Feitiços e Adivinhação



Capítulo XVII
Feitiços e Adivinhação



PLAFT!

Mais uma forte batida zuniu à janela da sala comunal da Grifinória, fazendo Rony bufar irritado e se levantar de supetão.

-PAREM JÁ COM ISSO!! – berrou ele assim que abriu a janela e encarou um grupo de alunos mais novos brincando nos brancos terrenos gelados, aparentemente travando uma divertida batalha de bolas de neve. Seu grito foi de tal intensidade que sobressaltou algumas garotinhas segundanistas que conversavam ali perto. Elas arregalaram os olhos para o ruivo antes de saltarem aos seus próprios pés e se apressarem longe dali através do buraco do retrato.

-Gritar com os alunos mais novos não vai resolver em nada os seus problemas, Rony. – falou Hermione da poltrona ali perto, onde ela estava confortavelmente enroscada e com o rosto oculto atrás de um livro. Rony ergueu os olhos para ela, mas a única coisa que conseguiu enxergar da garota foi a ponta superior do seu gorro vermelho, sobressaindo por cima do grosso exemplar de “O Livro Padrão de Feitiços, Sexta Série.”

-Eu não teria problemas e não precisaria gritar se você concordasse em me ajudar e me deixasse dar uma olhada na sua redação, Hermione.
– falou Rony num tom que beirava o desespero.

-Não. Você não teria problemas e não precisaria gritar se tivesse feito a redação ANTES e não tivesse deixado para a última hora como você SEMPRE faz. – retrucou ela, sem nem ao menos se preocupar em sair detrás do livro.

-Você mesmo disse, Hermione! Eu SEMPRE faço! Não há como mudar, está em mim! Anda, me ajuda!

-NÃO! Se você SEMPRE faz, então está na hora de deixar de fazer, Rony! E se eu não estivesse aqui?

-Mas você está!
– teimou ele.

-Mas eu não vou estar para sempre ao seu redor para ficar fazendo seus trabalhos por você!

-Claro que vai!
– disse Rony de uma vez, aparentemente sem pensar.

Hermione finalmente baixou seu livro muito devagar e buscou os olhos do garoto, que agora deliberadamente evitava os dela e encarava os terrenos cobertos de neve. Ela apertou seus lábios juntos para evitar um sorriso. Se Rony ao menos soubesse que isso era tudo o que ela queria... Ela não se importaria nem um pouco em fazer os trabalhos dele para o resto de sua vida, desde é claro, que como conseqüência ela nunca tivesse que se afastar... Ele estava em quase todas suas memórias de Hogwarts, e em todos os planos futuros dela. Hermione observou o ruivo pressionar os pés no chão e empurrar sua poltrona para mais perto da mesa, enquanto puxava e abria uma embalagem de Sapo de Chocolate. Ele parecia gracioso assim, com as orelhas tão vermelhas e brilhantes quanto seu cabelo... Anos atrás, ela nunca poderia imaginar em se apaixonar por alguém como ele... Inteligente e talentosa como era, a garota sempre idealizou estar ao lado de homens responsáveis e que fariam o tipo intelectual... Mas ao invés, ela tinha conhecido Rony Weasley. Conhecido e nunca mais conseguido estar alheia a ele. Agora, ela não poderia imaginar algo mais confortável do que estar ali, apenas aproveitando sua companhia, sua amizade inabalável... O ruivo não era nem próximo do garoto que ela idealizou: não era intelectual (às vezes ela pensava que o único modo de fazer as informações entrarem na mente dele era abrir sua cabeça e enfiá-las para dentro com uma pá), não era dedicado aos estudos e raramente era educado. Ele sempre dizia o que vinha à sua cabeça, não se importando se era algo inacreditavelmente doce ou assustadoramente rude. Mas sempre era algo absolutamente honesto, Rony não sabia mentir ou fingir. Ele tinha um jeito próprio, com frases e expressões que ninguém no mundo poderia copiar, nem mesmo sob o efeito da Poção Polissuco. Às vezes ele era brilhante. Outras, tolo. Tinha dias em que Hermione o odiava, achando que sua natureza teimosa apenas significava que ele possuía uma cabeça dura de mula, insofrível. Outras vezes ela via o fato diferente, percebendo que isso nada mais era do que lealdade e determinação crua e absoluta. Ele podia ser totalmente idiota. Assim como completamente esperto. Com ele ao seu lado ela se sentia confusa. Mas completa. Rony apenas tinha esse efeito sobre ela. Ele pertencia ao mundo dela. Ele ERA o mundo dela. Hermione suspirou, balançando a cabeça e dessa vez não conseguindo reprimir um sorriso carinhoso de se formar furtivamente em seu rosto. Rony pareceu ter visto do canto dos seus olhos, pois se virou para ela.

-Por que o sorriso? – perguntou ele, desconfiado.

-Você. – disse Hermione antes de poder se conter. – Quero dizer... Tem uma mancha de chocolate em sua bochecha.

Rony levou rapidamente a mão sobre a face.

-Do outro lado. – riu a garota, observando o ruivo friccionar seus longos dedos sobre a bochecha esquerda.

-Não aí, Rony! – falou Hermione se ajoelhando perto dele – Aqui, me deixe fazer isso...

Ela ergueu a própria mão, lentamente, e esfregou com o polegar a mancha de chocolate próxima à boca do ruivo. Rony sentiu o toque de Hermione. O toque dela era como fogo, como gelo. Seu dedo estava frio e trêmulo, mas fazia o corpo todo dele esquentar e queimar com afeto e paixão. Eles se encararam e como se só agora percebesse o que estava fazendo, um rubor forte subiu pelo pescoço e rosto da garota, que puxou sua mão depressa e arremessou-se de volta à sua poltrona, voltando a se esconder atrás do livro.

Harry, sentado mudo do lado oposto do amigo e se sentindo entre encabulado e divertido, não pôde evitar de sorrir, puxando seu próprio dever de Transfiguração para mais perto e escrevendo o título:
“As mais famosas histórias da Transfiguração Humana através dos séculos”.
O garoto coçou os olhos por baixo dos óculos e procurou por sua cópia de “Guia Completo de Transfiguração Avançada”, mas não a encontrou.

-Mione? – chamou ele, encarando a capa do livro no qual a amiga estava seguramente escondida atrás.

-Hum? – murmurou ela.

-Eu poderia tomar emprestado seu livro de Transfiguração? Acho que o meu ficou lá em cima, no dormitório.

-Na minha mochila.
– disse Hermione, ainda oculta pelo livro.

Harry ergueu os olhos pela mesa coberta de livros, penas e pergaminhos e avistou a mochila da garota no outro extremo, próxima ao lugar onde Rony estava.

-Rony, pegue para mim, por favor, está mais perto de você.

O ruivo, que até então parecia perdido nos seus próprios pensamentos, pulou de leve e perguntou:

-Anh?

-Pegue para mim o livro de Transfiguração da Hermione, dentro da mochila aí ao seu lado.
– repetiu Harry, revirando os olhos.

Rony alcançou para a mochila e remexeu em seu interior, tendo alguma dificuldade em encontrar o livro certo em meio a tantos outros. Assim que ele o puxou para fora, o garoto pôde notar que a tão cobiçada redação de Hermione estava dentro da contracapa. Com um relance rápido à garota (ou à ponta de seu gorro, que era só o que estava visível) ele puxou a redação para si e entregou o livro para Harry.

A sala comunal da Grifinória estava calma e vazia naquela tarde do primeiro domingo de dezembro. Alguns minutos se passaram nos quais o silêncio era quebrado apenas por sons longínquos nos terrenos, onde a maioria dos alunos aproveitava a chegada da neve, ou pelo farfalhar ocasional de pergaminhos e o arranhar frenético da pena de Rony. Então o buraco do retrato se abriu e Gina entrou, as bochechas coradas com o frio e a capa coberta com pequenos flocos brancos de neve.

-Olá. – cumprimentou ela, se sentando numa poltrona ao lado de Hermione. – O que vocês estão fazendo aqui dentro numa tarde de domingo?

-Montanhas de deveres.
– falou Harry com um suspiro cansado.

-Que COMO SEMPRE eles deixaram para a última hora. – completou Hermione, milagrosamente baixando seu livro. Harry lhe lançou um olhar exasperado, mas não retrucou.

-E você, Mione? – perguntou Gina.

-Só lendo um pouco, você sabe. – respondeu ela encolhendo os ombros.

-Suponho que eu deveria estudar também... – disse a ruiva pensativamente. – Ano de N.O.M.s... Vou começar depois das férias de natal.

-Mas isso ainda falta quase UM MÊS, Gina!
– exclamou Hermione, horrorizada.

-É... Tenho que aproveitar esse pouco tempo livre que me resta... – riu Gina.

-Você é mesmo irmã do Rony. – disse Hermione balançando a cabeça e lançando um olhar de esguelha ao garoto. Ele agora estava tão concentrado que não pareceu ter ouvido o comentário dela. Sua testa estava ligeiramente enrugada e suas sobrancelhas juntas, enquanto ele copiava algo com muita rapidez. Ele também estava corado pelo frio e um restinho da pequena mancha de chocolate ainda persistia na sua bochecha. Estava engraçado e inevitavelmente atraente... Mas espera um minuto. Copiava algo??

-RONY!!
– berrou Hermione tão repentinamente que fez todos se sobressaltarem e o ruivo jogar sua pena no chão, assustado.

-O-o quê? – gaguejou ele, sem ousar encará-la. A garota ergueu-se num salto e no instante seguinte estava ao lado de Rony, apontando furiosamente para um pergaminho sobre a mesa no qual o menino debruçara os dois braços em cima.

-O que EXATAMENTE é isso que você está COPIANDO, Rony?

-E-eu não estou... não estou copiando nada, Mione.
– disse o ruivo fazendo a melhor cara de cachorrinho filhote que conseguia e falhando miseravelmente ao tentar parecer inocente.

-AH, NÃO? O que é esse pergaminho em que você está SUBINDO EM CIMA, então? – exigiu ela com os dentes cerrados, seu tom perigoso.

-Er... é... bom... Não é nada, na verdade.

-E POR QUE esse “NADA” tem escrito HERMIONE no cabeçalho?

-Oh!
– fez Rony baixinho, com uma careta. – É mesmo... Não é que tem?

-Isso é MEU, Rony! Mais especificamente, isso é minha REDAÇÃO de Transfiguração!

-Tudo bem!
– disse o garoto dando-se por vencido e jogando os braços para cima. – Ok! Isto de fato é seu... Mas não há motivo para você pirar e nem começar a arrancar seus cabelos, certo?

Ela bufou e o fuzilou com o olhar.

-E nem os MEUS! – ele acrescentou depressa ao ver a expressão na face de Hermione.

-Me dê isso, Rony. – disse ela respirando fundo e esticando a mão para o pergaminho. – Eu não posso ACREDITAR que você estava COPIANDO minha redação.

-Espera!
– falou Rony afastando a redação longe da mão da garota. – Eu não estava COPIANDO, Hermione, só estava... obtendo umas idéias, isso é tudo.

-Certo.
– retrucou Hermione com sarcasmo, vermelha de raiva. – E suponho que você OBTEVE IDÉIAS tão IGUAIS às minhas que eu não me surpreenderia que você até mesmo tenha escrito “Hermione Granger” no cabeçalho da SUA redação!

Gina e Harry deram risadinhas com o comentário da garota e as pontas das orelhas de Rony voltaram a se avermelhar.

-Ei! – protestou ele. – Eu não seria idiota a ponto de copiar até seu nome, ok?

-Ahá! Então você confessa que COPIOU?

-Copiei! Mas não exatamente do jeito que você está pensando!

-E quantos jeitos diferentes de copiar existem?
– desdenhou ela.

-Eu modifiquei as palavras! – explicou Rony. - E saltei algumas frases, mudei algumas ordens...

-Ohh! Alguém já lhe disse que você é BRILHANTE?
– Hermione zombou.

-Não tanto quanto você, mas faço o que posso. – atirou ele de volta, com um pequeno sorriso inclinado.

Bingo! Pareceu a coisa certa a se dizer, pois Hermione fingiu não ligar mas aparentou estar muito mais calma quando voltou a falar:

-Quando você vai CRESCER, Ronald Weasley?

-Minha altura não está boa para você?
– respondeu ele, rindo.

-Ahh! – exclamou a garota em resposta, batendo sua mão à testa. A expressão dela estava engraçada e perdida entre exasperação e embaraço. – Você nunca vai deixar de ser criança, não é? Será sempre Ronald Weasley, o garoto-que-não-quer-crescer!

-Ok, Hermione.
– falou o ruivo. – Eu aceito ser o garoto-que-não-quer crescer, mas você não me fará começar a redação inteira de novo, fará?
Ele usou novamente a carinha de filhotinho de cachorro.

-Eu deveria... – murmurou ela.

-Mas...? – tentou ele meio que fazendo beicinho.

Hermione olhou para ele por um momento e suspirou.

-Certo. Não precisa começar de novo. Apenas mude as palavras, ok?

-Eu já lhe disse que fiz isso!
– Rony respondeu com um sorriso.

-E coloque seu próprio nome no cabeçalho. – caçoou ela, agora apertando os lábios para evitar de sorrir.

-E eu já lhe disse também que eu NÃO COPIEI seu nome! – protestou o garoto outra vez.

Gina e Harry sorriram novamente e um brilho “malvado” cruzou os olhos da ruiva.

-Quer dizer que a partir de hoje meu irmãozinho vai chamar-se “Hermione”, é? Mudou de nome, Roniquinho? – arreliou Gina.

-Eu estou satisfeito com o meu, obrigado. – disse Rony. E virando-se para Hermione, completou: - Nada pessoal, Hermione.

Todos eles riram, inclusive Hermione.

-“Hermione”... – Gina recitou o nome da amiga lentamente. – Seu nome é bastante diferente, não é?

-Muito melhor que GINEVRA.
– alfinetou Rony e levou um tapinha no braço, dado pela irmã.

-Bom, mas eu gosto do seu nome, Mione. – continuou a ruiva. – Não é comum... É um nome trouxa, suponho?

-Sim, de fato meus pais tiraram esse nome de uma personagem de uma história escrita por um famoso autor trouxa chamado Willian Shakespeare, o qual eles adoram.
– explicou Hermione.

-Eu já ouvi falar dele! – exclamou Gina. – Mas qual é a história?

-Na verdade é uma peça de teatro chamada “O Conto de Inverno”.
– esclareceu a garota. – Hermione era o nome da rainha da Sicília.

-Que interessante!
– disse Gina. – Ter o nome de uma Rainha inventada por um autor famoso...

-Bem, é.
– murmurou Hermione, sorrindo de leve.

-Autor famoso... Nenhuma maravilha que você seja louca por livros... – falou Rony.

Harry sorriu e se virou à Gina:

-Veja você quem são meus dois melhores amigos, Gina. – disse ele. – Um é chamado de Rei no Quadribol pela torcida da Grifinória e a outra tem o nome da Rainha da Sicília!

A ruiva sorriu de volta a ele e confirmou com a cabeça, acenando na direção do irmão e da outra garota enquanto falava:

-Rei Weasley e Rainha Hermione!

Ambos coraram com o comentário. Hermione sentiu o calor voltar às suas bochechas e um arrepio percorrer por sua espinha, mas intimamente ela sabia que seu coração tinha gostado daquela observação de Gina. “Rei Weasley e Rainha Hermione.” Sim, ela não poderia negar que soava agradável... Bastante agradável, por sinal.

Rony sentiu o sangue se apressar às suas orelhas novamente.

“Rei Weasley.”

Ele suspirou.

“Rainha Hermione.”

Ele pressionou sua pena com força no pergaminho à sua frente.

“Rei E Rainha.”

Ele sentiu seu coração acelerar uma batida e enviar uma mensagem ao seu cérebro, o fazendo sorrir. Finalmente terminando sua redação (que ele não copiou, apenas obteve algumas idéias), o garoto ergueu os olhos para Hermione. Rainha Hermione.

-Obrigado pela redação, RAINHA Hermione. – ele disse lhe entregando seu pergaminho e se curvando numa reverência zombeteira que fez Harry e Gina darem risadas. A garota pareceu ligeiramente envergonhada mas se recuperou depressa, girando os olhos e também entrando no jogo:

-Nem por isso, MAJESTADE.

Os quatro gargalharam mais uma vez com a brincadeira.

Rei E Rainha.

Toda brincadeira tem um fundo de verdade...

*****



-Até que enfim! – suspirou Rony, juntando seus materiais e atirando sua mochila às costas. Era manhã de segunda-feira e o sinal há pouco tinha soado pelo castelo anunciando o final de uma aula de Transfiguração particularmente difícil. – Por um instante eu pensei que essa aula fosse eterna.

-Rony!
– repreendeu Hermione, luzindo a ele. – Foi uma aula muito interessante, se você me perguntar!

-Fale por você, Hermione.
– respondeu o ruivo. – E agora ainda temos dois tempos de Feitiços e à tarde... ugh... tem a Morcega Velha da Trelawney. – completou com uma careta de desgosto.

-Não me lembre. – pediu Harry balançando a cabeça.

-Vocês dois não deveriam falar assim. – disse Hermione firmemente.

-Olha quem fala. – desdenhou Rony. – Aquela quem sempre chamou Adivinhação de bobagem e afirmou que a Trelawney é uma velha charlatona!

-E eu não mudei meu pensamento.
– ela disse encolhendo os ombros. – Mas desde que vocês se propuseram a continuar com a matéria, acho que têm a obrigação de seguir adiante sem reclamações.

Harry e Rony trocaram um olhar exasperado, o qual, felizmente, não foi notado por Hermione, que já tinha feito o caminho dela dentro da sala de aula de Feitiços, onde o minúsculo mestre Flitwick já os aguardava como o habitual, em cima de uma pilha de livros atrás de sua escrivaninha.

Os garotos acharam seus lugares, devagar, sentando-se um a cada lado de Hermione na mesinha de três lugares. Aos poucos todos seus colegas foram chegando e se acomodando também.

-Bom dia, meninos. – cumprimentou o pequeno professor na sua vozinha estridente e aguda. – Nossa aula hoje será dividida em dois assuntos. Durante o primeiro tempo vamos praticar o feitiço de desaparecimento, mas de uma forma muito mais complexa do que as que já foram apresentadas à vocês. Até agora nós unicamente trabalhamos para fazer desaparecer pequenos objetos ou pequenos animais, mas agora vamos dar um passo mais adiante. Nós vamos praticar o feitiço com o corpo humano!

Houve murmúrios e cochichos excitados por toda a classe, os quais o professor pareceu de certa forma até gostar, pois mostrava que a turma tinha ficado claramente interessada.

-Agora vamos, vamos, meninos, sua atenção, por favor. – repreendeu o professor, mas numa voz tranqüila. – Esse é um feitiço que deve ser encarado com toda cautela por vocês. Alguém saberia me dizer quais os problemas poderíamos ter se usássemos esse feitiço de modo indevido?

As cabeças de todos involuntariamente se voltaram para Hermione, que já tinha erguido sua mão com toda a velocidade, quase arrancando a orelha de Harry no processo.

-Srta. Granger?

-Um feitiço de desaparecimento quando usado no corpo humano deve ser cercado com toda precaução possível, pois se realizado incorretamente poderá ser irreversível, ou seja, tornar invisível para sempre a pessoa enfeitiçada.

-Muito bem, muito bem, Srta. Granger. Dez pontos para a Grifinória.

-Excelente, Mione.
– disse Rony à garota com um sorriso e Hermione nunca saberia dizer seguramente se foram as palavras dele ou aquele sorriso inclinado o causador daquele sentimento morno que subiu varrendo todos seus interiores.

-Por esta razão, - a voz do mestre continuou – é que de início não iremos nem cogitar a hipótese de vocês desaparecerem por completo o corpo do seu companheiro de prática. Quanto maior a área a ser desaparecida, maior a dificuldade a ser encontrada. Portanto vocês tentarão desaparecer apenas uma parte do corpo do seu colega, pois se errarem há maneiras de reverter o encanto. Se concentrem na parte do corpo em questão e com esse movimento – ele fez um gracioso floreio no ar com a varinha – pronunciem a palavra “Desaparecium”. Agora por favor em pares para começarmos a praticar. Teremos um horário inteiro para isso e só depois entraremos no outro assunto da aula de hoje.

Harry lançou um olhar para Rony e Hermione entendeu que mais uma vez tinha sido deixada. Os dois meninos sempre gostavam de trabalhar juntos, afinal de contas, mas isso não a aborrecia. O que certamente a deixava desanimada era com quem ela própria acabava tendo que trabalhar todas as vezes.

-Hermione? – chamou a conhecida voz de Neville atrás dela. Com as suspeitas confirmadas e reprimindo um suspiro, ela se levantou e se juntou ao garoto. Neville era uma pessoa maravilhosa e um amigo fabuloso, mas suas habilidades nas aulas estavam longe de qualquer um desses elogios. Hermione não se importava e até gostava de ajudá-lo, mas ela não poderia negar que às vezes, ou melhor, quase sempre, ela saía dessas aulas em dupla com ele levando algum efeito colateral.

E dessa vez não seria diferente...

*****



-Nem vem, Harry, você também não conseguiu! – exclamou Rony para o amigo algum tempo depois, quase no fim da primeira etapa da aula de Feitiços.

-Eu não estou dizendo nada... – defendeu-se Harry.

-Como se eu não te conhecesse o suficiente para saber que você está tentando segurar o riso!

-Bem, você está engraçado sem um pedaço da orelha...
– disse Harry, agora não conseguindo mais evitar a risada que há algum tempo lutava para deixar sua garganta.

-Então faça o serviço completo da próxima vez, companheiro! – retrucou o ruivo.

-Pelo menos eu consegui fazer desaparecer mais da metade dela! – Harry falou apontando à orelha de Rony. – Já o meu nariz que era suposto que você desaparecesse está intacto...

-Eu não diria intacto,
– falou Rony observando clinicamente o nariz do amigo – olhando desse ângulo ele parece bem mais pálido, quase transparente, até!

Os dois garotos caíram na gargalhada e deram uma olhada ao redor. O restante da turma não parecia estar tendo sucesso em dominar o feitiço de desaparecimento também: Simas tinha a testa suada e os olhos apertados em concentração, mirando sua varinha na direção do nariz de Dino, que continuava tão intacto quanto o de Harry; Parvati agitava sua varinha freneticamente em frente ao rosto de Lilá, igualmente sem efeito algum; Neville, por sua vez, parecia estranhamente deformado, já que em seu rosto redondo faltava o queixo.

-Hermione conseguiu. – falou Harry observando Neville.

-Agora me diz a novidade. – respondeu Rony com um meio sorriso, se virando para olhar melhor a dupla.

Hermione não parecia nada satisfeita. A garota balançava a cabeça resignadamente e fitava abaixo com um olhar quase aflito. Neville não parecia feliz tampouco e mesmo sob o frio de dezembro seu rosto rechonchudo estava brilhante com suor.

-O que está errado? – indagou Rony assim que viu a expressão no rosto de Hermione.

-Eu não sei. – murmurou Harry de volta, se erguendo um pouco para olhar por cima da cabeça do professor Flitwick, que agora se apressava na direção dos chamados de um afobado Neville.

-P-professor... – começou a voz gaguejante do garoto – eu tentei desaparecer uma sobrancelha de Hermione e-

-Tudo bem, tudo bem, Sr. Longbottom,
– interrompeu o mestre observando o rosto de Hermione e vendo que a sobrancelha da menina estava rigorosamente no lugar – o Sr. não foi o único quem não conseguiu.

-Não é isso, professor!
– disse Neville de uma forma urgente. – A magia não só não funcionou, ela até funcionou, quero dizer-

-Professor, ele desapareceu minha mão, ao invés!
– guinchou Hermione antes que o menino pudesse terminar a oração.

-Sua mão, Srta. Granger?

-Sim, senhor.
– disse ela erguendo o braço esquerdo e afastando a manga para mostrar que sua mão agora não era visível.

-Temo que o Sr. não tenha se concentrado o suficiente, Sr. Longbottom. – falou o pequeno professor em sua vozinha aguda. – Quanto tempo exatamente se passou desde que sua mão desapareceu, Srta. Granger?

-Em torno de vinte minutos, professor.
– respondeu ela. – Isso não está normal, não é mesmo? Quero dizer, o efeito desse feitiço no corpo humano tem duração exata de quinze minutos...

-Correto, Srta. Granger.
– disse o mestre. – Sua mão já deveria estar visível novamente...

-Minha orelha já está totalmente visível agora, Harry?
– perguntou Rony desconfiado, se virando para o amigo.

-Está começando a aparecer novamente. – respondeu Harry observando. – Deve estar completando os quinze minutos agora...

-A falta de concentração ou ela feita de maneira incorreta pode levar a esses casos, Srta. Granger.
– continuou o minúsculo professor. – A Srta. poderá aguardar mais algum tempo e esperar que sua mão se torne visível por si só ou ir até a Ala Hospitalar e tentar que isso seja revertido de imediato. Nesse caso, sinta-se dispensada da segunda parte da aula.

-Eu... eu prefiro aguardar, professor.
– disse a garota.

-Previsível. – murmurou Rony erguendo uma sobrancelha para Harry. – Hermione NUNCA perderia parte de uma AULA por causa de algo tão INSIGNIFICANTE quanto ficar sem uma mão, não é mesmo?

Harry apenas riu e acenou com a cabeça: - Nunca.

*****



Alguns minutos se passaram e Hermione agora já estava novamente sentada em seu lugar habitual entre os dois garotos. A primeira etapa da aula de Feitiços tinha finalmente terminado e no momento o professor Flitwick começava a segunda etapa.

-Bom, bom, meninos, o segundo assunto que iremos ver na aula de hoje é uma técnica que mesmo os trouxas costumam tentar dominar, embora poucos sejam aqueles que realmente consigam fazer isso, de fato. Os trouxas não sabem que estão tentando lidar com magia e que aquilo que eles meramente chamam de “Hipnose” é na verdade um feitiço poderoso. – explicou o mestre. – Alguém aqui poderia me dizer o que é a Hipnose?

Hermione ergueu a mão, embora o que poderia ser visto era somente o braço da garota, já que sua mão continuava firmemente invisível.

-Srta. Granger?

-A Hipnose é um estado de atenção focalizada e concentrada. O feitiço consiste em tirar sua atenção da experiência externa e direcioná-la internamente.

-Muito bem, correto como sempre. Fique com mais dez pontos para a Grifinória por isso, Srta. Granger.
– falou o professor alegremente. – Bem, como a Srta. Granger nos disse, então, uma pessoa em estado de hipnose está com a atenção focalizada ao seu interior sendo por isso capaz de obedecer aos comandos daquele que o enfeitiçou. Mas alguém saberia explicar por que mesmo sendo assim, a hipnose não é tão perigosa quanto a maldição Imperius?

O braço sem mão de Hermione cortou o ar novamente.

-Srta. Granger?

-Diferente do que ocorre na maldição Imperius, uma pessoa sob a ação do feitiço da hipnose jamais cometerá atos que de alguma forma afrontem sua moral, sua dignidade ou sua disposição pessoal.

-Maravilhoso, Srta. Granger!
– guinchou Flitwick. – Mais dez pontos para a Grifinória, por isso!

Rony sorriu e puxou a manga das vestes de Hermione.

-Só hoje você já nos conseguiu trinta pontos! – sussurrou ele perto do ouvido da garota, a fazendo estremecer.

-Qual seria a função desse feitiço, então, professor? – perguntou Parvati. – Se a pessoa só faz aquilo que deseja então qual o motivo de alguém hipnotizá-la para que ela faça isso?

-Muito boa a pergunta, Srta. Patil.
– disse o professor. – Sim, a pessoa hipnotizada só faz aquilo que ela queira fazer, mas ela poderá fazer coisas que em seu estado normal ela não SAIBA fazer. – explicou. – Suponhamos que a Srta. tenha vontade de dar um salto mortal mas que em seu estado normal não consiga fazer isso. Se alguém hipnotizá-la e lhe ordenar que dê tal salto mortal a Srta. o fará sem nenhuma dificuldade.

-UAU!
– exclamou Rony virando-se para Harry. – Isso não é brilhante? Antes de uma partida de Quadribol você poderia simplesmente me hipnotizar e ordenar que eu seja o melhor goleiro e defenda todos os gols!

-Você não precisa disso, Rony.
– murmurou Hermione entrando na conversa. – E além do mais, não é permitido usar Hipnose em exames e competições esportivas ou de qualquer espécie.

-Ah...
– lamentou o ruivo. – Qual é exatamente a graça disso, então? – completou, fazendo Harry rir e Hermione girar os olhos.

-Novamente vocês irão se dividir em pares para praticar. – continuou o professor. – Para o feitiço funcionar são INDISPENSÁVEIS três coisas: concentração, contato visual entre as duas pessoas e pronúncia correta das palavras “Mentum hipnosis”. Se qualquer um desses três fatores não for rigorosamente obedecido o feitiço falhará indubitavelmente. Comecem.

Hermione virou-se já conformada e esperando encontrar Neville. Não se enganou: o menino do rosto redondo já caminhava devagar na direção de onde o trio estava sentado. Mas milagrosamente, ele não chamou pelo nome dela desta vez.

-Harry?

Harry se virou surpreso para encará-lo.

-Anh?

-Você faria... er... você praticaria comigo o feitiço?
– perguntou Neville, nitidamente sem graça e evitando os olhos de Hermione, que de imediato percebeu que o garoto estava se sentindo culpado por tornar sua mão invisível.

-Eu... bom... claro, Neville. – disse Harry olhando de esguelha para Rony. – O Rony pode ficar com a Hermione, não pode? – completou ele, agora encarando totalmente o amigo.

Rony por algum motivo desconhecido pareceu corar, mas acenou fracamente com a cabeça, enquanto Harry saía para um lugar mais ao fundo da sala acompanhado por Neville.

-Bom... – começou o ruivo fitando a garota um tanto nervoso. – Vamos lá, então?

Hermione confirmou com um breve aceno. Por alguma razão ela também se sentia nervosa. Afinal, a última vez em que ela e Rony tinham trabalhado juntos só os dois numa aula de feitiços fôra há mais de cinco anos atrás e o resultado daquilo tinha sido um apelido de Pesadelo e várias horas ininterruptas de choro dentro de um banheiro.

-Muito bem, Rony, - falou ela tentando afastar todos aqueles pensamentos que lhe causavam nervosismo. – o que você gostaria de fazer mas não se considera capaz em seu estado normal?

“Beijar você.”
– foi o pensamento incoerente que deslizou na mente do garoto.

-Be-quero dizer... não sei... – falou ele, suas orelhas queimando.

Ela ergueu as sobrancelhas.

-Não sabe? Como não sabe, Rony? Apenas diga.

-Por que você não me diz, ao invés?

-Eu?
– indagou ela, ligeiramente alarmada.

-Sim, por que não? – retrucou o menino. – O que VOCÊ gostaria de fazer e não se acha capaz em seu estado normal, Mione?

Teria sido fácil mentir que a resposta dela não era a mesma na qual o ruivo tinha pensado há meros instantes atrás, se o calor que subiu por seu corpo não tivesse tingido as bochechas da garota de púrpura.

-Eu... eu não sei. – disse ela fitando abaixo. – Tente você me dizer, vamos!

-Hum...
– fez ele. – Voar sem precisar de uma vassoura?

Ela ergueu os olhos para encará-lo.

-O feitiço só funciona para coisas que forem possíveis, Rony! Coisas que você não consiga mas que sejam possíveis para um ser humano! E voar sem vassoura decididamente NÃO é possível. A não ser que você tenha um avião, um carro voador ou algo assim...

-O que é um avião?
– perguntou ele, confuso.

-Esqueça isso. Nós estamos perdendo nosso tempo. Vamos, pense em algo possível.

-Bem... tenho outra opção, mas suponho que ela não seja possível, também.

-Tente. Qual seria?

-Ser mais inteligente do que você.
– falou Rony com a voz fraca.

Hermione corou ainda mais e mordeu o lábio inferior.

-Rony! – exclamou ela olhando para baixo outra vez. – Por que isso não seria possível?

-Por que não existe ninguém tão brilhante?
– disse o ruivo ainda mais baixinho.

“Meu Merlim! Esse é mesmo o Rony me dizendo todas essas coisas?” - pensou Hermione.

-Não seja bobo. – ela falou de volta quase num sussurro. – Se é o que você quer, então será isso... Vamos começar?

-Sim.
– disse Rony com os olhos no teto.

-Er... Rony? – falou Hermione timidamente. – Você precisa olhar para mim.

-Que?
– espantou-se o garoto, arregalando os olhos azuis para ela.

-É preciso contato visual, lembra?

-Ah, isso... Ah, claro, tudo bem.


Rony olhou fundo nos olhos de Hermione e estremeceu. Ele não poderia levar isso por muito tempo. Não poderia continuar olhando-a daquela forma, se afundando na imensidão daqueles olhos castanhos... Os olhos da garota eram da cor de chocolate e o ruivo se pegou pensando que talvez fosse por isso que ele era tão vidrado em chocolate, por causa dos olhos de Hermione... Ou seria por causa do chocolate que ele era tão vidrado nos olhos dela? Rony sentiu-se confuso e não mais capaz de manter um pensamento sensato. Não olhando dentro daquele olhar... Não com ela olhando de volta com a mesma intensidade... Seu coração bateu tão forte contra seu tórax que o menino pensou que chegava a doer, fazendo-o apertar com força sua mão fechada sobre algo que ele não se preocupou em saber o que era. Ele apenas não poderia quebrar o contato visual, não poderia estragar a magia...

Hermione sentiu o olhar de Rony cruzar com o dela e todo e qualquer pensamento racional fugiu de sua mente. Era como se um fio invisível estivesse ligando o coração dela no dele através do olhar. Ela viu seus próprios olhos castanhos refletidos no fundo dos olhos azuis cobalto de Rony e achou que eles se misturavam perfeitamente bem e que se um dia os dois tivessem um filho ele teria exatamente aquela mistura no olhar. Uma mistura do castanho no azul, da inteligência no humor, da responsabilidade na descontração. Uma mistura de Hermione e Rony. Tantas características misturadas formando uma comum que seria compartilhada por ambos. Da mesma forma que vários ingredientes distintos levam à formação de um único bolo, as qualidades e defeitos dela e dele se misturariam para formar uma única característica. Uma chamada amor.

A garota tentou se chamar à realidade e se concentrar no feitiço que era suposto que ela estivesse praticando, mas nesse momento sentiu uma forte pressão em sua mão. Ela reconheceu aquela sensação e identificou aquele toque: Rony estava lhe apertando a mão com uma força incomum...

-Ai! – falou ela, finalmente quebrando o contato visual para olhar abaixo. Mas a única coisa que ela viu foi a mão de Rony. A dela estava invisível...

-O que foi? – perguntou ele confuso, ainda segurando a mão da garota.

-É minha mão que você está apertando, Rony...

O garoto também olhou para baixo e estudou sua própria mão sardenta por alguns momentos, em silêncio. Ele afrouxou o aperto e lentamente deslizou seus dedos para cima e para baixo nas costas da mão invisível de Hermione, que ofegou ligeiramente com o toque macio do garoto.

-Isso é estranho. – falou ele num sussurro, ainda acariciando a mão da menina.

-O que? – perguntou ela, sua voz falha.

-Eu não posso VER sua mão...

Hermione já tinha aberto a boca para falar que isso era culpa da magia errada de Neville quando Rony a desviou de seu objetivo ao completar:

-...mas eu ainda posso SENTÍ-LA... – ele falou ainda mais baixo, agora segurando a mão dela dentro da dele e escovando seu polegar levemente na pele da garota. Ela engoliu com força e impulsivamente apertou a mão dele de volta, que arregalou os olhos em surpresa antes de um canto de sua boca se curvar para cima num sorriso.

-Como vão indo vocês dois? – a voz de Flitwick soou nos ouvidos de ambos, fazendo-os quebrarem o contato.

-Er... – começou Rony.

-E-estamos tentando, professor. – disse Hermione muito vermelha.

-Certo, Srta. Granger. – concordou o mestre. – Oh! E vejo que a mão da Srta. está começando a aparecer novamente!

Rony e Hermione imediatamente olharam abaixo a tempo de ver a sombra pálida da mão da garota começando a se formar.

-Sim. – sorriu Hermione.

-Bom, se precisarem de mim me chamem, meninos! – disse o professor antes de se afastar.

À altura que o pequeno homem tomou distância, a mão de Hermione já tinha voltado a aparecer totalmente. A garota ergueu os olhos para Rony, meio encabulada.

-Suponho que deveríamos continuar? – falou ela.

-O que? – indagou o ruivo olhando esperançosamente para a mão de Hermione.

-O feitiço, Rony.

-Ah.
– disse ele sem conseguir manter um tom de desapontamento fora da voz.

-O que mais seria? – perguntou a garota sem encará-lo e propositalmente esbarrando as pontas de seus dedos nos dele.

-Não sei... – murmurou ele aceitando a sugestão e novamente cobrindo a mão dela com a dele.

A respiração de ambos estava rasa e se disputassem qual coração estava batendo mais depressa provavelmente daria empate. Os dedos de Rony corriam suavemente sobre as costas da mão da garota, enquanto seu polegar deslizava na palma, a fazendo arrepiar.

-O que é isso? – perguntou o ruivo numa voz baixa, acariciando uma mancha clara no pulso interno da menina.

Hermione respirou fundo para tentar encontrar sua voz. E seu juízo.

-É uma marca de nascimento.
– disse ela puxando sua mão da dele mas lamentando-se intimamente pela perca do contato morno de Rony.

-Ah. – foi só o que ele conseguiu falar mais uma vez, antes da vozinha aguda de Flitwick gritar anunciando que eles estavam dispensados e o sinal do fim da aula ser ouvido pelo castelo.

A cabeça de Hermione girou e a menina percebeu que pela primeira vez na vida ela não tinha sido capaz de se concentrar e realizar a tarefa de uma aula. Ela se concentrara em outras coisas. Realizara tarefas diferentes. Diferentes e mesmo que fosse difícil para ela assumir, muito melhores do que tarefas de aula...

Rony, por sua vez, atirou a mochila aos ombros relutantemente. Ele percebeu que pela primeira vez na vida estava lamentando o fim de uma aula e sorriu. Mais uma vez ele não tinha conseguido fazer o que um professor pedira. Ele tinha conseguido fazer muito mais...

*****



O almoço tinha passado muito silencioso naquele dia. Os sextanistas da Grifinória geralmente chegavam tarde ao Salão Principal em dias de segunda-feira devido à sua pesada carga horária e encontravam pouca gente ainda almoçando. Os professores já tinham sempre terminado suas refeições, também. O trio havia comido em silêncio quase total: Rony parecendo distante enquanto observava Hagrid e alguns outros mestres cuidando da decoração do Salão para o Natal; Hermione perdida em seus próprios pensamentos e Harry sem vontade de falar devido a uma forte dor de cabeça.

Assim, os três garotos deixaram o Salão. Harry e Rony fizeram seu caminho para a Torre Norte, rumo a mais uma entediante aula de Adivinhação e Hermione seguiu sozinha para sua aula de Aritmancia.

A sala de Sibila Trelawney estava quente e mal iluminada como o habitual. Os garotos acharam seus lugares sentindo-se meio zonzos devido ao forte cheiro de diferentes tipos de incensos, ervas e velas.

-Como é que ela AGUENTA isso? – disse Harry colocando a mão sobre o nariz. – Todo esse cheiro! Isso faz minha cabeça doer ainda mais...

Rony só respondeu depois de se recuperar do ataque de espirros no qual ele entrara desde que se sentaram ao lado de um incenso de aroma particularmente doce.

-Sabe, - disse o ruivo ainda fungando – ela pode até ter um terceiro olho, o tal olho interior e tudo aquilo, mas DEFINITIVAMENTE ela não tem nariz...

Os dois meninos explodiram em risadas e ficaram durante alguns minutos fazendo piadas sobre a professora e a aula até que ela chegasse.

*****



Hermione estava aproveitando sua aula preferida mais do que nunca. Ela adorava Aritmancia e todos aqueles cálculos que o assunto envolvia. Era algo prático, exato e objetivo, por isso lhe dava tanta segurança. Se sentindo totalmente relaxada, ela encostou-se na parede e continuou ouvindo a Professora Vector falar. Ela se prendia a cada palavra, com uma sensação confortável e aquecida que a sala lhe passava. Mas aos poucos a voz da professora foi se tornando distante e mais fraca, mais difícil de distinguir... Suas pálpebras foram se tornando cada vez mais pesadas...

Hermione agora estava sentada sozinha em uma mesinha na biblioteca, envolta em livros e pergaminhos. Ela se sentia feliz e empolgada com alguma coisa, provavelmente com o livro de Aritmancia que estava aberto em frente aos seus olhos. A biblioteca estava mergulhada em silêncio e tudo estava calmo. Até que o som de alguns passos ecoou pelo aposento, se tornando cada vez mais próximo...

-“O diretor quer ver você agora.” – ofegou um menininho baixo e gordo assim que a avistou.

Hermione ergueu-se rapidamente e juntou seus materiais, sentindo-se ligeiramente surpresa. Ela caminhou até a gárgula de pedra e disse uma senha, fazendo a estátua girar e revelar uma escada em espiral. Foi questão de segundos e a garota já batia à porta e encontrava um Dumbledore muitos anos mais jovem e com seus olhos azuis atrás dos óculos de meia lua com um brilho triste.

-“O Sr. desejava me ver, professor?” – perguntou Hermione e mais uma vez ela notou que a voz que saiu de sua garganta não era a dela: novamente era fina e infantil.

-“Sente-se, Srta. Taylor.”

Hermione sentou-se, agora ligeiramente alarmada pela seriedade contida nas palavras do diretor.

-“O que eu tenho para lhe falar não é fácil...” – começou ele. – “Mas nem sempre os caminhos fáceis são os corretos, então é preciso que a Srta. saiba...”

-“Sim, professor?” – falou a vozinha estranha vinda dela mesma.

-“Seu pai, Srta. Taylor... Ele está morto.”

Uma dor aguda atingiu o peito de Hermione e ela sentiu seus olhos tornarem-se imediatamente molhados. Não era verdade. Não poderia ser... As lágrimas picaram os cantos dos seus olhos e começaram a escorrer pelo seu rosto, primeiro fracamente, depois de modo torrencial. Ela levou suas mãos à face e deixou sua cabeça cair sobre a escrivaninha do diretor, seus cabelos lisos caindo-lhe nos olhos e grudando em seu rosto molhado. Sentiu uma mão de Dumbledore apertando-lhe o ombro de modo consolador mas a dor em seu peito só aumentava... Ela iria explodir de tristeza, ela iria morrer com essa dor...


Hermione abriu os olhos, ofegante. Seu rosto ainda estava molhado com suor e lágrimas, mas o escritório de Dumbledore havia desaparecido. Ela estava de volta à sala de Aritmancia. Devagar ela ergueu uma mão e tocou seu cabelo: estava cheio e cacheado novamente. Enxugando o rosto e tentando fazer sua respiração voltar ao normal, ela suspirou. Havia sido um pesadelo. Apenas mais um pesadelo.

*****



Harry correu a mão pelos cabelos e encarou o relógio de pulso uma vez mais. Agora finalmente faltavam menos de cinco minutos para o fim daquela aula terrível e o garoto desejou saber se esse tempo ainda seria suficiente para a velha professora prever a morte dele pela décima vez no dia. Esperando com toda força que não, o menino olhou para Rony. O ruivo dormia a sono solto sobre seus búzios, o assunto da aula daquela tarde. Sua boca estava entreaberta e algumas pedrinhas dos búzios estavam pressionadas contra sua bochecha, onde Harry soube que estariam marcas profundas quando o amigo acordasse. Sorrindo consigo mesmo ao pensamento, Harry se virou para verificar onde estava Trelawney e foi com um susto que ele a encontrou justamente atrás dele. O garoto cutucou Rony nas costelas e acenou discretamente na direção da professora.

-O que? – sussurrou Rony ainda meio sonolento.

-Ela está bem atrás de nós. – murmurou Harry sem deixar sair som algum, apenas mexendo seus lábios.

Com um relance discreto às suas costas, Harry percebeu que a professora tinha o olhar parado e não piscava, parecendo estranhamente congelada.

-Há algo errado com ela. – disse ele a Rony.

-Desde que ela nasceu, se você me perguntar. – falou o ruivo rindo.

-Estou falando sério! – repreendeu Harry. – Olhe!

Rony olhou à professora e percebeu sobre o que o amigo falava, pois a mulher se encontrava na mesma posição e seus grandes olhos estavam girando desgovernadamente em suas órbitas.

O sinal tocou e os alunos começaram a deixar a abafada sala pelo pequeno alçapão, mas Harry segurou o braço de Rony assim que o ruivo fez menção de se mover.

-Espera! – disse ele. – Não podemos deixá-la assim!

Rony reprimiu uma careta e afirmou com a cabeça.

Assim que a sala se esvaziou completamente e só ficaram os três no aposento, Harry aproximou-se cautelosamente da professora e perguntou:

-Professora Trelawney, a Sra. está bem?

Ela não deu sinal algum que tinha ouvido e seus olhos somente continuaram girando...

-Professora? – tentou ele novamente.

Nada.

-Sacode ela. – disse Rony, mas vendo o olhar de Harry, o ruivo continuou, olhando receoso para o rosto desfigurado da professora – Harry, acho que nós deveríamos ir e buscar ajuda.

-Certo.
– Harry concordou e ambos os meninos se viraram na direção do alçapão. Foi então que uma voz grave e sinistramente aumentada como a de um berrador ecoou pela pequena sala e com um arrepio pelo corpo os garotos notaram que o som estava vindo da boca frouxa da professora Trelawney.

-O mal está chegando... Ele está próximo e próximo e próximo... Sentimentos opostos culminando num ato de suprema maldade!...

Harry olhou para Rony, que tinha a boca aberta e estava extremamente pálido. Sua própria expressão não deveria estar diferente, mas ele voltou-se para Trelawney para ouvi-la continuar:

-Amor e ódio se cruzarão... Confundirão um tal coração... Sangue será derramado... Um feitiço maligno executado... Esse tempo logo virá... Vida inocente sucumbirá... terminará... MORRERÁ!!!

E com um destaque à última palavra, a velha mulher girou sobre o próprio corpo e com um baque surdo caiu de costas sobre o chão. Harry correu na direção dela, mas Rony parecia congelado de terror. Todo o sangue parecia ter esvaído do corpo de ambos os meninos, que estavam tão pálidos e brancos quanto algodão.

-Ela está respirando, acho que apenas desmaiou. – falou Harry respirando pesadamente.

-Vamos sair daqui. – ofegou Rony. – Buscar ajuda.

-Você busca ajuda. Traga a Madame Pomfrey.

-E você?
– resmungou o ruivo, seus olhos arregalados.

-Estou indo ver Dumbledore. Isto não está mais nas nossas mãos.

E com um último olhar um para o outro, os garotos desceram o alçapão e seguiram diferentes direções.

*****



N/A: Esse capítulo está cheio de pistas para o futuro da fic, por isso saiu desse tamanho.

O que tenho a esclarecer sobre o capítulo: A origem do nome da Hermione NÃO foi inventada por mim, eu retirei isso do livro “Almanaque de Harry Potter e outros bruxos”. O nome dela vem sim de uma rainha da Sicília, personagem de Shakespeare, da peça “O Conto de Inverno” (The Winter’s Tale).

Agradecimentos:


Ginny: Olá! É muito bom saber que ganhei outra leitora para a minha fic!! Fico contente que esteja gostando e agradeço muitíssimo os elogios!... Pode deixar que vou sempre estar atualizando rápido e espero sempre ver seus comentários por aqui, ok? Beijinhos!

Brine: **Roberta se levanta da cadeira e faz uma reverência à todos os comentários maravilhosos que recebeu, inclusive o da Brine**
Euzinha é que tenho que agradecer mais e mais!! Muito obrigada pelos comentários e elogios, não sei o que faria sem eles... Se você não se importa com capítulos grandes então não vai querer me estrangular com o 17, não é?? É o maior deles... rs... Muito mistério e mais um pouquinho de R/H... Espero que tenha gostado, vou adorar ler suas opiniões... Beijinhos e obrigada mais uma vez!!

Alulip: Ah, eu também queria um C.L.I., acho que se lançassem um, seria sucesso no mercado, não? Rs..rs... Ele ainda vai aparecer no decorrer da fic... Ah, que bom que você esteja achando que estou desenvolvendo bem os personagens, também gosto muito da Gina, mas acho que já deu para perceber quem é minha personagem favorita, não?? (não conto que é a Hermione!rs.rs...) Eu também amei a capa que a Mione me deu e também sou muito fâ do trabalho dela, e é uma idéia, quem sabe nós não possamos escrever algo juntas??... hehehheh...E mais uma vez, quem tem que agradecer aqui sou eu!! Aos comentários maravilhosos, elogios e tudo isso que me incentivam a continuar. Espero que tenha gostado do capítulo 17 também... Teve mais algumas pistas sombrias aí, não? E pode deixar que em breve temos mais da Rebecca...
Beijinhos e mais uma vez MUITO OBRIGADA, de coração!

Pequena Pri: Obrigada, obrigada, obrigada... Que bom que gostou do capítulo!! Bom, o que posso falar é que veremos o C.L.I. de novo... É, parece que R/H estão progredindo sim, vamos torcer, não é?? Rs.rs... Mais uma vez muito obrigada pelos elogios, você me deixa vermelha de vergonha e satisfação com eles... Pode deixar que vou tentar continuar atualizando assim rapidinho. Beijos!

Angel Weasley: Muito obrigada por mais um comentário!! Fico realmente feliz que esteja gostando da fic!! E aposto que a sua está maravilhosa, sim! Qual o nome dela para eu acompanhar?? E pode ter certeza, eu também quero um C.L.I. e um Rony...rs... Espero que não tenha achado o capítulo 17 muito ruim e continue acompanhando, ok? Beijinhos!

Brenda Pantoja: Que bom que você gostou do capítulo, Brenda! Eu também ri muito ao escrever as quedas do Harry e a briga Rony e Gina... Espero que mesmo esse capítulo sendo tão grande também tenha conseguido prender sua atenção. Continue acompanhando, viu? Grande beijo!

Nanda-Weasley: Já tá adicionada no MSN e no Orkut, ok? É, nem me fale, tudo o que eu queria era ser uma bruxa e ir para Hogwarts, encontrar um Rony... ai... rs..rs... Bom, sentiu falta da Rebecca?? Fica tranqüila, quando você menos esperar ela aparece!... E que bom que você gostou da capa nova! O que achou do capítulo? Excessivamente chato?? Hehhehehe... Mesmo assim espero que continue acompanhando e um big muito obrigada pelos comentários e elogios! Beijos!

Hellen Granger: Já está adicionada no MSN, vamos conversar sim!! Obrigadão pelos elogios, digna de JK??????? Ah, quem me dera..rs...rs... Que bom que está gostando da fic, quando chegar a ler tudo me diz se a opinião está a mesma, viu? E eu AMEI a capa que você fez para a Val, ficou MARAVILHOSA, você tem muito talento... Beijinhos e obrigada mais uma vez!

Letícia: Adorei falar com você no MSN, viu? E esse capítulo, achou que ficou entediante?? Achou alguma parte que identificasse com você de novo?? Rs..r.s... Espero que sim e que tenha gostado. Grande beijo e muito obrigada, Lê!

Val: Êhhh, mais um comentário do tamanho do Grope!!!! Quando eu vou postar o capítulo eu já posto pensando nos comentários e fico pensando assim: Hum, será o que a Val vai escrever no comentário gigante dela??
Muito obrigada amiga, por tudo!!! Você sabe que me incentiva d++ e que se não fosse por vocês todas eu nem continuaria essa fic... Você me pediu um N/A digno de fâ nº 1 da fic, mas qualquer coisa que eu escrever vai ser pequeno para te agradecer...
Te adoro e beijos!!!
Ah, e quanto a não te fazer chorar...rs... vamos ver, né? Vou pensar no seu caso! Rs...rs... Continue com as teorias aí...

Humildemente Ju: Você é quem me faz rir muito com seus comentários, você é muito engraçada... Essas idéias aí de comunidades no Orkut me fizeram rir durante um bom tempo... Se você ficou com preguiça de ler o capítulo passado pelo tamanho então imagina esse, héim?? O fim dele tá sinistro do jeito que você gosta, não é?? Bom, espero seu comentário e opiniões sobre o capítulo. Grande beijo, Ju!

Bom, gente, então é isso... Espero mais comentários, vamos lá, é tão rapidinho e de uma importância magnífica para mim!... Ah, para quem ainda não leu e quiser dar uma olhada nas minhas outras fics, são todas R/H...
Obrigada a todos que acompanham, beijos nos corações de cada um! Até a próxima...


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Comentários (3)

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