Esquadrão de Salvamento

Esquadrão de Salvamento



Capítulo Trinta – Esquadrão de Salvamento

Sem dúvida alguma, ver alguém chamando outra pessoa olhando para um espelho sempre me parecera algo razoavelmente anormal de se fazer. Mas Black fazia isso com uma segurança tão chocante que eu não pude deixar de acreditar que aquilo adiantaria de qualquer...

Meus pensamentos foram cortados quando vi uma névoa se revoltando atrás do espelho, assim que o reflexo de Black desapareceu. Olhei então de relance para Snape; ele estava olhando fixamente para algum ponto distante no corredor. Apesar de achar sinceramente que minha atuação com ele fora maravilhosa, eu ainda estava muito surpresa de ver que os efeitos haviam sido realmente significativos.

Por fim, Black curvou-se mais sobre o espelho, de pura ansiedade, quando a névoa se dissipou completamente. Meu queixo caiu enquanto eu via o rosto de Potter enchendo o vidro, com um sorriso despreocupado e um toque malicioso nos olhos.

-E então, Almofadinhas? – disse ele, em tom tranqüilo. – Onde você se meteu, hein? O Aluado estava te procurando agora há pouco, ele disse que você tinha saído da Grifinória com a Lílian... Vocês não...? – acrescentou ele, erguendo uma sobrancelha.

-Ah, cale a boca, Pontas – sibilou Black, protegendo o espelho com o outro braço e me olhando de relance. – A Evans está comigo sim, mas nada que a sua mente corrompida possa imaginar. Escute, nós precisamos de ajuda...

Ele disse isso num tom tão sério e tão compenetrado que a expressão de Potter, pelo que eu conseguia ver, mudou completamente.

-Onde vocês estão? – interrogou ele, quase esfregando a cara no que quer que ele próprio estivesse olhando. – Ei... Isso aí mais parece uma masmorra! Vocês estão perto da Sonserina?

-Um pouco mais longe do que isso – Black replicou, nervosamente, com outro olhar na direção de Snape, que nem se mexia. – Escute, nós fomos apagados, estamos em uma cela na...

Mas Potter o interrompeu, um segundo depois de eu ter criado coragem para me esticar sobre o ombro de Black para observar o espelho.

-Lil... Evans! Por Merlin, o que fizeram com ela? – ele quase gritou, de onde parecia ser o dormitório masculino da Grifinória ao fundo. Franzi a testa. – Parece que você viu uma quimera! Diabos, Sirius, quem levou vocês até aí?

-Os sonserinos nos pegaram e nos prenderam aqui – relatou Black num único fôlego. – Arrume ajuda. Eu... Acho que podem nos matar a qualquer momento; mas ouça, estamos na Mansão dos meus...

-Os Comensais da Morte estão vindo – Snape cortou-o, virando-se imediatamente para nós com a expressão mais vaga deste mundo.

-Estamos na Mansão Black, Potter! – quase gritei, quando os sons de vários passos conjuntos confirmaram a informação de Snape.

Mas quando voltei meu olhar para o espelho, o rosto de Potter estava difuso e sumindo.

-Potter! – exclamei, perdendo o controle ao ver sumir nossa única chance de escapar. – Que diabos está acontecendo?

-Essa droga de Magia Negra que infesta a casa! – sibilou Black, enquanto o rosto do outro sumia cada vez mais rápido; e cada vez mais rápidos se aproximavam os Comensais. Snape apontou a varinha para o espelho.

-Se não sumirem com isso agora vou partir essa porcaria em pedacinhos!

Quando o espelho voltou a refletir o rosto de Black, meus ombros se curvaram de vez e deixei escapar um sussurro desanimado.

-Adeus, Tiago...

Black girou depressa a cabeça para me lançar um olhar enviesado.

-Você foi apaixonada por ele o tempo todo, não é?

Virei-lhe as costas e bufei; com outro olhar para Snape, que transparecia urgência, apressei-me em voltar para o mesmo lugar onde despertara. Afinal, se ele não nos denunciasse, seria uma ingratidão deixar os outros descobrirem que ele tinha nos ajudado. Sabe-se lá por quê motivo exato.

Ao aceitar que os passos duros que ecoavam no corredor de pedra estavam a segundos de nos alcançar, olhei fixamente para Black e falei, num único suspiro:

-Já que vamos morrer, acho que você pode saber que o tempo todo, desde antes de eu mesma perceber, desde sei lá quando, eu sempre fui apaixonada por Potter. E se você der risada, juro que te mato antes que qualquer bruxo das trevas possa fazer isso. – acrescentei, na defensiva.

Talvez pela ameaça, talvez por não achar graça de verdade, Black não demonstrou reação alguma. Logo depois, Snape deu um passo para trás e um grupo de cinco Comensais, sendo dois deles Malfoy e Rodolfo Lestrange, parou diante das barras de ferro. Encolhi-me onde estava.

-Está na hora – disse num dos Comensais, com uma voz grave que parecia pertencer a um homem feito, bem mais velho do que os outros que eu já havia encontrado. Inclinei-me um pouco para a frente, tentando ver o rosto dele, mas não consegui nada.

Malfoy, com um sorriso triunfante, sacou a varinha e abriu a porta da cela; Black e eu trocamos um olhar sonhador, mas logo desistimos, vendo os outros Comensais entrarem atrás dele. Se ao menos tivéssemos nossas varinhas...

Estremeci em nojo quando Malfoy me puxou pelo braço, soltando-me das amarras a que eu ainda me segurava por fingimento. Ele segurou minhas mãos nas costas, como antes estavam; ah, eu daria qualquer coisa pra que aquele serzinho nojento me soltasse! Enquanto isso, Lestrange e outro deles se ocuparam em conter Black, que uma vez puxado de seu leito, debateu-se inutilmente, mais para demonstrar que não ia se entregar do que para tentar fugir de verdade. Os outros dois Comensais que restavam apontavam as varinhas para nós, enquanto Snape assistia tudo do mesmo lugar, imóvel.

Tentei não baixar a cabeça conforme Malfoy me empurrava para fora, ainda com aquele maldito sorriso estampado no rosto. Ninguém além de mim mesma ouviu o que ele sussurrou, desconfortavelmente próximo do meu ouvido.

-Onde estão seus preciosos amiguinhos sangues-ruins agora?

Não deveria ser uma resposta, mas tentei me afastar dele e acabei deixando escapar uma bufada irritada.

-É melhor começar a sentir medo – ele continuou provocando, enquanto eu pisava no corredor gelado de pedra. – Ou pode acabar caindo de costas apenas com o choque...

Não perguntei a que choque Malfoy se referia; só podia significar uma coisa. Nós estávamos sendo levados ao próprio Você-Sabe-Quem, ao Lorde das Trevas, ao Senhor Escuro, Àquele-Que-Não-Deve-Ser-Nomeado... Estávamos sendo arrastados direto para Voldemort.

Olhei de relance para Black, que estava decidido a não se entregar nunca às mãos dos Comensais da Morte; ele se debatia e xingava e gritava, como se tivesse esperança de que alguém lá em cima o ouvisse. Entretanto, até eu sabia que ninguém na casa dele se importaria se ele morresse.Afinal, ele era o unicórnio negro da família. Tão diferente e tão impossível quando um unicórnio negro. De certa forma, matutei, enquanto Malfoy me empurrava e outro Comensal apontava a varinha para mim, Black tinha que ser admirado. Era inútil o que ele fazia, isso era verdade; mas quantas pessoas em todo o mundo bruxo teriam coragem o suficiente para tentar e lutar pela vida até o final como ele estava fazendo? Baixei a cabeça, perguntando-me que espécie de grifinória eu era, que não conseguia reunir ânimo nem esperança para fazer o mesmo.

De um Maroto, meu pensamento voou para outro. Será que Tiago havia ouvido direito onde nós estávamos? Será que naquele momento ele estava correndo para a sala do Prof. Dumbledore para que ele viesse nos salvar? Quem sabe, se o diretor descobrisse onde estava Você-Sabe-Quem, ele poderia vir e destruí-lo de uma vez por todas?

Uma lufada do ar gelado que enchia o corredor me fez voltar à realidade e olhar para os lados. Havia várias outras celas, todas vazias naquele momento, e a cada três celas havia uma pequena escadaria do lado oposto, que eu não sabia onde poderia dar. Não, de que adiantaria pensar naquilo tudo? Antes que Dumbledore pudesse chegar, Black e eu já estaríamos em pedacinhos sangrentos espalhados aos pés dele...

Enquanto Black continuava resistindo bravamente, passei alguns instantes mais pensando em Potter. Certo, então eu ia morrer. E ele? Será que sentiria minha falta? AH! Que coisa mais idiota de ficar se perguntando a segundos da morte, Lílian Evans! Francamente! Suspirei baixinho. No final das contas, por que eu havia sido tão ridícula com Tiago, com Potter, tanto faz, o tempo todo? Fazia séculos que eu gostava dele. E pior, a palavra gostar era insuficiente pra dizer o que eu sentia por ele. Ele simplesmente parecia ser perfeito pra mim... Se eu não fosse tão cabeça dura e se ele fosse menos infantil, poderíamos... O que estou dizendo? A culpa foi toda minha. Quando ele virou o mundo de ponta cabeça pra tentar ficar comigo, tudo que eu consegui fazer foi chamá-lo de idiota retardado e sair correndo, antes que pudesse mudar de idéia! Eu tinha caído naquela velha armadilha do destino de novo, de desejar ter feito tudo diferente antes de dar adeus à vida...

Meu coração quase parou quando chegamos ao final do corredor, de frente para uma porta fechada, feita de algum metal muito pesado e escuro. O Comensal que apontava a varinha para mim virou-a para a maçaneta e assim que sua varinha emitiu um pequeno jato de luz verde-ácido, a porta rangeu levemente e abriu-se. Sem resistir à curiosidade, estreitei os olhos para as sombras projetadas no chão de lajotas. Engoli em seco, e Black finalmente caiu em silêncio.

Nós dois fomos puxados para dentro; era uma câmara assustadora, pouco diferente das celas pela qual tínhamos acabado de passar. Entretanto, uma diferença era gritante: havia Comensais da Morte altos e mascarados cobrindo cada polegada de parede, em suas vestes negras, sobre as quais incidia parte da luz dos archotes acesos ali. Antes que eu pudesse completar meu exame do lugar, Malfoy me empurrou com selvageria e eu fui arremessada de joelhos no meio do círculo; o cabelo que não grudara ainda no meu pescoço suado me caiu sobre o rosto, quando Black também passou pelo mesmo processo.

Num momento muito vagaroso, que pareceu durar toda a eternidade, eu ergui a cabeça, sentindo um olhar muito forte sobre mim. No fundo, eu sabia quem era, sabia o quê era, mas eu tinha que olhar por mim mesma... O universo pareceu parar junto com o sangue em minhas veias quando eu vi o bruxo que estava sentado em uma cadeira tão imponente quanto um trono.

Voldemort tinha a face distorcida; eu me perguntei ligeiramente se alguém poderia ser tão assustador por si mesmo. Tinha um nariz pequeníssimo, prestes a desaparecer sob os ossos, olhos vermelhos estreitos e gelados; quando encarei-o, senti um arrepio percorrer toda a minha espinha, desde a nuca. Ele era tão branco, tão pálido, que quase decidi que só poderia ser um fantasma. Mas não... Um fantasma nunca poderia me fazer sentir indefesa, fraca e inútil, apenas em olhar para mim...

O olhar dele desviou-se para Black, que o encarava ainda furiosamente, ainda que continuasse calado. A porta se fechou e os cinco Comensais que nos buscaram completaram o círculo medonho.

-Então finalmente nos encontramos – o Senhor Escuro disse, numa voz tão fria, tão cadavérica, tão desdenhosa que eu só pude estremecer mais ainda; depois engoli em seco e tentei recuperar o controle de mim mesma. Já que eu ia morrer, não ia me entregar, também. O olhar dele escorregou sobre mim outra vez, e eu resisti ao impulso de me encolher. – Devo dizer que ouvi um grande falatório sobre vocês... e outros. Sendo assim, segui à risca as normas de etiqueta e os trouxe, para uma pequena diversão.

Alguns dos Comensais mais altos riram quando ele disse isso. Eu, claro, não achei a menor graça, sabendo muito bem a que tipo de diversão ele se referia. Meu queixo tremia, e eu me senti como se só a presença dele roubasse minha energia. Qualquer esperança que eu pudesse ter alimentado, já estava muito longe dali. Não havia como escapar... Eu era fraca demais, o poder dele era imenso, quem era eu para...

-Creio que a princípio o rapaz Black não estava nos planos – ele continuou, com um olhar de relance para onde estavam os Comensais atrás de nós. – Não me agrada a idéia de ser obrigado a resolver problemas disciplinares... De qualquer forma, você também já se tornou uma anomalia. Uma sangue-ruim e um amante de trouxas traidor de seu sangue me parecem uma boa pedida para a noite... Sem dúvida....

Black sibilou algo, ao meu lado. Entretanto, eu não entendi completamente. Mas acabei não passando curiosidade, pois ele fez questão de repetir:

-Creio que tenho uma noção bem mais clara do que seja uma anomalia! – gritou, e sua voz ecoou nas paredes. Senti vontade de enfrentar o bruxo que nos ameaçava, também. Mas no auge do meu sentimento de insignificância, não consegui pensar em nada para dizer.

-Ora, vejam só isso – disse o... o... Voldemort, num tom de escárnio. – Parece que já sabemos por onde começar.

Ele ergueu uma mão, segurando sua própria varinha nela. Senti tanta piedade de Black quanto seria possível então.

-Crucio!

Ele começou imediatamente a gritar e a se contorcer, sacudindo-se como se subitamente estivesse sendo atacado por todos os Comensais da Morte ali presentes. Senti uma aflição enorme em vê-lo daquela forma. Até cheguei a me erguer um pouquinho, como se quisesse correr até ele e fazê-lo parar, de algum jeito que na verdade eu não conhecia, mas justamente essa ignorância me fez ficar onde estava. Os Comensais à nossa volta riam de se acabar, e mesmo que houvesse cerca de trinta Comensais ali, as risadas fizeram parecer que o lugar estava cheio com pelo menos o triplo deles.

E então, tão facilmente quanto começara, Voldemort baixou a varinha e Black caiu jogado, estirado no chão, ofegando e gemendo, com o rosto contorcido na dor que restara da maldição.

-Agora nossa estimada Srta. Evans... – o Lorde das Trevas sussurrou cruelmente, girando devagar sua varinha, apontando-a diretamente para mim... – Crucio!

Todo o lugar onde eu me encontrava desapareceu; e só havia dor e dor e mais dor no mundo. Acho que gritei, acho que me contorci, acho que urrei, com tanta ou mais força do que Black fizera. Eu estava sendo rasgada, partida em pedaços, meus nervos pulsavam e dores agudas tornavam cada segundo impossível de viver... Não... Ao longe eu ouvi mais risos, talvez fossem dos Comensais, talvez não, eu só conseguia ter consciência de uma coisa... Daquela dor insuportável... Por favor, que ele pare logo... Eu não vou resistir... Não vale a pena continuar vivo... Acabe logo com isso...

Logo, eu não tinha mais energia nem mesmo para continuar gritando e me debatendo... Talvez agora não faltasse muito... Quem sabe eu já estava perto e então, nunca mais sentiria dor de novo... Nunca mais sentiria nada...

Senti então que jogavam sobre mim um balde de água gelada, quando voltei à realidade, de cara contra o chão de pedra, com todos os meus músculos latejando e pulsando. O contorno dos meus olhos, que eu forçara a fecharem-se, formigava desconfortavelmente e eu tive a impressão de que desmaiaria a qualquer momento. Quem sabe depois eles simplesmente me matassem... E então eu não teria mais que passar por aquilo...

Entretanto... Por que tudo havia parado? Outra rajada de vento me arrepiou o pescoço, e ela me pareceu material demais para ser causada pelo olhar de... de Voldemort... Procurei reunir forças para girar o corpo. Depois de um longo momento, virei-me e entendi porque de repente o tempo tinha parado.

A porta por onde Black e eu outrora havíamos sido jogados estava aberta outra vez. E aos pés de Voldemort estavam jogados outros três montes maltratados de vestes. Primeiro não acreditei no que estava vendo, depois tive certeza de que simplesmente não podia estar sonhando.

-Então quer dizer que temos mais visitas... – sibilou Voldemort, observando divertidamente Tiago, Alice e Frank, recém-jogados aos pés dele por algum Comensal qualquer.

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