Para Manter a Rotina



Água e Vinho





Capítulo Oito - Para Manter a Rotina




Passado o choque, eu retomei o caminho para a sala comunal como se nada tivesse acontecido. Pelo menos era isso que eu acreditava estar demonstrando. Isso porque, poucos minutos depois de eu ter chegado, Remo estava passando pelo buraco do retrato da Mulher Gorda.



Ele me olhou e pareceu ter tomado um grande susto. Então, apenas respirou fundo e falou:



-Bom, acho que não preciso dizer nada. Você deve ter visto o mesmo que eu.



-Sim, eu vi. Mas não tenho certeza se estou sabendo o mesmo que você sobre aquilo.



Remo estranhou o que eu havia dito.



-Por que diz isso?



-Seus amiguinhos infernais estavam aos cochichos no jantar. Frank me disse que tinha um plano para... Não importa, mas o que ele disse foi que Black o estava ajudando. E tudo isso me parece muito suspeito.



-Ah...-murmurou Remo.-Sim, talvez eles tenham algo a ver com aquilo. Frank nunca faria uma coisa dessas se não fosse pelo bem de um... Plano, como você disse.



Eu me levantei da poltrona onde me sentara não tinha nem cinco minutos.



-Acho que nós temos que voltar lá. Imagine o escândalo quando os alunos do primeiro ano forem voltar do jantar.



-Não precisa -disse Remo.- Hoje o primeiro ano tem Astronomia, não vão vir pra cá depois do jantar.



Fiquei quieta por um momento, imaginando se Black teria pensando nesse detalhe ou apenas dera muita sorte. Se o primeiro ano fosse parar naquele corredor aquela hora, provavelmente ficaria olhando os dois como se fossem elefantes acasalando num jardim zoológico.



-Bem, então...



-Não há nada que possamos fazer.



-É, isso mesmo. Temos que deixar que esse tal plano ande. Quem sabe dê certo.



-Você não pode mesmo me dizer o que é?



-Me desculpe, Remo, mas sem a autorização do Frank eu acho melhor não te contar nada.



-Tudo bem, Lílian, não faz mal...-de repente a voz dele tremeu e eu vi Remo fazer uma careta de dor. Subitamente assustada, corri até ele.



-Remo?? O que você tem?



-Fora uma dor de cabeça, acho que nada muito fora do normal...-murmurou ele, se sentando na poltrona mais próxima, enquanto eu andava à volta dele, querendo fazer alguma coisa e sem saber exatamente o quê.



-Foi por isso que você também subiu mais cedo?-perguntei com cautela, me lembrando do meu solitário gesto egoísta e me arrependendo amargamente.



-Não exatamente... Eu discuti com Tiago e Sirius, por um motivo meio idiota, mas foi o suficiente pra me fazer subir -contou ele, pondo a mão na cabeça.



Minha memória fez outra de suas gracinhas me lembrando da hora em que eu esquematizara o modo do agir dos outros três amigos dele, destacando a parte em que Remo e Pettigrew desistiam, e evitei um sorrisinho.



-Mas Remo, você está mesmo bem?-perguntei, observando-o cuidadosamente.



-Estou, Lílian, fique tranqüila. Eu tenho um bom remédio pra enxaqueca.



Remo tirou a varinha das vestes e conjurou uma garrafa verde, com uma trava muito forte. Eu estranhei a segurança da bebida.



-Nossa, tudo isso apenas pra um remédio?-perguntei.



Remo apenas deu um sorriso fraco, abriu com a garrafa com um certo esforço e virou o líquido goela abaixo.



Uns dez minutos depois, os outros começaram a voltar do jantar. Não pude deixar de cair na risada quando um grupo numeroso de segundanistas passaram do meu lado, comentando "aquele casal que estava se amassando no corredor pra Torre da Grifinória". Remo, que não parecia ter melhorado muito (preciso confessar que ele estava amuado demais pra quem só tinha um pouco de dor de cabeça), também riu, mas se segurou, murmurando que como monitores nos devíamos tentar sermos mais sérios.



E toda a minha esperança de que aquela armação pra enciumar a Alice tivesse dado certo foi pelo ralo quando ela chegou, sorrindo feliz da vida, logo ao lado de Black. Aquilo deve ter despedaçado o coração do pobre Frank em pedacinhos. Esse Black ainda ia me pagar pelo que estava fazendo!



Foi ficando tarde, e os mais novos começaram a recolher as tarefas de casa para irem dormir. Remo já tinha ido havia um bom tempo, e eu tivera bastante distração durante a noite, graças a Pettigrew, que conseguiu transformar uma poltrona inteira num grifo mudo e cego. Só não me perguntem como. Quando eu consegui desfazer a confusão só estávamos Pettigrew e eu mesma na sala comunal, ele encolhido num canto entre um sofá enorme e a lareira, eu encharcada de suor com fios de cabelo grudados na cara. Finalmente a poltrona jazia imóvel no chão, na sua forma de antes.



-O que exatamente você estava tentando fazer -perguntei bem devagar, a raiva pingando de cada palavra- quando conseguiu essa magnífica proeza?



Pettigrew gaguejou em resposta. Eu ia pegar embalo para um sermão razoavelmente quilométrico quando entraram Frank e Potter na sala comunal. No mesmo instante, deixei Pettigrew onde estava e fui até os dois.



-Então esse era o seu brilhante plano, Frank?-perguntei, furiosa.



Frank estava com uma cara péssima. Mas ainda me devia satisfações, afinal eu era amiga dele.



-Lílian, eu... Ah, eu estou morrendo de vergonha...-murmurou ele, chutando o pé de uma poltrona e disfarçando a dor.



-Que bom, Frank. Sinto dizer mas desta vez foi merecido! Eu te disse para não confiar no Black, eu sabia que ele ia armar alguma com você...



-Evans -interrompeu Potter.- Já chega. Ele já percebeu que você está furiosa com ele e radiante consigo mesma por estar certa outra vez. Deixe o cara em paz.



-E desde QUANDO você defende o Frank, Potter?-retorqui, o meu tom de voz subindo gradativamente.- E quem é você para falar do Black quando você já fez coisas muito piores?



-Ah, parem vocês dois.-foi a vez do próprio Frank interromper.- Eu já não tive um dia dos melhores, e podem acreditar que não ajuda nem um pouco ouvir vocês dois brigando pela milésima quadragésima nona vez. Eu vou dormir.



E tomou o rumo do dormitório masculino. Apesar de tudo eu estava triste por ele. Queria mesmo que tivesse dado certo, mas Alice ainda estava encantada com o outro infeliz. Não pretendia mais dirigir a palavra a Potter quando ele falou comigo.



-Evans, escute o que eu vou te dizer. Eu não concordei com um só pedaço desse plano. Foi uma maldade do Sirius, temos mais planos e não sei o que deu nele pra fazer isso com o pobre Longbottom.



-Eu disse em algum momento que queria ouvir explicações suas, Potter? E mais: espera mesmo que eu acredite em você? Que prova você me deu de que é confiável?



-Talvez quando eu te tirei daquele parque quando você estava apavorada demais pra fazer isso sozinha.-disse ele, cruzando os braços.



Eu fiquei arrepiada de me lembrar daquele dia, mas acredito ter disfarçado muito bem. Recusei-me a dar qualquer resposta e tomei o rumo do meu dormitório.



-Hahaha... Ela me ama - ouvi Potter falar para Pettigrew num tom zombeteiro.







Eu estava tão cega tentando me proteger das provocações de Potter naquela hora que até me esqueci a menção que ele havia feito a algum novo plano. Infelizmente, fui me lembrar apenas quando já era tarde demais.



Depois de uma aula particularmente cansativa de Poções, na qual Snape novamente conseguira fazer um trabalho melhor que o meu, reuni meu material e saí da sala.



Não demorou muito para que eu percebesse a aglomeração mais adiante. Fechei de vez a minha mochila e, murmurando "com licença, monitora" enquanto abria espaço, logo cheguei ao motivo do congestionamento e também, dos risos da maioria dos meus colegas grifinórios.



Sim, isso mesmo que você pensou. Nada muito diferente do que aconteceu no começo desta história. Mas agora Lúcio Malfoy estava na dança também. Potter estava brincando de sacudir Snape no ar enquanto Black fazia Malfoy ficar com os pés grudados no teto do corredor. Parecia que estavam competindo para ver qual dos dois conseguiria fazer sua vítima vomitar primeiro.



Imediatamente, saquei a minha varinha; não sabia onde estava Remo, mas a verdade era que eu queria o gostinho de acabar com a alegria daqueles dois.



-Muito bem, os dois palhacinhos podem ir desmanchando o circo! Acho que não vão querer que eu chame algum professor!



Potter e Black me olharam com cara de riso. Decerto estavam esperando alguma abordagem do tipo.



-Tem certeza, Evans?-perguntou Potter.-Vai querer arriscar que o Ranhoso e o seu amiguinho fantasma se espatifem do chão quando tentar nos desarmar?



Supus que estavam chamando Malfoy de fantasma porque ele estava tão transparente que eu quase podia ver todos os traços de suas veias por baixo da pele. Fiquei furiosa pela chantagem.



-É isso mesmo, monitora -Black acrescentou.- Você só vai poder segurar um...



Apontei a minha varinha para Black.



-E se eu não me preocupar em segurar nenhum deles, apenas deixe você aleijado ou deformado pelo resto da vida? Não duvide de mim, Black, posso dar um jeito de fazer isso, e os dois não vão levar nada além de um tombo... Agora coloquem os dois no chão bem devagar, e baixem essas varinhas!



Os outros alunos, que formavam um círculo em volta de nós, estavam mudos como túmulos, querendo ver como os dois iriam reagir.



-Evans, você não pode...



-Ah sim, eu posso, Potter.-retorqui. -E não duvide disso...



Fingi tomar ar para lançar um feitiço quando Black me interrompeu.



-Droga, está bem...-em seguida ele colocou Malfoy no chão e acenou para que Potter fizesse o mesmo com Snape.- Satisfeita agora?



-Perfeitamente -falou uma voz severa atrás de mim. Eu sorri de prazer ao reconhecer a profª McGonagall.- Creio que já tivemos paciência demais com os senhores... Podem ir guardando essas varinhas, pois ganharam uma detenção.



Potter me olhava furioso a princípio, mas depois percebi que ele disfarçou para tentar não me dar o gostinho da vitória. Pobrezinho, como ele era ingênuo.



Quando a multidão se dispersou, eu cheguei bem pertinho de Potter e Black e sussurrei, no meu melhor tom maligno:



-Vocês realmente acharam que eu sabia desfigurar alguém??

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