-se do marido e da neta, parecendo radiante. – Ah... oi, Draco. – cumprimentou, meio sem graça, adiantando-se para apertar a mão do loiro, que respondeu ao cumprimento com entusiasmo. 


Luísa aproximou-se de Rose, que a ajudou a vestir um par de luvas, um cachecol e um gorro.


- Agora, despeça-se do papai e dos seus avós. – disse Rose, ao que a menina obedeceu imediatamente.


Cumprimentou Scorpius por último, e ele lhe recomendou:


- Não faça bagunça, Luísa. Comporte-se e seja boazinha. Obedeça à mamãe, ao seu tio e aos seus avós.


- Pode deixar, papai. – concordou, antes de beijar a bochecha dele. Em seguida, saiu da cozinha segurando a mão de Rose, contente. Estava praticamente saltitando ao lado da mãe.


- Você não podia ter escolhido mãe melhor para a Luísa, filho. – comentou Astoria, assim que ouviram a porta de entrada se fechar.


- Mas isso não importa agora, Astoria. É hora de Scorpius nos contar como a Rose voltou para a vida dele. – falou Draco, puxando a esposa para a cadeira mais próxima.


Com um pesado suspiro, Scorpius começou a contar tudo o que acontecera desde o dia em que Rose aparecera na soleira da porta pela primeira vez. Falou sobre o processo, sobre as investigações, sobre a briga que tivera com ela, tudo. Draco e Astoria não interferiram. Quando terminou, Astoria comentou, em tom conclusivo:


- A Rose ainda te ama.


- Eu não entendo a Rose. – desabafou Scorpius. – Nunca entendi. Numa hora, ela parece triste. Na outra, está feliz. Num minuto fala que gosta de mim, no minuto seguinte diz que eu não tenho direito nenhum de falar nada sobre o tal John. No casamento das primas dela, esteve a ponto de me beijar. Depois, dizia que estava se sentindo abandonada porque o Glenn não apareceu no casamento e não deu satisfação nenhuma. A Luísa me disse que ela estava chorando no carro quando saiu daqui, e agora ela me aparece com uma cara ótima!


- Scorpius, ninguém tem o direito de julgar outra pessoa. – comentou Draco, severamente.


- Além disso, meu filho, é normal que as pessoas sejam confusas quando são adolescentes. Muitos não sabem o que querem da vida. E é comum, também, que não entendam os próprios sentimentos, que não saibam bem como reagir a eles. Você nos disse que sempre gostou da Rose. – ia explicando Astoria, pacientemente. – Mas ela via você como o cara que devia bater em todos os testes e depois como um amigo. As mulheres são diferentes, Scorpius. Elas levam essa coisa de amigos bem a sério.


- Eu nunca fui confuso como a Rose. – rebateu Scorpius. – Sempre soube o que queria da vida.


- Scorpius... você passou por muita coisa ainda criança. Teve que enfrentar muita rejeição por conta do sobrenome que carrega. É um fardo pesado para qualquer um. A Rose, não. Os pais e os tios dela sempre foram heróis. E ela cresceu tendo os mimos que eles nunca puderam ter. Além disso, o pai dela abominava você. E todos sabemos que ela sempre foi muito ligada a ele. Com certeza deve ter sido difícil para ela. Como namorar um cara que o pai odeia? Como aceitar que o ama? – ia dizendo Astoria. – Ela deve ter ficado apavorado com a ideia de falar em casa que Scorpius Malfoy era namorado dela. Se já foi complicado o pai dela aceitar você como amigo...


- Resumindo: ela escolheu o pai dela em vez de mim. – disse Scorpius, amargamente.


- Não diga isso, meu filho. – falou Astoria, ansiosa. – Não é uma questão de preferir um ou outro.


- Você e o papai também enfrentaram problemas para ficar juntos. Das duas famílias. Mas nunca abaixaram a cabeça. Por que a Rose pode ter justificativas? – quis saber, cansado.


- É diferente, Scorpius. Sua mãe e eu nunca fomos exatamente ligados à nossa família como a Rose é à dela. – manifestou-se Draco.


- Scorpius, meu anjo, não estou justificando o que a Rose fez, ou as escolhas que ela seguiu. Só estou pedindo, por favor, que a compreenda. – falou Astoria. – Se você compreendê-la, pode ser que a perdoe.


- Se é que ela se importa. – retrucou.


- Acredite, ela pode te surpreender. – assegurou Astoria, levantando-se. – Vamos começar a preparar o almoço? – sugeriu, caminhando para o fogão.


- O que vamos fazer hoje? – perguntou Draco, beijando o pescoço da esposa quando se aproximou dela.


Sem querer ser visto, Scorpius saiu da cozinha e foi para o quarto de Luísa, parando para olhar o quadro com as fotos de Rose. Não era necessário inventar justificativas. Era necessário compreendê-la. Era uma questão de orgulho, também. Conseguiria passar por cima de todas as mágoas para aceitá-la outra vez? O que seria mais determinante: a falta que ela fazia ou a consciência tranquila de saber que a culpa fora toda dela, unicamente?


Scorpius se sentou na tapete emborrachado que comprara para a filha. Pela primeira vez, conseguiu imaginar como a cabeça de Rose talvez estivesse um dia, com turbilhões de pensamentos que não levavam a conclusão nenhuma. Pela primeira vez, estava confuso em relação aos próprios sentimentos.


*


- Oi, papai! – disse Luísa, claramente contente, jogando os bracinhos em volta do pescoço de Scorpius.


- Oi, meu amor. – respondeu, apertando a menina nos braços. Ficara longe dela apenas um dia, mas parecia muito mais. Tinha se acostumado de tal maneira a tê-la fazendo barulho o tempo, gritando “papai” para cima e para baixo e gargalhando encantadoramente que a casa parecera estranhamente vazia quando Draco e Astoria foram embora após o almoço. – Espero que tenha se comportado direitinho. – acrescentou, colocando a loirinha no chão e lhe lançando um olhar que pretendia ser severo.


- A Luísa não deu trabalho nenhum. – disse Rose, sorrindo, parada na soleira da porta.


- Papai, meu tio é o tio mais legal do mundo! – disse Luísa, visivelmente animada. – Ele me ensinou a tocar bateria! E eu já aprendi tudinho.


- Ah, é? – falou Scorpius, surpreso.


- Hum-hum. – fez Luísa, e a julgar pela expressão que carregava no rosto, iria desatar a falar mil coisas ao mesmo tempo. – A vovó Mione faz os melhores cookies que eu já comi, e o vovô Ron também é muito legal, ele deixa a gente comer pipoca e pôr os pés na mesinha de centro, mas a vovó não gosta.


- Tá bom, filha, depois você vai me contar tudinho, ok? – disse Scorpius, abaixando-se para ficar da altura dela, e interrompendo o que parecia ser apenas o início de uma saraivada de casos. – Mas agora é hora de jantar, certo?


- Eu já comi pizza, papai. – contou. – Mas só porque hoje é domingo. O vovô Ron disse que domingo pode, mas que no resto da semana a gente tem que comer arroz e feijão. – acrescentou rapidamente.


- Nesse caso, a senhorita vai subir, escovar os dentes...


- Já escovei. Mamãe comprou uma escova de dentes para eu usar quando for na casa dela. – disse Luísa.


Scorpius lançou um olhar surpreso para Rose. De fato, ela estava se saindo uma mãe muito melhor que a encomenda.


- Então você vai subir, vestir o pijama e escolher uma historinha para a gente ler. – sugeriu Scorpius, por fim.


- Pode ser o conto dos três irmãos? – sugeriu a loirinha.


- Claro que pode. – Luísa saiu correndo, mas voltou assim que Scorpius falou: – Não vai dar tchau para a mamãe?


Sem mais, ela deu um beijo em Rose e voltou-se para subir as escadas:


- Sem correr, Luísa, ou você se machuca. – advertiu Scorpius, levantando-se. Virando-se para Rose, ele disse: – Obrigado por tudo.


- Tudo o quê? – quis saber a ruiva, fitando-o com olhos azuis curiosos.


- Por ter levado a Luísa para conhecer sua família. – explicou, sem conseguir sustentar o olhar dela. Havia algo de decidido nele que o loiro nunca vira. Perguntava-se internamente se era um bom sinal ou não.


- Agora, nós somos a família dela também. – respondeu Rose. – E todo mundo gostou muito da Luísa. E, aliás, eu é que tenho que te agradecer.


- Por...? – quis saber Scorpius, voltando a encará-la.


- Por ter confiado em mim o suficiente para me colocar como mãe de uma criança tão especial quanto a Luísa. Obrigada, Scorpius. – falou Rose, de uma só vez, com ternura no olhar.


Ele deu de ombros.


- Sempre soube que você seria uma boa mãe. – replicou, simplesmente. – Bem, eu queria falar com você sobre o processo. – comentou, lembrando-se do telefonema de Natalie.


- Ah! Que bom você ter mencionado isso, eu trouxe outra procuração para você. Não é obrigado a assinar, mas achei que pudesse ser uma boa ideia. – comentou Rose, estendendo-lhe o papel que carregava.


- “Instrumento de mandato. Scorpius Greengrass Malfoy vem, por meio deste, declarar junto aos órgãos competentes do Ministério da Magia que confere plenos poderes para que Rose Granger Weasley, defensora pública, represente-o judicial e extrajudicialmente no processo de adoção da menina Luísa, sobrenome e filiação desconhecidos, de naturalidade escocesa, nascida no dia dezoito de maio de 20??, contando na presente data a idade de quatro anos e oito meses”. – leu ele, em voz alta. – Eu tenho que adotar a Luísa de novo? – quis saber, erguendo os olhos para fitar a ruiva.


- Não vai ser adotar de novo. Para o Ministério da Magia, você nunca a adotou. – explicou Rose. – A certidão de nascimento dela que consta o seu nome como o do pai vale apenas para a Justiça trouxa. É como se não existisse para os bruxos.


- Mas...


- Scorpius, você está sendo processado por trabalhar em um hospital que cuida de trouxas. As pessoas acham que você é um bruxo maquiavélico que faz experimentos malucos com os trouxas. Que, sei lá, os tortura. E desconfiam que você fez algum mal à Luísa também. Você não vai conseguir aproveitar a adoção que já conseguiu. É preciso abrir outro processo. – explicou Rose, pacientemente. – Como é um processo conexo ao da Suprema Corte, a Defensoria pode tomar parte sem que seja necessário que você se declare incapaz de pagar um advogado.


Sem questionar, Scorpius conjurou uma caneta e assinou a procuração, devolvendo-a a Rose.


- Muito bem. – disse ela, em tom de aprovação. – E, Scorpius... – começou, fazendo o coração do rapaz acelerar de uma hora para outra. Era agora. Tinha que ser. Ela iria se desculpar. – Vejo você na sexta. – acrescentou, sorrindo docemente e fazendo o coração dele afundar dois metros.


- Até sexta. – respondeu, observando-a caminhar de volta para o carro.


Ah, Rose. Cabelos de fogo. Olhos do mar. Andando sensualmente. Havia feminilidade em cada gesto dela. Em cada palavra dita pela voz suave.


- Papai, já vesti o pijama! – gritou Luísa, pelas grades que protegiam quem estava no segundo patamar de uma queda livre até o térreo.


- Estou indo, minha filha. – respondeu, fechando a porta atrás de si ao mesmo tempo em que Rose arrancava o carro.


*


Até a sexta-feira, Scorpius não teve mais notícias de Rose. Queria vê-la, perguntar como estavam as coisas do processo e, se criasse coragem, pedir desculpas por ter sido tão rude da primeira vez em que se reencontraram.


Natalie ainda lhe avisou a respeito de duas ou três vezes em que Rose voltou ao hospital, em horários que Scorpius não trabalhava. Ele fez o impossível para chegar lá a tempo de encontrá-la, mas ela sempre conseguia ia embora antes que o loiro chegasse. Fazia isso de propósito, pensava ele. Mas como Draco bem apontou, era de se esperar que a ruiva agisse assim, já que Scorpius praticamente a escorraçara de casa por não querer discutir nada a respeito da própria defesa. “É natural que ela queira se virar sozinha, sem que você a atrapalhe ou a atormente com faltas de educação”, dissera ele, severamente.


Scorpius chegou ao Ministério da Magia faltando uma hora para a audiência, que começaria às três da tarde. Foi direto para o Departamento em que ficava a Defensoria Pública. Precisava falar com Rose antes da audiência. O quê, exatamente, não sabia. Queria apenas que a ruiva entendesse que não a desprezava. Tinha acordado decidido a reatar com ela. Finalmente, rendia-se à verdade irrevogável: não podia mais viver sem Rose. Nem que para isso tivesse que ser apenas “amigo” dela. Os sete anos que passaram afastados tinham sido os piores de toda a vida. Luísa aliviara o sofrimento. Dera-lhe uma razão para viver. Mas Rose... Rose era como um sopro de vida, que deixava absolutamente tudo melhor. Mais nítido. Mais encantador. Rose era a mulher que amava. Que desejava. Era tudo de que precisava para ser o homem mais feliz do mundo. Mas ela não estava lá. Apenas uma das primas que ela tinha, de cujo nome ele nem se lembrava, com uma moça e dois rapazes com cara de que tinham acabado de se formar em Hogwarts. Parecia estar ensinando algo a eles. Bateu na porta entreaberta com os nós dos dedos.


- Boa tarde, Malfoy. – cumprimentou a ruiva, levantando-se com a mão estendida. Scorpius ficou surpreso ao ver o tamanho da barriga de grávida dela. “Está até hoje trabalhando”, pensou, incrédulo, avaliando que faltavam poucos dias para o bebê nascer.


- Boa tarde...? – respondeu, apertando a mão dela rapidamente.


- Molly Adams. – esclareceu a ruiva, fazendo sinal para que Scorpius entrasse. A moça e os rapazes o encaravam, curiosos. – Sei que, por enquanto, temos apenas esta salinha, mas semana que vem nos mudaremos para o andar novo que o Ministro mandou construir. Em que podemos ajudá-lo? – quis saber, indicando a ele que se sentasse em uma cadeira acolchoada ao lado da porta.


- Vim procurar a Srta. Weasley. – respondeu, sentando-se. Lançou um olhar de esguelha para os três jovens presentes, sentados em cadeiras ao redor da mesa de Molly.


- Eles são novos defensores públicos, respondendo à sua pergunta muda. – disse Molly, sentando-se à mesa de Rose. – Acompanharão seu processo hoje. Estávamos dando uma olhada nele. Somos uma instituição, Malfoy, e trabalhamos sempre em equipe, nunca sozinhos. Mas, obviamente, isso não diminui a responsabilidade que temos de guardar sigilo a respeito dos problemas dos nossos clientes. – acrescentou, em tom inflexível, ao ver que o loiro fez menção de abrir a boca quando mencionara que os jovens estiveram olhando o processo.


- Eu não disse isso. – murmurou Scorpius, abismado com a capacidade de Molly de detectar o que falaria e se adiantar na mesma hora. Em resposta, ela ergueu uma sobrancelha.


- Nem precisava dizer. Sei que pensou. – comentou. – É o que todos pensam quando dizemos isso. Enfim. Você disse que está procurando a Rose? – perguntou, mudando de assunto subitamente.


- Isso mesmo. – confirmou Scorpius, ainda impressionado com a desenvoltura, a inflexibilidade e a sutileza de Molly enquanto defensora pública. Perguntava-se, internamente, se Rose também seria daquele jeito dentro de um tribunal.


- Lamento, Malfoy, mas ela saiu para almoçar e ainda não voltou. – respondeu, inclinando-se para trás na cadeira, levemente. Scorpius tentou não demonstrar o pânico que acabava de lhe atingir em cheio. Rose iria defendê-lo dali a uma hora e não tinha chegado ainda. – Mas pode ficar tranquilo. – assegurou Molly, observando-o atentamente. – Ela não vai te abandonar. Falando nisso, ela saiu justamente para terminar de preparar sua defesa. Defesa que você tão levianamente desprezou. – acrescentou, sutilmente.


Embora a voz de Molly não carregasse tom algum de acusação, Scorpius se sentiu estranhamente envergonhado. Não tinha se dado conta, ainda, de como poderia ser difícil preparar uma defesa sem a ajuda do acusado. Por mais que a ruiva à sua frente não o dissesse claramente, era fácil perceber que ela não gostara muito de suas atitudes.


- Bom... Sra. Adams... pode me dizer o que, exatamente, a Rose foi fazer? – quis saber o loiro, incapaz de conter a curiosidade. E não importava se Molly lhe jogaria mais alguma indireta. Queria ver Rose.


- Ela foi levar a sua filha para a casa dela. Hugo vai cuidar de Luísa durante a audiência, porque a Sra. Mary Hopkins foi arrolada como testemunha. – explicou, rapidamente. – Suponho que saiba que a Sra. Hopkins é uma bruxa abortada.


- Claro. – respondeu, na mesma hora, sem realmente prestar atenção. Refletia sobre o quanto achava que conhecia Rose e o quanto ainda faltava para conhecer.


- Bem, se não se importa, Malfoy, tenho mais algumas recomendações para fazer aos meus colegas de serviço. E tenho que fazê-las logo, porque daqui a alguns dias estarei de licença. – disse Molly, levantando-se para voltar à própria mesa. – Espero que não fique entediado aqui, mas você só poderá se dirigir ao tribunal quando a Rose chegar para te acompanhar.


- Não tem problema. – disse Scorpius, distraído. Não prestava atenção no que os defensores conversavam. No momento, sua mente só tinha espaço para pensar em Rose. Nada mais.


*


- Tio Hugo, a gente vai continuar as aulas de bateria hoje? – quis saber Luísa, ansiosa, depois de cumprimentar os avós e o tio.


- Claro que vamos, Lu. Vamos tocar bateria, assistir televisão, comer pipoca com os pés na mesinha de centro, tomar sorvete e fazer guerra de balões d’água! – enumerou Hugo, animado. Estava de folga dos treinos do Chuddley Cannons por conta de uma lesão no tornozelo. Ficaria mais duas semanas em casa. O que veio a calhar bastante para Rose, afinal, Hermione também sairia para a audiência e Ron queria, de todas as formas, assisti-la. Harry já havia autorizado que se ausentasse do serviço dos aurores pelo resto do dia.


- Podemos começar pela bateria? – quis saber a menina, com os olhinhos azuis brilhando em expectativa.


- Só se for agora! – concordou Hugo, pegando-a no colo para levá-la para a salinha acústica que Hermione construíra para que o barulho da bateria não incomodasse os vizinhos e os demais habitantes da casa.


- Comporte-se, Luísa! – advertiu Rose, com certa severidade na voz.


Hermione saiu da cozinha, carregando algumas pastas nas mãos.


- Você está bem, Rose? – quis saber. – Parece pálida.


- Estou ótima. – mentiu Rose, voltando-se para a janela da sala. Não estava nada bem. Estava preocupada. Nem tanto pela audiência, mas pelo futuro de Luísa. E pelo futuro que as duas teriam em relação a Scorpius.


- Filha, você vai conseguir livrar o Scorpius, fique tranquila. Até porque ele não fez nada de errado. – assegurou Hermione, colocando uma das mãos sobre o ombro da ruiva.


- Eu sei, mamãe. Mas eu tenho medo. – confessou, voltando-se para a mãe com os olhos marejados. – E se o Scorpius não me quiser mais?


- Rose, meu anjo, ele quer você. – assegurou Hermione, passando as mãos pelos cabelos da filha. – E vai fazer de tudo para ficar ao seu lado. Porque, conforme você mesma já disse, vai entender suas razões. Porque você vai convencê-lo, correto?


- Correto. – disse, com pouca convicção e muita insegurança.


- Leve suas ideias adiante, Rose. Vai ver que vai dar tudo certo. Você e Scorpius já tem um destino traçado. – falou Hermione, confiante.


- Mamãe, você acredita em destino? – perguntou Rose, surpresa.


- Você não? – respondeu, afastando-se da filha com um sorriso no rosto.


*


Cinco horas depois, a audiência finalmente chegava ao fim. A Suprema Corte pedira que os presentes se retirassem para que pudessem deliberar para lavrar a sentença. Scorpius estava ansioso. Achava que a atuação de Rose fora impecável. Assim como Molly demonstrara mais cedo, Rose era inflexível, sutil e falava com desenvoltura invejável. Mas, desde que ela chegara para acompanhá-lo ao tribunal, não dissera palavra alguma que revelasse nada a respeito da relação de ambos. As conversas tinham sido pautadas apenas por assuntos relativos ao processo.


Durante a audiência, Scorpius foi interrogado por Kingsley Shacklebolt, Ministro da Magia e presidente da Suprema Corte. Rose lhe explicara que era ele o porta-voz das perguntas dos demais membros. Além disso, Rose carregara todo o equipamento trouxa que lhe permitiria mostrar as entrevistas que gravara no hospital. Para tanto, tinha conseguido autorização junto ao Departamento de Ligação com os Trouxas para instalar tomadas no tribunal de forma provisória. Peritos do mesmo departamento assistiram às gravações e assinaram parecer para declarar que os trouxas ali gravados não haviam sido enfeitiçados ou coagidos de nenhuma forma para que prestassem tais declarações. Para completar, o testemunho de Mary Hopkins tinha sido determinante. Ela confirmou tudo o que foi dito pelas pessoas no hospital e, inclusive, acatou por si mesma o pedido de Jeffrey McCartney, bruxo da Suprema Corte para quem Molly trabalhara, que consistia em depor depois de ingerir algumas gotas de Veritaserum, situação que corroborava tudo o que Rose alegara para defender Scorpius.


- Ah, Rose, você foi ótima! – dizia Molly à prima, na sala reservada para a defesa ficar enquanto os ministros deliberavam. – Não vai nem ter jeito de ninguém condenar o Malfoy.


- De verdade, Molly? – quis saber Rose, parecendo insegura, o que surpreendeu Scorpius, sentado a um canto com os pais e com Mary. No tribunal, a ruiva era segura e confiante. Fora dele, insegura e temerosa.


- De verdade. Você devia ter visto a tia Hermione; estava quase aos prantos de tão orgulhosa que parecia estar. – comentou Molly, sorrindo.  


- A propósito, Rose, eu gostaria de lhe parabenizar pela tirada que deu no Sr. McCartney. – disse o novo defensor de cabelos pretos. – “O meu relacionamento com o Sr. Malfoy é puramente profissional nesta audiência, e o que tive ou deixei de ter com ele não é nem um pouco relevante quando se trata de discutir se um médico está ou não fazendo algum mal aos seus pacientes”. – repetiu o rapaz, claramente encantado. – O cara parecia ter comido feijãozinho com gosto de vômito, pela cara que fez.


- Obrigada, Paul. – respondeu Rose, sorrindo. – É o tipo de resposta que você tem que aprender a ter na ponta da língua.


- Rose – chamou Astoria, de onde estava sentada. – Você acha que o Scorpius vai mesmo ser absolvido? – quis saber, parecendo insegura.


- Claro que vai, Ast. – respondeu Draco, antes que Rose pudesse abrir a boca. – E qualquer um que questionar isso, questiona o trabalho da Rose também. Ela foi absolutamente perfeita.


Rose sorriu para ele, lisonjeada pelo elogio e agradecida pela confiança que depositava nela.


- Sua mãe vai votar, Rose? – continuou Astoria.


- Não. Por ser minha mãe, ela se declarou suspeita de votar, apesar de ter escolhido acompanhar a audiência. E o Ministro também não vai votar. – acrescentou. – Como ele foi amigo da minha família antes de se tornar Ministro da Magia, também se declarou suspeito. Presidiu a audiência porque é dever dele, de qualquer forma.


- De qualquer modo, ainda há 31 bruxos que vão votar. – comentou Molly.  


Naquele instante, a porta da salinha se abriu e todos retornaram ao tribunal. Depois de terem se acomodado devidamente, Scorpius em uma cadeira no meio da sala, com Rose em pé ao seu lado, Kingsley disse, com a voz grave retumbando nas paredes de pedra:


- Findas as deliberações, o processo segue com a votação dos bruxos integrantes da Suprema Corte, à exceção de Kingsley Marcus Shacklebolt, presidente da corte, suspeito por ter mantido relações de amizade com a família da defensora do acusado, e de Hermione Jean Granger Weasley, também tendo se declarada suspeita por ser mãe da defensora. Por favor, levantem as mãos os integrantes da Corte que, depois de ouvidas as considerações da acusação feita por investigadores do Ministério e a defesa encabeçada por Rose Granger Weasley, são a favor da condenação do réu Scorpius Greengrass Malfoy. – pediu.


Jeffrey McCartney ergueu a mão na mesma hora. Molly fez um sinal de desaprovação com a cabeça.


Kingsley esperou mais alguns segundos para confirmar que ninguém mais levantaria a mão. Por fim, disse:


- Declaro o réu, assim, inocentado, por trinta votos a um. Os votos escritos de cada um dos integrantes da Corte, devidamente fundamentados, serão remetidos em até três dias úteis para a Defensoria Pública, para que os confira e o processo possa ser devidamente arquivado. Declaro encerrada a sessão. – concluiu, levantando-se da própria cadeira.


Scorpius suspirou aliviado. No minuto seguinte, estava rodeado pelos braços da mãe em um abraço sufocante.


- Ah, meu anjinho... ainda bem que tudo deu certo, eu estava tão preocupada com você...


Draco apenas batia carinhosamente nas costas do filho, contente.


Scorpius lançou um olhar de esguelha para Rose. Parecia igualmente aliviada, rodeada pelos pais e pelos colegas da Defensoria. Scorpius voltou a atenção para Mary Hopkins, que se aproximava, depois de ter visto Astoria o largar.


- Scorpius, posso ir para casa? – perguntou. – A Rose disse que sim, mas vim saber se você precisa de ajuda com a Luísa.


- Não, Mary, hoje você ganhou todo o fim de semana de folga. Obrigado por tudo o que fez por mim hoje. – agradeceu, comovido.


- Não precisa agradecer. – respondeu, com um sorriso no rosto. – Fiz o que devia ter feito.


- Te vejo na segunda-feira, então. – disse Mary, retirando-se do tribunal.


- Scorpius... – chamou Rose, aproximando-se.


- Sim?


- Preciso falar com você. – disse, decidida.


Draco e Astoria se entreolharam e saíram de perto, aproximando-se de Ron e de Hermione para cumprimentá-los.


- Pode falar. – disse Scorpius, fitando-a com curiosidade.


- É sobre a adoção da Luísa. Amanhã precisamos trazê-la ao Ministério. Um assistente social vai conversar diretamente com ela, para saber a respeito da relação que existe entre você e ela. – contou.


- Tão rápido? – surpreendeu-se o loiro.


- Já que você foi absolvido, não há, em tese, nada que impeça que nós a adotemos. É mesmo só para verificar como ela se sente, e para saber se realmente é bruxa. – continuou, mas Scorpius não estava mais escutando.


- Você disse “que nós a adotemos”? – repetiu, para confirmar. Viu Rose corar na mesma hora.


- Bem... é. Fiz o pedido com meu nome e o seu. Imaginei que não teria problema, já que...


- Não tem problema. – interrompeu Scorpius, fitando-a com intensidade. – Você fez a escolha certa.


- Até amanhã, então, Scorpius. Esteja aqui às nove com a Luísa. – acrescentou, afastando-se.


- Rose... – chamou ele, segurando-a pelo braço. Sentiu a mão estranhamente quente ao tocá-la. Rose o fitou, surpresa. Há algum tempo ele não a chamava pelo primeiro nome. – Obrigado por tudo.


- É só o meu serviço. – respondeu, timidamente. – Não precisa agradecer.


- Eu...preciso falar com você. É importante. – pediu, com urgência na voz.


- Agora não, Scorpius. – disse Rose, desvencilhando-se da mão dele, gentilmente. – Tenho alguns assuntos pendentes a respeito do processo para resolver. Só alguns trâmites burocráticos, mesmo, nada demais. Já avisei ao Hugo que você vai buscar a Luísa daqui a pouco, ela deve estar te esperando com ansiedade.


Scorpius a observou se afastar e sair do tribunal na companhia de Molly. Sentiu-se rejeitado. Mesmo sendo importante, ela não quisera falar com ele. Parecia uma desculpa furada o motivo que havia arranjado. De qualquer forma, não desistiria de Rose. Jamais. Decisão recém tomada.  


*


- Aonde estamos indo, mamãe? – perguntou Luísa, curiosa, na manhã de sábado. Acompanhava Rose e Scorpius pelos corredores do Ministério da Magia.


- Você vai ficar em uma salinha de brinquedos enquanto a mamãe e o papai resolvem alguns assuntos com o vovô Ron. – disse Rose, mentindo a respeito da última parte.


Scorpius parecia ter o coração na mão. Não conseguira responder nenhuma das perguntas da filha enquanto a levava para o Ministério e, agora, Rose se via obrigada a se virar sozinha.


- Vocês vão demorar? – quis saber Luísa.


- Prometo que não. – disse Rose, sorrindo, abrindo uma porta em cuja placa lia-se “Serviço social”.


Scorpius admirou-se ao ver uma salinha de brinquedos muito parecida com à da festa do Ministério em que conhecera Rose, na infância. A um canto, havia mesinhas e cadeiras de plástico com blocos de desenho e porta-lápis cheios de lápis para colorir e giz de cera. No outro canto, havia cama elástica, piscina de bolinhas e um brinquedo que lembrava um labirinto.


- Eu vou ficar aqui sozinha? – perguntou Luísa, parecendo desolada. Scorpius buscou o olhar de Rose, pedindo ajuda silenciosamente. Partia o coração ver a filha falar daquele jeito.


Rose abaixou-se e ficou da mesma altura da loirinha, dizendo-lhe com carinho:


- Vai ser rápido, filha, a mamãe promete. E daqui a pouco vai chegar mais crianças. Papai e eu prometemos que não vamos demorar. Você se lembra disso, não é?


- Lembro. – murmurou Luísa, abraçando a ruiva com força.


- Então, tchau, meu amor. – disse Rose, levantando-se, enquanto Scorpius se abaixava para beijar a testa da menina.


Se Rose não o tivesse puxado pela manga da camisa, Scorpius com certeza teria ficado ali. Deixou-se conduzir por ela para uma salinha que havia ao lado da sala de brinquedos, em que estava uma mulher de meia-idade que os recebeu com um sorriso no rosto.


- Bom dia, Srta. Weasley, Sr. Malfoy. – cumprimentou, alegre. – Meu nome é Abigail, sou a assistente designada para o processo de adoção da menina Luísa.


Scorpius não escutou o que ela dizia. Dirigiu-se para o canto da sala em que havia um vidro pelo qual podia ver a loirinha na sala de brinquedos. Observava-a atentamente. Luísa ficou por vários minutos avaliando cada um dos brinquedos, sem entrar em nenhum.


- Srta. Weasley, receio dizer que o Sr. Malfoy terá que esperar mais um pouco. Não posso entrar na sala de brinquedos agora para conversar com a menina, porque é de praxe que esperemos sete minutos para observar as crianças. A senhorita sabe que estão aqui para acompanhar a conversa, correto? E que a menina não consegue vê-los da sala de brinquedos, certo? – disse Abigail, sem se importar em se dirigir a Scorpius.


- Sim, senhora. – respondeu Rose.


- Até lá, a Luísa tem que ficar sozinha? – perguntou Scorpius, incrédulo.


- É o procedimento do Ministério da Magia. – respondeu Abigail, simplesmente, saindo da sala e deixando-os sozinhos, fechando a porta ao passar.


Scorpius fitou Rose, que lhe disse, parecendo temer a reação dele:


- Scorpius... eu... acho que é bom informá-lo que, nesses casos, o Ministério geralmente serve algum suco ou leite para as crianças com umas gotinhas de Veritaserum.


- Como é que é? – fez ele, voltando as atenções para Luísa outra vez. – Mas ela é menor de idade! Não precisa de autorização do responsável?


- Eu achei que não se importaria se eu concedesse a autorização. – murmurou Rose, aproximando-se dele. – Já que não temos nada a esconder, achei que pudesse ser uma boa ideia.


- Tudo bem. – comentou, distraído, observando a filha mexer em algumas bolinhas da piscina, sem entrar nela.


- E provavelmente a Abigail vai usar um desses brinquedos para colocar a Luísa em uma situação de risco. Para ver se ela é bruxa ou não. – comentou Rose, observando a loirinha, que se encaminhou para uma das mesinhas de plástico.


- Rose, eles não podem fazer isso com a minha... com a nossa filha. – corrigiu-se, automaticamente, voltando-se para a ruiva ao seu lado. Os olhos da ruiva encheram-se de lágrimas pela emoção de ouvi-lo falar “nossa filha”. – E se eles a machucarem? – acrescentou, preocupado, voltando as atenções para Luísa outra vez.


Ele sentiu que Rose pegava uma das mãos dele entre as dela com carinho. A ruiva murmurou:


- Não se preocupe, Scorpius, vai dar tudo certo.


Scorpius voltou o olhar cinzento para Rose. Ela parecia preocupada, também, e à beira das lágrimas. Abraçou-a com cuidado, temendo que talvez ela pudesse se desvencilhar. Mas não o fez. Aceitou, de bom grado, o contato com o corpo do rapaz. Ele beijou o topo da cabeça dela ternamente. Ambos ainda observavam Luísa.


- Eu sei que vai, Rose. Ninguém vai nos tirar a filha que temos. – sussurrou em resposta, apertando Rose contra si com mais força ainda.


*


Scorpius e Rose estavam sentados lado a lado. Scorpius segurava a mão de Rose. Ambos observavam Luísa com atenção. Ela tinha acabado de pegar vários lápis coloridos e parecia ter começado a desenhar no bloco de desenhos que estava em cima da mesinha. Abigail abriu a porta, carregando uma jarra com suco de abóbora em uma das mãos e alguns copos de plástico coloridos na outra.


- Olá! – cumprimentou Abigail, com um sorriso no rosto, colocando a jarra e os copos em cima de uma das mesinhas desocupadas.


- Oi. – cumprimentou Luísa, timidamente, sem olhar para a mulher.


- Me desculpe por ter demorado – disse Abigail, sentando-se defronte à menina. – Eu fico aqui para cuidar das crianças para o pais, mas não sabia que você viria tão cedo. A propósito, meu nome é Abigail. E o seu?


- Meu pai disse que não posso conversar com quem não conheço. – disse Luísa, baixinho, continuando a fazer o desenho.


- Ah, é? – fez Abigail, fingindo-se ofendida. – Deixa eu ver se eu adivinho que é o seu pai. Hm... – ela fez uma cara pensativa. – Só pode ser o Scorpius Malfoy!


- Você conhece meu pai? – quis saber Luísa, surpresa.


- Claro que conheço! E a sua mãe também! Ela se chama Rose, não é?


- É, sim. – respondeu a loirinha.


- E como é o seu nome? – perguntou Abigail de novo, fitando-a com atenção.


- Luísa Weasley Malfoy. – respondeu, sem pestanejar.


- Você quer beber um pouquinho de suco, Luísa?


Scorpius sentiu a tensão se espalhando por cada milímetro do corpo, enquanto observava Abigail servir suco de abóbora “batizado” para a filha em um copinho lilás. Sentiu que Rose afagava seu braço, e saber que ela estava ali o acalmou na mesma hora.


Nos minutos seguintes, acompanharam Abigail perguntando a Luísa sobre Scorpius e sobre Rose: como a tratavam, se era feliz com eles, se gostava deles, como era a família de cada um... Scorpius achou que as respostas da filha eram suficientes para que qualquer um lhe concedesse a adoção definitiva dela. Mas não tinha acabado ainda. Emocionou-se quando a loirinha respondeu o seguinte ao Abigail lhe perguntar se queria passar o resto da vida com ele e com Rose:


- Quero, sim. Eu sei que eles são pai e mãe só de coração, e são os melhores pais do mundo! Eu amo muito os dois e também sei que eles me amam muito porque eles me falam isso também.


- Você não tem vontade de conhecer seu pai e sua mãe de verdade?


- Meu pai Scorpius e minha mãe Rose são meus pais de verdade. – respondeu Luísa, com uma carinha confusa. – Eles é que cuidaram de mim. Meu pai me salvou, você não sabia? Olha, eu fiz eu desenho da minha família. – acrescentou, estendendo o bloco de desenhos para Abigail.


- Que lindo desenho, Luísa. – elogiou a mulher, visivelmente emocionada.


Scorpius e Rose se entreolharam. Ele se surpreendeu ao ver que ela chorava.


- Eu nunca... nunca pensei que... – murmurou, sem saber o que dizer.


- Vem cá, Rose. – disse Scorpius, simplesmente, abraçando-a com ternura.


Distraíram-se com o abraço por alguns instantes, e ao voltarem as atenções para Luísa e Abigail, viram que esta colocava a menina em pé na cama elástica.


- Será que você consegue pular da cama elástica para o chão? – dizia Abigail, observando-a começar a pular.


- Vou tentar. – respondeu Luísa, pulando cada vez com mais impulso.


- Rose, a Luísa não pode... – começou Scorpius, andando em direção à porta da sala.


- Não, Scorpius, você não pode ir! – disse Rose, puxando-o pelo braço com toda a força que tinha. – É loucura atrapalhar tudo agora!


- Loucura é deixar nossa filha cair e se machucar, Rose! – retrucou, praticamente aos gritos.


- Por favor, Scorpius, por favor, você tem que ficar! Eu sei que é horrível ficar aqui só observando, sem fazer nada, mas é necessário! Eles precisam saber se ela é bruxa! – continuou, ainda tentando segurá-lo.


- Por Merlin, a menina só tem QUATRO anos! – replicou, esbaforido.


- Scorpius, por favor. Por favor. Fique aqui. – suplicou a ruiva, quase chorando. – Não põe tudo a perder agora que a gente tá tão perto de conseguir ficar com a Luísa para sempre, sem problemas.


Scorpius parou, com a mão na maçaneta. Ainda não tinha se dado conta de que, desde o minuto em que havia começado todo o processo de adoção, tanto Rose quanto ele mesmo referiam-se a Luísa como “nossa filha”. Pela primeira vez, pareciam realmente uma família de verdade. Finalmente, ele e Rose haviam colocado qualquer problema pessoal que tivessem em relação ao relacionamento deles dois de lado. Tudo por Luísa. Tudo para serem a família que, no íntimo, ele sempre desejou que fossem.


- Está bem, eu fico. – disse, voltando-se para a cadeira em que estivera sentado.


No minuto em que se sentou, observou Luísa, finalmente, reunir a coragem que precisava e saltar, no ar, da maior altura que conseguiu alcançar. O coração dele gelou na mesma hora. Encolheu-se. No segundo seguinte, porém, observou a loirinha cair no chão do outro lado da sala de brinquedos, em pé. Ilesa. Sem machucado algum.    


Scorpius ouviu Rose começar a chorar, emocionada.


- Ela é bruxa, Scorpius. Uma criança trouxa não conseguiria essa proeza. Nossa Luísa é uma bruxinha.


- E tenho certeza de que será uma bruxinha tão inteligente quanto a mãe dela. – acrescentou Scorpius, sorrindo para Rose, aliviado. E tranquilo. Como nunca antes estivera.


Aproximou-se da ruiva e enxugou as lágrimas dela com delicadeza, mais uma vez.


- Não chora, Rosie. Deu tudo certo.


Abigail entrou na sala.


- Sr. Malfoy, Srta. Weasley. – cumprimentou, com um aceno de cabeça. – Outros assistentes sociais acompanharam por outra sala a minha conversa com a Luísa. O pedido de adoção que fizeram foi deferido. Como viram, a menina é bruxa e, devo acrescentar, será uma bruxa magnífica. Nunca recebi criança alguma que saltasse daquela altura com apenas quatro anos. Podem levá-la para casa. E, Srta. Weasley, a certidão de adoção será enviada para a Defensoria em até dois dias úteis.


Sem esperar mais outra permissão, Scorpius e Rose correram para a sala de brinquedos.


- Papai, mamãe, vocês voltaram! – disse Luísa, contente, correndo para abraçar os dois. – Mas vocês demoraram! Mamãe, você brigou com o papai de novo? – acrescentou, ao ver as lágrimas nos olhos de Rose.


- Não, meu anjinho. Papai e eu não brigamos. Estou chorando de felicidade. – explicou Rose, dando um beijo estalado na bochecha da menina.


- Eu achei que as pessoas só chorassem quando estavam tristes. – comentou, passando a mãozinha pelo rosto da ruiva.


- Vamos para casa, filha? – disse Scorpius.


- Vamos! – concordou.


Ao descerem do elevador no Átrio, com Luísa segurando a mão de cada um de um lado, Scorpius e Rose viram Draco, Astoria, Ron, Hermione e Hugo reunidos a um canto. Eles correram até os três, olhando para Luísa com carinho e preocupação.


- E então? – quis saber Ron, parecendo o mais inquieto. Fora o primeiro a emparelhar com eles.


- Deu tudo certo, papai. – respondeu Rose, contente.


- Vem cá, netinha. – disse ele, abrindo os braços, contente, para receber Luísa no colo.


Entre risos e conversas, foram para a casa em que Scorpius morava e fizeram um grande almoço para comemorar – Astoria cozinhou, com a ajuda de Rose e Hermione, Ron soltou Fogos Filibusteiro sem se importar com os vizinhos, Hugo fez guerra de balões d’água com Luísa, Scorpius cuidou de arrumar bebidas para todos e Draco passou todo o tempo livre pirraçando Ron, que lhe fez as mesmas honras.


Parecia um sonho, pensava Scorpius, contente, vendo todos ali reunidos. Enfim, realizava-se algo que sempre quisera. Pelo menos até Rose ir embora sem se despedir de ninguém.


- Papai, a mamãe vai vir morar com a gente um dia? – perguntou Luísa, à noite, quando Scorpius a cobriu com o cobertor para que dormisse.


- Talvez, filha. – respondeu, com cuidado. – Se ela quiser.


- Ela não quer? – perguntou Luísa, parecendo decepcionada.


- Não sei, ela nunca me disse nada. – respondeu Scorpius, sentando-se no chão ao lado da cama da menina.


- E se você pedisse para ela? – sugeriu Luísa.


- É uma boa ideia, meu anjo. – concordou Scorpius, sorrindo para a filha, e considerando atender ao pedido. Por Luísa. E também por ele mesmo. Naquele dia, percebera que não havia mais como se afastar de Rose. E que ainda a amava muito, acima de qualquer escolha que, um dia, ela tivesse feito.


- Então você vai pedir? – quis saber Luísa, com os olhinhos brilhando. – E ela vai ser sua namorada?


- Namorada, não, filha. – respondeu, carinhosamente, afagando os cabelos dela.


- Mas, papai, ela gosta de você! Ela me disse! E você também disse que gosta dela! – disse Luísa, inconsolável.


- Eu sei, Luísa. E é por isso que eu vou pedir a sua mãe que se case comigo. – comentou, observando um sorriso instantâneo brotar dos lábios da filha.


*


A campainha tocou, insistente. Scorpius estava tomando banho, mas, ao perceber que não parariam de tocar enquanto não atendesse, vestiu a primeira bermuda que encontrou e desceu as escadas enxugando os cabelos com uma toalha. Não podia ser Astoria com Luísa. Afinal, a mulher tinha acabado de buscar a neta!


Surpreendeu-se ao ver Rose parada na soleira da porta. Não a via há uns três dias. Desde que ela fora embora da casa dele sem se despedir.


- Rose! – exclamou, vendo-a corar de leve ao vê-lo só de bermuda.


- Posso entrar? – perguntou, timidamente.


- Claro que pode! – disse Scorpius, na mesma hora, afastando-se para abrir passagem. – A Luísa não está, acabou de sair com minha mãe.


- Eu sei. – murmurou Rose. – Ela me disse. Eu vim falar com você.


Scorpius trancou a porta e fitou-a com curiosidade. Indicou a sala com uma das mãos.


- Pode entrar aí e se sentar. Aceita suco, água?


- Não, obrigada. Aceito sua atenção. – disse, baixinho, sentando-se num sofá.


Scorpius jogou a toalha no canto do outro sofá e se sentou defronte a Rose.


- Você já tem minha atenção. Quando quiser, pode começar a falar. – anunciou, perguntando-se, afinal, o que Rose queria. E também se estaria de conluio com Astoria.


- Promete que só vai me escutar, sem interferir, e só vai falar quando eu deixar? – quis saber, parecendo ansiosa.


- Rose...


- Por favor, Scorpius, promete! – pediu outra vez.


- Tudo bem. Eu prometo. – cedeu, fitando os olhos azul-escuros de Rose com curiosidade.


- Scorpius, eu quero te pedir desculpas. E pedir uma nova chance para você. – falou de uma só vez, ansiosa. – Não sei o que se passou na minha cabeça aquele dia, mas... eu queria ter uma oportunidade de escolher de novo. Eu juro que tentei esquecer você nesses sete anos, porque fiquei magoada com sua reação de me rejeitar tão duramente, mas hoje eu entendo tudo. E depois de todo esse tempo, eu percebi que nunca amei você só como amigo, mas era infantil demais para entender isso e aceitar. E aquela noite que nós passamos juntos foi, sem sombra de dúvida, melhor que qualquer outra da minha vida. E, agora, com toda essa surpresa que foi a Luísa, eu percebi que sempre quis uma família com você. Nossa família. Sempre foi você, Scorpius. Só existiu você. – concluiu, olhando para ele com ternura.


Scorpius estava surpreso. E feliz. Como nunca pensou ser possível. Fez menção de abrir a boca, mas Rose interveio:


- Ainda não. Eu quero... bem, antes de você dizer qualquer coisa, lembrar você de uma coisa. Por favor, não ria. A Laura me ajudou, porque... bem... não sabia direito como é isso. – Rose fechou os olhos. Respirou fundo e, ainda de olhos fechados, começou a cantar, baixinho. – Hoje eu preciso te encontrar de qualquer jeito, nem que seja só para te levar pra casa, depois de um dia normal...


A música que ele cantara para a ruiva quando se reencontraram. A música deles. O coração de Scorpius acelerou.


Vendo que ela não iria abrir os olhos enquanto não acabasse a música, Scorpius saiu da sala de fininho e correu até o quarto. Abriu o criado-mudo e pegou a caixinha com o anel que comprara na joalheria no dia anterior. Colocou-a no bolso. Correu de volta para a sala e se sentou no sofá novamente. Rose cantava:


- Hoje, preciso de você/Com qualquer humor/Com qualquer sorriso/Hoje, só tua presença/Vai me fazer feliz/ Só hoje... – finalizou, abrindo os olhos. – E não diga nada ainda, Scorpius, que não seja para responder minha pergunta. A que eu vou fazer. – falou, severamente, levantando-se do sofá.


Abismado, Scorpius viu Rose se ajoelhar no chão, dizendo:


- Scorpius Greengrass Malfoy, você quer se casar comigo?


Lentamente, Scorpius se levantou também e caminhou até Rose. Estendeu a mão para ela e a ajudou a se levantar.


- Não seja ridícula, Rose. – murmurou. – É claro que eu não vou aceitar um disparate desses.


- Mas... – começou ela, parecendo desolada. Os olhos se encheram de lágrimas.


Scorpius pousou um dedo sobre os lábios dela.


- Quietinha. Agora é minha vez de falar.


- Scorpius... – chamou Rose, sem saber o que dizer.


- Não adianta, Rose, eu não vou voltar atrás na minha decisão. – disse, sério, consciente de que devia estar ferindo os sentimentos dela. Mais determinado do que nunca. Iria até o fim. – Não tenho que te desculpar por nada. Acho que fui muito rigoroso com você todo esse tempo. E tenho que admitir que a admiro profundamente pela iniciativa. Eu não tenho um décimo da sua coragem. Fato. – concluiu, fazendo-a sorrir de leve. – Agora, se me permite consertar o disparate...


Scorpius tirou o dedo de cima dos lábios de Rose e se ajoelhou, tirando a caixinha do bolso e a abrindo.


- Rose Granger Weasley – começou, vendo o rostinho dela se iluminar. Orgulhoso de saber que provocava tal efeito nela. – Você é a mulher da minha vida. E eu te amo muito. Aceita se casar comigo?


- É claro que aceito, Scorpius. Não precisa nem perguntar. – respondeu, emocionada.


Scorpius se levantou e colocou o anel no dedo de Rose, absurdamente feliz. No minuto seguinte, jogou a caixinha no chão de qualquer jeito e a beijou, apaixonadamente, com saudades, amor e desejo.


O beijo era ainda melhor que nas lembranças e sonhos mais profundos dele. Porque era real. E sentir o corpo da mulher que mais amava junto de si, correspondendo a tudo, era perfeito.


- Vovó, meus pais estão se beijando! – gritou Luísa, da porta da sala, fazendo Scorpius e Rose se separarem para olhar para ela. Parecia radiante.


- Luísa, isso não se faz! – ralhou Astoria, correndo para a neta. – Scorpius, Rose, me desculpem, mas a Luísa esqueceu o ursinho e quis voltar de qualquer jeito para pegá-lo...


- Sem problemas, mamãe. É bom que ela fica sabendo que nós vamos nos casar! – contou Scorpius, satisfeito.


- De verdade? – quis saber Luísa, com os olhinhos brilhando.


- Ah, querido, fico tão feliz... – disse Astoria. – Agora, vamos, Luísa. Vamos pegar o ursinho. Hoje você vai dormir na casa da vovó. O papai e a mamãe tem muito o que conversar.


Quando Astoria saiu com uma Luísa saltitante ao seu lado, Scorpius puxou Rose pela mão e a levou até ao quarto onde dormia.


- Acho que podemos conversar depois. – comentou, em tom de conversa, beijando o pescoço da ruiva, e deliciando-se ao ver que ela se arrepiara instantaneamente.


- Se você assim diz.. – concordou, beijando-o mais uma vez.


***


N/A.: Olá, bonitas! Primeiro: me desculpem, mas não deu para postar o epílogo hoje também. Daqui a dois ou três dias eu volto com ele prontinho, já que não é muito grande. Segundo: espero, do fundo do coração, que não se decepcionem com o final. Terceiro: eu sei que disse que ia parar com isso, mas estou sentindo falta das leitoras nos comentários: Saki Malfoy, H. Granger Malfoy, Beatriz Facchin...


Quarto: quero agradecer IMENSAMENTE a Lana Sodré, Ana CR, Dani_Ela, juliana vieira, L. Oliveeira e Letícia Tonks pelos comentários do capítulo anterior e por todos os comentários postados em capítulos passados.


Por fim, quero pedir que COMENTEM MUITO este capítulo, todas vocês que passam por aqui. Seria muito bom, pelo menos por uma vezinha apenas, saber a opinião de todas as leitoras. Nem que seja só para dizer que se decepcionou com o final, não sei. Votem também. E levem em consideração que hoje é meu aniversário de dezenove aninhos, e vocês podem me dar esse presente fantástico: COMENTÁRIOS!!!!!!!!!


                                                                                                                      Até o epílogo,


                                                                                                                                                    Luhna

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Comentários (8)

  • Maria Eduarda Rieg Weasley

    É a terceira vez q eu leio e tds as vezes eu me emociono!! Vc esta d parabens!!

    2014-01-11
  • Ana CR

    Ah, que perfeito!O ciume do scorpius com os enfermeiros, a conversa com astoria e draco... as atitudes de rose... tudo!Sorri, chorei, me emocionei!Tudo perfeito de mais!Indo pro epilogo 

    2013-05-05
  • Dani_Ela

    Capítulo lindo! Adorei dar tudo certo e, principalmente, a Luíza ser bruxa! Tô morrendo de curiosidade pra saber como que o epílogo vai ser! Beijos! 

    2013-05-04
  • L.Oliveeira

    Assim você me mata, assim você me mata!Pare com isso, hermosa, esse capítulo foi PERFEITO! Gente, morri com eles. São tão... caramba, não conseigo nem encontrar um adjetivo para definar o quão TUDO essa fic é! Esse Scorpius é tão... Deus. Foi perfeito! Sei que eu não escrevo um texto, mas é porque eu fico sem palavras quando uma fanfic é perfeita assim. Já falei perfeito demais, né? PERFEITO, PERFEIT, PERFEITO!E NEM OUSE DAR UM FINAL INFELIZ A ELES! Como eu sempre digo para Lana, eu te caço, viu? :DAMEI *------------*Ah, e parabéns, hermosa. Por seu aniversário e por essa fic maravilhosa *---* 

    2013-05-04
  • Lana Silva

    Ahhh que linda Luhna. Bem em primeiro lugar que capitulo foi esse ? Eu li de madrugada, ouvindo minha mãe me mandar dormir e sem querer, porque tinha que terminar o capitulo. Fui dormir quase 4 da manhã lendo ele, e me emocionando cada vez mais. Achei lindo, maravilhoso... Amei isso. A relação que a Rose desenvolveu com a Luísa em pouco tempo. E a Luísa é uma graça então não tem como não amar ela, achei lindo o que o Scorpius fez, ele deu uma mãe e um pai a Luísa e fez a escolha certa colocando como mãe da Luísa a Rose. Gostei do Draco, Astoria, Hermione e Ron os aconselhando é isso que eu esperava deles e eles cumpriram aquele papel maravilhoso de ajudar os filhos, naquele momento confuso para eles. A Rose foi mais maravilhosa que nunca nesse capitulo, ela além de se tornar mãe da Luísa, defender o Scorpius o pediu em casamento \o/ Quase morri com essa parte. E achei lindo mesmo os dois pedindo desculpas e a Luísa aparecendo bem na hora do beijo kkkkk foi muito bom flr. Eu queria dizer que sinto muito que a fanfic esteja acabando, mas que estarei aqui para ver suas próximas fanfics. Parabéns pela fanfic maravilhosa e que venha o epílogo \o/Feliz Aniversário, você merece tudo de bom amore 19 anos \o/ que você continue escrevendo um monte de fanfics maravilhosas \o/ kkkkkk E que Deus lhe dê tudo de bom :)Beijoos! 

    2013-05-04
  • Beatriz Facchin

    mais que perfeito !

    2013-05-04
  • Juliana Aparecida Chudo Marques

    Adoreii o final.. comecei a ler sua fic faz pouco tempo... mas é muitooo boa.. não vejo a hora de ler o epilogo... beijoos

    2013-05-03
  • juliana vieira

    achei muito fofo o capitulo finalmente se resolveram, fiquei feliz por eles. e feliz tb pela luiza ser bruxa, facilita e muito o lado deles,kkk. adorei a fic, acho uma pena ter acabado. bjos e continue escrevendo adorei

    2013-05-03
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