Cruciatus



Antes do Amanhecer
por Snarkyroxy

traduzido por Bastetazazis
beta-read por Ferporcel


Sumário: Hermione recebe uma explicação pelo comportamento estranho do mestre de Poções, e Snape entrega a poção Cruciatus para Voldermort. Será que o Lorde das Trevas está contente?

Disclaimer: Qualquer coisa que você reconheça pertence ao talento imensurável de J. K. Rowling; eu só gosto de pegá-los emprestado para brincar com eles. Eu os devolverei quando terminar... embora não necessariamente nas mesmas condições em que os peguei...

* * * * * * *

Capítulo 13 - Cruciatus

O dia seguinte era sábado, o primeiro desde que Hermione havia começado seu trabalho com Snape que ela não descia ao laboratório dele em seu dia designado de folga.

Apesar do acordo original entre eles, ela se descobriu freqüentando o ambiente de trabalho dele com mais freqüência que o determinado, ficando além da hora em numerosas ocasiões, e aproveitando a paz e o silêncio do laboratório, e os recursos da extensa biblioteca dele para fazer suas lições, bem como para ajudar Snape com as tarefas dele.

Para sua alegria, o mestre de Poções não parecia se importar que ela aparecesse fora dos horários marcados, meramente erguendo uma sobrancelha e continuando com o próprio trabalho, ou, certa vez, comentando maliciosamente que se ela não conseguia ficar um dia sem a companhia dele, ela realmente precisava sair mais do laboratório.

Ela revirou os olhos para ele antes de virar-se, fingindo interesse na terceira prateleira do armário de ingredientes, para esconder o rubor que surgiu em suas bochechas. O comentário dele, embora não tivesse a intenção, não estava muito longe da verdade.

Depois da reação estranha e confusa dele na noite de sexta-feira, entretanto, Hermione não sentia nenhuma vontade em se aventurar nos aposentos privados dele até que fosse absolutamente necessário. Por mais que ela quisesse participar do trabalho dele, na sua teimosia Grifinória, ela não daria a Snape a satisfação de saber que sua cede pelo conhecimento a traria de volta, não importasse como ele a tratava.

Ela estava mais frustrada que qualquer outra coisa. Eles estavam se dando tão bem no último mês; ela havia realmente gostado do tempo que passara com ele, mesmo quando os dois estavam absortos nos seus próprios trabalhos, preparando poções em silêncio. Era uma escapatória da barulhenta sala comunal da Grifinória, e Hermione teve a distinta impressão que Snape, também, apreciava sua companhia quieta à solidão.

Após o almoço no sábado, ela se descobriu no escritório do Diretor, desabafando sua frustração ao bruxo ancião que, sentindo que alguma coisa estava errada, havia convidado-a para uma xícara de chá e um – intocado – prato de bolinhos.

– Ele me dá nos nervos – ela disse, balançando a cabeça. – Nós estávamos nos dando tão bem, e agora ele está simplesmente... mudado. Eu não entendo. Num minuto ele está me infernizando, com bom humor eu devo acrescentar, e no outro, ele me ignora, ou pior.

O Diretor parecia sério. – Você deve lembrar-se, Srta. Granger, que ele está sob uma forte carga de pressão no momento, talvez a maior de todas.

– Eu entendo isso, mesmo – ela disse. – Eu só não vejo por que isso lhe dá o direito de ser tão grosseiro. Eu estou tentando ajudá-lo, mesmo que isso não tenha sido idéia dele.

– Vocês pareciam estar se dando bem, como você disse – Dumbledore comentou. – Aconteceu alguma coisa que mudou isso? Qual foi a última coisa que vocês discutiram?

Hermione teve que pensar por um instante antes de se lembrar. Ela descreveu ao Diretor a breve conversa a respeito de Trato das Criaturas Mágicas, e como Snape, mesmo reconhecendo suas habilidades com a égua apaixonada, não achava que este sucesso seria repetido com outras criaturas.

– Oh – ela disse de repente, a compreensão transparecendo nas suas feições. – Ele disse que outras criaturas não trabalhariam com ele porque elas não gostam de magia negra.

Ela não havia pensado muito sobre o comentário dele na noite anterior e somente agora lembrou-se da amargura no tom dele quando se referira à Marca Negra no seu braço.

– Ao que me parece – o Diretor disse pensativo –, a direção da conversa de vocês o fez lembrar-se do que ele foi, e talvez ele sentiu que você estava se aproximando demais dele.

– Aproximando demais? – Hermione estava confusa. – Eu dificilmente chamaria nossa relação de próxima. Amigável talvez, mas nada mais.

– Amigável é muito mais do que Severo está acostumado, Srta. Granger – o Diretor a lembrou. – Você tem que ver a situação do ponto de vista dele. Ele permitiu a um estudante – com relutância, no início – o acesso não apenas ao seu laboratório particular, mas também aos seus aposentos. Ele deixou você se envolver na pesquisa e no trabalho dele e a passar tempo extra no laboratório fora do horário combinado. Ele a levou com ele para visitar uma criatura que não consigo nem fazê-lo falar a respeito, muito menos me mostrar onde ela habita. E depois disso tudo, ele simplesmente tornou-se distante e frio novamente.

– Talvez – o Diretor continuou –, com a satisfação em ter alguém que aprecie o conhecimento tanto quanto ele, ele se permitiu esquecer porque ele se distancia de todo mundo.

Hermione pensou novamente nas imagens que vira na Penseira de Dumbledore. Parecia que fora há tanto tempo que ela assistira horrorizada enquanto Voldemort comandava o jovem Snape a demonstrar sua lealdade de uma vez por todas, sacrificando aqueles mais próximos a ele para prová-la.

– Ele está me afastando dele por que acha que eu vou me machucar? – ela sussurrou.

O Diretor assentiu com a cabeça tristemente.

– Apesar das aparências externas, Srta. Granger – Dumbledore continuou –, eu acredito que Severo pensa mais em você do que ele gostaria de admitir. A realidade da situação, por mais desagradável que pareça, é que isto é uma guerra. A vida é uma coisa preciosa, mas o sacrifício de uma vida para a continuidade da nossa causa já foi necessário no passado, e será novamente. Eu acredito que Severo se distancie tanto de todos porque ele não quer, nunca mais, se colocar nesta situação novamente.

Aquilo fazia tanto sentido, dada a atitude estranha dele, que Hermione não sabia por que aquilo não tinha lhe ocorrido antes.

– Isso é uma bobagem, mesmo – ela comentou. – Minha parceria com ele não me pôs em mais perigo do que eu já estava. Eu sou uma das melhores amigas do Harry, e uma nascida-trouxa também. Na verdade, eu não poderia ser mais alvo primário do que já sou.

– Infelizmente eu tenho que concordar em grande parte com esta dedução, Srta. Granger – o bruxo ancião disse pesaroso. – Entretanto, é evidente que Severo não concorda com isso, especialmente depois de um certo incidente algumas semanas atrás, envolvendo você e um dos jovens sonserinos dele.

– Ele lhe contou sobre aquilo? – ela ficou boquiaberta.

O Diretor assentiu com a cabeça. – Ele estava preocupado que isso possa acontecer novamente. Fui eu quem sugeriu que ele lhe permitisse usar o caminho alternativo para o laboratório dele.

– Oh – ela disse.

Dumbledore sorriu, os olhos brilhando suspeitosamente. – Não se zangue com os modos do Severo, Srta. Granger. Eu posso lhe assegurar que, seja lá o que ele faça, é com as melhores intenções, mesmo que às vezes isso seja difícil de perceber.

Hermione deixou o escritório do Diretor sentindo-se aliviada e muito mais feliz com a situação que outrora. Ela ainda não iria ao laboratório hoje, mas não ficaria mais apreensiva em voltar lá amanhã, conforme o horário combinado.

* * * * * * *

Mais tarde naquele dia, Hermione estava jantando, deliciando um suntuoso roast beef com pudim de Yorkshire, quando Harry, sentado ao lado dela, derrubou seu garfo repentinamente e segurou sua testa com as duas mãos.

O tinido do garfo não chamou a atenção de ninguém em volta, exceto por ela e Rony, felizmente, e Hermione largou seus talheres rapidamente e virou-se para seu amigo.

– Harry, o que foi?

Ele balançou a cabeça, fazendo uma careta de dor, as mãos pressionando fortemente sua cicatriz. – Ele está muito bravo com alguma coisa – ele ofegou discretamente.

Hermione encontrou os olhos de Rony do outro lado da mesa.

– É melhor nós tirarmos ele daqui – o ruivo disse. Hermione assentiu e levantou-se, tentando não chamar atenção enquanto agarrava o braço de Harry para afastá-lo da mesa com ela.

O trio seguiu para as portas do Salão Principal, e Hermione olhou de relance para a Mesa Principal momentaneamente. Dumbledore estava vendo-os sair, franzindo a testa, e mais um olhar de relance para o final da mesa mostrou que o mestre de Poções não estava no jantar.

Ela virou-se, guardando aquele pedaço de informação na mente para preocupar-se com ela mais tarde, e acompanhou seu amigo para fora do Salão.

– Ala Hospitalar – disse Hermione, e Rony, segurando o outro braço de Harry, assentiu com a cabeça e guiou-os em direção às escadas.

Como era a hora do jantar, não havia mais ninguém por perto, pelo que eles estavam eternamente agradecidos quando, na metade do caminho para a enfermaria do segundo andar, Harry gritou e caiu de joelhos. Ele teria caído completamente se não fosse pelo suporte dos amigos.

– Rony, vá e chame a Madame Pomfrey – Hermione disse com urgência, ajoelhando-se ao lado de Harry, sem saber como ajudá-lo.

Harry ofegou por ar, esfregando a cicatriz com uma mão até que Hermione pudesse ver marcas de unha na testa dele. Ela moveu a mão dele gentilmente para longe, permitindo que ele enfiasse seus dedos apenas na palma da sua mão.

– Harry, você tem que usar sua Oclumência – ela implorou. – Tente bloqueá-lo.

– Eu não consigo – ele se afogou. – Não está funcionando.

A dor parecia amenizar depois de alguns minutos, e Hermione ajudou Harry a sentar apoiando-se na parede de pedra do corredor.

– Ele está furioso com alguma coisa – Harry disse sem fôlego. – Alguém falhou com alguma coisa que ele pediu, e ele está ficando impaciente para que isso seja feito.

Hermione estremeceu. Ela odiava a maneira que Harry falava quando estava preso às emoções de Voldemort. Era aterrorizante a força da conexão entre os dois inimigos.

– Vamos – ela disse eventualmente. – Você acha que consegue se levantar? Madame Pomfrey estará aqui em um minuto, e você não vai querer que ela te veja assim, no chão. Você ficará na Ala Hospitalar por uma semana!

Ela o ajudou a erguer-se vagarosamente sobre os próprios pés, e eles continuaram pelo corredor, encontrando Rony e a medibruxa virando o corredor.

– Agora, Sr. Potter – ela o repreendeu. – O que você fez consigo mesmo desta vez?

– É a minha cicatriz – ele disse, retraindo-se novamente e levando a mão para esfregar a marca vermelha e inflamada.

A medibruxa considerou-o por um momento.

– Srta. Granger – ela disse finalmente. – Faça a gentileza de buscar o Diretor. Sr. Weasley, se puder me ajudar a levar o Sr. Potter até a Ala Hospitalar?

Hermione deixou seus amigos com relutância e subiu rapidamente mais um lance de escadas em direção aos gárgulas do lado de fora do escritório do Diretor. Ela estava prestes a dar-lhes a senha quando pensou: Sua idiota, Granger, provavelmente ele ainda está jantando.

Ela virou-se para descer rapidamente as escadas e viu o Diretor vindo em sua direção.

– Srta. Granger – ele cumprimentou. – Algum problema?

– É o Harry, professor. A cicatriz dele. Ele está na Ala Hospitalar. Madame Pomfrey me pediu para procurá-lo.

Dumbledore fez sinal para que ela o seguisse e virou-se, seguindo a passos largos para a escada e descendo até a enfermaria.

– Professor – Hermione disse, quase sem fôlego. O bruxo ancião conseguia mover-se rapidamente quando necessário. – Eu achava que Harry tinha conseguido bloquear Voldemort, mas esta noite, ele sabia o que ele estava sentindo.

– Harry vem progredindo maravilhosamente na arte da Oclumência – Dumbledore disse, parando assim que chegaram à porta da Ala Hospitalar. – Entretanto, a ligação dele com Voldemort é ao mesmo tempo única e forte, e mesmo sendo um Oclumente poderoso, ele ainda será perceptivo às fortes explosões de emoção de Tom Riddle.

O Diretor empurrou as portas para abri-las, e o último som que Hermione esperava ouvir alcançou os seus ouvidos.

Risadas.

Risadas histéricas.

E vinham do Harry.

Seguindo o Diretor rapidamente através da sala, Hermione olhou pasma a expressão horrorizada de Rony para seu outro amigo na cama. Lágrimas de riso corriam dos olhos de Harry, mas as pupilas dele estavam dilatadas, e ele parecia aterrorizado. Era óbvio que as emoções que ele mostrava não eram dele.

O Diretor adiantou-se rapidamente, agarrando as duas mãos de Harry nas dele e dizendo: – Vai passar, Harry. Não vai durar muito agora. Vai passar.

Realmente passou depois de alguns minutos agonizantes, e Harry finalmente relaxou o suficiente para que Madame Pomfrey pudesse colocar um frasco de Poção Calmante nos lábios dele. Fez efeito quase que instantaneamente, e Harry se afundou nos travesseiros, exausto.

– Ele está feliz agora – o jovem rapaz de cabelos escuros murmurou adormecido. – Ele conseguiu o que queria. Tudo está conforme planejado. – Então os olhos dele se fecharam, e ele foi levado por um sono inquieto.

– Vamos, todos vocês para fora – a medibruxa ordenou. – O Sr. Potter precisa descansar.

Hermione, Rony e até mesmo o Diretor, deixaram-se ser afastados do lado da cama, e Madame Pomfrey fechou as cortinas em volta dela.

– Isso foi assustador pra caramba – Rony disse baixo assim que saíram da Ala Hospitalar. – O que você acha que Você-sabe-quem conseguiu que o deixou tão excitado?

Hermione encontrou o olhar do Diretor, mas não disse nada. Ela tinha uma sensação desconfortável de que ela sabia exatamente o que deixara Voldemort tão feliz, e quem havia conseguido isso para ele.

– Eu não sei, Sr. Weasley – disse Dumbledore, dando a Hermione um olhar significativo –, contudo nós usaremos todos os nossos recursos para descobrir o que aconteceu. Neste meio tempo, Harry está em boas mãos. Eu sugiro que vocês dois tentem não se preocupar e descansem um pouco.

O Diretor partiu em direção ao seu escritório, e Rony foi para as escadas que levavam à Torre da Grifinória.

– Você não vem, Mione? – ele disse quando ela não o seguiu imediatamente. – Você ouviu o Dumbledore, Harry ficará bem.

– Eu sei – ela disse distraidamente e depois acrescentou –, não, vá em frente, acho que vou dar uma caminhada para limpar a cabeça.

Ela esperou até Rony desaparecer escada acima e depois, ignorando sua decisão anterior de esperar até amanhã, seguiu diretamente para o corredor leste do primeiro andar.

– Professor? – ela chamou assim que emergiu da passagem na sala de estar de Snape. A sala estava silenciosa e fria, assim como o laboratório quando ela checou o outro cômodo. Olhando atentamente para o armário contendo as amostras de poções, ela percebeu que alguns frascos da falsa Poção Cruciatus não estavam lá.

Ela mordeu os lábios.

Será que ela devia permanecer ali e esperar até ele voltar? Será que ele teria as respostas de por que a cicatriz de Harry estava doendo tanto, por que ele sentiu tanto ódio, seguido por alegria? Será que um pouco da fúria de Voldemort foi dirigida a Snape?

Ela decidiu ficar, a preocupação tanto com Harry quanto com o mestre de Poções vencendo o bom senso e a necessidade de descanso. Ela poderia ao menos trabalhar um pouco enquanto esperava, então começou a preparar mais algumas poções para a enfermaria. Poções Calmantes, como a que a medibruxa havia dado a Harry mais cedo, poções do sono e pomadas para contusões. Todas eram relativamente simples de preparar, mas requeriam a sua concentração e serviam para livrar sua mente de outras preocupações.

Parecia que horas haviam se passado quando o som de alguém chegando pela rede Flu na lareira da sala de estar chegou aos seus ouvidos, e ela lançou os olhos através da porta parcialmente aberta, a tempo de ver o mestre de Poções desaparecendo pela porta do outro lado da sala, que Hermione concluíra que levava ao seu quarto. A porta bateu logo atrás dele.

Hermione franziu a testa, mexendo seu caldeirão, pensativa. Alguma coisa não estava certa nessa aparição fugitiva dele, mas ela não conseguia entender completamente.

Geralmente, após retornar de uma reunião com Voldemort, ele viria direto para o laboratório, pálido e silencioso, e começaria a preparar o que quer que fosse requisitado a ele naquela noite.

Depois de alguns minutos e nenhum som a mais vindo do outro cômodo, suas preocupações aumentaram e, lançando um feitiço de estase no seu caldeirão, dirigiu-se à sala de estar.

A primeira coisa que ela notou foram as pesadas vestes de veludo de Comensal da Morte de Snape jogadas casualmente no chão perto da lareira. Sua testa franziu ainda mais; não era típico do Snape deixar qualquer coisa fora do lugar. Ela apanhou-as, assustando-se levemente quando uma máscara preta caiu do meio das pregas.

Ela dobrou as vestes cuidadosamente sobre as costas de uma das poltronas, mas não conseguiu se persuadir a mover a máscara de onde ela estava no piso da lareira.

Ela sabia que era apenas um objeto, e que era bobagem ter medo dele, mas aquilo carregava implicações tão terríveis, especialmente para alguém como ela, uma nascida-trouxa. Era a última coisa que muitas pessoas como ela viam antes de suas vidas acabarem repentina e violentamente.

Seus pensamentos mórbidos foram interrompidos por um som amortecido vindo da direção do quarto. Atravessando a sala, ela permaneceu quieta na frente da porta fechada, ouvindo. Mais alto agora, ela reconheceu o som como uma tosse, uma terrível tosse seca.

Ela olhou fixamente para a porta fechada. O que Snape faria se ela se aventurasse dentro do seu quarto, sem ser convidada? Pelos sons que vinham lá de dentro, ele não parecia estar em condições nenhuma de repreendê-la com severidade, e assim, sua preocupação pesando mais que o seu medo, ela agarrou a maçaneta e abriu a porta.

– Professor? – ela chamou.

Não ouvindo resposta, ela deu um passo para dentro do quarto escuro, iluminado apenas pelo brilho de uma vela solitária na cômoda. Aquela luz era suficiente para ver que o quarto estava vazio, e sua atenção voltou-se para a única outra porta que havia no quarto, quando outro surto de tosse veio lá de dentro.

Antes que ela perdesse a coragem, atravessou o quarto, empurrou a porta do banheiro até abri-la completamente, e ofegou com a visão diante de si.

Snape estava de joelhos, vomitando impotentemente no vaso de porcelana à frente dele.

Vendo-o agora, ela percebeu o que estivera estranho quando ela o vira de relance assim que ele retornara. Ele devia ter renunciado às camadas de roupas de sempre de embaixo das vestes de Comensal da Morte, pois agora ele estava vestindo apenas uma calça preta e uma camisa de linho branca, tão úmida de suor que Hermione podia ver a palidez da sua pele através do tecido fino.

Com o ranger da porta nas dobradiças, ele virou-se em direção ao barulho, ainda segurando o vaso com uma força nas mãos que embranquecia os nós dos dedos.

Seu rosto era uma máscara de dor, mais pálido que nunca, e brilhante com a transpiração.

– O que você... – ele conseguiu dizer, antes de desviar dela assim que outra onda de tosse seca invadiu seu corpo. O cabelo dele caiu para frente, obscurecendo da sua vista as feições torturadas, quando ele esvaziou o conteúdo do estômago na privada.

Inicialmente chocada em silêncio, Hermione colocou-se em ação. Ela não fizera aquelas aulas de Magia Medicinal para nada. Uma rápida sacudida da sua varinha conjurou uma toalha de rosto úmida e fria, e ela aproximou-se do mestre de Poções.

Mexas pálidas de cabelo molhados de suor estavam grudados no rosto dele, e ela hesitou, apenas momentaneamente, antes de aproximar-se ao lado dele e puxar os cabelos do rosto dele, segurando-os gentilmente num rabo de cavalo atrás da nuca para prevenir que eles caíssem para frente novamente.

Ela percebeu, assim que a mão dela roçou levemente na parte de trás do pescoço, que todo o corpo dele estava tremendo.

Cruciatus? ela pensou. O que ele poderia ter feito possivelmente para enfurecer Voldemort a ponto de deixá-lo num estado daqueles?

A não ser que isso fosse normal…

Ele não retornara desta maneira nas últimas vezes que fora convocado... mas Voldemort estivera razoavelmente satisfeito com o progresso dele na criação da poção. É desta forma que Snape retornava sempre que desagrava o mestre dele? Seu coração ainda apertava dolorosamente no seu peito com a idéia do mestre de Poções tendo que se recuperar disso, sozinho, toda vez.

A tosse parou e Snape sentou-se sobre suas pernas, ofegando por ar, os olhos cheios de lágrimas do esforço por ter vomitado por tanto tempo.

Hermione soltou o cabelo dele e pressionou o pano úmido na mão livre dele. A outra ainda estava segurando o vaso sanitário para firmá-lo. Ele pegou o pano sem nenhum comentário e limpou seu rosto com o tecido frio enquanto Hermione conjurava um copo com água.

Ela não podia confiar na sua voz, então trocou o pano úmido na mão dele pelo copo de água em silêncio, arrependendo-se disso no momento seguinte, quando o copo escorregou pelos dedos trêmulos dele.

O copo quicou, e ela ficou feliz por ter conjurado instintivamente um copo inquebrável. Ela conjurou outro, dizendo calmamente: – Deixe-me ajudá-lo.

Ele encontrou o seu olhar atento e assentiu de leve com a cabeça, os olhos dele não deixando os seus enquanto ela levava o copo até a boca dele, inclinando-o vagarosamente para que a água fria passasse pelos lábios dele. Ele tomou alguns goles de água com certa dificuldade antes de empurrá-lo.

Então ela afastou-se dele, limpando a água do primeiro copo que caíra no chão e virando-se para colocar os copos na bancada do lavabo. Ela manteve-se de costas o maior tempo possível, fingindo interesse na parede de pedra do cômodo, para dar ao professor a oportunidade de se recompor um pouco.

Devia ser humilhante para ele ser visto naquele estado por qualquer pessoa, mesmo por alguém que ele claramente confiava mais do que queria admitir em voz alta... pelo menos segundo Dumbledore.

Pelo menos ele ainda não a mandara sair, embora se aquilo era porque ele queria que ela ficasse, ou porque ele não estava em condições de discutir, estava fora de questão.

Ela virou-se para encará-lo quando ouviu um movimento e observou-o enquanto ele levantava-se tremendo sobre seus pés e cruzava o espaço entre eles. Ele ainda parecia mais pálido que o normal, e ela teve que resistir ao impulso de ir até ele para segurá-lo.

– Obrigado – ele disse irritado, a voz dele era seca e arranhada, completamente destituída do seu costumeiro tom aveludado. Apenas quando encontrou os olhos dele foi que ela entendeu a gravidade daquela palavra, e em algum lugar, entre a sua preocupação e o seu medo, ela sentiu uma sensação estranha de júbilo crescer dentro dela. Suas mãos queriam alcançá-lo, para ajudá-lo, para confortá-lo e aliviar sua dor; mas a sua mente estava entoando: Ele está me deixando ajudá-lo! Ele não está me afastando dele!

Ela percebeu que continuava fitando os olhos dele e desviou o olhar, desconfortável com a proximidade deles naquele cômodo pequeno. Ele passou por ela até a pia do lavabo e ligou a água fria com uma palavra murmurada, juntando-a nas mãos e espalhando-a pelo rosto.

Ela saiu do banheiro silenciosamente para dar-lhe alguma privacidade, mas hesitou em ir mais além, sua curiosidade pelo que havia acontecido e uma preocupação genuína com Snape a impediam de sair totalmente.

Ela sentou-se cuidadosamente na beirada de uma cadeira de veludo azul escuro e levou um tempo para estudar sua vizinhança, como podia com a luz fraca.

O quarto certamente não era o que ela esperava. Embora, para ser justa, ela não passara muito tempo refletindo sobre a decoração do quarto do mestre de Poções.

Se ela um dia conseguisse contar a Harry e Rony sobre o quarto sem que eles viessem correndo para as masmorras para matar Snape, ela teria um grande prazer em anunciar que não havia nenhum caixão, ou nem mesmo um gancho pendurado no teto, onde o “morcegão seboso” dormia.

Na verdade, o quarto é bem agradável, ela pensou. Escuro, com certeza, mas não era o quarto frio e insensível que ela teria esperado. Ela percebeu, com um traço de divertimento, que as únicas cores da Sonserina a vista estavam num cachecol listrado pendurado num gancho atrás da porta.

O quarto fora agraciado com as mesmas janelas enormes da sala de estar, embora estas estivessem escondidas no momento por pesadas cortinas, que pareciam combinar com o tecido da poltrona em que estava sentada. Havia um armário enorme ao longo de uma parede, semelhante ao que o Professor Lupin aprisionara o bicho-papão para aquela aula no terceiro ano. Havia também uma cômoda alta, e duas mesas de cabeceira em cada lado da cama.

A cama em si parecia… confortável. Hermione não podia pensar numa palavra melhor para descrevê-la, mesmo; era o tipo de cama que qualquer um desejaria se afundar nela depois de um dia longo e difícil. Os lençóis da cama eram em tons fortes de ocre, contrastando lindamente com as cortinas e poltronas azuis, e conferindo ao quarto receptividade e aconchego.

O ranger das dobradiças da porta do banheiro a alertaram sobre a presença de Snape no quarto, então ela se levantou, seu movimento o alertando do fato de que ela não havia saído.

– Você não deveria estar aqui – ele disse cansado, mal conseguindo atravessar o quarto antes de se largar pesadamente na beira da cama. O colchão afundou levemente com o peso, e ele fechou os olhos, levantando uma mão ainda trêmula para apertar os cantos dos olhos.

– Eu jamais pensaria em deixá-lo desse jeito, professor – ela respondeu, trivialmente. – O que aconteceu?

Ele deu um suspiro. – Eu entreguei a Poção Cruciatus completa para o Lorde das Trevas.

– Eu não entendo – ela disse vagarosamente. – Como... se você deu a ele o que ele queria...

– Por que ele fez isso? – Ele apontou para si mesmo e suspirou. – Como você sabe, eu vinha entregando a ele uma variedade de amostras da poção durante as últimas semanas para demonstrar o meu progresso. Embora eu tenha entregue a poção verdadeira hoje à noite, eu ainda levei algumas outras amostras comigo, caso ele questionasse por que eu tinha tanta certeza que esta funcionaria.

Hermione assentiu com a cabeça, esforçando-se para ouvir a voz dele, que não passava de um baixo ruído rouco.

– Eu deixei a poção verdadeira por último e testei as outras duas em – a voz dele falhou momentaneamente, e ele voltou o olhar para o chão –, ...em alguns trouxas que os Comensais da Morte haviam capturado.

Hermione engoliu em seco, sentindo-se mal.

– O Lorde das Trevas ficou furioso quando as amostras mataram as vítimas instantaneamente, sem sofrimento. Ele me ordenou testar o conteúdo do último frasco em mim mesmo – Snape terminou calmamente.

– O quê? – Ela levantou-se abruptamente, movendo-se para ficar em frente a ele. Ele levantou a cabeça, e ela percebeu que o suor ainda escorria pela testa dele.

– Então funciona – ela sussurrou, um sentimento sutil de temor acometendo-a quando o mestre de Poções deu uma risada amarga e depois começou a tossir novamente.

– Eu diria que sim – ele murmurou, limpando a garganta com um esforço dolorido. – Melhor do que eu poderia imaginar, se você me perdoa a escolha das palavras.

Ela assentiu, concordando. “Melhor” certamente não caía bem. Snape ficou em silêncio por um momento, e Hermione o observava, vendo, mesmo à meia-luz, os tremores que ainda corriam pelo corpo dele.

– Como foi? – ela sussurrou.

– Foi... – ele pausou, procurando pelas palavras certas –, ...eu não sei como descrever. O poder da Maldição Cruciatus, como você provavelmente deve saber, é dependente do bruxo que a lança. Não pode ser sustentada por um tempo indeterminado e, embora possa ser relançada, há sempre tempo necessário para se recompor, para tomar fôlego. Isto foi diferente; não houve alívio. Eu não conseguia respirar, não conseguia pensar... eu sei que estava gritando, até minha voz acabar... e depois de um tempo devo ter desmaiado, porque quando voltei aos meus sentidos, eu estava sozinho.

A voz dele cessou, e de alguma forma, ao longo da narrativa, Hermione se viu ajoelhada no chão próxima à cama, apertando as mãos dele nas suas. Ele não se afastou, mas simplesmente ficou olhando para alguma coisa acima e atrás dela, esperando que ela agisse.

Da parte dela, Hermione estava sem palavras. Ela estava horrorizada, tanto com o que ele havia passado, quanto com a frieza com que ele falou sobre aquilo. A impassividade dele à familiaridade dela segurando a mão dele a irritada, e ela se perguntava se ele estava em uma espécie de choque.

Ela não se atrevia a sugerir nenhuma poção, com receio que elas interagissem com a que, indiscutivelmente, ainda estava no corpo dele desde o início da noite.

Poções, ela pensou. Como eu posso ter me esquecido?

– O antídoto! – ela exclamou em voz alta, levantando-se, mas hesitou quando ele balançou a cabeça.

– Não ficará pronto até amanhã – ele disse, fazendo uma careta. – Precisa ferver lentamente por trinta e seis horas depois que os excrementos foram adicionados.

– Você deve descansar então – ela sugeriu.

– Não – ele disse, levantando-se também. – Há muita coisa para fazer. O Lorde das Trevas quer um lote cheio da poção para o próximo sábado.

O mestre de Poções atravessou o quarto a passos largos em direção à sala de estar. Ele andou metade do caminho antes de vacilar e agarrar-se ao encosto da poltrona para se apoiar. Ficou apoiado ali por um momento, respirando com dificuldade, e Hermione foi até ele.

– Professor, por favor – ela implorou. – Você não pode fazer nada neste estado. Você precisa descansar até os efeitos da poção passarem.

– Nós não sabemos quanto tempo isso vai durar – ele protestou sem um traço da sua persuasão habitual. – Eu não posso me dar ao luxo de perder tempo.

– Você não será útil para ninguém se acabar explodindo o caldeirão porque estava exausto, e você não está em condições de preparar corretamente os ingredientes enquanto estiver tremendo deste jeito.


Ela agarrou o ombro dele, com firmeza suficiente para sentir os tremores involuntários que ainda o atravessavam. Foi apenas então que ela percebeu que a camisa dele ainda estava molhada de suor, e fria.

– Você vai pegar um resfriado também – ela disse calmamente, puxando gentilmente a manga da camisa dele e guiando-o para sentar-se novamente na beira da cama. – Você deveria colocar uma roupa seca.

Ele assentiu meio entorpecido e alcançou o botão de cima da sua camisa. O fato de ele fazer isso na frente dela era um sinal de como ele estava fora de si, mas isso não importava, porque os dedos dele estavam tremendo tanto que ele não conseguia desabotoar a camisa. Ele suspirou e largou sua mão no colo.

– Você quer que eu te ajude? – ela perguntou cuidadosamente.

Ele suspirou, corando discretamente o seu rosto pálido.

– Se eu quero? Não – ele disse. – Se eu preciso? Parece que sim.

Ela deu um passo a frente novamente, respirando uniformemente pelo nariz e tentando fazer seus dedos pararem de tremer enquanto ela alcançava o primeiro botão abaixo do queixo dele.

Ele inclinou a cabeça para trás, facilitando o acesso para ela, e fechou os olhos, permanecendo desta maneira enquanto ela desabotoava cada botão. Quando ela chegou ao ponto onde a camisa desaparecia por dentro da calça, hesitou e levantou os olhos para encontrá-lo observando-a contemplativamente. Ela sentiu o rubor crescer no seu rosto e deu um passo para trás, esperando que a luz fraca no quarto mascarasse o seu desconforto.

– Eu vou só, err, ir ali por um minuto – ela murmurrou, gesticulando para a sala de estar.

– Isso não será necessário – ele disse, e ela levantou os olhos, assustada. Ele está querendo dizer...

– Você pode voltar para os seus próprios aposentos, Srta. Granger – ele continuou.

Ah.

– Você vai ficar bem, professor? – ela perguntou.

– Eu tenho certeza que ficarei bem – ele respondeu, com um traço de sarcasmo, ainda que sem maiores conseqüências, formando-se lentamente no rosto dele. – Entretanto, se você quiser voltar pela manhã, quando o antídoto estiver terminado, você poderá observar o estágio final do processo de preparo.

Ela fez um aceno com a cabeça, mordendo os lábios, e depois de um momento virou-se para a porta.

– Srta. Granger – ele a chamou gentilmente.

Ela parou e virou-se para trás. Ele havia se levantado da beira da cama novamente, embora ainda estivesse agarrado ao canto da coluna da cama para se apoiar.

– Eu… – ele começou, depois fez uma pausa por um momento antes de dizer simplesmente: – Sua ajuda foi apreciada.

Ele parecia tão diferente do temido mestre de Poções, parado ali na meia luz, uma faixa do seu peito pálido visível pela frente aberta da camisa, o cabelo escorrido, úmido e desgrenhado.

Ela assentiu com um gesto, permitindo-se um pequeno sorriso antes de deixar o quarto, fechando a porta gentilmente atrás dela.

Ele realmente era apenas um homem, ela reconheceu, depois de tudo que foi dito e feito. Sem as vestes, sem o sarcasmo, sem as pessoas o julgando pela marca no seu braço, ele era apenas um soldado lutando numa guerra; alguém que contribuíra tanto e recebera tão pouco em troca.

Ela entendeu, depois de vê-lo esta noite, por que Dumbledore os colocara lado a lado. Se alguém dissesse, meses atrás, que ela estaria no quarto do mestre de Poções com ele seminu, ela teria lhe entregue pó de Flú e instruções de como chegar em St. Mungos na hora. Agora, entretanto, ela estava contente que o Diretor insistira nessa relutante parceria, contente por poder estar lá para ajudar Snape quando ele precisava, e que ele havia permitido que ela o ajudasse.

Ela sabia que quando ele voltasse ao normal de novo, provavelmente tentaria afastá-la, magoá-la com suas palavras severas ou o seu silêncio, mas ela não seria intimidada. Ela estava nisso agora até o fim. Verdade, ele ainda era tão sarcástico, austero e teimoso como sempre, mas ele não era mais cruel. Com todo o fingimento de lado, o mestre de Poções era apenas humano, capaz de se machucar como qualquer outra pessoa.

Ela olhou fixamente para a porta fechada do quarto. Sabia que ele lhe dissera para sair, mas ela não conseguia se levar de volta para seus próprios aposentos. Os efeitos da poção pareciam estar passando, mas eles estavam realmente lidando com o desconhecido. Não havia como saber se os sintomas poderiam ressurgir novamente no meio da noite, e ela tinha intenção de estar ali, caso o pior acontecesse.

E, ela podia admitir para si mesma, mesmo que não admitisse para mais ninguém, ela queria ficar porque preocupava-se genuinamente com o homem no quarto ao lado, como professor, como mentor de certa maneira, e como amigo.

Ela olhou de relance para o relógio na lareira. Já passava da meia-noite. O antídoto estaria pronto em onze horas...

Ela tirou suas vestes externas e, franzindo a testa momentaneamente em concentração, configurou a peça de roupa em uma manta macia. Depois ela se aconchegou numa das poltronas perto da lareira, enrolando a manta firmemente em volta de si mesma.

Várias vezes durante a noite ela se levantou para parar com o ouvido pressionado na porta do quarto, procurando por sons de desconforto que viessem de dentro. Mais de uma vez, ela teve que se conter conscientemente para não abrir a porta.

Cada vez, ela voltava para sua poltrona e olhava fixamente para as brasas do fogo apagando-se, flashes dos eventos desta noite passando pela sua cabeça. O sono demorou a chegar.

* * * * * * *

Continua…

N.A.: Este capítulo levou mais tempo para ser escrito que o de costume… mas é maior que o de costume, então eu espero que isso compense o atraso!

(N.T.: E as tradutoras também esperam que a demora seja compensada por esse capítulo mais longo.)

Obrigada a todos que leram e deixaram reviews! Seus comentários são sempre apreciados.

N.T.: Obrigada a Ferporcel por mais uma excelente betagem...

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