XIX



A neve caia sem dó, deixando o jardim dos Weasley completamente branco. O vento gélido estava cortante, porém, não tão cortante quanto o choro baixo da garota que tinha acabado de aparatar ali na companhia de um menino.


Assim que surgiram no jardim, Scorpius apertou Rose contra seus braços, em uma tentativa frustrada de acalmar o choro da garota que tinha irrompido quando Lilian sumiu pelo vilarejo com Hugo em seu encalço. Não houve brigas, não houve insultos. Apenas uma troca de olhares feridos entre duas melhores amigas que eram orgulhosas para se perdoarem.


Garotas eram complicadas, pensou Scorpius. Rose estava profundamente magoada porque, apesar de ter errado, Lilian estava se mostrando absurda em repelir a sua presença sempre que possível. Na opinião de Scorpius, ele definiria Lilian Luna Potter em duas palavras: mimada e infantil. Sinceramente, ele acreditava que Anthony estava se livrando de uma boa ao decidir esquecer a filha dos Potter.


– Ela me odeia Scar. – Ele ouviu a voz lamuriosa de Rose e lhe apertou ainda mais contra os braços. Estava gelado, mas ele não se via capaz de afastá-la de si naquele momento. – Minha melhor amiga me detesta. Eu devo ser uma pessoa horrível!


Afastando alguns flocos de neve que tinham se acumulado sobre os cabelos ruivos de Rose, ele lhe afagou o rosto, obrigando-a a olhar em seus olhos.


– Preste atenção Rose. – Ele lhe disse. – Ninguém tem o direito de fazer você se sentir assim. Você é uma garota incrível, não deixe se levar pelo que os outros pensam de você.


Rose sentiu as bochechas se aquecerem e desviou os olhos, constrangida com o elogio.


– Você sabe que Lilian está sendo infantil, não sabe?


– Sim. – Ela concordou relutantemente. – Mas eu não devia ter escondido aquilo dela e... – Scorpius, vendo os olhos dela marejarem, a interrompeu.


– Pare de se culpar por isso Rosie. – Ele pediu carinhosamente. – Você já pediu desculpas pra ela, não pediu?


Rose afirmou. Ela já tinha tentado de tudo. Já havia mandado cartas, tentando conversar com a prima pela lareira e, inclusive, já tentou até fazer Albus de coruja, mas nenhuma de suas tentativas deu certo. Porque Lilian não estava disposta a aceitar suas desculpas.


– Então você precisa parar de se humilhar. – Scorpius respondeu de forma dura. – Mais cedo ou mais tarde, Lilian irá perceber o que está fazendo e tudo voltará a ser como antes.


– E se ela nunca mais falar comigo? – Rose perguntou com a expressão de um gatinho assustado que partiu o coração dele em vários pedaços. – E se nunca mais voltar a ser a mesma coisa?


Malfoy respirou fundo. Normalmente não era bom com conselhos, sempre acabava metendo os pés pelas mãos e as pessoas normalmente ficavam ainda pior do que estavam. Mas com Rose era diferente. Porque ele sabia que enquanto ela estivesse chateada, ele também não estaria bem.


– Ela vai ter provado que nunca foi digna da sua amizade e que o que vocês tinham não era exatamente verdadeiro. – Scorpius respondeu e, ao notar a expressão chorosa de Rose, percebeu que havia sido sincero demais. – Mas não se preocupe, eu sei que ela vai voltar a falar com você. Vocês duas são piores que duas vizinhas fofoqueiras, não vão agüentar ficar muito tempo longe.


Rose acabou deixando o riso escapar, embora tenha dado um soco leve no braço dele pela expressão “vizinha fofoqueira”.


– Você realmente acha isso? – Ela perguntou.


Scorpius sorriu, cobrindo seus lábios em um beijo rápido.


– Eu tenho certeza. E além do mais, eu estou com você. Nunca se esqueça disso.


Os olhos de Rose brilhavam pelas lágrimas, mas mesmo assim ela conseguiu esboçar um leve sorriso. No fundo, ela sabia que Scorpius estava certo e que ela devia deixar Lilian um pouco de lado e aproveitar as coisas maravilhosas que estavam acontecendo na sua vida. E foi pensando nisso que ela encarou Scorpius com um olhar curioso, como de quem tentava resolver um mistério.


Isso porque ela nunca saberia como eles tinham chegado àquele ponto. A cumplicidade que desenvolveram naqueles dias era uma coisa de outro mundo, algo que ela nunca pensou que fosse possível acontecer. De um jeito completamente torto e errado, Scorpius Malfoy parecia entendê-la e decifrá-la de um jeito que ninguém mais conseguia.


– Posso saber por que você está me olhando desse jeito? – Scorpius questionou a tirando de seus devaneios.


Rose simplesmente sorriu para ele.


– É que eu estava pensando. – Ela respondeu. – O que você fez com o garoto arrogante que eu conheci a vida toda em Hogwarts?


O questionamento pegou Scorpius de surpresa, mas mesmo assim, ele não sentiu dúvidas quando respondeu a ela de forma sincera:


– Acho que ele não existe mais. – Ele respondeu a puxando para mais perto dele, seus narizes praticamente se encostando.


– Está querendo dizer que eu sou a responsável por essa sua versão mais sofisticada e evoluída do seu ser? – Ela perguntou zombeteira, fazendo Scorpius revirar os olhos.


– Você está ficando muito convencida Weasley.


– Me desculpe se eu aprendi com o melhor.


E em seguida, sem mais respaldas, ele quebrou o restante da distância a beijando mais uma vez. E ela se esqueceu de todos os problemas quando sentiu os lábios dele pressionando os seus.


Porque era assim que acontecia. Quando estavam juntos, o mundo em volta poderia explodir. Eles não precisavam de mais nada.


**


–Ela está atrasada. – O homem de cabelos grandes e levemente grisalhos comentou. Os olhos verdes salpicando de um sentimento facilmente reconhecido como ciúmes.


Gina Potter revirou os olhos quando encarou o relógio pendulo que havia na parede. Ele marcava exatamente 22h10min.


– Você está exagerando Harry. – Ela respondeu calmamente, como se explicasse àquilo a uma criança. – E, além do mais, Lilian saiu com Hugo, seu sobrinho lembra? – Ela comentou sarcástica. – Ele não é qualquer garoto. Vai trazer sua princesinha intacta para casa.


– Pode não ser um garoto qualquer. – Harry comentou com seus olhos ainda presos no relógio. – Mas não deixa de ser um garoto.


Ele mal terminou de falar e pulou da poltrona onde estava ao ver a lareira da família se acender. Estava pronto para pular em cima de Lilian e lhe fazer um monte de perguntas, porém, assim que a menina irrompeu pela lareira, ela correu em direção à saída do cômodo, visivelmente chorando.


Ainda em choque, Harry ficou parado alguns segundos até estremecer com o barulho da porta do quarto da filha batendo no andar de cima. Em seguida, voltou seus olhos para a esposa, que estava com a mesma expressão confusa que ele próprio estava. Alguns segundos depois, a lareira da sala dos Potter brilhou de novo, e por ela, Hugo surgiu. O garoto estava agitado e os cabelos estavam desgrenhados, além de sua respiração estar semelhante a de alguém que disputou uma maratona.


– Onde ela está? – O garoto perguntou afobado. – Ela está lá em cima?


Harry não deixou o menino terminar de falar, simplesmente o segurou pelo colarinho da camisa e o ergueu uns bons centímetros do chão, causando gritos em Gina.


– O que você fez a minha filha seu moleque? – Hugo engoliu em seco ao ver a expressão zangada do tio.


– Eu... Tio.. Eu não...


Ele não conseguia falar, porque além de estar nervoso, o punho de Harry começava a forçar contra o seu pescoço.


– Harry, você quer, por favor, soltar o garoto? – Gina perguntou furiosa, se aproximando do marido que permaneceu impassível.


– Só quando Hugo me disser o que houve com a Lilian.


– Se você não percebeu, ele está tentando fazer isso. – Gina respondeu sarcástica. – mas você não está deixando o garoto respirar!


Os olhos de Harry, que tinham se prendido em Gina, se voltaram para o sobrinho, e ao perceber que o rosto do moleque começava a atingir um tom duvidoso de verde, ele o soltou. Não por vontade própria, mas porque não queria enfrentar a fúria de Gina e, muito menos, a de Hermione.


Assim que caiu no chão, Hugo levou as mãos ao pescoço e se afogou com o ar enquanto tentava voltar a respirar novamente.


– Ande logo, eu não tenho a noite toda. – Harry resmungou enquanto se sentava em uma poltrona, ignorando os olhares nada amistosos da esposa.


Hugo respirou fundo antes de conseguir formar uma frase descente.


– Rose. – Ele respondeu primeiramente, enquanto se recuperava do recente susto. – Nos encontramos com a minha irmã e Scorpius em Hogsmead e, como elas não estão se falando, Lilian saiu correndo que nem uma louca na minha frente. Foi isso o que aconteceu.


Harry adquiriu uma expressão avaliativa.


– Tem certeza que foi só isso?


Gina revirou os olhos, enquanto Hugo começava a suar frio.


– É claro que sim tio!


Potter estreitou os olhos violentamente na direção de Hugo, que se encolheu no sofá onde havia sentado.


– Não me chame de tio, seu moleque!


Hugo arregalou os olhos. Harry Potter estava, definitivamente, caducando.


– Mas tio, digo, Harry, como que eu...


Notando o embaraço do sobrinho, Gina se intrometeu na conversa, encarando Harry furtivamente.


– Querido, não dê bola para as loucuras de Harry. É apenas a idade se aproximando. – Ela falou carinhosamente. – Você pode ir embora agora, Hermione deve estar morta de preocupação com você. – Ela completou, lembrando-se que a cunhada estava realmente preocupada com a integridade física do filho. Agora Gina percebia que ela não estava exagerando.


Aproveitando a deixa dada pela tia, Hugo levantou-se se despediu rapidamente dos dois, adentrando na lareira dos Potter e sumindo pelas labaredas em poucos segundos. Mas ele ainda ouviu a voz do tio ecoar de forma ameaçadora:


– Vou continuar de olho em você!


**


Tanto Rose quanto Lilian demoraram a dormir naquela noite, por isso que, na manhã seguinte, ambas estavam adormecidas em suas respectivas casas sem que ninguém fosse corajoso o suficiente para acordá-las antes do meio dia. Em contrapartida, Albus e Anthony acordaram cedo naquela manhã, aparatando quase que ao mesmo momento no quarto de Scorpius, sem se perguntarem se ele estaria dormindo ou não.


Por sorte – ou azar, dependendo do ponto de vista – Scorpius estava de pé quando Albus, o primeiro a chegar, apareceu de supetão no meio de seu quarto. Malfoy piscar os olhos várias vezes até ter a certeza de que não estava sonhando.


– Cara, você precisa aprender a não aparatar no quarto dos outros dessa maneira! – Resmungou Scorpius enquanto entrava no closet em busca de um casaco de frio.


Potter não teve tempo de retrucar, porque naquele mesmo momento um estampido denunciou outra pessoa aparatando ali, fazendo com que Malfoy revirasse os olhos.


– Definitivamente, vocês precisam aprender a aparatar no jardim e bater na porta. Seria bom acordar e não dar de cara com um de vocês, sabe?


Em seguida, ele voltou-se para o banheiro a fim de fazer sua higiene pessoal. Anthony encarou Potter um pouco confuso.


– Ele já está reclamando? – Questionou intrigado. Albus deu de ombros.


– Nem dá bola. Agora que está apaixonado, Scorpius vai começar a agir como uma mulherzinha. – Explicou Albus em meio a caretas. – Um soldado a menos no nosso time, gostaria de saber o que as meninas de Hogwarts vão achar quando descobrirem que o garanhão Malfoy não está mais disponível.


Anthony gargalhou.


– Elas terão que se contentar com nós dois, meu amigo! – Ele respondeu, piscando um olho para Albus, que se animou bastante diante daquela perspectiva.


Afinal, alguém precisaria suprir a falta de Scorpius no time dos solteiros, não?


**


Enquanto o trio maravilha estava na mansão Malfoy, Hugo não estava, nem de longe, tão animado quanto os garotos. Tinha acordado por volta das oito da manhã e, desde então, se via perdido pelos cantos da casa, optando por, no final das contas, passar a manhã inteira assistindo televisão.


Sua cabeça tinha dado um nó e apenas pensar em Lilian lhe trazia um ligeiro mal estar. Muitas vezes ele tinha reclamado a respeito do quanto Rose e ela ficavam irritantes quando estavam juntas, porém, hoje ele se arrependia de tais comentários. Isso porque separadas elas são muito piores e conseguem ficar ainda mais insuportáveis.


Lilian estava sendo imatura porque, ao menos na sua visão, ela já devia ter perdoado sua irmã, afinal, ela não tinha feito por mal. Mas era claro que, se tratando de Lilian, a rainha do drama, nada poderia ser resolvido de forma simples, de modo que há dois dias elas vêm tirando a paz e a sanidade de toda a família.


Mas mesmo com todos aqueles defeitos como a impulsividade e a mania irritante que ela tinha de sempre se achar a dona da razão, Hugo continuava gostando dela.


Ele estava feliz por tê-la levado ao cinema na noite anterior, porém, as coisas estavam lhe parecendo erradas, como se não estivessem encaixadas em seus devidos lugares o fazendo pensar que, talvez, ele estivesse confundido com o turbilhão de sentimentos que estavam dentro dele. Mas Hugo amava Lilian de todo o coração. Ele se sentia bem quando a fazia sorrir, fazendo seu coração transbordar de felicidade sempre que eles estavam juntos.


Não havia a menor possibilidade de ele estar confundindo tudo afinal, nada mais poderia ser amor, se o que ele estava sentindo não era.


Hugo Weasley acabou tão perdido em seus pensamentos, tentando decifrar as sensações que estavam agitadas dentro dele, que se assustou quando, pela janela da sala, duas corujas entraram a toda velocidade. Uma era o correio diário com um exemplar do Profeta Diário que a coruja apenas largou sobre o colo de Hugo, levantando vôo em seguida. A outra porém, lhe fez subir um arrepio. Porque ele conhecia aquela coruja.


Apenas estranhou o motivo de, além de um envelope lacrado com uma carta, a coruja estar sustentando, também, outro exemplar do jornal bruxo mais famoso de Londres.


**


Rose estava perfeitamente adormecida em sua cama. Sua mente parecia esquecida do desentendimento por olhares que tivera com Lilian na noite anterior enquanto relembrava todos os detalhes do encontro da noite anterior. Ela estava devaneando com os sorrisos de Scorpius e a leve pressão que seus lábios faziam contra os dela quando sentiu um peso incomum em cima de si.


Ela tentou ignorar e voltar para o sonho, porém, o peso em cima dela começou a estapeá-la no rosto.


– Rose. – Ela conseguiu distinguir uma voz risonha. – Rose, acorde!


Mas ela não queria acordar para realidade, ela gostava dos sonhos, que sempre eram mais divertidos que a realidade.


– Mãe, só mais cinco minutinhos. – Ela resmungou preguiçosa, virando-se para o outro lado.


Porém, acabou despertando abruptamente quando ouviu uma gargalhada. Um pouco confusa, Rose sentou na cama e encarou a figura que, agora, estava rocha de tanto rir, sentada a sua frente. Dominique simplesmente não se agüentava.


– Domi, o que está fazendo aqui? – Rose questionou estranhando a presença da prima.


Foram necessários alguns minutos para que Dominique Weasley recuperasse a razão e se lembrasse do porquê de sua visita.


–Bem, eu soube que você e Lilian estão brigadas, então vim ver como você está. – Respondeu Dominique.


Rose adquiriu uma expressão vazia e se levantou, procurando uma roupa que pudesse substituir a camisola de algodão que ela vestia. Definitivamente, ela não gostaria de tocar no assunto Lilian Potter logo depois de acordar, mas como Dominique não tinha tido a intenção de magoá-la, Rose se limitou a resmungar enquanto caminhava em direção ao banheiro.


– É por isso que eu não gosto desse seu casinho com o Al. – Rose disse se referindo aos beijos escondidos que ela sabia que Dominique e Albus tocavam. – Ele sempre acaba contando tudo pra você.


Dominique pareceu não se abalar, porque acompanhou a prima até o banheiro enquanto respondia.


– Não sei por que você pensa que foi o Albus.


Rose virou-se e a encarou desdenhosamente, incentivando-a a dizer o contrário.


– Oras, se não foi o Albus, quem mais poderia ter sido? A sua coruja?


Dominique revirou os olhos.


– Para a sua informação, eu não vejo Albus desde o Natal, okay? – A loira lhe disse, não conseguindo esconder o ressentimento na voz. – E quem me contou não foi ele, foi Teddy.


– Teddy? – Rose franziu o cenho.


– É, ele namora minha irmã lembra? – Perguntou sarcástica, fazendo Rose revirar os olhos daquela vez. – Enfim, ele cruzou com James no ministério ontem a tarde ele contou. Depois disso, Teddy contou a Victoire, que contou a mim, que estou aqui falando com você agora.


Foi impossível não rir de Dominique, porque a garota sempre fazia caretas engraçadíssimas quando falava rápido demais. A loira tagarelou mais alguns minutos enquanto Rose trocava de roupa contando sem grande emoção que Teddy tinha pedido Victoire em casamento. Depois de pronta, ambas sentaram-se na cama da ruiva e, quando Dominique conseguiu parar de falar por alguns instantes, Rose questionou.


– Parando pra pensar agora, como foi que você entrou no meu quarto? – Rose ergueu uma sobrancelha. – Vai me dizer que Hugo já está acordado? – Ela perguntou ainda mais incrédula com sua conclusão, visto que nas férias, Hugo nunca levantava antes do almoço.


Dominique riu.


– Quando eu cheguei, ele abriu a porta com uma cara meio apavorada. Estava meio branco, sabe? Como se tivesse sido beijado por um dementador. – Avaliou ela, arrancando risadas de Rose pela comparação. – Ele tinha uma carta na mão, provavelmente da sua mãe para tê-lo assustado tanto.


– Que estranho, quando mamãe quer falar conosco, sempre nos chama pela lareira. – Lembrou Rose.


Acabou ficando curiosa com a correspondência do irmão, mas não pode pensar muito no assunto, porque Dominique puxou de dentro das vestes o exemplar perfeitamente enrolado de um jornal que, pela cara psicopata da prima, só poderia ser O Profeta Diário.


– Mas o verdadeiro motivo de eu aparecer aqui, prima querida, não tem nada a ver com suas brigas com Lilian. – revelou Dominique, oferecendo a prima o jornal já desdobrado. – Prepara-se porque eu acho que você não vai gostar nada do que está escrito aí.


Rose cuidadosamente pegou o exemplar que Dominique lhe oferecia e, com certo receio, o encarou. E então, sentiu o sangue do rosto se esvair ao ver uma foto sua e de Scorpius Malfoy estampando a coluna social.


**


– Maldito jornalzinho de quinta categoria. – Scorpius resmungou enquanto o amassava e jogava por cima do ombro.


Ele, juntamente de Albus e Anthony, estavam na sala de estar na mansão Malfoy quando o correio diário chegou, largando sobre eles um exemplar do profeta diário que estampava uma foto dele e Rose em um canto da capa e com uma matéria sensacionalista publicada na coluna social.


– Calma, Scorpius. Você sempre soube do tipo de notícia que o Profeta prioriza. Ninguém se importa mais com as fofocas deles.


Scorpius tentou controlar a respiração antes de responder a Albus, porém, nenhuma palavra saia de sua boca. Ele estava com raiva, mas não do que tinham publicado, e sim como tinham publicado e descrito a relação dos dois.


Um jornal medíocre pensou Scorpius. E que mesmo depois de todos aqueles anos continuava rotulando as pessoas.


**


– “Rebeldia Adolescente” – Rose leu o título da reportagem incrédula. – “Rose Weasley e Scorpius Malfoy foram flagrados em encontro romântico ontem à noite no vilarejo de Hogsmead. Fica a pergunta no ar: como a família da mocinha irá reagir ao descobrir que a pequena Rose está envolvida com o filho de Draco Malfoy, um ex comensal da morte? Certamente Ronald Weasley e Hermione Granger não se agüentarão de tanto desgosto.”


Apesar de ter lido em voz alta, Rose continuava lendo e relendo aquela reportagem, como se esperasse que seus olhos a estivessem traindo. Além de citarem Draco como ex-comensal, Cameron Skeeter – Sobrinho mais velho da odiada Rita Skeeter – ainda dizia que a família Malfoy, apesar de ser rica e poderosa, não havia se redimido e que eles ainda eram envolvidos com magia das trevas. Rose estava estupefata com a matéria ridícula, de modo que Dominique resolveu falar para ver se ela conseguia reagir.


– Eu não sei como o Profeta Diário ainda consegue leitores depois de todos esses anos. – A loira falou em meio a uma careta. – Já não é a primeira vez que eles escrevem algo sensacionalista. Por que o ministério simplesmente não o tira de circulação?


– É simplesmente um absurdo! – Rose bradou com as orelhas pegando fogo. – A família de Scorpius foi julgada e absolvida, tio Harry garantiu isso lembra? – Rose falou a prima, recordando-se da história acerca da sentença falsa de Narcisa Malfoy que salvou a vida de Harry Potter. – É um absurdo continuarem falando essas asneiras!


Dominique Weasley concordou, embora estranhasse um pouco a raiva desmedida da prima. Quando a compreensão atingiu sua mente, com a verdade gritante praticamente chocando-se com o seu rosto, um sorriso largo iluminou o rosto dela. Porém, Rose parecia ocupada demais parar perceber enquanto revirava as gavetas da escrivaninha que ficava de frente para janela.


– O que você está fazendo? – A loira questionou um pouco confusa.


– Procurando um pergaminho. – A outra respondeu, já com um rolo amarelado nas mãos. – Preciso ver se Scorpius já viu isso.


E então, Dominique teve a confirmação que precisava. Os olhos de Rose e Scorpius pareciam finalmente terem se aberto, percebendo a tamanha mentira que contaram para si mesmos durante todos aqueles anos. Ela sempre soube que eles acabariam juntos, embora tenham precisado de um acordo absurdo para, finalmente, aceitarem uma aproximação.


Ela podia não ter um relacionamento sério com ninguém, mas apesar disso, Dominique conseguia distinguir facilmente quando as pessoas estavam a apaixonadas, como era o caso da prima com o Malfoy. E quando não estavam também. Isso porque de amor não correspondido, Dominique entendia até as entrelinhas.


**


Tanto a manhã quanto o dia passaram de forma rápida. Dominique passou o dia todo na casa de Rose. A ruiva parecia estar bem animada com o baile da manhã seguinte e, embora a loira tentasse disfarçar seu desânimo, ficava claro que Dominique não estava tão contente assim. Escolheram vestidos e sapatos e colocaram a conversa em dia, embora Rose tenha percebido que a prima nunca gostava muito de falar de si mesma.


Aquela situação era um pouco estranha, pensou Rose. Ela nunca tinha tido aquele grau de intimidade com Dominique. Ambas apenas se encontravam durante os almoços da Toca e não costumavam se visitar e trocar mensagens como ela e Lilian já fizeram um dia. E devia admitir que, apesar de sentir a falta da Potter, era realmente bom mudar os ares de vez em quando.


Dominique podia não gostar de falar sobre sua vida pessoal, mas tinha um humor genial que compensava qualquer outra falha.


Quanto a Scorpius, Albus e Anthony, os três passaram o dia na mansão Malfoy, mais precisamente nos jardins, treinando algumas jogadas de quadribol, e o anfitrião foi o alvo da maioria das piadas durante o dia, principalmente depois que ele recebeu uma carta de Rose perguntando como ele estava depois da reportagem do Profeta.


Por serem garotos, não estavam preocupados com as roupas de gala que deveriam vestir no dia seguinte para comparecer ao tradicional baile do ministério. Isso porque homens ficam prontos e aceitáveis depois de colocarem um terno preto com uma gravata e uma camisa bonita, ao passo que as mulheres precisam de vestidos, sapatos e maquiagens para se sentirem aceitáveis.


Depois de algumas jogadas e de já estarem suficientemente cansados, resolveram se sentar embaixo de um grande salgueiro. O assunto, obviamente, era leve e descontraído. Apenas adquiriu um ar mais sério quando Albus questionou Scorpius sobre um assunto que nem mesmo ele tinha pensado ainda.


– Agora que você e Rose parecem ter se ajeitado, vão contar a todos sobre aquele acordo patético?


Scorpius precisou refletir por longos segundos para responder. Isso porque era complicado e aquela decisão implicaria em muitas coisas. Os 300 galeões daquele acordo já não importavam mais, porque o que estava em jogo ia muito além do dinheiro. Tinha a ver com a forma com que ele e sua garota iriam lidar com a decepção dos pais quando eles soubessem que tudo tinha começado com uma mentira.


– Sinceramente? Ainda não tenho nem idéia. – Respondeu Scorpius encolhendo os ombros levemente. – Acho que precisamos contar, mas ainda não falei com Rose sobre isso.


– Então vocês estão realmente se acertando? – Anthony mediou. – Digo, você já está sentindo que a relação de vocês está evoluindo?


– Bem, nós jantamos juntos ontem e ela pareceu bastante a vontade comigo. – Scorpius respondeu de forma quase vaga. – Acho que temos tudo pra dar certo, é só ela querer.


Insegurança. A voz de Scorpius estava repleta desse sentimento obscuro e que parecia consumi-lo aos poucos. Isso porque eles trocavam beijos, carinhos e confidências, mas nunca falaram sobre seus próprios sentimentos. E Malfoy tinha um medo absurdo de que tudo o que ele sentia não fosse correspondido da forma como ele esperava.


Um medo que seria completamente infundado se ele soubesse que, naquele momento, Rose Weasley estava em seu quarto se remoendo acerca da demora de Scorpius para responder a sua correspondência e sentindo-se da mesma forma que ele: insegura quanto aos sentimentos e intenções da pessoa que havia feito sua vida dar um giro de cento e oitenta graus em menos de uma semana.


**


A resposta de Scorpius só chegou à noite, quando Rose Weasley estava sentada e jantando com os pais e o irmão. Hugo lhe pareceu distante o dia todo e, enquanto se servia com uma porção de purê, Rose teve a sensação ainda mais viva de que ele parecia estar com os pensamentos em outra dimensão.


A coruja negra dos Malfoy adentrou na sala dos Weasley no exato momento em que Hermione Granger começava a passar as instruções para que seu marido se comportasse de maneira aceitável durante o baile, visto que ela havia aceitado o convite dos Malfoy e todos se sentariam com eles. Obviamente, Ron Weasley impôs algumas condições, de modo que Astória Malfoy teve trabalho para convencer Draco a convidar os Potter para o jantar também.


Assim que a carta de Scorpius caiu sobre o colo dela, Rose levantou-se e correu para o quarto como um foguete – sob os protestos do pai.


Logo que fechou a porta e se viu sozinha, ela rasgou o envelope sem pena alguma e tirou de lá a correspondência.


Rose,


Primeiro quero pedir desculpa por ter demorado. Anthony e Albus passaram o dia por aqui, então acabei ficando sem tempo para responder.


Quero dizer que eu vi, sim, a matéria no Profeta Diário. E, pelo que percebi, Draco Malfoy também viu e não ficou nada satisfeito. Acho que Cameron Skeeter terá mais um processo para sua coleção. Só espero que você não tenha se importado com a exposição.


Como foi seu dia? Estou me sentindo um pouco culpado por não ter falado com você o dia todo.


Com carinho,


S. Malfoy.


Rose ficou incontáveis minutos observando a caligrafia torna de Scorpius. Era tão bom saber que ele se preocupava com ela e, ao mesmo tempo, tão estranho, que a única coisa que pareceu acalmar seu coração, foi escrever algo em resposta.


Scorpius,


Não tem problema, Dominique ficou aqui em casa o dia todo. Espero realmente que Skeeter pare com essas acusações infundadas. Achei um absurdo.


E eu estou bem, não pensei muito em Lilian, sabe? Vou seguir seu conselho.


Como estão os preparativos para o baile? Papai e mamãe já estão me enlouquecendo com suas discussões.


Com carinho,


R. Weasley.


.


.


Rose,


Que bom que entendeu. Lilian não está se mostrando madura, então, dê um tempo a ela. Quanto ao baile, bem, você sabe como meu pai é. Acho que minha mãe e a sua terão muito trabalho para segurar os dois amanhã!


Preciso dizer que estou ansioso para te ver de novo. E isso é bem estranho porque há duas semanas não nos importávamos com a presença um do outro. Que tipo de poção você andou usando em mim? – Brincadeirinha, não leve a sério esse último comentário.


Amor,


Scorpius.


.


.


Scorpius,


Droga, como você descobriu a minha idéia da poção de Amortentia?


Brincadeiras a parte, me sinto mais ou menos como você. É bem esquisito nos vermos nessa situação depois de anos nos detestando. Como está sendo pra você a experiência de me conhecer melhor?


Amor,


Rose.


.


.


Rose,


Você é bem melhor do que imaginava. Por favor, não se assuste com o que eu vou dizer, mas, eu acho que estou gostando de você. De verdade


Com amor,


Scorpius.


Era tão gostosa a sensação de esperar a resposta de Scorpius, que Rose havia se perdido na hora. Não fazia nem idéia de que já passava das 23h00min e, sinceramente, ela não estava nem um pouco interessada em saber que horas eram. Naquele exato momento, ela estava com a última correspondência de Scorpius nas mãos, sentindo os olhos marearem levemente.


O que ela poderia dizer? Ela sabia qual era a resposta para suas dúvidas, ela tinha total certeza do que realmente estava acontecendo e do que realmente estava sentindo. Só faltava coragem, um pouquinho de coragem.


Scorpius,


Só se você prometer não se assustar com o que eu vou dizer. Acho que posso estar amando você.


Vejo você no baile amanhã.


Boa noite,


Rose.


Em seguida, sentindo os olhos pesarem pelo sono, Rose vestiu-se com uma camisola curta de algodão e se embolou em meio às cobertas, sentindo a estranha sensação de dever cumprido. Não estava arrependida como pensou que poderia ficar, pelo contrário, estava satisfeita.


Scorpius, quando recebeu a correspondência, ficou ligeiramente pálido, embora seu peito se inundasse de um tipo de alegria que ele ainda não conhecia. Até pensou em responder a carta da menina, mas resolveu esperar para respondê-la pessoalmente, durante o baile. Até lá, não tocaria no assunto.


E enquanto Scorpius planejava algo que pudesse surpreendê-la, Rose sentia seus olhos se fechando lentamente, ao passo que em seus lábios um sorriso suave brincava.


Borboletas no estômago, coração descompassado, arrepios irregulares e a estranha necessidade de estar sempre ao lado dele. Se aquilo não era amor, o que mais poderia ser?


Parecia que o destino, finalmente, estava vendo seus planos se cumprirem.

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