Isso não é uma audiência




Capítulo 9 - Isso não é uma audiência



Quando Martha e Severo chegaram à sala do Prof. Dumbledore, ele estava com dois bruxos que se voltaram para ela assim que ela entrou. Um deles tinha cabelos bem pretos e uma aparência de uns 30 e poucos anos, que olhava para ela com curiosidade. O outro era mais velho, alourado, tinha uma expressão decididamente inamistosa e Martha até se encolheu um pouco.



Com seu jeito eternamente afável, Dumbledore saudou-os:



- Ah, Severo, Martha. Bem-vindos. Deixe-me lhes apresentar o Sr. Trumvald e o Sr. Gasbriel, do Ministério da Magia. Creio que todos sabemos o objetivo de sua vinda.



Trumvald - o de cabelos pretos - disse:



- Obrigado aos dois por terem vindo. Não se preocupem, isso não é uma audiência. Gostaríamos de dar início aos procedimentos o mais breve possível. Prof. Snape, se puder me acompanhar, gostaríamos de lhes fazer algumas perguntas.



Imediatamente, o homem mais velho, Gasbriel, se virou para Martha:



- Srta. Scott, por favor, sente-se aqui.



Sem tirar os olhos de Severo até que ele fosse levado para fora da sala, Martha sentou-se onde estava indicado, notando que ela tinha ficado sozinha com o auror mais velho. Ele sorriu para ela, pegando uma caneta:



- Agora, se puder fazer o favor de pegar essa caneta, podemos dar início.



Ela esticou a mão:



- Essa caneta? Mas eu - ohhhhhhhhhhhh!



Sentindo um puxão na altura do umbigo, Martha de repente perdeu a noção de onde estava. Ela parecia estar sendo sugada para um outro lugar, mas estava tão tonta que mal sabia sequer o que estava acontecendo.



Quando ela finalmente conseguiu se assenhorear de si mesma, o auror chamado Gasbriel tinha um copo d'água nas mãos e um sorriso nos lábios:



- Beba isso. A senhorita parece um tanto esbaforida.



Era o mínimo que se podia dizer. Ofegante, ela indagou:



- O que... o que aconteceu?



- Nada demais. Nós apenas a transportamos para um local mais apropriado. Por favor, beba um pouco de água.



Ela obedeceu, olhando em volta, trêmula. Ela realmente não estava mais no escritório de Dumbledore, mas sim numa sala escura, e ela estava no centro da sala, com cerca de vinte pessoas a olhando. Nenhuma delas parecia ser muito simpática.



- O-onde estou? O que fizeram comigo?



- Tenha calma, Srta. Scott. Isso não é uma audiência. Isso é um tribunal.



- Tribu... Mas eu não fiz nada! Do que estão me acusando?



- Nenhuma acusação recai sobre a senhorita, pode ficar tranqüila. Só queremos fazer algumas perguntas antes de mandá-la de volta para casa, em Londres.



- Minha casa é Hogwarts! Onde está o Prof. Dumbledore? E o Prof. Snape? Ai, meu Deus, isso não pode estar acontecendo!



- Tenha calma, Srta. Scott, como eu disse, nada de mal lhe acontecerá. Mas já que perguntou pelo Prof. Snape, que tal falarmos sobre ele?



- O que quer saber?



- Ele a trouxe para Hogwarts, não foi?



- Isso mesmo - ela viu uma pessoa adiante tomando notas numa pena.



- A senhorita sabia que ele era um bruxo?



- Sim, eu sabia.



- Como?



- Ele me contou. Falou-me sobre o seu mundo.



- Ele lhe disse alguma coisa sobre o Estatuto Internacional de Sigilo em Magia?



Naquele momento, tudo fez sentido. Ela olhou para os lados, tremendo ainda mais. Martha estava apavorada. Eles a estavam usando para julgar Severo!...



- Ele me disse que era proibido para nós sabermos sobre magia.



- Ainda assim ele lhe contou quem ele era?



- Eu pedi que me contasse. Ele não queria, mas eu insisti. A culpa é minha!



- Nós decidiremos de quem é a culpa, Srta. Scott. Diga, ele deixou claro que isso era proibido?



- Sim, sim, mas ainda assim eu insisti! Ele não queria!



- Por que queria saber tanto sobre o Prof. Snape?



- Porque eu estou apaixonada por ele, e achava que ele podia ser casado.



- Deve ter ficado aliviada então. Digo, sabendo que ele não era casado, e sim, bruxo.



- Para dizer a verdade, não fiquei. Eu sabia que ele iria me deixar para voltar para seu mundo. Eu iria perdê-lo de qualquer forma.



- Ele lhe contou que estava sendo procurado pelas autoridades?



- Foi um mal-entendido. Severo é inocente!



- Sim, mas àquela altura, isso não estava claro. Como confiou nele, um possível criminoso e ainda por cima com poderes mágicos? Para uma trouxa como a senhorita, deve ter sido um tanto inquietante. Ele a ameaçou de alguma forma?



Ela sentiu o medo se transformando em raiva rapidamente:



- Nunca! Severo jamais me machucaria!



- Mas tenho a impressão de que ele terminou fazendo exatamente isso... ele a tirou de seu mundo, não foi? A senhorita tinha um emprego, uma casa, amigos, família?



- Severo me salvou de um relacionamento abusivo. Eu vim com ele porque quis. Não quis me separar dele e ele não quis me deixar. Foi apenas isso.



- Lamento, mas ele sabia perfeitamente dos riscos e da lei. O Estatuto Internacional de Sigilo em Magia é bastante específico.



- Mas não estamos violando a lei! Eu renunciei a meu mundo! Não vou contar a ninguém sobre bruxos e magia. Quem iria acreditar em mim, mesmo?



Gasbriel abanou a cabeça:



- Os procedimentos são claros. A senhorita deve ter suas memórias apagadas e ser mandada de volta para seu mundo.



- Eu não tenho mais nada lá! Eu larguei tudo para vir com Severo: emprego, casa, amigos! Eu não tenho família, não tenho ninguém! Só o que eu tenho é Severo! Por favor, não me tirem a única coisa que tenho! - as lágrimas escorriam por suas faces, e ela se virou para os demais bruxos, que a observavam na penumbra - Por favor, não façam isso! Não me mandem de volta!



- Senhorita, aquele é o seu lugar. Eu sinto muito.



Ele fez um gesto e dois bruxos abriram a porta lateral. Outros dois bruxos entraram, e Gasbriel disse:



- Eles vão retirar suas memórias agora. Pode ficar tranqüila, nenhum mal lhe acontecerá.



Martha tentou se levantar, mas cordas surgiram magicamente de sua cadeira, amarrando-a no lugar. Ela começou a ficar desesperada:



- Não, não por favor! Me soltem! Por favor, me escutem! Precisam me escutar! Não podem fazer isso sem me ouvir!



- Srta. Scott, por favor. É um procedimento simples, não há motivo -



Ela sentiu nova fúria se inflamar dentro dela:



- Não há motivo?! Você está a ponto de arruinar minha vida e quer que eu fique quietinha?!



- Dificilmente sua vida estará arruinada, senhorita. Ao contrário, a senhorita terá de volta sua vida. No seu mundo.



- Pois era preferível que me matasse a me levar de volta! - disse ela, em prantos - Eu imploro, por favor. Se quiser me levar de volta, faça isso, mas não apague minha memória. Eu nunca fui feliz antes e agora você quer tirar de mim a lembrança dos dias mais felizes da minha vida. Eu prefiro morrer a não me lembrar da melhor coisa que já me aconteceu. Pode me levar de volta, mas tenha piedade e me deixe ao menos lembrar que eu já fui feliz... por favor, eu imploro... por favor...



Houve um silêncio estranho enquanto Martha soluçava. Aparentemente, ela tinha conseguido balançar até Gasbriel, que fez sinal para os dois apagadores de mentes esperarem. Depois - com uma voz mais suave - ele chegou perto de Martha e tentou explicar:



- A senhorita deve entender o grande risco que isso tudo representa.



Mesmo desesperada, Martha conseguiu um argumento:



- E quanto a famílias misturadas? Eu sei que alguns dos alunos de Hogwarts têm um ou os dois pais que não são mágicos. O que acontece com eles? Eles têm as memórias apagadas também?



- Claro que não. Mas seu caso é totalmente diferente. A senhorita não tem parentes bruxos. Nem vem de uma família... misturada, como disse.



- Mas Severo e eu vamos nos casar! Nós vamos ser uma família misturada! Está querendo me dizer que bruxos não podem se casar com trouxas?



De repente o silêncio deixou o ar tão pesado que alguém poderia cortá-lo com uma faca. Os bruxos presentes pareciam estar cochichando entre si, mas tão baixinho que Martha mal conseguia ouvir, e fungou alto, ainda tremendo. Parecia que ela tinha conseguido causar algum impacto.



- Sr. Gasbriel.



O chamado foi de um bruxo de cabelos grisalhos, que estava sentado na posição mais nobre de toda a sala. Por causa da penumbra, Martha não podia vê-lo direito, mas viu quando ele cochichou algo para Gasbriel. O auror assentiu e virou-se para Martha.



Ela sentiu o coração se acelerar.



- Diga-me, Srta. Scott, quanto tempo pretendia ficar em Hogwarts com o Prof. Snape?



- Para o resto de minha vida. Eu amo Severo.



Ele considerou a pergunta, andando na frente de Martha apenas assentindo.



- Sei. E como pretendia se inserir na vida entre os bruxos?



- Eu me ofereci para ajudar o professor de Estudo de Assuntos Trouxas em suas aulas. O Prof. Dumbledore estava considerando minha oferta.



Gasbriel voltou seus olhos para o bruxo de cabelos grisalhos, e os dois trocaram uma comunicação silenciosa. Martha podia sentir que alguma coisa estava acontecendo.



Mas aí uma outra coisa aconteceu. A porta principal da sala, que ficava bem nas costas de Martha, abriu-se ruidosamente, e uma voz majestosa vociferou:



- O que significa isso?!



Martha reconheceria aquela voz em qualquer lugar do universo:



- Severo!!



Ela se virou o máximo que as cordas lhe permitiam, e viu Severo invadir a sala, os olhos pretos com um brilho simplesmente homicida. Atrás dele, vinha o prof. Dumbledore, que parecia igualmente furioso:



- Eu exijo uma explicação!



A luz na sala se acendeu completamente, e Martha viu o bruxo de cabelos grisalhos se erguer, parecendo nervoso:



- Dumbledore! O que está fazendo aqui?



- Tentando recuperar a noiva do Prof. Snape, é claro! Ah, Cornélio, eu estou mais do que decepcionado com você - com um gesto, o prof. Dumbledore fez desaparecerem as cordas que prendiam Martha, e Severo correu a abraçá-la - O que lhe deu o direito de raptar uma hóspede de Hogwarts?



- Eu sou o ministro da Magia! - Martha arregalou os olhos ao ver que tinha uma autoridade tão importante no caso - É meu dever defender a lei e essa moça é uma ameaça às nossas leis!



- Duvido muito que a jovem Martha sozinha possa efetivamente colocar em risco todo um conjunto de leis que remonta a -



Irritado, o tal Cornélio não deixou Dumbledore terminar:



- Você sabe muito bem o que quero dizer! Ela é uma trouxa, Dumbledore!



- E está noiva de Severo. Você não ignora que ela já deu sua palavra de que respeitará o sigilo de magia.



- Isso não pode ser verdade! - insistiu Cornélio - Snape é um sangue puro, de uma das famílias mais tradicionais do mundo bruxo. Como ele pode estar noivo de uma trouxa como ela?



Martha decidiu naquele exato momento que, ministro ou não, o tal Cornélio definitivamente não era uma pessoa legal. Severo pareceu ser da mesma opinião, pois ele avançou lentamente contra o ministro, e usou sua voz mais ameaçadora:



- Ministro, é melhor retirar o que disse sobre minha futura esposa. A menos que tenha à mão um auxiliar para um duelo.



O tal Cornélio empalideceu bastante.



- Ora, professor, o senhor sabe que eu não quis dizer nada de impróprio.



O Prof. Dumbledore interveio:



- Agora esperamos que tudo esteja esclarecido, então podemos ir. Certo, Cornélio?



Houve um silêncio tenso durante alguns segundos, com todos os bruxos na expectativa, mas Cornélio finalmente aquiesceu, relutante:



- Está bem. Audiência encerrada!



Visivelmente mais satisfeito, o Prof. Dumbledore se virou para Severo e Martha:



- Oh, minha criança, eu sinto muito tudo o que aconteceu. Não preciso dizer que isso foi absolutamente feito sem que eu soubesse de nada. Caso contrário, eu jamais teria permitido.



Martha ainda tremia, agarrada a Severo:



- Eu pensei que fosse perdê-lo... tive muito medo...



- Agora está tudo bem - ele beijou a testa dela - Vamos voltar para Hogwarts.



Dumbledore tirou um boné velho do meio de suas capas douradas:



- Eu também trouxe uma chave de portal. Foi o que eles usaram para raptar você. Basta tocar aqui... isso...



Martha mais uma vez experimentou aquela sensação de ser puxada pelo umbigo, e ficou razoavelmente tonta. Dessa vez, ela conseguiu ver que o mundo se rearrumou ao redor dela precisamente no escritório do Prof. Dumbledore. Ela estava agarrada a Severo, ainda trêmula:



- Ainda bem que voltamos... Oh, foi tão horrível...



- Você foi ótima - disse o prof. Dumbledore - Eles jamais esperavam por aquilo. Acho que pretendiam apenas intimidá-la.



Martha disse:



- Fizeram um ótimo trabalho.



Severo se virou para ela, franzindo o cenho:



- Você está bem?



- Estou cansada. Prof. Dumbledore, sem querer ser rude, eu gostaria de me recolher, com sua licença.



- É claro. Mas por favor, peça a Dobby que lhe traga algo para jantar. Eu sei que você praticamente não comeu nada o dia todo.



Severo ficou impressionado. Realmente, não havia nada que acontecesse em Hogwarts sem que o Diretor ficasse sabendo.



- Só mais uma coisa e vocês poderão descansar à vontade - ele disse, com um brilho maroto nos olhos. - Parabéns aos dois pelo casamento. Tenho certeza de que serão muito felizes, e contem comigo para o que precisarem. Gostariam que eu fizesse o anúncio à escola hoje no jantar?



Severo respondeu:



- Na verdade, senhor, nós gostaríamos de adiar o comunicado por mais uns dias, enquanto iniciamos os preparativos. Há alguns aspectos que nós gostaríamos de lhe falar.



- Certo, então. Agora tenham um bom descanso.



Antes de sair, Martha se aproximou do Prof. Dumbledore e gentilmente lhe depositou um beijo na bochecha muito rosada:



- Obrigada por tudo, professor. Jamais esquecerei o que o senhor fez hoje.



Ele sorriu e Severo a levou para as masmorras, evitando os alunos, que deveriam estar se dirigindo ao Salão Principal para o jantar. De algum modo, aqueles breves minutos no escritório de Dumbledore tinham conseguido acalmar Martha um pouco. Quando ela entrou nas masmorras, Severo logo foi para o laboratório:



- Deixe eu lhe dar uma poção calmante agora mesmo. Você estava tremendo até ainda há pouco.



- Eu já estou melhor, obrigada. Só fiquei assustada e com muita raiva - ela o abraçou - Pensei que fosse perdê-lo, meu amor. Podemos ficar juntos um tempinho?



- Claro. O que você gostaria de fazer?



Martha cochichou diretamente no seu ouvido:



- Quero fazer amor com você e depois tomar um banho bem gostoso de banheira. O que você acha do meu plano?



Ele não pôde evitar dar um risinho:



- Adorei seu plano. Mas você tem certeza, querida? Depois de tudo que você passou hoje, eu pensei que você quisesse apenas descansar.



Ela ergueu a cabeça e disse, séria, olhando fundo dentro dos olhos de ônix que a encaravam:



- Depois de tudo que eu passei hoje, o que eu mais preciso agora é ter você perto de mim, saber que eu sou sua e que ninguém pode nos separar. Não quero esquecer o que aconteceu. Quero que isso nos deixe mais fortes e unidos. Preciso de você, Sev. Mais do que nunca.



Um arrepio de paixão percorreu o corpo de Snape e ele investiu contra os lábios de Martha:



- Eu é que preciso de você. Agora.



- Oh, Sev...



Seus lábios se encontraram, e seus corpos se aproximaram, o desejo intenso queimando nos dois. Os dois se entregaram à paixão e às delícias de um amor impetuoso, sem limites, desesperado - tão desesperado como os dois em reforçar seus laços. Afinal de contas, aquilo tinha sido apenas o início das provas pelas quais eles deveriam passar para conseguirem concretizar seu amor.




Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.