Aquela Noite Na Torre



A gente não sabe o quanto desejaria poder trocar uns bons meses da nossa vida para não passar por certas situações, até que passamos por elas.

Pode ser que nunca as tenhamos imaginado, muito menos considerado a hipótese, mas tais situações existem. Estão lá, prontas para servirem de material para que deuses mesquinhos e com um senso de humor duvidoso as usem contra você.

E Luíza acabara de descobrir uma delas: ter Zacharias Smith como expectador e, pior ainda, seu salvador naquilo que foi a sua primeira demonstração de inabilidade social no mundo bruxo. Estava convencida, desde o conhecera no casamento de Ana, que o rapaz era o ser mais cético e desagradável que a raça humana tivera a infelicidade de produzir. Ficava doente só de pensar no quanto ele deveria estar satisfeito por se mostrar superior a ela naquela situação. Ter lido as passagens dos livros Harry Potter só a fez ter certeza de que sua primeira impressão fora a correta.

Algo gritava dentro dela, mandando tirar o braço de Zacharias de sua cintura, tomar as rédeas da situação, e fazer picadinho das indesejadas pretensões heróicas dele! No entanto, outra voz, esta mais conhecida sua, lhe dizia: fazer o quê? Não tinha nenhuma idéia melhor. À bem da verdade, não era o tipo de pessoa com jogo de cintura, e atitudes ousadas não combinavam com ela. Aliás, pensou, rendendo-se à realidade, costumava parecer uma idiota quando tentava se impor.

- O que acha de uma declaração para o Profeta Diário, senhor Smith? – Rita Skeeter perguntou, ignorando a forma “pouco entusiasmada” com que fora recebida por ele.

O fotógrafo de Skeeter apressava-se a recarregar a máquina. Um bloco de papel e uma pena voadora se aproximaram a toda velocidade da repórter, parando ao seu lado, pondo-se em posição de espera.

- Não. – Zacharias respondeu secamente e começou a se afastar, puxando Luíza consigo.

- Quem sabe sua noiva...? – Ela insistiu.

Luíza olhou-a por sobre o ombro e chegou a abrir a boca, mas Zacharias apertou a mão que segurava seu braço, alertando-a que aquela não era uma boa idéia.

- Não. – Ele foi mais categórico, e nem se voltou para responder à repórter. A essa altura, a pena já escrevia furiosamente no bloco de papel.

- Tudo bem. Vai estar amanhã nos jornais de qualquer forma... – Skeeter falou baixinho, rindo consigo mesma.

Mas Zacharias a ouviu, e, irado, voltou-se para a jornalista:

- Nesse caso, é melhor eu dar uma exclusiva para Luna e Colin Creevey. Pelo menos, terei certeza de que minhas palavras não serão distorcidas.

Satisfeito com a expressão furiosa que via em Rita Skeeter, retomou o caminho em direção aonde Agatha aguardava, aflita. A velha senhora continuava no mesmo lugar onde Luíza a deixara, conversando com a “amiga bisbilhoteira”. Sozinha agora, Agatha mal esperou que chegassem para soltar uma torrente de palavras entre aliviada, culpada e apreensiva:

- Merlin, Luíza, se Zacharias não estivesse agido rápido... Quando percebi, vocês dois já estavam conversando com o auror! Ele descobriu que você é uma trouxa? - A moça confirmou com um aceno de cabeça.

- Um fantasma a atravessou e, como não pôde vê-lo ou ouvi-lo... – Olhou desdenhosamente para Luíza. – Azar o seu haver uma convenção de fantasmas em Hogsmeade hoje, não é?

”Ó céus, que criatura abominável!” Ouvi-lo a fez subitamente consciente do braço que ele ainda mantinha em sua cintura, e não conteve dizer, ainda que a voz soasse débil pela insegurança:

- Pode me soltar, agora.

- Skeeter ainda está nos observando. – Ele respondeu por entre os dentes, em um sorriso falso. – Estamos noivos, lembra?

- Noivos? – Agatha exclamou, dando-se conta pela primeira vez da atitude íntima que os dois jovens exibiam. – Acho melhor irmos para casa, há muito a ser explicado...

- Concordo. – Zach disse. – Tenho muitas perguntas... – E olhou para a brasileira, indicando claramente que a pergunta era sobre a presença dela no mundo mágico. A última vez que a vira, Luíza nem sequer sonhava que bruxos existiam. Surpreendeu-se ao vê-la ali, mas, mesmo não sabendo de todos os detalhes, não foi difícil imaginar que sua tia avó estava envolvida, especialmente vendo-a a poucos metros da moça. Luíza era amiga de Ana, e Agatha a conhecia.

Uma vez em Smith House, Agatha se encarregou de por o sobrinho a par dos últimos acontecimentos envolvendo a brasileira, Zacharias não parava de olhar assombrado para a moça.

- Você é imune aos feitiços de memória?

- É o que parece... – Ela respondeu, mais um murmúrio do que outra coisa, pega de surpresa.

- E lembra-se de tudo o que lê? – A cada pergunta, a voz dele subia uma nota, indicando o assombro crescente (assombro ou incredulidade, Luíza não saberia dizer ao certo).

- Sim. – A voz saiu um pouco mais audível.

- E... Você leu... Você sabe...

- Li todos os seis primeiros livros da série Harry Potter. – Luíza ergueu os ombros: - Exceto o sétimo. Estava esgotado nas livrarias.

- E, lembra de todos eles? Frase por frase?

- Posso citar cada uma das vezes em que você foi mencionado, inclusive textualmente. – Desta vez, a voz soou um pouco mais firme. A incredulidade insistente que via na voz dele irritou-a a ponto de estimular uma insuspeita coragem dentro dela.

- Hum... Não, não é necessário. – Ele pôs fim aos questionamentos. Ninguém melhor do que o próprio Zacharias Smith para saber o que tinha acontecido na sua adolescência.

Satisfeita consigo mesma com o que considerava o primeiro ponto que marcava em frente a Zacharias, aceitou quando Agatha, preocupada com o estresse que ela havia sofrido naquela manhã, sugeriu que fosse descansar um pouco. Realmente, tinha trabalhado muito na reprodução dos símbolos que estavam em sua mente...

Assim que viu a moça subir as escadas e sumir no corredor do andar de cima, Agatha se inclinou para o sobrinho, que estava na poltrona oposta à sua:

- Merlim, o que vai fazer agora, Zacharias? Depois que Skeeter publicar a matéria, todos irão assumir que foi você que revelou o mundo mágico para ela, porque está apaixonado. As conseqüências, quando a moça for embora...

- Eu sei, eu sei! – Zach se levantou e começou a caminhar pela sala, passando as mãos no rosto, parecendo cansado. – Eu pretendia só ganhar tempo, depois iria dar um jeito do auror e Madame Rosimerta não espalharem a notícia... Não contava com Rita Skeeter aparecendo e ouvindo tudo! – Voltou-se para a tia, uma indagação no rosto. - Vi que tinha mais repórteres, de outros jornais e revistas, sentados no Três Vassouras. Tudo isso por causa de uma convenção de fantasmas?

- Não... – Agatha inclinou ligeiramente a cabeça, séria, como se o assunto fosse outro motivo de preocupação. – Estão aqui por causa dos rumores de que Severo Snape reassumirá da cadeira de Poções em Hogwarts.

- O QUÊ? – Zacharias não conseguiu conter o espanto e até uma pontada de indignação. – A senhora tem certeza? Snape... Logo ele... Ele... Matou Dumbledore!

- Todos sabemos as circunstâncias em que isso ocorreu, Zacharias. – A velha senhora ponderou, conciliadora. - Tudo indica que é verdade, sim. Embora eu não tenha sabido até sair de casa esta manhã. – Ela franziu o cenho, certamente imaginando como algo assim chegou primeiro aos ouvidos da imprensa do que dos habitantes de Hogsmeade. – Disseram que Minerva vai falar com os jornalistas hoje à tarde, e não acho que ela concordaria em fazer isso se não fosse verdade, e para acalmar os ânimos. O cargo de Poções... Sabe o que dizem sobre ele Nenhum professor de Poções dura mais que um ano, e agora, com a morte dessa última professora... Como era mesmo o nome dela? Ah, sim, Medéia. Suponho que Minerva queira acabar com os boatos.

- Ridículo! – Ele murmurou, pouco convencido.

- Mas... – Agatha notou algo “no ar”. – Por que veio a Hogsmeade, Zacharias?

- Eu... – Ele balançou a cabeça, como que para lembrar-se de algo. – Vim trazer uns papéis para a senhora assinar. – Pegou uma pasta de couro de dragão e tirou documentos de dentro dela.

O pai de Zacharias cuidava da parte de Agatha nos negócios da família.

- Poderia ter mandado algum de seus empregados fazer isso, como sempre fizeram. – Agatha disse. – Eu te conheço, rapaz. Veio aqui por outro motivo. Diga-me qual é. – Sorriu encorajadoramente.

Sentando-se novamente, ele demorou alguns segundos para finalmente falar, como lhe custasse admitir o que o tinha trazido até ali.

- Meu pai... Ele está me pressionando para casar. Não sei mais o que fazer com ele.

- E desde quando você é homem de se deixar intimidar por seu pai, Zacharias? – Riu.

- Eu sei... Mas agora ele está conseguindo me enlouquecer! – Disse, exasperado. – E a senhora... Ele escuta a senhora.

- Bem... No momento estou sem argumentos, não é? Você está oficialmente “noivo”. – Ela indicou o andar superior da casa com uma das mãos.

Zacharias inclinou o corpo e apoiou os cotovelos nos joelhos, escondendo o rosto nas mãos, parecendo cansado. Agatha ponderou que ele deveria estar imaginando o quê, exatamente, tinha acontecido com sua vida relativamente calma.

- A moça precisa ficar aqui, Zacharias. – Agatha declarou abandonando o ar de divertida piedade de momentos antes. – As vidas de muitas pessoas dependem disso, inclusive a de sua prima e do bebê que ela espera.

Ele ergueu os olhos para a tia:

- Essa moça é um perigo para os outros e para si mesma. Não viu como andava por aí sorrindo simpaticamente para todo mundo, como se as todas as pessoas fossem afáveis e bondosas? – Ele perguntou, a desaprovação evidente na voz. – Ela confia em todos, inclusive naqueles a quem devia temer.

Mesmo diante das palavras do sobrinho-neto, Agatha sabia que ele iria manter aquele noivado de fachada, custasse o que custasse, para proteger a vida das pessoas envolvidas. No entanto, algo estalou na mente daquela senhora ao ouvi-las.

- E você não confia em ninguém, não é Zacharias? Não tão facilmente.

Ele fixou o rosto sério na tia alguns segundos antes de responder convictamente:

- Jamais.

E Agatha sorriu, sua longa experiência lhe dizendo que aquele arranjo inesperado poderia trazer bons frutos, afinal.

***

[Enquanto isso, na Itália...].

- Está confirmado. Ele esteve em Glastonbury menos de um dia após detectarmos o sinal de atividade do medalhão.

- Tem certeza disso? – Renzo perguntou ao seu homem de confiança na Inglaterra.

- Absoluta. As câmeras de segurança do Tor registraram uma falha de seqüência de imagens durantes alguns segundos... No mesmo dia em que os dois guardas noturnos foram pegos em um sono pesado. Imagine que eles disseram que parecia que tinham sido enfeitiçados, pois nunca dormiram daquele jeito... – O inglês fez o último comentário com falsa surpresa, visivelmente divertido.

- É incrível. O maior evento mágico desde o fim da Segunda Guerra dos Bruxos, e lá está ele. Harry Potter. De novo. O rapaz parece mesmo ser perseguido pelo destino. – Renzo não sabia se sentia inveja ou pena do garoto. De qualquer forma, isso não era relevante. – Faz muito tempo que não vou à Inglaterra, sabe? Acho que está na hora fazer uma pequena viagem...

***

Ana quase engasgou com o seu café da manhã quando leu as notícias no Profeta Diário: “SOLTEIRÃO FISGADO – Zacharias Smith assume noivado com uma trouxa”.

O artigo, apesar de assinado por outra pessoa, tinha todo o veneno de Rita Skeeter. Era um texto dela, sim, não havia dúvidas. O quê ela queria fazendo outra pessoa assumir um texto seu? Talvez temesse que Hermione interviesse... Assim, poderia dizer que a publicação ou não da matéria não estava em suas mãos.

E este era só o início dos problemas. Havia um bom número de famílias bruxas com moças que tentavam há anos assumir o posto de noiva de Zacharias Smith – embora Ana não conseguisse entender qual lógica do universo faria alguém desejar o destino cruel de ser a companheira do primo...

Certo, ele era bonitão. Loiro, alto e de feições muito bem esculpidas. Fisicamente, muito bom de se olhar. No entanto, era quase impossível sobreviver ao humor desconfiado e irônico de Zach. Até mesmo Ana, com a paciência de Jó, tinha seus limites. Parecia que as “famílias tradicionais” estavam mais interessadas com o prestígio e o poder que o casamento com um Smith poderia trazer. Quando lessem a notícia que tinham sido preteridas em favor de uma trouxa sem nome... Céus! E Rita Skeeter usava isso nas entrelinhas, falando de maneira velada sobre esse “milagre” de que fez o difícil herdeiro bruxo render-se ao matrimônio!

Já conseguia até ver as hostilidades pelas quais Luíza iria sofrer. Tudo isso por SUA culpa. Se não tivesse permitido que tocasse naquele medalhão, se fosse mais capaz de desvendar aquele mistério de Ravenclaw. Mesmo agora, passados quase dois meses, desde o “compromisso” de Luíza, ainda não conseguia acreditar que tudo isso estivesse acontecendo.

Por hora, tinha dois sobrinhos para embargar no Expresso de Hogwarts. Apesar da insistência de Agatha para que ficassem também em sua casa naqueles dias antes do início das aulas, Ana não quis que Felipe perdesse a experiência de chegar à Hogsmeade de trem, junto com os demais alunos. Além disso, sua tia andava ultimamente com idéias de encher Smith House de jovens. Ana sorriu. Tinha até mesmo a impressão de que ela estava satisfeita com o “noivado” de Luíza e Zach.

E ainda havia mais um problema... Uma questão muito séria a ser resolvida em Hogwarts.

Questão esta que, esperava, não tivesse nada com o verdadeiro batalhão de corujas que eram enviadas por Mel aos seus amigos, e o outro batalhão que chegava, trazendo as cartas destes para a menina. Tivera uma longa conversa com ela e com Lipe – não é que o garoto já estava envolvido também? – e eles lhe garantiam que não estavam envolvidos em nada perigoso. Ana os fez repetir isso com as mãos bem visíveis diante de si, de forma que pudesse averiguar que não estavam fazendo figa. Satisfeita, por enquanto, embarcou-os no trem.

Dentro de algumas horas iria revê-los.

***

A Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts parecia potencialmente a mesma. Os mesmos muros, paredes e salas do imenso castelo com séculos de idade. No entanto, o ar estava tenso.

Severo Snape voltara.

Os sussurros se intensificaram no desembarque e, quando as carruagens chegaram aos portões de Hogwarts, tinham se transformado em uma cacofonia de vozes. A maioria dos alunos nascidos trouxas não sabia da “terrível notícia”, pois em suas casas não tinham contato com o mundo mágico. Vários deles, entre aterrorizados e perplexos, falavam em deixar a escola. O clima tenso era praticamente palpável.

“Um assassino!” – era a exclamação mais ouvida.

- Realmente - Dizia um sextoanista da corvinal, cujo grupo andava um pouco mais à frente de Hector e os outros. – Estou esperando que a qualquer momento um representante do Ministério chegue e dê fim a esta loucura. – McGonagall deve estar caducando...

- Retire o que disse! – Hector estancou, o olhar raivoso e as palavras saindo como um chiasso entre os dentes firmemente apertados, mas alto e claro e suficiente para a ameaça velada nelas ser bem entendida.

- Como é? – O garoto mais velho voltou-se e encarou Hector e depois os demais. A surpresa inicial do garoto foi se dissipando em uma segurança presunçosa à medida que foi se dando conta da pouca idade de seu interlocutor.

- Eu disse para retirar o que disse sobre a Diretora McGonagall! – Hector manteve o olhar firme.

- Hector... – Mel tocou de leve o braço do amigo, tentando acalmar os ânimos, embora compartilhasse com ele a vontade de defender a mestra e amiga.

Os cinco amigos estavam a caminho do Salão Principal, quando ouviram o comentário. Josh e Andy tinham se postado cada um de um lado de Hector, como duas pilastras de apoio, prontos para agir a um sinal dele. Danna observava tudo mordiscando o lábio inferior e, embora preocupada, também não parecia contente com o comentário ouvido. O grupo que conversava com o sextoanista também parara para acompanhar o embate, assim como alguns alunos que passavam. Apenas Felipe não estava ali, porque os calouros sempre vinham de barco no primeiro dia em Hogwarts.

- E por que eu faria isso, Lupin? – O grupinho de Hector era bem conhecido, de forma que era impossível não saber seus nomes. – Por acaso eu não estou certo? Severo Snape é um ASSASSINO. Comensal da Morte. Ficou do lado de Você-Sabe-Quem até bem próximo do fim da Guerra. Acha que trazer alguém como ele para dar aula é coisa que uma pessoa com juízo perfeito faria!?

- Sabe perfeitamente que as coisas nunca foram tão simples assim, MacNeil. – Mel surpreendeu até mesmo os amigos ao se pronunciar. Ela mesma não acreditava que estava defendendo Snape. Mas a situação o exigia... – Entende sobre o quê estou falando, não é?

MacNeil, o sextoanista da corvinal, era mestiço. Não tinha certeza, mas a lógica lhe dizia que ele sabia dos livros. Resolveu arriscar-se. A expressão espantada que o garoto exibiu foi a sua resposta. Engolindo em seco, ele fez um sinal afirmativo com a cabeça, rendendo-se ao argumento de Mel sem muita boa vontade.

- Tome cuidado com o que diz, Warmlling. - Foi o único comentário de MacNeil antes de voltar-lhe as costas e se afastar com os seus amigos o seguindo.

Sabia que uma referência tão ousada ao assunto magicamente proibido chocaria o garoto a ponto de fazê-lo calar-se. Mas agora, ao ver os rostos espantados de Danna e de Andy, duvidou que sua escolha tivesse sido acertada. Engoliu em seco, perguntando-se, em pânico, se tinha levado a todos a um ponto sem saída. Primeiro, os comentários de Lipe durante a viagem de trem – sem sentido para seus dois amigos, que ignoravam que o mundo trouxa conhecia Harry Potter como o personagem de um livro – e, agora, as frases cheias de duplos sentidos, e porque não dizer, sentidos secretos...

- Vamos nos apressar, gente. – Josh foi a sua salvação. Ele, assim como Hector, era um dos privilegiados que sabiam dos livros, graças ao fato de pais terem sido citados neles. – Com comensal da morte ou não, não quero perder o banquete! – Apelou para o seu conhecido apetite.

Joshua pegou Andy com um braço e Danna com outro e os incitou para dentro do grande Salão Principal. Um tanto frustrado por ter conseguido apenas uma retirada estratégica de seu oponente, e não a retratação que tanto queria, Hector sorriu forçadamente para Mel, e ambos seguiram em frente. Até pensou em reclamar da intervenção da garota, mas, ao perceber a palidez de MacNeil com as palavras da amiga, mudou de idéia. Jamais teve idéia de como os nascidos trouxas e mestiços tinham medo da retaliação do Ministério. Ela tinha se arriscado para impedir que ele se metesse em problemas. E tinha que reconhecer, mais confusão era a última coisa que a Diretora McGonagall precisava agora.

Principalmente com “Aquilo-Que-Não-Deve-Ser-Mencionado”...

***

No Salão Principal, olhares temerosos, terrificados, desconfiados e até mesmo mortais eram direcionados a Severo Snape. Este, sentado na mesa dos professores, parecia não tomar conhecimento de ser o centro das atenções. Ou a opinião geral não lhe importava em absoluto.

Alan, sentado na mesa da Sonserina, mantinha a mesma postura de digna e calma indiferença. Felizmente, a reação dos seus colegas de Casa não era tão ardorosa quanto a do resto, o que lhe facilitava enfrentar este primeiro confronto.

O confronto de Severo Snape com o seu passado. O enfrentamento verdadeiro, não aquele que se realizara diante do Ministério da Magia há mais de um ano. Desta vez, teria que encarar os rostos de jovens alunos, como aqueles com que se deparara naquela terrível noite de 1997. Naquela época, muitos deles eram jovens demais para entender, mas haviam crescido com pessoas que ainda se lembravam dele como o assassino de Dumbledore.

A pequena porta que havia logo atrás da mesa dos professores se abriu, e uma mulher morena e visivelmente grávida entrou. Depois dela, um “gigante” ruivo. A mulher deteve-se durante alguns segundos, olhando as quatro mesas repletas, e, aparentemente achando algo engraçado, voltou-se para o homem atrás dela e sussurrou-lhe algo em seu ouvido, fazendo-o sorrir.

- Não é sua tia Ana e o marido? – Perguntou-lhe Rose, uma de suas colegas na corvinal.

- É. Tio Carlinhos trouxe um dos seus dragões, a pedido de Hagrid. Para as aulas... Espere aí, agora você está falando comigo? – Rose ergueu os ombros, entre embaraçada e ao mesmo tempo não querendo dar o braço a torcer.

Desde o ano passado, no primeiro dia de aula, as outras meninas de seu próprio ano e Casa fingiam que ela não existia.

- E precisava trazer a sua tia, com uma barriga daquele tamanho? – Grizel, como sempre, fazia de tudo para ser desagradável. De todas as suas colegas, Mel tinha certeza que era a corvinal sardenta e gordinha que alimentava as intrigas contra ela.

- Se conhecesse meus tios, saberia que com barriga ou sem barriga, eles não conseguem ficar separados. – Mel retrucou sarcasticamente. – Isso é o que casais que se amam fazem, Grizel. Nunca viu isso em casa?

A menina ficou branca e depois vermelha e, com satisfação, Mel viu as demais ocupantes da mesa, que estavam por perto, disfarçar risinhos. Um menino do quinto ano até comentou que, se fosse casado com a tia dela, não iria querer ficar longe da esposa também. E dava para ouvir alguns suspiros femininos enquanto observavam o ruivo tratador de dragões.

O casal se dirigiu à mesa dos professores e, para a surpresa geral, sentou-se ao lado de Snape, à direta, com Ana na cadeira mais próxima. Ela comentou alguma coisa com o professor de Poções, que em resposta torceu a boca e girou os olhos, como se requeresse muita paciência conversar com ela. No entanto, pareceu muito confortável com a jovem senhora ao seu lado.

As surpresas não paravam por aí. Rony e Hermione entraram também, causando sussurros especulativos sobre a presença do casal, que dispensava apresentações. Ambos cumprimentaram a Diretora McGonagall com um aceno de cabeça e ocuparam as cadeiras ao lado de Carlinhos e Ana. Rony não escapou de um “tapinha” nas costas dado por Hagrid, que estava ao seu lado.

Em seguida, uma ruiva estonteante atravessou a mesma portinha pela qual Ana e Carlinhos tinham entrado.

- Gina Potter. Ela vai ser nossa nova professora de DCAT! – Hector ouviu um colega comentar.

- Eu que não perco uma aula este ano... Quer dizer, se eu realmente ficar aqui com Snape, e tudo mais...

O comentário do garoto foi interrompido pela exclamação geral dos alunos, pois, logo atrás de Gina... Harry Potter! O rosto mais conhecido em todo o mundo bruxo, o nome mais citado, a lenda viva, e... Se sentou ao lado de Severo Snape! A agitação foi rapidamente controlada por McGonagall, que ordenou silêncio.

- Isso só pode significar uma coisa: estão dando seu apoio ao Snape... – Andy comentou aos cochichos para Danna e Hector, que se inclinaram para ouvir.

Parecia haver um muro de proteção ao redor de Snape: Carlinhos e Ana, Rony e Hermione, à direita; e Harry e Gina à esquerda.

Gina, que tinha a Diretora sentada à sua esquerda, inclinou-se para ouvir algo que esta lhe dizia. Quando a mulher mais velha terminou, assentiu levemente com a cabeça, concordando. Instantes depois, Minerva McGonagall se levantava para receber os alunos do primeiro ano, que entravam em fila, tendo o professor Flitwick, agora Vice-Diretor de Hogwarts, à frente das crianças.

Atenta às atitudes do irmão, Mel o viu olhar diretamente para Severo Snape. Este também olhou para o garoto, depois que Ana o indicou, toda orgulhosa do sobrinho. Lançando uma rápida mirada avaliativa, Snape pareceu decidir que o garoto significava encrenca. E, para piorar tudo, Felipe encarou a situação de forma divertida, voltando-se para os demais meninos na filha e levando uma das mãos à testa, como se tivesse comentando que só faltava a cicatriz e a forte dor de cabeça para que a cena fosse igual a que Harry protagonizou aos onze anos.

Mortificada, Mel procurou por seus “comparsas” nas outras Casas, aos quais tinha solicitado ajuda para vigiar o irmão caso ele fosse parar em uma casa diferente da dela – Hector, na Grifinória; Joshua, na Lufa-Lufa; e Alan, na Sonserina (embora duvidasse que Lipe fosse para lá, mas, “Seguro morreu de velho”, como dizia sua avó).

O Chapéu Seletor cantou sua canção, e Mel não conseguiu prestar atenção na letra. Quando a seleção finalmente começou e chegou a vez de Felipe, estava quase sem ar, de tanto que segurava a respiração, nervosa. O garoto sentou-se no famosíssimo baquinho e, com aquele enorme sorriso traquinas que sempre o acompanhava, esperou que o objeto mágico fosse encaixado em sua cabeça. Não precisou de muito tempo para que o Chapéu chegasse a um veredicto:

- Grifinória!

Mel olhou imediatamente para Hector, que lhe fez um sinal imperceptível para que ficasse tranqüila. No entanto, não sabia se conseguiria, pois Hector se mostrara mais divertido do que alarmado com o jeito extrovertido e impertinente do irmão mais novo da amiga. Algo como... “Até que o tampinha é legal”, dito com um sorriso no canto dos lábios, logo apagado quando Mel bufou com o comentário.

- Grifinória? – Ana, que tinha esperanças que ele fosse para a Lufa-Lufa, resmungou.

- Ora querida... – Carlinhos disse, satisfeito. – Pelo menos, não é Sonserina.

Snape fez um trejeito desgostoso, em disse, em desdém: “É claro que ele não iria para a Sonserina!”.

Felipe correu para a mesa de sua Casa, todo contente. Saudou Harry, que devolveu o comprimento com um sorriso cúmplice. Agora eram colegas de Casa.

Depois de Felipe, a seleção não demorou a terminar. Aquele era o momento em que, tradicionalmente, os diretores da escola sorriam de uma forma que indicava que o pior já havia passado, e iniciavam o suntuoso banquete com que Hogwarts recebia os alunos. No entanto, não havia nada de alívio no ambiente, e até mesmo as palmas que acompanhavam a seleção para as Casas foram um tanto forçadas. Os olhares permaneciam todo o tempo em Severo Snape, desconfiados.

- Meus caros alunos... – McGonagall começou, a voz cansada. – Sinto-me na obrigação de, antes de mais nada, acalmar os ânimos a respeito de alguns boatos fantasiosos a respeito do novo... – Minerva hesitou quanto ao “novo”, mas não olhou para Snape. - ...Professor de Poções.

- Ah, eu sabia! – Murmurou um aluno da Lufa-Lufa, sentado ao lado de Josh. – Que alívio. Vai ver que não é o Snape...

- Ao contrário do que dizem, o Professor Snape não deve mais nada à sociedade bruxa. – Murmúrios de surpresa ou indignação (ou os dois) ecoaram. – SILÊNCIO!!!

O pedido da professora foi seguido de um poderoso estrondo provocado magicamente por sua varinha. Não se poderia afirmar se foi a voz dela ou o som que calou a todos no recinto. É possível que tenha sido uma última voz exaltada e retardatária, ouvida justo no momento que o volume das conversas diminuiu: “Ele é um assassino!”. Fosse o que fosse, um mausoléu não seria mais silencioso que o Salão Principal naquele instante, enquanto todos esperavam pelo que McGonagall pudesse dizer em defesa de Severo Snape. Enigmático, o indivíduo que despertara tamanha controvérsia mantinha-se em seu lugar, não fazendo nada mais do que levantar um pouco o queixo, os maxilares firmemente apertados.

Mas não foi Minerva quem tomou a defesa do Professor de Poções.

- Creio que deva prosseguir daqui, diretora. – Harry sugeriu enquanto se levantava da cadeira. McGonagall assentiu. – Todos devem saber que eu seria a última pessoa a fazer a defesa de Severo Snape... – Dirigiu-se aos alunos, que o olhavam assombrados. – E confesso que, mesmo reconhecendo a justiça da causa, é difícil, para mim, assumir tal encargo. – Olhou Snape, que apertou os olhos, irritado. – Mas a verdade é que o que presenciei naquela noite na Torre... A Torre de Astronomia... – A voz de Harry falhou quase que imperceptivelmente. – Não foi um crime, mas uma encenação salvar minha vida e a do próprio Snape.

Harry esperou que o novo tumulto provocado por suas palavras cessasse, para continuar:

- Sei que para muitos de vocês é difícil de acreditar. Mesmo eu, ou talvez especialmente eu, tive problemas em assimilar a verdade quando meus olhos, e meus sentimentos, insistiam em dizer que havia acontecido um crime. – Ele fez uma pausa, buscando falar em admitir em voz alta o que custava a reconhecer até para si mesmo. Sentiu a mão de Gina tocar a sua, por trás da mesa. Um toque sutil, de encorajamento, enquanto ela mantinha os olhos fixos na audiência, sem dar mostras públicas dessa consciência da necessidade dele de apoio naquele momento. Assim era Gina. – Mas não tenho dúvidas - continuou - de que meu ex-Professor de Poções, se cometeu algum crime durante a Segunda Guerra, não foi o assassinato de Alvo Dumbledore.

Retirou um frasco escuro, fechado com um lacre rebuscado e dourado. Abriu-o e despejou o conteúdo em uma penseira que McGonagall providenciara para ele.

- Estas são as lembranças de Severo Snape daquela noite. Foi retirada há dois anos, em uma audiência formal no Ministério da Magia. Estavam presentes Hermione Granger Weasley, Ronald Weasley e eu mesmo.

Harry fez um sinal para que Hermione se aproximasse. Ela se levantou e caminhou até onde ele e a penseira estavam.

- Também estavam lá – Continuou Hermione. - Outros profissionais do Ministério, como aurores e inomináveis, além dos ex-ministros Cornélio Fudge e Rufo Scrimgeor, e do atual, Gwidion Norwood. Uma vez que tanto Fudge quanto Scrimgeor, como todos sabem, eram opositores de Severo Snape nos processos, foi o próprio Scrimgeor quem removeu esta lembrança, a fim de que não houvesse dúvidas.

- Muitos desaprovariam minha decisão de mostrar essa lembrança a vocês... – McGonagall disse. – Mas, se tem idade o suficiente para julgar tão duramente um outro ser humano, sem se perguntar porque pessoas mais experientes do que vocês o absolveram, acho que também tem idade suficiente para enfrentar a verdade.

Hermione fez alguns movimentos de varinha, da penseira em direção à parede atrás da mesa dos professores. Uma fumaça púrpura se formou, e logo a imagem refletida na penseira era reproduzida na parede, como em um projetor de cinema.

Era um cenário noturno. O local, inconfundível: a Torre de Astronomia de Hogwarts. A terrível Marca Negra pairava sobre ela, e seu simples espectro lançado na parede, mesmo sabendo-se ser apenas a imagem de uma memória, fez muitos dos presentes estremecerem.

Snape entra pela porta, segurando a varinha. Em seu campo de visão, a imagem mais aterradora que já tinha visto: Dumbledore apoiado na parede, os Comensais, o lobisomem e Draco.

- Temos um problema, Snape – disse o corpulento Amico, cujos olhos e varinha estavam igualmente fixos em Dumbledore -, o menino não parece capaz...

“Não há tempo, Severo”, a voz de Dublembore soou em sua mente. “Não importa o que faça, não conseguirá salvar a minha vida. Mas pode salvar a sua e de Harry...”.

O velho diretor conseguiu forças para enviar uma imagem do menino, escondido debaixo da capa de invisibilidade. Petrificado pelo próprio Dumbledore para impedi-lo de se expor a inimigos aos quais não poderia sobreviver. Ele já havia sugerido isso, em uma conversa que tiveram na Floresta Proibida. Snape se enfurecera e se negou a cumprir o plano de Dumbledore.

“Não!’, ele respondeu, sabendo o que o outro estava lhe pedindo. “Não me peça isso!”.


- Severo...

O tom súplice e fraco o atormentava. “Estou morrendo, Severo. Tomei um veneno poderoso na caverna... Que acelerou a maldição que o anel de Slytherin continha...”. Snape podia sentir a agonia do professor pelo elo mental. Cada vez mais fraco, Dumbledore não conseguiu mais ter forças para impedir as terríveis imagens que lhe vinham à memória, e que agora podiam ser vistas por Snape também.

Imagens de erros antigos, batalhas travadas a muitos anos que custaram a vida de pessoas a quem amava.

“Severo”, Dumbledore reuniu as últimas forças para afastar o efeito cruel do veneno e manter a mente longe de suas lembranças nefastas. “Eu não sobreviverei. Mas, se não me matar, morrerei em agonia profunda, tanto física quanto mentalmente... E Harry”.

“Acha que sou um covarde? Enfrentarei meu destino, não cometerei um ato bárbaro desses para salvar minha vida! Sabe o que está me pedindo?”


Snape não respondeu, adiantou-se e tirou Malfoy do caminho com um empurrão. Os três Comensais da Morte recuaram calados. Até o lobisomem pareceu se encolher.

“Harry...”. Dumbledore insistia em se preocupar com o garoto.

“Para o inferno com o Potter! Como acha que ele poderá ser nosso salvador se você mesmo teme que morra na mão de simples seguidores do Lorde das Trevas?”

“Ele carrega consigo mesmo a destruição de Voldemort”.


Snape fitou Dumbledore por um momento, e havia repugnância e ódio gravados nas linhas duras do seu rosto.

“Então, irei, mais uma vez, ser o paria traidor enquanto Potter será poupado... Como espera que eu viva com a sua morte, Alvo?”.

“Não terá... Às vezes... A morte é uma benção”.

Dumbledore sentia dores terríveis. Sofrimento e sacrifício que seriam em vão se Snape se revelasse. Se morresse por não cumprir o Voto Perpétuo que fizera diante de Narcisa e Bellatriz, os Comensais permaneceriam na Torre tempo suficiente para que o feitiço de petrificação lançado por Dumbledore perdesse o efeito. Potter, impulsivo como era, iria se revelar e seria morto.

Então, não haveria mais esperanças.


- Severo, por favor...

Snape ergueu a varinha e apontou diretamente para Dumbledore.


Nunca sentira tanto ódio, tanto rancor e tanta dor por algo que tivesse que fazer. Sua mente lhe dizia que seu amigo morreria, mas se negava a ser ele o causador de sua morte. Então, o fraco elo mental que o Diretor mantinha com ele se rompeu, e Snape soube que a vida esvaía-se do corpo do velho bruxo.

A morte já o estava levando naquele momento.


- Avada Kedavra!

Um jorro de luz verde jorrou da ponta de sua varinha e atingiu Dumbledore no meio do peito.


Severo não conseguiu deter o impulso de impedir que o corpo sem vida de Dumbledore caísse duramente contra o chão. Manteve-o suspenso, por uma fração de segundo, antes de dar-se conta que os outros Comensais desconfiariam de um gesto tão atencioso com um inimigo. Tremendo por dentro, presenciou o mestre e amigo cair sobre as ameias.

Tentou controlar-se, voltar à antiga frieza. Agora, tinha que afastar os Comensais dali, ou Potter estragaria tudo.


As lembranças foram interrompidas. O silêncio era tão completo, que o canto das cigarras podia ser ouvido. Não havia um único presente que não estivesse abalado com as imagens. Snape, que permanecera rígido desde o começo da exibição, agora estava apertando as mãos com tanta força que as juntas dos dedos ficaram brancas.

- Snape... – Ana tocou levementeno braço.

- Isso... Isso é uma afronta à memória de Dumbledore.

- Já conversamos sobre isso, lembra? Serenna estava junto. Você concordou que não havia saída. Agora, acalme-se.

- Eu não estou nervoso! – Agora, a irritação era evidente nele.

- Isso. – Ana sorriu. – Melhor assim.

Hermione sacudiu sua varinha e a fumaça se desfez. A lembrança de Snape foi retirada da penseira guardada novamente no frasco escuro, sob o testemunho de dois aurores que vieram especialmente para este fim. Lacrado novamente, ela passou o objeto para que um dos aurores o levasse de volta ao Ministério.

- Como você devem ter notado – Hermione voltou a dirigir-se aos alunos. – Não havia nenhuma distorção ou névoa na lembrança. Além sabe o que isso significa?

Mesmo que ainda estivesse com os olhos do tamanho de pratos, de tantas surpresas que a lembrança de Snape lhe causou, Mel levantou rapidamente o braço, e o sacudiu no ar.

Hermione abaixou a cabeça, um pequeno sorriso indicava que estava vendo a ela mesma, quando criança. Tentando voltar à seriedade que o momento exigia, fez um gesto para que Mel falasse.

- Significa que a memória não foi alterada. – A menina se levantou e forçou a voz para que fosse ouvida por todos.

- Isso mesmo. E é por esta razão que sabemos que Snape não pode ter mentido em relação ao que aconteceu lá.

- O conteúdo dessas imagens nunca foi divulgado, a pedido do próprio Severo Snape, que não queria que as lembranças e auto-recriminações que foram despertadas em Dumbledore, e as quais o antigo diretor compartilhou com ele, fossem de conhecimento público.

A decisão se mostrara providencial há meses atrás, quando os Comensais tentaram um novo levante. A lealdade de Snape continuava uma incógnita para eles – o suspeito perdão do Ministério, perdão este dado pela segunda vez; contra o fato dele ter matado Dumbledore, uma forte prova de que lado estava.

Ana levantou-se, apoiando-se no braço oferecido pelo marido. Qualquer movimento com aquele barrigão de grávida exigia um verdadeiro planejamento antes.

- O Professor Snape tem se dedicado à atividades que reforçam sua habilitação, e seu caráter. Fui designada para acompanhar e relatar seus passos ao Ministério. Muitos de vocês já devem saber que existe um... – Ana não queria usar a palavra “orfanato”. – Um lar para jovens bruxos que perderam suas famílias. Alguns deles estudam em Hogwarts, portanto, são seus colegas. Eles convivem com o Professor Snape, tenho certeza que poderão confirmar tudo o que digo.

Alguns dos jovens que viviam no “Lar de Elizabeth”, dirigido por Snape e por sua irmã, assentiram com a cabeça. Estavam assustados com toda aquela polêmica e, embora jamais tivessem visto seu diretor como um pai afável, concordavam que não era “mau”. De todos eles, talvez Alan, filho adotivo de Snape, fosse a melhor propaganda que o Professor de Poções poderia ter.

Rony se sentiu incômodo quando percebeu que alguns alunos começaram a lançar olhares questionadores em sua direção.

- Por que estão olhando para mim? – Perguntou para Carlinhos, em voz baixa.

- Esperam que você diga alguma coisa. Afinal, Gina e eu já estamos aqui por motivos próprios: ela, para lecionar; e eu, para ajudar Hagrid com a aula com o dragão. E você?

Rony olhou rapidamente para a esposa, que ainda estava de pé junto a Harry e McGonagal, e fazendo uma careta, respondeu:

- A Mione me obrigou.

Carlinhos não teria desperdiçado a oportunidade de jogar na cara do irmão que aquilo não era verdade, que, no fundo, Rony tinha alguma simpatia pelo Morcegão e usava a insistência de Hermione para não admitir isso. Rony era um Weasley. Mais teimoso que uma mula e, apesar de reconhecer que, além da mãe, e de Harry, a cunhada era a pessoa que mais tinha influência sobre o irmão mais novo, Rony não estaria ali se não sentisse que queria. Mas a Diretora o interrompeu:

- Era isso que queríamos mostrar a vocês. – McGonagall disse depois de um longo suspiro de quem se debruçara sobre um problema por muito tempo. – Os boatos sobre o cargo de Poções estar enfeitiçado não tem o menor cabimento. Tanto, que o professor Snape o aceitou para dar fim a estes absurdos. E, para quem, ainda assim, tiver a ousadia de dizer que foi ele mesmo quem o enfeitiçou, devo lembrar-lhes que ele nunca o quis, o que é de conhecimento geral. Sei que muitos alunos estão ausentes hoje, e espero sinceramente que mudem de idéia durante esta semana e se juntem a nós. Também sei que muitos de vocês só vieram para se certificar que as notícias eram verdadeira e se eu iria ter “coragem” de contratar o professor Snape. Bem, é verdade. E não há, como puderam perceber, qualquer motivo para que aceita-lo como mestre em Hogwarts seja um ato de coragem. Se ainda assim, alguns de vocês quiserem deixar a escola, podem se retirar. Peço que se dirijam ao aviário, e mandem cartas para que seus pais ou responsáveis os venham buscar.

Dizendo isso, McGonagall sentou-se novamente e, com um gesto de varinha, a deliciosa comida que sempre era servida nos banquetes apareceu na mesa. Era o sinal de que o assunto estava encerrado. Ana sentou se também, e Hermione e Harry voltaram a seus lugares.

Hagrid, preocupado, apertava com força o garfo, a expressão bondosa e apreensiva, até que o garfo se quebrou ao meio, uma parte dele caindo no prato do Professor Flitwick.

Os alunos olharam-se, alguns constrangidos, outros completamente atordoados, como os dos primeiros anos. Após dois ou três segundos, alguns alunos começaram a se servir, sendo pouco a pouco seguidos por outros.

Ninguém se retirou.

***

A primavera se aproximava no Hemisfério Sul. Nando e Myra estavam em um parque verde, observando o pôr do sol, deitados de costas, lado a lado no chão de grama verdinha. O sol poente refletia seus raios avermelhados através do céu, e tornava as águas do lago próximo de um dourado brilhante. Ambos fitavam o espetáculo da natureza com um sorriso preguiçoso nos lábios.

- Sabe o que está faltando? – Nando perguntou, sem desviar o olhar do céu.

- O quê? – Ela devolveu a pergunta. Não podia imaginar o que poderia ser, estava tudo perfeito naquele cenário paradisíaco.

- Eu conhecer sua família.

Myra ficou tensa no mesmo instante. Engoliu em seco, e, disfarçando seu temor o máximo que podia, respondeu:

- Mas... Eu sou tenho meu irmão. Não é preciso...

- Claro que é. Se ele é toda a sua família, eu quero conhecer. – Ele virou-se de lado, apoiando a cabeça em uma das mãos. – Não agora, porque tem o período das festas típicas regionais. Nem entre dezembro e fevereiro, porque é verão, e tem muitos eventos para a banda se apresentar. Sem falar que as formaturas vão até março... Em junho, recomeçam as feiras. Mas ficarei de folga entre abril e maio.

Myra apertou os lábios, reprimindo a risada. Esse povo não parava de festejar nunca? Abençoados fossem, porque lhe daria bastante tempo para pensar em algo.

- Certo... Só vou te avisar que meu irmão é... Diferente.

- Ele é vocalista de uma banda, não é? Pois então, temos muito em comum. Tenho certeza que vamos nos dar bem. A banda dele é conhecida em seu país?

- É... Posso dizer que somos populares entre... Nosso público alvo. – O que significava: “os bruxos”.

- “As Esquisitonas”... – Nando franziu o cenho, pensativo. – Tenho a impressão que já ouvi alguém falar sobre eles...

Myra puxou-o pela camisa, beijando-o de surpresa. Precisava desviar os pensamentos dele daquele caminho perigoso. Ainda não estava preparada para revelar que tanto ela quanto o irmão eram bruxos. Sentia que Nando era diferente, que ele a amava de verdade e que não seria como Dylan. Mas precisava de tempo.

Talvez, algum dia, ainda visse Fernando e seu irmão, Myron, no mesmo palco, cantando “Do The Hippocriff”.

***

(N/A) – Em negrito: trechos do livro “Harry Potter e o Príncipe Mestiço”, Editora Rocco, 2005, p. 467-468.

Gente, imperdoável a demora. Mas vocês nem imaginam os imprevistos. Escrevi um pouquinho todos os dias, mas, para meu azar, parte do que já tinha escrito foi para a loja de conserto junto com o meu pc de casa...

Tive que improvisar, enquanto o “caboclo escrevedô” que “baixou” em mim tinha que trabalhar três vezes mais para postar este capítulo ainda este fim de semana.

Por esta razão, não vou postar os agradecimentos especiais (de novo, desculpem). Mas vou tentar postar no capítulo dezoito, que não demora a sair (o rascunho dele está no computador bom, graças a Deus).

No próximo, vamos ter grandes emoções... E mais sobre o segredo de Corvinal, o que eu não pude colocar neste aqui.

Beijão para todos, mil obrigadas pelos pedidos de atualização (gente, são vocês que não me deixam desanimar, valeu!). Mesmo se não respondo, podem ter certeza que leio os comentários e recados com muito carinho, viu?

Inté mais, persoar! (Em clima de festa junina, ehehehe).

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