Um pai



Harry entrou em choque.
Não conseguia se mover, não encontrava forças para pensar.
Sentiu uma tontura e sua cicatriz doeu um pouco.

Por um impulso, levantou-se e começou a andar de um lado pro outro com a mão na testa.
Quem Dumbledore pensava que era?
Como ele podia brincar com uma coisa dessas, sabendo que a morte de seus pais o machucavam tanto?

-Harry – Dumbledore disse com o mesmo tom calmo – Sente-se, por favor.

Harry passou a mão no cabelo e andou mais rápido.

-Por favor – insistiu Dumbledore – Tente se acalmar para que eu possa lhe contar tudo.

-Se acalmar! – berrou Harry – Como você pode me pedir para eu me acalmar!? Meu pai está vivo! Ele não morreu e você sempre soube disso!

-Você tem todo o direito de se irritar comigo, mas precisa ouvir o que eu tenho para falar.

-NÃO – Harry explodiu – EU NÃO QUERO OUVIR! DURANTE TODO ESSES ANOS EU CONVIVI COM A DOR DE NÃO TER MEUS PAIS! DURANTE TODO ESSE TEMPO EU SOFRI QUE NEM UM IDIOTA! EU CHORAVA QUASE TODAS AS NOITES POR ESTAR SOZINHO! POR NÃO TER NINGUÉM! E AGORA VOCÊ VEM DIZER QUE MEU PAI ESTÁ VIVO!? NÃO!! VOCÊ NÃO TINHA O DIREITO DE TER MENTIDO PRA MIM! NÃO TINHA!

Harry sentiu o mundo cair em suas costas e se ajoelhou.
Então, começou a chorar sentindo uma dor enorme invadir seu coração.

-Sinto muito – Dumbledore disse num tom triste.

Harry soluçava e se sentia cada vez mais fraco.

Ficou algum tempo lá, abaixado e chorando. Tentando esquecer de todos os seus problemas. Tentando ser alguém normal, como Rony, como Hermione...ou até mesmo como Neville.

Por um lado, Harry sentia vontade de sorrir, de sair abraçando todo mundo, de gritar para o mundo o quanto amava Hermione...porque sim, ele tinha um pai. Tiago estava vivo, seu pai estava ali presente...ele não estava sozinho como pensava estar...ele tinha alguém. Isso confortava Harry nos segundos que ele pensava em cometer uma loucura. Como por exemplo, abandonar tudo e fugir.
Seria muita idiotice fugir assim...mas pelo menos ninguém poderia o surpreender com mais alguma verdade sobre sua vida que nem ele mesmo sabia.

Harry se levantou e andou até a janela.
A escuridão cobria todos os arredores de Hogwarts. A única iluminação era a lua que brilhava intensamente.

Harry tirou os óculos e enxugou os olhos. Respirou fundo e se virou para Dumbledore que o fitava atento.
Dirigiu-se até a cadeira e se sentou.

-Eu quero saber de tudo – disse com a voz rouca.

-Vai saber – Dumbledore disse balançando a cabeça – Você saberá de cada detalhe, Harry. Mas acho melhor o seu pai lhe contar.

Harry sentiu uma faca entrar pela sua barriga. Seu coração começou a bater tão rápido que ele mal conseguia respirar. Sentiu uma tontura muito pior que a anterior.

-Meu...p-pai? – perguntou lentamente.

-Sim. Acho que ele que precisa lhe contar tudo.

-Eu não quero...eu...- Harry disse franzindo a testa – Acho melhor não...eu tenho...

-Medo? – Dumbledore completou.

-Muito. Muito medo – o garoto confessou.

-Posso lhe garantir que você o conhece muito bem.

Dizendo isso Dumbledore fez um sinal para Fênix que saiu voando levemente e passou pela porta.

-O que ela foi fazer? – Harry perguntou tremendo – Dumbledore, por favor...não quero ver ele agora.

-Harry, eu sei como isso está sendo difícil para você. Mas não pode fugir disso. Não pode. Ele é o seu pai. E vou te dizer uma coisa...ele vem esperando por esse dia desde que você escapou de Voldemort...a mais de 17 anos.

Harry tentou fazer com que suas mãos parassem de tremer, mas era impossível. Cada segundo que passava era uma tortura e parecia durar uma eternidade.
Quando Harry se imaginaria numa situação dessas?
Ele iria ver seu pai.
Seu pai que ele pensava estar morto até meia hora atrás.

Fênix voltou voando e pousou.
Dumbledore acariciou o bico da ave.

-Ele está vindo – disse calmamente.

Harry fez menção de abrir a boca para dizer alguma coisa, mas as palavras não saíram.

-Não se preocupe, tudo vai dar certo – Dumbledore disse percebendo o nervosismo de Harry.

Harry que não tinha muita escolha balançou a cabeça afirmativamente.

O silêncio predominou ali até que Harry ouviu passos.

Suas mãos tremiam cada vez mais e ele não conseguia tentar parecer calmo. Estava suando e sentia seu rosto cada vez mais quente.

Os passos iam ficando cada vez mais próximos...a mão de Harry tremia cada vez mais...os passos se aproximavam...Harry agora sentia que suas pernas também tremiam...os passos estavam cada vez mais próximos...até que pararam.

Havia alguém ali, Harry sabia que havia.

Dumbledore ergueu as sobrancelhas e balançou a cabeça para que ele entrasse.

Harry não conseguia se mover. Não tinha coragem de olhar e encarar a verdade...não tinha coragem de ver o seu pai.

Sentiu a presença do homem se aproximar. Percebeu que o mesmo havia se sentado do seu lado.
Mas Harry não conseguia olhar, não conseguia virar o rosto e ver como seu pai estava.
Foi a primeira vez na vida que sentiu tanto medo assim.
Nem quando enfrentara Voldemort ele sentira o que estava sentindo.

Você está sendo um idiota! , Harry pensou, ainda imóvel, Você tem um pai...você realmente tem um pai...você irá conhece-lo...pare de ser panaca...vamos vire e veja quem é...vamos vire, vire, vire, vire, vire...

Harry não agüentava mais aquelas palavras ecoando na sua cabeça.

Por um impulso, virou o rosto e o viu.
Finalmente o viu.

Harry se levantou da cadeira e levou a mão até a boca.

-Lupin! – o garoto gritou se afastando até a janela.

Lupin mordeu o lábio inferior e respirou fundo. Parecia mais nervoso que Harry.

-Harry...filho – ele murmurou com os olhos lacrimejando.

-Filho? – Harry perguntou agora mais confuso do que nunca – Que brincadeira é essa?

Lupin olhou para Dumbledore pedindo ajuda.
O diretor se levantou e andou até a porta.

-Vou deixar que seu pai lhe explique tudo, Harry – disse se virando e descendo as escadas.

Silêncio.
Silêncio durante alguns minutos.

Harry não conseguia dizer absolutamente nada. Não tinha coragem de perguntar tudo que estava entalado...tinha medo das respostas.

Até que Lupin tomou iniciativa e fitou Harry.

-Por favor, sente-se – disse com a voz pouco rouca.

-Estou bem aqui – Harry disse trêmulo.

-Certo. Eu vou te contar tudo. Tudo que você merecia saber desde o começo.

Harry o fitou. Seu coração estava a mil e o garoto achou melhor sentar na cavidade da janela, pelo fato de suas pernas estarem tremendo demais.

-Não sei como te explicar isso...é complicado – Lupin começou a dizer – Por isso eu começo e você pergunta tudo que quiser, certo?

Harry balançou a cabeça concordando.
Ele até perguntaria se conseguisse falar alguma coisa.

-Eu e Lupin...nós trocamos de corpo.

-Como? – Harry perguntou baixinho – Você e Lupin...quer dizer você é o Lupin...

-Não sou. Eu sou Tiago Potter. Seu pai.

Harry deu um suspiro nervoso e passou a mão no cabelo.

-Não pode ser...você é o Lupin...aquele cara que nos deu aula de Defesa Contra as Artes das Trevas no terceiro ano...cara, você não pode ser meu pai!

-Eu troquei de corpo com Lupin.

-Como assim? Por favor, me conte tudo – Harry disse ainda com a voz trêmula. Mas se sentia um pouco melhor por estar conseguindo dizer o que sentia.

-Ele sabia que Voldemort iria atacar eu e sua mãe. Como Lupin era sozinho...não tinha uma família disse que trocaria de corpo comigo...para me salvar. Tínhamos também um outro membro da Ordem...uma amiga de sua mãe...que também queria trocar de corpo com ela...mas sua mãe...ah, Harry ela era tão teimosa – ele dizia fazendo uma força horrenda para não chorar – E ela...ela não aceitou...eu...eu também não...afinal, eu não agüentaria viver sem ela.
“Estava tudo certo. Arrumamos um esconderijo, mas como você sabe nos entregaram. O tempo era curto demais, Harry. Quando mal esperávamos, Voldemort estava dentro de casa.
Eu tentei...tentei trazer Lílian para o andar de baixo...mas Voldemort não me deixava entrar...eu joguei naquela maldita porta todos os feitiços que eu conhecia mas ela não abria – agora ele não segurava as lágrimas – Eu tentei chegar até a janela, mas não conseguia enxergar nada, absolutamente nada. Foi quando eu estava voltando para dentro de casa que ouvi o grito da sua mãe. Eu...não conseguia pensar em nada...não conseguia me mexer...até que Lupin chegou correndo pela porta do fundo. Eu estava decidido a morrer...já que eu achava que Voldemort havia matado você e sua mãe. Eu não achava certo Lupin, um dos meus melhores amigos, morrer no meu lugar...não era justo.
De repente...eu, eu ouvi um choro...o seu choro Harry...e mesmo sabendo que eu havia perdido Lílian eu fiquei tão feliz quando percebi que você não estava morto que nem pensei em como isso havia acontecido.
Foi aí que Lupin me convenceu. Ele disse que eu ainda tinha você...que eu não tinha te perdido...e que eu não podia te abandonar aqui.
Foi tão rápido, Harry...eu mal consegui me despedir dele...Voldemort estava se aproximando...eu só me lembro de ver Lupin em meu corpo...ajoelhado na sala, esperando pela morte.”

Harry estava intacto.
Agora entendia tudo!
Tudo fazia sentido!

-Por que você não voltou para me buscar? – o garoto perguntou baixinho.

-Dumbledore apareceu logo depois e pediu que ficasse com você...que era perigoso eu tentar te criar...já que Voldemort poderia descobrir o que eu e Lupin fizemos.
“Então eu te entreguei a Dumbledore. Pensando na sua felicidade, tudo pelo seu bem, Harry. Eu não queria te colocar em risco algum.
Eu venho, desde aquele dia, te acompanhando de longe...eu vi o seu primeiro dia no colégio...eu vi que você ganhou o prêmio de melhor redação na quinta série...eu até lembro que você ficou triste porque Valter e Petúnia não compareceram...mas eu estava lá. Eu sempre estive com você. E quando...quando eu vim te dar aula...ah céus...eu vi como você é inteligente...como você tem força de vontade e talento.”

Harry sorriu por uma fração de segundos e limpou as lágrimas que deslizavam em seu rosto.

-Eu não entendo – ele disse ainda abalado – Como...

Mas a antes que Harry pudesse terminar o que dizia, Tiago o interrompeu.

-Eu que dei a capa de invisibilidade a Dumbledore e pedi que ele lhe entregasse.
“Eu que dei a chave do nosso cofre em Gringotes a Hagrid. Para que você não passasse necessidade nenhuma.”

-Mas...no quarto ano...eu vi o meu pai...bom, pelo menos o corpo dele sair da varinha quando eu estava lutando com Voldemort...como se você não está morto?

-Os fantasmas assumem a forma física que tinham na hora da morte. Isso significa que como Lupin estava no meu corpo, ele ficou parecendo ser eu...mesmo depois de morto.

-Isso...é muito...confuso – Harry disse com dificuldade.

-Eu sei que é – Tiago disse se aproximando – Mas eu sei também que você tem os olhos da sua mãe...e que você é o meu filho...a pessoa que mais me importa no mundo. Eu sei que é difícil...mas eu quero que saiba que eu não te abandonei em momento algum...só fiz o que achava melhor pra você...e por um lado foi. Você veio para Hogwarts...fez amigos maravilhosos, mostrou que joga quadribol tão bem quando eu – ele disse dando uma risada discreta – E mostrou que é muito, mas muito corajoso. Ah e outra coisa, essa sua mania de levantar a sobrancelha, você puxou de mim.

Harry deu uma risada e olhou para o teto.
Seu pai estava ali na sua frente.
Ele podia ver que Tiago era tudo aquilo que ele sempre achou que fosse.
Harry sentiu uma vontade imensa de chama-lo de pai. Sabia que seria difícil dizer aquelas palavras, mas ele queria tentar.

-Ah...p...p...p-pai – ele disse finalmente sorrindo.


Por um impulso deu um abraço forte em Tiago.
O abraçou tinha toda a vontade que ele sempre teve de abraçar seu pai.
Estava tão feliz que mal percebeu que a corrente que Hermione lhe dera estava brilhando intensamente...e a cor era vermelha.

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