CAPÍTULO XIV



— SIM, MAMÃE, definitivamente estarei lá — ela disse, confirmando mais uma vez para a mãe que poderia comparecer à reunião familiar na véspera do Natal.

Ela havia feito o impensável e deixado de ir às duas últimas, preferindo ficar para ajudar os colegas de trabalho em alguns casos que haviam exigido que ficassem trabalhando durante a época das festas. Poderia ter feito o mesmo este ano, só que não havia tido nenhum assunto requerendo atenção imediata. Na verdade, prometia ser uma semana tão parada, que ela havia folgado.

Não é que não gostasse da família... gostava. E adorava a oportunidade de ver todos os seus primos e primas, só que, às vezes, eles eram lembretes dolorosos de que apenas o trabalho não era o suficiente para fazê-la se sentir realizada. Suas amigas haviam achado maneiras de ter tanto carreiras quanto famílias.

Ela procurava se convencer de que não era nada demais, aos 30 anos de idade, não ter encontrado alguém com quem compartilhar a vida, mas aquele enorme relógio biológico dentro dela, com freqüência cada vez maior, a lembrava impacientemente de que sua hora estava chegando.

Como dissera para Harry na noite anterior, jamais havia conhecido alguém tão interessante quanto ele, mas também entendia que ele tinha razão no tocante ao que ele tinha a oferecer.

Ao terminar as compras de Natal, preparando-se para visitar a família em alguns dias, ela o afastou de seus pensamentos e procurou se convencer de que era melhor que ele não aparecesse esta noite, quando ela estivesse recolhendo donativos. Um rompimento brusco a ajudaria a esquecê-lo, esquecer a paixão que a havia dolorosamente feito enxergar tudo que estava faltando em sua vida.

Mas, ao tirar o traje de Papai Noel do armário e começar a vesti-lo, não havia como negar que parte dela queria vê-lo.







O GLOBO DE cristal repousava sobre a mesa, ao lado do cálice de sangue vazio.

Harry pegou o globo, sacudiu-o, devolveu-o à mesa e ficou assistindo aos flocos de neve falsos girando ao redor do Papai Noel.

Lá de fora vieram as batidas irregulares do sino, chamando-o, mas ele passara a maior parte da noite ignorando-o, procurando se convencer de que atender ao seu chamado só faria trazer nada além de dor para ambos.

Harry sabia que ela não ficaria ali muito mais tempo. Já eram quase 21h e a biblioteca logo fecharia. O fluxo de pedestres cairia drasticamente após isso, deixando-a sem motivos para permanecer ali.

Mas a hora chegou e passou, assim como 22h, e o sino continuava a badalar até que ele não conseguiu mais evitar o seu chamado.

Vestiu-se rapidamente e estava descendo as escadas quando o badalar cessou. Ele também se deteve, achando ter perdido a sua chance, até que o sino começou a tocar a esmo, sem nenhum ritmo, até que o silêncio tomou conta da noite.

Havia algo errado.

Ele desceu apressadamente as escadas e atravessou correndo a rua até chegar ao local onde Annah estava caída no chão, o pote de contribuições virado ao seu lado, moedas espalhadas pelo chão. O sino em silêncio na sua mão.

Ao se curvar para tomá-la nos braços, Harry pôde sentir o cheiro de sangue. Podia ver o vapor se erguendo do centro do corpo dela e se espalhando pela noite. Ele rasgou a parte da frente do casaco de Papai Noel e o sangue de Annah aqueceu a palma de sua mão.

Ela havia sido esfaqueada. O fluxo constante de sangue escapando do corpo da mulher lhe dizia que o atacante dela havia atingido uma artéria.

Harry apertou a ferida com a mão e olhou desesperadamente ao redor, buscando ajuda, mas, devido à hora avançada, a região estava vazia. Ele chamou Dobby silenciosamente e se concentrou no que poderia fazer por Annah.

O rosto dela já estava ficando pálido, À medida que o sangue que lhe dava vida vazava por entre os dedos dele, Harry sussurrou o nome dela, e quando ela não respondeu, repetiu-o um pouco mais alto.

Ela se sobressaltou, as pálpebras tremendo enquanto Annah esforçava-se para recobrar a consciência. Ela sussurrou algo, só que, mesmo com a sua audição de vampiro, ele mal conseguiu escutá-la. Ele a apertou de encontro ao corpo e sussurrou:

— Não me deixe.

Desta vez conseguiu escutar as palavras sussurradas.

— Acredita no destino, Harry?

Ele lhe fitou o rosto e depois abaixou o olhar na direção do sangue que lhe escapava do corpo a uma velocidade alarmante. Dobby chegou, mas deteve-se abruptamente, seu olhar fixando-se na calçada ao lado deles.

Harry acompanhou o olhar do guardião e notou a crescente poça de sangue. Ele fitou os olhos de Dobby e reconheceu a tristeza que encontrou ali.

Ao olhar novamente para Annah, permitiu que o vampiro emergisse e escutou a batida irregular do coração dela, esforçando-se para manter a vida. Desacelerando-se à medida que a vida ia se esvaindo.

As palavras dela não saíam de sua cabeça.

Acredita no destino, Harry?

Destino.

Que jamais lhe trouxera nada além de morte, e aqui estava ele novamente, pensou ao apertá-la nos braços e lhe sentir a vida desaparecendo.

— Harry — disse Dobby pousando uma mão gentil sobre o ombro do patrão.

Este olhou para o guardião, que fez um gesto com a cabeça na direção de Annah, e disse:

— Não precisa terminar desta maneira.

Acredita no destino, Harry?

Ele não ousava ter esperanças. Não ousava acreditar que, desta vez, o destino tivesse um plano diferente em mente. Mas, mesmo ao se esforçar para acreditar, se deu conta de que não poderia hesitar por muito mais tempo. O coração dela fraquejava, e o espaço de tempo entre cada batida estava ficando mais longo. Cada batida estava ficando mais fraca.

Acredita no destino? Harry perguntou-se, mas ao fazê-lo, voltou para o seu quarto de dormir em uma explosão de velocidade vampira e gentilmente deitou Annah na cama.

Ele libertou o vampiro, e curvou a cabeça na direção do pescoço dela, sentindo os últimos vestígios de vida em seu corpo, teimosamente, recusando-se a desistir.

Fincando as presas no pescoço da mulher, ele se alimentou dela e lhe concedeu o beijo derradeiro. Sob suas presas, vieram os primeiros sinais de algo diferente no corpo dela, e ele a tomou nos braços novamente.

As pálpebras dela se abriram hesitantemente e ele rasgou o próprio pulso com os caninos, e levou o pulso à boca de Annah, mas, ao fazê-lo, disse:

— Se não se alimentar agora, a transformação se interromperá.

E você morrerá, pensou, mas nada disse. Sabia que ela entendia, mas não houve nenhuma hesitação quando ela fechou a boca sobre o pulso dele e se alimentou.

O seu corpo respondeu ao contato dos lábios de Annah na sua pele. Ao cheiro do sangue de ambos. Ao olhar para o lugar onde ela havia sido esfaqueada, viu que o sangue havia parado de jorrar. Os poderes de cura do sangue vampiro correndo agora por suas veias já estavam em atividade.

Mas o mesmo podia ser dito da paixão do beijo vampiro. O corpo dele já estava, dolorosamente, duro como pedra.

Ao terminar de se alimentar, ela inspirou ofegantemente e perguntou:

— O que é isto?

— A paixão derradeira — ele respondeu, curvando a cabeça para lamber os restos do sangue dos lábios dela. Ao fazê-lo, sentiu o calor de seu corpo, ultrapassando a capacidade humana, à medida que a transformação prosseguia.

Annah se agarrou aos ombros dele, enquanto tudo ao seu redor e dentro dela mudava com velocidade alarmante. O desejo crescia dentro dela, tanto para possuir quanto para ser possuída, quase doloroso em sua intensidade e sabia que ele sentia o mesmo. Sob as mãos de Annah, o corpo de Harry também tremia enquanto ele buscava se conter.

— Do que tem medo? — ela perguntou.

— Se consumarmos esta paixão agora... poderá haver conseqüências.

A força das emoções, intensas, sombrias e esperançosas, lhe preenchia a voz.

Ela envolveu seu rosto com as mãos, um rosto que havia se tornado querido para ela em poucos, breves dias, e disse:

— Neste caso, permita que o destino o presenteie com vida neste Natal.

Ele murmurou um palavrão, antes de tomá-la nos braços e levá-la até o banheiro, onde gentilmente a despiu, descartando a fantasia de Papai Noel e as roupas de baixo sujas de sangue.

Quando ela se postou diante dele, nua, o corpo ardendo de desejo e manchado de sangue, ele a tomou nos braços e sussurrou:

— Jamais se arrependerá desta escolha.

Ele estendeu a mão para além dela, para as portas de vidro do enorme chuveiro, e as abriu. Entrou com ela no boxe e ligou a água, que jorrou sobre eles vinda de todos os lados, lavando toda e qualquer evidência da violência anterior. Tudo que restava do ferimento a faca era uma linha rosada sobre o abdômen.

Devido à temperatura elevada da água, o vapor logo encheu o boxe do chuveiro, mas, devido às mudanças que ocorriam dentro dela, Annah estava toda arrepiada. Quando ele a abraçou, seu corpo era ainda mais frio, e ela estremeceu.

Ele encostou a testa na dela.

— Isso é o ardor do vampiro. Quando a transformação estiver completa, você o sentirá apenas quando deixar o demônio assumir o controle.

Ela entendeu que, quando o humano estivesse no comando, o frio da morte marcaria sua pele, pois ela estaria...

Morta.

Caso ele não a tivesse transformado como ela havia pedido, sua vida estaria acabada. Mas não estava, e nos braços dele havia a promessa de ainda mais.

— Faça amor comigo, Harry — ela disse, pousando a mão sobre o coração dele, que batia fortemente sob seus dedos.

Sempre mostrando consideração, ele começou a dizer:

— Você tem...

— Certeza? Mais do que imagina.

A tensão deixou o corpo dele sob a mão dela, do mesmo modo que a hesitação foi embora com a água que lhes descia pelos corpos.

Ele curvou-se e a beijou, abraçando-a com força de encontro ao corpo ao lhe devorar a boca com a sua, murmurando suaves palavras de amor em uma língua que não exigia tradução.

Ambos estavam respirando ofegantemente quando ele se abaixou para lhe sugar os seios e intensificar o desejo que já explodia dentro dela. Ela implorou que ele a preenchesse ali mesmo, não vendo a necessidade de mais preliminares, e Harry obedeceu, colocando uma das coxas entre as dela e encontrando o centro de Annah. Lentamente, ele se colocou dentro dela, alargando-a e incendiando-a ainda mais ao penetrá-la.

Ela lhe agarrou os ombros e lhe envolveu a cintura com as pernas, aprofundando a posse.

Ele gemeu e espalmou uma das mãos na parte inferior das costas dela, enquanto apoiava a outra na parede do boxe do chuveiro. Fitou-a nos olhos ao mexer os quadris, e fez força para cima, arrancando um suspiro de surpresa de Annah devido a potência de sua arremetida.

— Eu a machuquei, cara mia? — ele perguntou, mas não esperou uma resposta antes de inclinar a cabeça e lhe tomar na boca o mamilo intumescido.

Ela lhe segurou a cabeça com uma das mãos, usando a outra para se equilibrar, ao mover os quadris e montá-lo, a temperatura elevada da água em nada se comparando à que tomava conta de seus corpos.

O clímax que veio foi rápido e castigador, deixando-os agarrados um ao outro, como se a separação pudesse causar dor.

E talvez pudesse, ela pensou, abraçando-o com força ainda maior, mesmo após ele já ter lhe deixado o corpo.

Harry, também, se recusava a perder esta ligação, visto que, de algum modo, conseguiu agarrar uma toalha, para envolver com ela os corpos úmidos fundidos um no outro. Ele voltou à vida, mais rápido do que ela pensara ser possível. Quando a penetrou novamente, ela ainda estava úmida e sensível devido a cópula anterior.

A fricção de Harry se movendo dentro dela logo levou Annah ao apogeu, mas ele permaneceu duro como pedra ao caminhar com ela de volta para a cama e pousá-la em sua beirada, de modo a poder tocá-la enquanto continuava suas carícias lentas e atormentadoras.

Quando ele lhe acariciou novamente os mamilos, torcendo-os com os dedos, ela chegou novamente ao apogeu, seu corpo arqueando para fora da cama, implorando mais, e ele lhe fez a vontade, descendo uma das mãos para fazer pressão sobre seu clitóris. Esfregando-o, e intensificou o prazer que se espalhava pelo seu corpo até que ele deu uma última arremetida para dentro dela e também chegou novamente ao clímax. O corpo dele estremeceu devido à intensidade de seu prazer.

Ao largar-se sobre ela, Harry estava estremecendo, e Annah pôde sentir o calor de seu corpo.

Ao se erguer com uma das mãos, ele estava usando o seu rosto de demônio, e algo no íntimo dela respondeu. O ardor explodiu no seu âmago, quase lhe incendiando o corpo, tamanha a sua intensidade. Ela sabia o que ele queria, o que era necessário para encerrar a cópula, mas mesmo assim, ele pediu.

— Morda-me, cara mia. Torne-me seu — ele disse, e ela ergueu a cabeça e fincou as presas no pescoço dele.







— TEM CERTEZA de que quer fazer isso? — ele perguntou, pousando a mão possessiva sobre a barriga dela.

Annah descansou a mão sobre a dele, sabendo, assim como Harry, que uma nova vida crescia dentro dela. Fazia apenas dois dias desde que ele a havia transformado, mas, neste ínterim, ela rapidamente se dera conta do quanto um vampiro estava ciente, não só do mundo à sua volta, mas das condições e de todas as necessidades do próprio corpo.

Foi como soube que o destino havia lhe concedido um presente maravilhoso naquele Natal.

Instantes mais tarde, a porta se abriu, e sua mãe os recebeu com um sorriso alegre no rosto.

— Filha. Não me disse que ia trazer alguém.

Annah sorriu, e entrelaçou os dedos aos dele.

— Mamãe, quero que conheça Harry.







FIM

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