Atravessando as Brumas.



O condado de Somerset fica a aproximadamente cento e cinqüenta quilômetros de Londres. A primeira vista, não se vê grande coisa na região, exceto pelos enormes espaços formados pelos campos agrícolas.

Então, descobrimos as diversas construções centenárias e locais pitorescos que parecem terem saído de romances, indo de velhos contos medievais ao mundo novecentista dos livros de Jane Austen. Mas, se pensarmos bem, Somerset também não se difere do resto da Inglaterra quanto a isto, uma vez que o país está repleto de ruínas e praticamente transpira História por seus quatro pontos cardinais.

Ainda assim, está entre os locais mais visitados. Pode-se dizer que um turista não foi realmente à Grã-Bretanha se não conheceu o Big Ben, Stonehenge e Somerset.

Tudo isso porque lá está a Abadia de Glastonbury. Ou melhor, o que restou dela. Hoje, é um conjunto de paredes, escadas e pedras dispostas sob um tapete de grama verdinha – e atualmente muito bem aparada, por sinal.

Místicos do mundo todo ou aficionados por grandes mitos épicos acham Glastonbury o máximo. A primeira igreja cristã da Inglaterra. O local onde José de Arimatéia teria passado os últimos anos de sua vida e ali morrido. O “túmulo” do rei Arthur. E, é claro, o boato que Glastonbury e Avalon, a ilha sagrada dos seguidores de uma antiga religião celta, seriam, na verdade, o mesmo lugar.

As sacerdotisas que ali moravam e mantinham as vivas tradições eram chamadas de “bruxas” pelos cristãos (de uma forma depreciativa, é claro). As lendas dizem que as sacerdotisas tinham o poder de cura, manipulavam os elementos da natureza, como fogo e chuva, e eram poderosas profetizas.

- Os trouxas dão voltas em torno dos monumentos sem, contudo, achar nada. – Lupin comentou para os três companheiros.

- Pelo jeito, NÓS é que não vamos achar nada. – Tonks ponderou. – Não estou conseguindo ver coisa alguma neste mapa, Remo.

- Também pudera. – O marido lhe respondeu jovialmente. – Este é o mapa da região há oito séculos.

- E só agora você me avisa? – A auror fechou o mapa com um jeito irritado e um tanto desajeitado.

O combinado na noite anterior era que o casal Lupin iria sozinho até Glatonbury. Mas Harry não pensava ficar de fora. Apenas não disse nada para não abalar ainda mais Ana e Hermione. Por alguma razão, cada vez que ele fazia questão de se envolver pessoalmente, as pessoas mais próximas tomavam aquilo como um indicativo que as coisas estavam ficando sérias. Certa vez, Ana dissera que quando o “personagem principal” estava interagindo, as pistas ficavam subitamente mais quentes e perigosas.

- Por que um mapa do século XIII? – Harry perguntou.

- Orientação. – Foi Gina quem respondeu. – A região foi modificada nestes séculos todos.

Harry não conseguira esconder dela os eventos da noite anterior. Para variar, a ruiva parecia poder ler sua alma: “O que está deixando de me contar, senhor Potter?”

- Estou vendo que Hogwarts vai ganhar uma excelente professora de Defesa Contra As Artes das Trevas, Gina. – Lupin assentiu.

As referências às modificações que a região sofrera lhe avivou as aulas de História da Magia. Ou melhor, o quê Hermione recontava para eles, porque era a única que conseguia ficar acordada nas aulas de Binns. E, é claro, a garota não admitia que os amigos fossem para as provas sem uma revisão completa.

Durante os séculos que se seguiram à separação física de Avalon e Glastonbuy, o “lado trouxa” teve seu lago pantanoso (o famoso “Lago”) drenado. Os terrenos foram aplainados. Novas estradas construídas e rios tiveram seus cursos modificados. Os especialistas bruxos ainda discutiam se essa alteração foi a causa da perda de grande parte do poder geográfico de Avalon. Afinal, Glastonbury era a sua outra metade, quase como o reflexo de um espelho.

- Mas acho melhor nos apressarmos. – Ele comentou com uma ruga de preocupação na testa. – É verão, e Somerset está apinhada de turistas. Algum trouxa pode nos ver aparatando. - Apesar dos primeiros raios da manhã mal terem saído, o risco que corriam era muito grande.

- É verdade. – Tonks concordou. – E ultimamente os trouxas estão mais atentos à magia. Ana me disse que, hoje em dia, um inglês liga imediatamente coisas estranhas à Harry Potter.

- Er... – Harry exibiu um sorriso hesitante. – Isso é reconfortante, Tonks.

Gina soltou uma sonora gargalhada, sendo acompanhada pelo riso baixo de Lupin. Harry tentava não rir da vermelhidão da auror, e disfarçava tossindo.

- Ah, vocês me entenderam. – Tonks revirou os olhos, terminado por rir também.

- Bem. – Lupin assentiu. – Vamos até o Tor. Lá teremos mais informações.

***

O sapato fazia barulho à medida que a morena avançava pela calçada. Caminhava rápida e decididamente, seu semblante fechado em contrariedade e irritação, ignorando friamente os olhares masculinos que atraía.

Entrou no Edifício Innominato, um monstruoso arranha-céu em vidro e concreto, e atravessou a recepção sem sequer dar importância aos funcionários que lá estavam. A mulher não se vestia como as executivas que trabalhavam ali, mas como uma modelo. Os recepcionistas se entreolharam e decidiram que ela parecia poderosa demais para que se arriscassem a interpelá-la, e deixaram que tomasse o elevador. A aquela hora o prédio estava quase vazio, e não tiveram dificuldade em observar que o elevador subia sem se deter em andar algum.

Arregalaram os olhos quando perceberam que a mulher misteriosa se dirigia à cobertura. Rapidamente, um deles discou o ramal correspondente e avisou à secretaria sobre a visitante. Ela ainda estava ouvindo a descrição da tal mulher quando a visualizou caminhando até a sua sala. Com poucas palavras encerrou a conversa e pôs o telefone no gancho.

- Vorrei parlare col dottor Leone. (Desejo falar com o doutor Leone). Informou-lhe a mulher sem nenhuma cortesia, apesar das palavras aparentemente suavizadas.

Disse seu nome e imediatamente foi conduzida até uma luxuosa sala que, como sabia, metade do mundo empresarial daria a vida para conhecer.

Mas não era mulher de se impressionar. Ignorou a opulência e o poder que o lugar exalava e fixou o olhar furioso no homem sentado atrás da mesa Luís XVI:

- Che cosa volete da me? (O que querem de mim?)

A pergunta no plural não estava incorreta. Referia-se a um grupo em especial ao qual Renzo era o único que lhe havia sido concedido conhecer. Embora nunca demonstrasse, temia o poder e influência que aquelas pessoas tinham. Muito poucos podiam perceber a sua existência. Eram quase imperceptíveis, apenas observando e documentando cada evento, enquanto seu momento não chegava. Mas ela não era como a maioria das pessoas. Marcella era como eles.

- Marcella! Cara... – Ele disse com um sorriso irônico. – La vista de una bela faccia mi ha sempre fatto bene al cuore! (A visão de um belo rosto sempre me faz bem ao coração)

Ela manteve a expressão carrancuda, nem sequer piscando diante do comentário jocoso. Renzo Leone era um exímio manipulador de vontades desde a juventude. No entanto, não devia estar com vontade de exercitar sua habilidade com ela, porque continuou a falar tranquilamente, não dando importância ao seu mau humor.

- Bene... Vamos falar em inglês de agora em diante, cara. Temos um convidado.

Só neste momento Marcella se deu conta de que havia mais alguém na sala. O estranho se virou e então pôde ver seu rosto. Mal conteve a expressão de desagrado quando reconheceu o inglês.

- Bom dia, Marcella. – O estrangeiro a cumprimentou com falsa cortesia, demonstrando que a antipatia era recíproca.

- Nosso amigo londrino traz notícias surpreendentes de sua terra natal, cara!

- Deve ser realmente terrível para todo este estardalhaço. – Ela exagerou no comentário, pois sabia que tudo devia estar correndo em segredo absoluto, como sempre. – O que houve? – Perguntou ao inglês. – Estão tendo dificuldades com o “Menino-Que-Sobreviveu”? Ou eu deveria dizer o “Segredo-Que-Escapou”?

O estrangeiro se mexeu desconfortavelmente em sua cadeira, e Marcella sorriu. Atingira-o no que mais doía em seus colegas britânicos. Aliás, era a razão da desavença entre o inglês e ela.

- Harry Potter não é problema agora, nunca foi e nunca será. – Declarou Renzo, dando fim às hostilidades. – É assunto encerrado, como você sabe.

- Nesse caso, poderiam ir direto ao ponto? Sou uma mulher bem ocupada.

- O medalhão de Ravenclaw foi despertado. – O estrangeiro anunciou, sem maiores preâmbulos. – No Reino Unido.

Observar a reação de Marcella a esta notícia foi como ver gelo derreter. Da indiferença e agastamento, a morena passou a mais acurada atenção. E não era para menos. Ela dedicara a vida ao estudo do medalhão de Ravenclaw.

- Quem... Quem em seu pessoal? Ele sobreviveu?

- Não, e não sei. Ou seja: não, não foi ninguém do meu pessoal; e não sei se sobreviveu porque não tenho conhecimento de quem foi que o fez.

Marcella fechou os olhos e tencionou os maxilares. Quando voltou a abri-los e falou, sua voz soou calma, porém cheia de veneno:

- O que prova que eu estava certa há dez anos. Você é um incompetente...

- Como ousa... - O inglês se levantou, indignado.

- Chega! – Renzo os interrompeu antes que o desentendimento passasse à discussão. – Estão parecendo dois simplórios, brigando por algo que nem sequer sabem porque aconteceu!

Os dois oponentes se calaram imediatamente, um tanto chocados com as palavras do outro. Não estavam acostumados, de forma alguma, a serem chamados de “simplórios”.

- Já que se pôs a criticar tão veementemente, Marcella... – Renzo continuou. – Suponho que tenha alguma idéia de como começar a procurar pelo medalhão.

Endireitando os ombros e reassumindo a postura segura e fria de antes, ela fixou o olhar em um dos homens mais poderosos da Europa:

- É claro que sim. Todos os casos na Grã-Bretanha, envolvendo grandes poderes mágicos, começam e terminam em uma única pessoa: – Ela apoiou a mão esquerda na mesa e inclinou-se para o outro italiano, o suficiente para encará-lo nos olhos. – Harry Potter.

***

O Tor de Glastobury é, na realidade, uma torre da antiga Capela de São Miguel. Acredita-se que ela tenha sido construída sob as ruínas de um local de rituais pagãos. Localizada em um elevado não muito longe da Abadia, a torre pode ser vista à quilômetros de distância.

O único jeito que os homens modernos encontraram de entrar na antiga capela foi literalmente escavar no morro sob o qual a construção cristã tentou esconder os vestígios das que a precederam.

Esconder, mas não eliminar. A razão disso era outro dos mistérios de Glastonbury.

Geralmente, não havia problemas em se misturar com os turistas trouxas e entrar na capela para, discretamente, achar as indicações que levariam a Avalon. Mas Harry não queria se arriscar a encontrar as verdadeiras “levas” de bruxos que procuravam a mística ilha para passar alguns dias de descanso nas férias de verão. Ser o Eleito trazia mais problemas do que soluções. Para piorar, algum trouxa poderia olhar para ele e dizer: “nossa, você se parece muito com Harry Potter”.

Passar pelos vigias não foi um problema para os bruxos. Um movimento de varinha e, de repente, os guardas sofriam de um sono incontrolável.

- Tenho que deixar o turno da noite, Tom. - Disse um deles com um bocejo.

- Eu também. Vi em um documentário que essa troca do dia pela noite não faz bem... – O segundo homem já ressonava antes de terminar a frase.

Os quatro avançaram pelas escadas de pedra. Gina já estava quase na metade quando Harry a deteve:

- Espere! Câmeras de vigilância. – Ele apontou para vários globos de vidro em cima de hastes de metal escuro.

- Tem certeza? – Gina duvidou. – Se parecem tanto com postes comuns.

- Esse é o objetivo. – Tonks assegurou. – Mas acredite, são câmeras. E funcionam com tão pouca bateria que a presença de magia quase não as afeta. Aprendemos a evitá-las no curso de aurores.

Harry meneou a varinha na direção de algumas das câmeras e Tonks fez o mesmo com a outra metade.

- Pronto. – Harry disse. – Agora não nos verão.

- O quê fizeram? – Lupin perguntou.

- Os trouxas vão ver as mesmas imagens repetidas. Vai voltar funcionar quando voltarmos.

Uma vez dentro da capela, Lupin se deteve diante de um afresco medieval representando um anjo cravando a espada em um dragão verde, que encarava seu algoz.

- São Miguel. – Lupin comentou, apontando a ponta luminosa de sua varinha para o desenho. – Um conhecido combatente de dragões.

Harry se posicionou ao lado dos demais admirando a imagem. Pensou que ali, naquele lugar, aquelas aulas de História pareciam mais interessantes. Quase podia ouvir a voz de Hermione explicando para ele e para Rony:

“- É uma simbologia muito usada na bíblia e nos mitos medievais. – A garota gesticulava, empolgada. – O dragão representava “O Mal” ou então o paganismo. Logo, é uma linguagem aceita pela Igreja, e usada diversas vezes para se referir aos seguidores da Deusa, que tinham como símbolo o dragão”.

“- E o quê isso nos interessa? – Rony havia feito pouco caso com um trejeito aborrecido, enquanto lançava o olhar comprido para a janela da Sala Comunal da Grifinória, por onde se via o campo de Quadribol”.

“- O que interessa? O quê interessa? – Hermione repetia a pergunta daquele modo de quem está zangado. Harry suspirou, desanimado, sabendo que mais uma briga iria começar. – Você vive em um lugar que tem tudo com isso, Ronald!”.

De volta ao presente, Harry sussurrou:

- Draco dormiens nunquam titillandus.

- Sim. – Lupin sorriu, entendendo onde o ex-aluno queria chegar. - Dizem que o lema de Hogwarts nasceu do fato dos druidas, ou os sacerdotes da Religião da Deusa serem treinados na Ilha do Dragão, e levarem no braço uma tatuagem desse animal. – Ele abaixou-se para uma inscrição que brilhava na parede, estimulada pela luminosidade de sua varinha. – Ah, era isso que eu estava procurando.

"Houve uma batalha no céu. Miguel e seus anjos tiveram de combater o Dragão. O Dragão e seus anjos travaram combate, mas não prevaleceram. E já não houve lugar no céu para eles." (Ap 12,7-8).


- A entrada para Avalon está sempre mudando. A única forma de saber qual é a atual é entrando aqui e procurar por algum sinal.

Enquanto lia a inscrição, Harry não pôde deixar de concluir que aquelas inscrições eram quase tão antigas quanto a capela, se não tinham a mesma idade. Para colocar tantas pistas dentro daquele lugar, devia haver alguém infiltrado na Igreja e que tivesse influência para tanto.

- Deixe-me ver o mapa, Ninfa. – Lupin pediu, abrindo tão logo a esposa o estendeu, ainda que um tanto contrariada com o apelido que lembrava o seu vexaminoso primeiro nome. – A passagem da inscrição é de Apocalipse, capítulo 12. Os doze signos do Zodíaco dispostos pela região.

Os outros bruxos assentiram, concordando com a interpretação.

Há milênios, um povo desconhecido havia desenhado os doze signos do Zodíaco no solo, em escala gigantesca. Os traçados eram formados por estradas, cursos de rios e pelo desenho natural dos relevos geográficos. Nem mesmo os bruxos sabiam muito sobre quem era esse povo ou o quê pretendiam ao fazer esses símbolos. E, pelos escritos de Avalon que sobreviveram aos desastres e guerras, nem os antigos habitantes dessa ilha conheciam seus misteriosos antepassados.

Tudo o que se sabia é que era através desses pontos que se podia abrir ou fechar os portais para Avalon.

- Capítulo doze... – Lupin continuou. – Versículos de sete a oito... – Ele passou o dedo pelo mapa, no círculo que os signos, marcos com seu traçado realçado no papel. Então, na ordem, começando por Áries, em Walton Hill... O sétimo é Libra. Entre sete e oito, ou seja, entre os signos de Libra e Escorpião. Entre Barton St. David e West Lydford.

- Área bem grande para se procurar... – Comentou Gina.

***

Hector Lupin era um garoto persistente com uma imaginação que nada ficava devendo à perigosa mente dos gêmeos Weasley. Ele não gostava nem um pouquinho de ser deixado de lado na noite anterior, quando os pais o mandaram para a casa dos Shacklebolts.

Mas conseguira reverter a situação. Como as poucas palavras sussurradas que ele conseguira ouvir na conversa dos pais frequentemente apareciam “medalhão” e “Avalon”, rapidamente concluíra que se tratava daquele mesmo objeto que pedira para Andy ajudá-lo a pesquisar.

Após algumas horas de conversa sussurrada à noite, quando os meninos deveriam supostamente estar dormindo, o plano estava pronto. No dia seguinte, enviaram uma coruja para Andy, perguntando se ele poderia vir até a casa de Josh, trazendo tudo o que ele pudesse achar sobre esses assuntos.

Antes do meio-dia, Andrew apareceu na lareira dos Shacklebolts, acompanhado de um elfo doméstico. Explicou que os pais estavam viajando, mas o elfo se recusou a deixá-lo sair desacompanhado – o que o grifinório admitiu um tanto encabulado.

Os três garotos se trancaram no quarto do mais novo dos Shacklebolts, em um claro tom de segredo.

- Por que a urgência, Hector? – Andrew perguntou. – Aliás... Você não tinha prometido a seu pai não se meter mais nos assuntos dos adultos?

- O que eu prometi foi que ficaríamos somente nas pesquisas. – Hector corou um pouco, mas falou com sua costumeira confiança. – E é o que estamos fazendo, não é.

Andrew encarou o amigo durante alguns segundos, certamente imaginando por quanto tempo o outro grifinório iria se contentar em ficar só com os livros. Ele sabia que mais cedo ou mais tarde iria discutir com Hector sobre alguma idéia perigosa e maluca dele...

- Gente... – Joshua os chamou, com certa urgência na voz. – Melhor andarmos logo com isso. Não vai demorar muito para que minha mãe apareça por aqui com algum “lanchinho”. – Ele fez uma careta, sabendo das preferências saudáveis da Sra. Shacklebolt.

Andy deu de ombros, e começou a falar sobre o que tinha descoberto:

- Andei pesquisando lá na biblioteca de casa. Mas não encontrei nada além do que está nos livros de História da Magia.

- História? – Hector levantou as sobrancelhas. – Nós procuramos nos livros de DCAT.

- É, Lupin. – Andrew respondeu, jocoso. – História. Aquela matéria que conta sobre o que aconteceu com pessoas, povos e lugares....

Hector comprimiu os lábios, irritado. Na cabeça dele, tudo que era perigoso devia necessariamente ser mencionado em Defesa Contra As Artes das Trevas. E, puxa vida, do jeito que seu pai falara sobre aquele medalhão parecia o caso. Aliás, tinha certeza que havia magia das trevas envolvida!

- Tá, tá... – Hector bufou. – Não me dou muito bem com pesquisas, todo mundo sabe disso. Não tenho paciência. – Admitiu, tenho que engolir a expressão divertida de Josh quando ele praticamente rosnou a resposta. – Então, o quê descobriu sobre Avalon?

- Existiu um tempo em que o local era conhecido como a “Terra mais sagrada da Inglaterra”. – Andrew jamais abandonava completamente o “ar adulto”, mas a seriedade que adotou ao responder alertou os seus amigos, capturando-lhes a atenção. - Então, houve luta pelo poder na Ilha. Os padres, lutando por aquilo que acreditavam ser Glastonbury; e os seguidores da Antiga Religião, por Avalon.

- Uma disputa religiosa? – Josh perguntou.

- Não. – Andy negou categoricamente, sua voz soando mais grave do que nunca: - Uma guerra política. Entre bruxos e trouxas.

- Uau... Uma guerra. – Hector estava ansioso. – Quem venceu?

- Ninguém. Não se sabe exatamente o quê aconteceu, mas, em algum ponto na Batalha de Camlann... Avalon desapareceu.

- A Ilha inteira? – Josh arregalou os olhos.

- É. Antes ela estava atrás de Glastonbury, embora invisível para os trouxas... E, de repente, foi engolida pelas brumas e ninguém conseguia encontrá-la, nem mesmo as sacerdotisas. Ninguém sabe o que aconteceu com aquelas que estavam na Ilha.

Os três garotos permaneceram em um estupefato silêncio por alguns segundos, até que Andrew retomou a narrativa.

- A entrada para Avalon só foi redescoberta duzentos anos depois, e por acaso. Um grupo de bruxos estava sobrevoando a região de Somerset, quando percebeu as formas de um dos signos do Zodíaco no chão.

- Ah, essa história meu pai me contou. – Joshua endireitou os ombros, animado. – Através dos símbolos, os bruxos descobriram uma forma de encontrar novamente Avalon.

- Hum-hum... – Andrew balançou a cabeça, concordando. – Levou mais alguns anos, mas conseguiram achar a entrada. Antes de desaparecer, o caminho era sempre o mesmo. Mas, sem um bruxo para guardar os portões em Avalon, a entrada se abria aleatoriamente.

- E conseguiram achar uma entrada depois de séculos... – A mente de Hector trabalhava a todo o vapor. – Ouvi meu pai dizer que é preciso entrar na Capela de São Miguel, no Tor de Glastonbury, para achar a entrada.

- Sim, mas naquela época não havia como saber onde o portal ser ia aberto. Então, com a descoberta do Zodíaco, dava para pelo menos ter uma idéia de onde ele estaria... Ainda assim, não era fácil. O zodíaco cobre quilômetros e quilômetros! Foi por pura sorte que, anos depois, um bruxo estava no local certo e na hora certa.

- E, uma vez em Avalor, é possível controlar as entradas. – Josh pôs a mão no queixo, adotando uma expressão reflexiva. – Mas onde o nosso medalhão e os símbolos entram nisso?

- Não é “nosso” medalhão, Josh. – Andrew contrapôs. – Gente, realmente acham...

- Desembucha, Bennet. – Hector estava começando a ficar impaciente. Ele e Andrew se encararam, desafiantes.

- Olha, vamos fazer o seguinte: vamos contar tudo o que sabemos, e depois decidimos o que fazer... – Andrew estreitou os olhos para ele. – Ou se vamos fazer alguma coisa... – Desta vez foi Hector quem o encarou, incrédulo. – Olha, gente, não vamos nos desentender agora porque, se a minha mãe perceber que vocês brigaram, vai querer obrigá-los a fazerem as pazes... E vocês sabem como ela faz comigo e com os meus irmãos? - Os rapazes ficaram em silêncio, indicando que não. – Ela nos obriga a nos abraçar. – Joshua estremeceu. – Dá para acreditar?

Os outros dois meninos arregalaram os olhos de horror. Não, definitivamente, não iriam jamais discutir na frente da Sra. Shacklebolt.

- Certo... Hum... – Andy aclarou a garganta. – Os símbolos. Bem, eles estão em toda Avalon. Não dá para saber exatamente o quê significam, porque se perdeu muito dos significados da escrita dos celtas. Acho que essa parte você vai ter que descobrir com o seu pai, Hector.

“Tá, como se eu pudesse perguntar para ele”, pensou Hector.

- Deixa que eu me viro. Quer dizer... – Ele olhou para Joshua. – Eu e o Josh. Afinal, o tio Quim deve saber alguma coisa também. Aconteceu algo ontem, e aposto que tem haver com o medalhão. Se ao menos a gente tivesse acesso à casa da tia Ana...

- Quem sabe quando a Mel voltar. – Andy sugeriu. – Ela vai estar de volta bem antes do início das aulas. Parece que o irmão dela vai mesmo para Hogwarts e querem que ele tenha algum tempo para se acostumar ao mundo mágico.

- Você está se correspondendo com a Mel? – Hector estranhou. Por que ele estava escrevendo para ela? Aliás, por que ele mesmo não tinha pensado nisso? Ah, que besteira, porque iria querer escrever para ela?

- Não... – Andrew corou. – Eu escrevi algumas vezes para a Danna. Poucas vezes. – Apressou-se a acrescentar. – E ela me contou.

- Ah, está escrevendo para a Danna... – De repente, Hector estava sorrindo de forma estranha, mas descontraída.

- Isso mesmo! A Mel! – Joshua exclamou, assustando os outros meninos. – Ela é brasileira, e o Hector ouviu o Neville dizendo para o Professor Lupin que aquela flor em um dos lados do medalhão era da Amazônia!

- Não sei não, Josh. – Andrew ponderou. – A sra. Weasley também é. Digo, a Ana Weasley. Ela já teria achado algo se fosse tão fácil assim. É adulta, auror e conhece os meios tanto trouxas quanto bruxos.

- É, tem razão... – Josh “murchou”.

- Não, acho que não custa tentar. Eu mesmo vou escrever para a Mel. – Hector declarou.

Os meninos continuaram a discutir o que tinham descoberto, anotando os detalhes, e distribuindo tarefas. Vinte minutos depois, a sra. Shacklebolt apareceu com uma bandeja voadora atrás dela, cheia de petiscos deliciosos. Josh fez uma careta desanimada para a quantidade de frutas que via, mas os amigos pareceram não se importar: devoraram cheios de entusiasmo.

***

Barton St. David marca o símbolo de Libra no “Zodíaco de Glastonbury”, enquanto West Lydford, o de Escorpião. Além velhas igrejas, ruazinhas largas com pitorescas casas típicas da classe média, postos de saúde e escolas, a região se constitui de quilômetros e mais quilômetros de campos com um rio aqui ou ali.

Assim que chegaram na Igreja de Barton St. David, com sua singular torre quadrada, Lupin parou, olhou ao redor e começou a se afastar em direção de um dos campos.

- Remo! Não devíamos entrar na Igreja para ver se encontramos outra indicação? – Tonks o chamou, verbalizando também as dúvidas dos outros.

Ele parou, voltou-se e olhou para a esposa com um sorriso amoroso antes de responder, sorrindo:

- Esta igreja é uma construção recente. Um templo anglicano, com uns duzentos anos, mais ou menos.

- Estamos no lugar errado? – Harry perguntou.

- Talvez não. A igreja é recente, mas existem vestígios de uma muralha. – Ele apontou o local mais adiante. – Vê? Dá para ver o que restou dos blocos de pedra meio escondidos pela grama. Além disso... Quando se trata de procurar pela entrada de Avalon, acho uma boa idéia “seguir as brumas”.

Lupin se referia à neblina que se via sobre o chão de terra escura. Neblina baixa e... Que estranhamente só estava naquele local!

Uma vez que os quatro estavam no meio daquele campo, a neblina se adensou até cobrir quase que completamente suas visões. Quando a névoa voltou a se dissipar, eles não estavam mais no campo em frente à igreja, mas às margens de um grande de lago. À frente, a ilha mais maravilhosa que tinham visto.

- Como vamos atrav... – Gina começou a perguntar, sendo interrompida pela súbita aparição de um barqueiro vestido como um bárbaro do século VI.

- Olá, meu nome é Edgar e sou o seu...- Os olhos dele recaíram sobre Harry e se fixaram na cicatriz. – Santos Hipogrifos, é Harry Potter!

- Er... – Harry resolveu falar, após alguns segundos em que o homem ficou em pé, no barco, encarando-o com os olhos do tamanho de um prato e sem dizer nada. –Poderia nos levar até a ilha, por favor?

O barqueiro sacudiu a cabeça, como se tivesse saído de um transe, e disse:

- Senhor, eu me dou como comida de dragão peruano se não o fizer!

Edgar, um senhor de meia-idade robusto e com as faces coradas os levou através das águas do lago pantanoso. Ele era um dos funcionários do grupo financeiro que agora “administrava” o lugar. Milhares de wiccas ao redor do mundo não vão gostar disso, eu sei, mas... Avalon agora é um famoso resort bruxo. E o papel de Edgar naquilo tudo era representar os fiéis barqueiros que, sob o comando da Grã-Sacerdotisa de Avalon, atravessavam as pessoas até a ilha.

À frente dele, Avalon se mostrava majestosa. A ilha se eleva em um monte rochoso, e nele mesmo as construções haviam sido esculpidas. Harry podia ver claramente as entradas de cada uma delas. Lembrou-se de tê-las visto antes, nas fotos que Gui e Fleur trouxeram de sua lua de mel, há quase dez anos.

Foi então que se deu conta de outra coisa: turistas bruxos. Aquelas construções poderiam abrigar uma quantidade perigosa deles. Não queria que sua visita à Avalon fosse motivo para especulações.

- Senhor Edgar... – Harry pigarreou. – Sei que o que vou pedir pode parecer estranho, mas...

- Não querem que sua visita seja de conhecimento público? – O homem sorriu. – Não se preocupe, estamos acostumados a receber celebridades que não querem ser incomodadas.

- Não é isso... Quer dizer, sim. – Harry não gostava de ver as coisas por este prisma, como “celebridade”. Não era assim que queria que fosse visto. – Não que vamos fazer algo que deve ser escondido, só é mais prudente...

- Não se preocupe, rapaz, explicações não são necessárias para mim. Você nos salvou, há dez anos. E, pelo que ando lendo no Profeta Diário, continua fazendo isso.

- Ah, não, eu não...

- Sim. Salvou. Pode até achar que estava tentando salvar a sua própria vida, mas, no caminho, acabou salvando outras. Deixe-me te contar uma coisa, filho. Sou um aborto. Tenho dois filhos, um é um bruxo e o outro é um aborto, como eu. Há dez anos, quando Você-Sabe-Quem invadiu Hogsmeade, meu filho aborto morava lá, trabalhando para Madame Rosimerta. Se não fosse vocês resgatá-lo das mãos dos Comensais... – A voz do homem falhou. – Jamais poderei agradecer o suficiente, senhor Potter. Se não quer que saibam que o senhor e seus amigos estiveram aqui, é por uma boa causa tenho certeza.

Harry corou até a raiz do cabelo, enquanto Gina sorria para ele daquela forma que sabia que ela sabia o que estava se passando dentro de sua mente. Sentiu as mãos dela entre as suas, e permaneceram em silêncio até que chegaram às margens da Ilha. Acima deles, as rochas refletiam um brilho bronzeado sob os raios do sol.

- Senhor Edgar, existe um lugar com todos esses símbolos? – Lupin lhe mostrou o decalque que fizera dos relevos. Edgar fez que não com a cabeça.

- Com um deles pelo menos, então. – Gina sugeriu. Ela pensou por dois segundos e acrescentou: - O pentagrama. Algum lugar onde o pentagrama se destaque.

- Lá. – Edgar apontou para um lugar no alto do monte. – Subam pelas escadas de pedra, elas vão levá-los direto a um monumento circular, não muito grande. Na realidade, ele quase passa despercebido, já que está fora do círculo de pedras.

O barqueiro disse que os esperaria em um pequeno recôncavo um pouco mais adiante, que era escondido da vista da maioria dos hóspedes. Não fez qualquer tentativa de segui-los, intuindo que não queriam testemunhas do que quer que fossem procurar.

Parecia que tinham procurado uma eternidade, subindo e descendo pelas escadarias e caminhos estreitos quando finalmente atingiram o cume. Havia uma construção circular, que em muito lembrava Stonehenge, embora em tamanho menor. Levaram algum tempo até encontrar a estrutura que Edgar lhes indicara.

Uma pedra circular, que evidentemente não fazia parte da construção maior. Ela estava fora do círculo e tinha o tamanho de uma mesa de pôquer e bem mais baixa, de forma que os bruxos tiveram que se ajoelhar para examinar os símbolos que estavam gravados na pedra, nas laterais. No alto, no “tampo” da mesa, um enorme pentagrama.

- Dá para ver que o pentagrama foi talhado na pedra bem depois dela ser posta aqui. – Comentou Lupin. – Quem quer que o tenha construído, teve cuidado, paciência e habilidade para fazer os relevos das laterais. O pentagrama foi feito quase com pressa, sem nenhuma preocupação artística, como se apenas quisesse o pentagrama aqui...

Ele, Tonks e Harry estavam absorvidos no estudo dos símbolos, procurando entre os desenhos (alguns já ocultos pelo limo). No entanto, Gina se sentira atraída por uma parte em especial da vista. Harry percebeu a fascinação da esposa e se aproximou. Sabia o que ela estava pensando, porque ele estava sentindo o mesmo.

- O que acha que tem daquele lado? – Ela perguntou ao marido.

- Não tenho certeza... – Harry deu de ombros. – Mas acho que daqui se via Glastonbury.

- Dizem que Avalon não é mais a mesma, mas...

- Dá para sentir a magia fluindo. – Concluiu o pensamento dela.

- Você também? – Gina se admirou, embora demonstrasse estar aliviada por mais alguém ter percebido.

- Sim, desde que chegamos. Ficou mais forte aqui. – Ele acompanhou o olhar que Gina lançou para o casal Lupin e compreendeu. – Não, acho que só nós estamos sentindo.

- Harry... – O nome do marido saiu mais como um gemido.

- Ora, vamos... Isso não significa que é uma coisa ruim, só porquê...

- Eu sei. – Ela suspirou profundamente e sorriu. – Certo. Vamos nos preocupar com o medalhão primeiro...

Gina sentia algo grande a envolvendo, e se sentia apreensiva, mas não exatamente impulsionada a agir. Como um cego diante do mar: sente o cheiro, o som das ondas, e instintivamente sabe que é grande, poderoso, apesar de não poder vê-lo.

- Achei! – Lupin exclamou, chamando-lhe a atenção.

Havia um buraco circular na base do monumento. Parecia ser o sol da cena de uma batalha, mas tinha o tamanho e o formato exato do medalhão. Ele e Harry trocaram um olhar rápido.

- Não vamos saber se não tentarmos... – O ex-professor disse enquanto encaixava o medalhão no vazio circular.

Coube perfeitamente. Tão bem que todos prenderam a respiração, os olhos fixos no medalhão. Mas nada aconteceu.

- Parece que achamos mais uma peça, mas o quebra-cabeças está longe de se completar. – Lupin suspirou, desanimado.

- Espere, quem sabe... – Harry se abaixou ao lado de Lupin. – Quem sabe girando o medalhão... – E suas palavras foram acompanhadas do movimento. - Como uma chave...

Pressionando os dedos no objeto, quando completou a volta de cento e oitenta graus, o quadrado que representava aquela cena de batalha se moveu, revelando um compartimento secreto.

A euforia tomou conta do grupo. Harry já estava pensando em verificar seu interior quando ouviu um estalido. Mesmo sem entender, sem ter tempo de sequer pensar, seus instintos lhe disseram que deveria se afastar. Algo se projetou de dentro da pedra, veloz, atingindo-o no braço, rasgando a pele.

- Harry! – Gina gritou, correndo para o marido.

Ajoelhado e com grande parte do corpo pendendo para frente, Harry mantinha a mão pressionada sobre o braço esquerdo, que sangrava. Estava desconcertado. Sabia que tinha sido atingido por um projétil, e que o mesmo apenas passara de raspão, mas em toda a experiência de ferimentos e de dores nunca tinha se deparado com algo como aquilo. Uma dor aguda o trespassou, tão intensa que pensou que fosse afogá-lo. E tão de repente quanto começara, se foi.

- Estou bem! Tudo bem, Gina. – Ele acalmou a esposa e os amigos. – Foi de raspão. – Voltou-se para Gina, que continuava fitando-o preocupada. - ´Tá tudo bem, Gina, sério.

- Da última vez que você se feriu e disse que iria ficar tudo bem, Potter, um basilisco tinha te ferido e estava prestes a morrer. – A voz era um mescla de censura e brincadeira. – Não temos Falkes aqui por perto, desta vez.

- Sim, senhora! – Ele se esforçou por sorrir. Gina já lhe fechava as feridas com movimentos de varinha, ajudada por Tonks.

Certificando-se de que o ex-aluno estava bem, Lupin levantou-se e se ocupou em procurar pelo que o tinha atingido. Encontrou uma flecha alguns metros adiante.

- Que bruxo, medieval ou não, poria uma armadilha com flechas? – Mostrou o objeto para os demais.

- Seja quem for, deixou bem claro que era hostil à idéia de alguém seguir as pistas do medalhão... – Tonks olhou para a pedra que se fechara novamente.

- De qualquer forma, o compartimento está vazio. – Harry declarou. – Consegui ver o interior de relance. – Olhou para Lupin. – É possível que tenhamos feito algo errado, e por isso a armadilha foi acionada.

- É o que está parecendo. – Ele concordou e em seguida fez um sinal para que todos se afastassem. Com cuidado, voltou a girar o medalhão, encaixado na pedra. Nada aconteceu.

- Foi um tiro de aviso. – Harry disse, desanimado. – Não vai abrir novamente, a menos que descubramos o que se espera que façamos.

- Então todo mundo concorda que, por enquanto, vamos ter que deixar a “Pedra Assassina” para depois? – Gina sugeriu.

***

De manhã, Luíza havia saído com Serenna em busca dos livros escritos por Rowling. Parecia ainda muito pálida, mas garantiu que se sentiria muito melhor depois de se inteirar de tudo e, quem sabe, “o mundo faria sentido novamente”.

Carlinhos perambulava pela sala, preocupado com a esposa. Ana tinha chorado baixinho em seus braços durante muito tempo antes de finalmente adormecer. Achou melhor deixá-la dormindo mais um pouco. O sono lhe faria bem.

Em certo momento, sentiu uma necessidade imperiosa de ir até ela, como se Ana precisasse dele. Subiu as escadas quase correndo, tão forte era a sensação. A cama estava vazia e ele sentiu um frio de medo antes de vasculhar o resto do quarto.

Encontrou-a acordada, em pé diante da janela. Ana olhava, mas nada via. Seu semblante taciturno não tinha resquícios da jovem alegre e um tanto espevitada que ele conhecera.

- Sabe, seria de se esperar que eu corresse agora para o St. Mungus – Ela finalmente se pronunciou, falando mais para si mesma. –, e procurasse saber se espero um menino ou uma menina. Mas não posso. E se confirmarem que é um menino? É insano, eu sei, mas a idéia me aterroriza.

Carlinhos venceu o espaço entre eles em um instante. Forçou-a gentilmente a erguer o queixo até que seus olhares se cruzaram.

- Você não precisa. Não se não estiver preparada.

- Parece que não tem um único grama de sangue grifinório em mim, não é? – A voz dela saiu trêmula, como se tentasse gracejar, sem conseguir.

- Querida, você tem mais sangue grifinório em um único dedinho do pé do que muito marmanjo que eu conheço tem no corpo inteiro. – Ele afirmou com uma convicção que a fez sorrir de verdade.

Satisfeito ao vê-la finalmente relaxar, abraçou-a e a acalentou nos braços, como se fosse uma menina.

- As coisas estão finalmente parecendo menores agora, à luz do dia... – Ouviu-a comentar. – Mas, Carlinhos – Ela se afastou um pouco para fitá-lo. – Aquele sonho de Hermione tinha um claro aviso de perigo. Não era um sonho comum, tenho certeza.

- Mais um motivo para se acalmar. Avisos geralmente partem de quem se preocupa e quer ver nosso bem, não de quem quer lançar uma maldição fatal, não acha?

Ana deixou os olhos percorrem o rosto seguro do marido enquanto refletia a sobre o que ele acabara de dizer.

- O que seria de mim sem você? – A pergunta foi acompanhada de um sorriso lento.

Parecia que eles estavam aprendendo um pouco um com o outro. Geralmente, era Ana que o acalmava e suavizava suas preocupações.

- Oh, realmente, estaria perdida. – Ele fingiu gravidade. – De fato, acho que não há outra alternativa que não seja você ficar o resto de sua vida comigo...

***

Estava sendo um final de semana conturbado, não havia dúvidas. Sábado com medalhões milenares dando sinal de vida, manhã de domingo sendo atingido por flechas voadoras em ilhas misteriosas... E agora, uma tarde em uma reunião da Ordem conclamada às pressas.

Harry percebeu que grande parte dos membros já se encontrava na sala de estar da antiga Mansão dos Blacks. Sentiu-se um pouco encabulado pela demora, ainda que justificada pela resistência de dois bebês de quase oito meses em dormir – incluindo um elfo doméstico que parecia se ressentir mais do que os próprios bebês, quando estes choravam fazendo manha. Dobby, como elfo livre, deixara Hogwarts já há algum tempo e fora servir mais que satisfeito o casal Potter.

Ana e Carlinhos chegaram logo depois, acompanhados da amiga dela. Esta última ainda estava pálida, mas parecia melhor que Ana, que exibia uma coloração esverdeada no rosto: “Droga de noitebus!”, a ouvia resmungar, enquanto Carlinhos pacientemente a amparava. Com a gravidez avançada, ela não poderia aparatar ou fazer uso da rede de Pó de Flu.

A moça trouxa, Luíza, agora o olhava todos com assombro, à medida que iam sendo apresentados a ela. Ficou evidentemente sem fala quando chegou a vez de Harry, o olhar se fixando na cicatriz em forma de raio. Dando-se conta que o estava encarando, abaixou a cabeça, envergonhada, e buscou refúgio sentando-se ao lado de Ana. Pobre moça. Devia estar sendo difícil e aterrorizante para ela.

Snape chegou através da lareira da cozinha, sendo seguido por Serenna. Quando ela sentou perto de Ana e Luíza, conseguiu perceber que a outra brasileira se encolhia cada vez que Snape chegava perto para falar com a irmã. Certamente, agora que a moça sabia quem ele era... O antigo professor de Poções ainda carregava o estigma de ter matado Dumbledore, mesmo entre os bruxos.

Hermione estava sentada em uma cadeira, próxima à parede, parecendo muito contrariada. Antes mesmo de convocar os outros membros da Ordem, Gina e Harry haviam ido à casa de Rony e Hermione para contar o que tinha acontecido. A amiga não gostou nada de ter sido colocada de lado, quando estava tão impressionada com os sonhos que tivera. Aliás, havia pilhas e mais pilhas de livros em cima da mesa, todos sobre Avalon, e Harry não tinha dúvidas que ela havia lido cada um deles. Hermione ficou ainda mais chateada quando soube que o marido estava a par da ida deles com Tonks e Lupin até a antiga ilha, e que a idéia de deixá-la de fora partira dele. O argumento “você não está em condições...” nem chegou perto de aliviar o lado dele, pelo contrário. Seja lá o que ela viu ou sentiu naquele sonho, deixou-a perturbada o suficiente para abalar sua costumeira capacidade de se concentrar.

O burburinho da sala foi diminuindo quando Harry pediu silêncio. Um suor frio percorreu-lhe a espinha só de pensar nas coisas terríveis que teria que dizer, especialmente quando se passara tão pouco tempo do último perigo que tiveram que vencer. (1) Talvez devessem ter deixado Molly e Arthur de lado... A sogra, principalmente. Um rápido olhar para Ana confirmou-lhe que ela pensava o mesmo – ambos sabiam o quanto a senhora Weasley temia que a história de seus irmãos se repetisse, e viesse a perder mais um ente querido.

O olhar inquieto do olho mágico de Moody sobre ele lhe lembrou que todos estavam esperando que ele falasse. Começou tudo do início, pois nem todos se lembravam que Ana havia achado aquele medalhão dentro de um livro de Cornelius Agripa que estava no Ministério, nem as coisas que Lupin havia descoberto. Por fim, quem era Luíza e o que tinha acontecido no dia anterior.

Se todos já estavam curiosos em saber quem era a moça, ficaram absolutamente impressionados quando souberam que Feitiços de Memória não funcionavam nela.

Harry começou a sentir pontadas no braço esquerdo.

- Então, você deve se lembrar de tudo o que o medalhão te mostrou, não é, querida? – Agatha perguntou à Luiza, a quem já conhecia de longa data, desde a época em que visitava Ana em Brasília.

- Sim... – Ela respondeu, a voz saindo a custo. – Mas a informação é complexa demais, e eu não entendo a linguagem usada. Deve ser a antiga escrita celta.

Estavam mal, pensou Harry. Há centenas de anos esta escrita havia sido perdida, sobrevivendo apenas os significados de alguns símbolos principais e, ainda assim, cada um podia ter interpretações diversas. Um único símbolo, a exemplo da escrita chinesa, poderia trazer idéias completas.

- Quando disse complexa, Lú... – Ana falou, a inflexão de dúvida evidente na frase.

- Se essas informações fossem um mapa – Luíza se sentia mais confiante falando com Ana. – Eu estaria com a cidade de São Paulo inteirinha na minha cabeça.

O assombro dos presentes que conheciam o bastante o Brasil para saber o que aquilo significava foi o suficiente para fazer os demais compreenderem a grandiosidade do que Luíza estava falando. Os assovios agudos e uníssonos de Fred e Jorge, impressionados, fez-se ouvir.

-E tem as imagens desconexas, ainda... – Luíza continuou. – Como se fossem ilustrações do texto que eu não entendo. Acho que se esperava que eu pudesse ler aquela escrita. – Ela balançou a cabeça, em sinal de pesar. – Se eu pudesse ligá-lo a significados seria mais fácil, mas...

Harry tentava achar saídas para as questões cada vez mais complicadas que estavam se apresentando. E ainda nem havia contado sobre a vista a Avalon! As pontadas que estava sentindo no braço se transformaram em um latejar leve, e se esqueceu dele. Tinha que organizar as informações, encontrar um sentido... Sua cabeça começou a doer.

A moça trouxa ergueu o olhar, que mantivera baixo o tempo todo, e viu os rostos sombrios pela sala. A expressão acanhada e assustada que ela trazia desde que entrara ali foi substituída por compaixão.

- Não se preocupem. Eu vou começar a trabalhar nisso hoje mesmo... Quer dizer, tentar me lembrar de todos os símbolos e na ordem certa. Se não conseguir enquanto estiver na Inglaterra, continuarei quando retornar para casa, e os mantenho informados.

- Acho que não entendeu, senhorita. – Moody tentou suavizar o máximo que pôde a sua voz de rosnado. - Algo terrível pode estar acontecendo e, até sabermos o quê, deve ficar no Mundo Mágico.

- Mas, e o meu trabalho? E a minha vida?

- É exatamente essa a questão. – Snape finalmente se manifestava, a voz fria. - Um tipo poderoso e antigo de maldição mortal pode ter sido lançado sobre uma de vocês. – Olhou dela para Ana. - Ou sobre as duas.

- Severo! – Serenna o censurou pela forma indelicada como colocara a questão, ao mesmo tempo em que se ouvia uma exclamação baixa e aflita de Molly e Ana punha as mãos de forma protetora sobre o ventre.

A repreensão de Serenna foi mais eficaz que o olhar irado que Carlinhos lhe lançara, e quando Ana lhe perguntou se ele tinha certeza, respondeu com um pouco mais de tato:

- Nossa esperança é que as investigações de Lupin estejam certas que o emblema de Ravenclaw seja autêntico. – Snape ignorou o resmungo de Tonks, “É claro que Remo está certo”. – Se for assim, não me parece maldições fatais seja algo do feitio de Rowena Ravenclaw.

Fazia sentido, pensou Harry. Mas ainda tinha muitas pontas soltas, e Quim verbalizou uma delas:

- E os sonhos de Hermione?

- Podem ter sido só uma coincidência.

- Foi a coincidência mais vívida com a qual já me deparei, então. – Hermione respondeu sem nenhuma agressividade, apenas constatando um fato. – Queria acreditar também que foi só um sonho, mas as evidências que encontrei nos livros e mapas em que pesquisei... A floresta, o lago, tudo como era há séculos atrás... Igual no meu sonho.

Luíza voltou-se para Ana, buscando confirmação de que o que eles estavam falando era verdade. Carlinhos, de pé atrás dela, tinha uma das mãos no ombro esquerdo da esposa, enquanto Ana apertava firmemente a mão direita na mão livre dele. O braço esquerdo ousava sobre o ventre, como que querendo proteger o ser frágil que crescia nele. Aquilo pareceu a convencer.

-Eu fico. – Ela declarou, visivelmente comovida.

Agatha, que retorcia nervosamente um lenço bordado e com rendinhas nas mãos, enxugou uma lágrima:

- Então fique na minha casa, querida. Não, não discuta comigo, Ana. – Ela acrescentou quando viu a sobrinha abrir a boca para contestar. – Não há espaço suficiente na casa de vocês, agora que o bebê está chegando.

- Eu estou registrada em um hotel... – Luiza esclareceu.

- Não podemos deixá-la longe de nós. Não, nem pensar. – Agatha foi categórica. – Ficará comigo e com Moody.

Luíza arregalou os olhos e encarou o velho auror, a face cheia de cicatrizes, o olho mágico perscrutando tudo ao redor. Não tinha medo dele, só estava surpresa.

- É... – Ana sorriu. – Moody e tia Agatha se casaram.

- Vamos ter que por você a par dos acontecimentos dos últimos nove anos. – Serenna deu umas palmadinhas no ombro de Luíza, como se dissesse que tudo daria certo.

“Primeira etapa concluída”, pensou Harry, preparando-se para falar sobre aquela manhã. Chegara até mesmo a pensar em deixar Luíza no Lar de Elizabeth, o orfanato mantido pela Ordem e que Serenna e Snape administravam (2), mas era evidente que ela ficaria mais confortável com Agatha. E, é claro, não tinham com ela o mesmo “probleminha de vigilância” que tinham com Draco, quando se precisou escondê-lo por lá por uns tempos. (1)

- Em Smith House ficará protegida, senhorita Esteves. – Ele disse. – Com a vantagem de termos vários colaboradores da Ordem em Hogsmeade e em Hogwarts. – Harry lembrou-se da Professora McGonagall, que não pudera comparecer.

Dizer estas palavras lhe custou muito. Tinha um zunido em sua cabeça agora, além da dor de cabeça. Suava frio.

- Harry, o quê você tem? – Gina, que havia se voltado para ele quando falara, percebeu a mudança no estado do marido.

- Acho que peguei uma virose...

Harry passou a mão pela testa, e percebeu porquê Gina pareceu tão alarmada: seu rosto estava úmido de suor e, quanto levantou o braço, viu sua mão tremer sem controle. Gina tocou-lhe o braço esquerdo para fazê-lo se sentar, e o leve toque lhe provocou uma dor terrível, que Harry não conseguiu esconder.

- Diffindo! – Gina não hesitou antes de fazer o tecido da camisa dele se rasgar, revelando o profundo corte no braço, inchado e começando a enegrecer nas bordas. – Merlin, é no mesmo lugar que a flecha te atingiu!

Rony e Hermione já estavam a postos ao lado dele segundos antes de Gina revelar o ferimento.

- Que história é essa de flecha, Gina? – Arthur ajudava Rony a amparar Harry, que piorava rapidamente.

A sala se tornara um rebuliço, com todos querendo ajudar sem saber como. Enquanto Lupin resumia os acontecimentos daquela manhã, Gina voltou-se para o lugar onde os gêmeos estavam:

- Jorge, chame a Alicia!

Harry podia sentir os próprios dedos ficando insensíveis, e por mais que tentasse, não conseguia manter o equilíbrio.

- Amorentia. – Snape diagnosticou, após sentir o cheiro que saía do ferimento. – O veneno só reage no corpo quando se usa magia para fechar o corte.

- Por isso a armadilha trouxa. – Lupin disse. – Não queriam que desconfiassem que houvesse venenos mágicos. – Fitou Snape, preocupado. – Você tem o antídoto?

- Para a imensa sorte de Potter, único antídoto possível, Psychotria, é um dos ingredientes para a poção Mata-Cão que costumava fazer para você. Deve ter um pouco na despensa ainda.

E essa foi a última frase que coerente que Harry ouviu. O resto foi uma seqüência de sons longínquos, ecos dentro de sua cabeça que se confundiam uns com os outros em uma cacofonia impossível de se entender. Tentava lembrar-se de onde estava, porquê estava ali, e entender a razão de sentir-se em um limbo, mas ficava cada vez mais difícil.

Seu queixo começou a doer e em seguida sentiu um gosto amargo na boca, escorrendo pela garganta. Depois de alguns minutos, sua mente foi clareando e conseguiu distinguir rostos e sons. Estava deitado em um dos sofás, com todos ao redor dele.

- Ele está acordando. – Gina disse.

- O que aconteceu?

- A flecha. Ela estava envenenada. Snape conseguiu o antídoto.

- Agora me lembro... – Harry fez um breve movimento de cabeça na direção de Snape, à guisa de agradecimento. Era o mais perto que o seu ex-professor iria ganhar de um “obrigado” dele. – Mas porque meu maxilar está doendo? – Questionou, massageando o queixo.

- Você não queria engolir, Rony teve que te segurar e te forçar a tomar a poção. – Desta vez foi Hermione que respondeu.

- Sério? - Ele olhou para o cunhado. – Valeu, cara. Qualquer dia desses, eu devolvo o favor. – Brincou.

- Não tem pressa. – Rony sorriu, aliviado, quando constatou que ele estava se recuperando.

- Ainda bem que havia o antídoto. – Arthur comentou, enquanto Molly passava por ele para, ela mesma, verificar se o genro não apresentava mais nenhum sinal de doença.

- Não, não haveria grandes danos. – Snape declarou.

- O que quer dizer? – Quim ficou o outro, entre incrédulo e indignado com o comentário. – Sei que Potter e você jamais serão amigos, mas, por Merlim, Snape. Amorentia pode matar!

- Exatamente Shacklebolt. “Pode”. – Ele assinalou bem a palavra. - Mas não havia a quantidade necessária para isso. Pelo que eu pude analisar da flecha que Lupin me mostrou, a ponta envenenada era pequena demais. Com a amorentia que devia ter nela, o efeito seria apenas perda de consciência e eventualmente, de memória.

Alicia chegou com Jorge e se dedicou a examinar Harry, e as pessoas começaram a se afastar para deixá-la fazer seu trabalho.

- Se a intenção não era matar... – Ana comentou. – Então, é possível que a flecha estivesse lá só para impedir que a pessoa errada contasse o que descobriu. Ela perderia a consciência e não se lembraria do quê aconteceu. – A brasileira parecia reavivar com a esperança, como se um peso tivesse sido tirado de seus ombros.

- É possível. – Snape concordou com um breve aceno de cabeça.

- Mas eu tive horas antes que o efeito começasse. – Harry objetou, enquanto inclinava a cabeça, como Alicia lhe pedira, para que um instrumento medibruxo cheio de pontas pudesse ser passado por ali.

- Só que ela passou de raspão. – Lupin disse. – Se tivesse te atingido de verdade, você poderia ter caído inconsciente ali mesmo.

- Mas se tivesse outras pessoas, como havia...

- Não iriam se atrever a tentar abrir aquilo de novo tão cedo. – Rosnou Moody. – Exatamente como fizeram, mesmo não sabendo do veneno.

Harry tinha muitas dúvidas, mas Carlinhos fez um gesto em direção a Ana e ele se calou. Melhor deixá-la com aquela esperança.

Não havia mais razão para a reunião continuar, e, com as tarefas divididas, as pessoas começaram a retornar para suas casas. Luíza iria voltar para o hotel, pegar suas coisas e ir com Agatha e Moody para Smith House. Alicia concluiu que seu paciente estava realmente bem, e que a poção tinha sido administrada corretamente (o que provocou um esgar desdenhoso de Snape).

Quando só restou o casal Lupin, Serenna, Snape, Rony, Hermione e Gina e ele, Harry encarou seu antigo Professor de Poções e disse:

- Tem mais não tem?

- A diferença de quantidade entre o que estava naquela flecha e o que seria necessário para matar era muito pouca. Pode ter sido intencional, ou apenas mais um golpe de sorte seu, Potter.

Agora Harry entendia. Ana estava abalada demais, possivelmente porque a gravidez a deixava mais vulnerável, Lupin e Snape deviam ter achado melhor deixar esse detalhe omisso por enquanto.

- Ainda pode haver uma maldição fatal. – Concluiu.

- É o que está parecendo. Concordo com Lupin sobre os significados daqueles desenhos no medalhão. – Admitiu, ainda que a contragosto.

- Pois bem. – Ele assentiu, o olhar de Gina lhe passando tranqüilidade e confiança. – Eu estou pronto. Com maldição ou não, se quiser ferir aqueles a quem amo, terá que passar por cima de mim primeiro.

***

Luíza já estava a cinco dias em Hogsmeade. Aquela era a primeira vez que tomava coragem de sair de Smith House para dar um passeio na vila, ainda que estivesse acompanhada de Agatha.

As pessoas eram muito agradáveis e apenas tomava cuidado, como Agatha a instruíra, a não se aproximar demais de ninguém para não dar oportunidade para que lhe fizessem perguntas. Em último caso, deveria dizer que era filha de bruxos, parentes do primeiro marido de Agatha, mas que nascera sem poderes (um “aborto” como eles chamavam).

Pessoalmente, Luíza achava que o aviso de Agatha não era necessário: ela não teria coragem de se aproximar de ninguém mesmo. Apesar de passar pelas ruas de Hogsmeade sempre com um sorriso simpático e um “bom dia”, jamais travava conversa com ninguém. A idéia de que qualquer um deles era capaz de transformá-la em um objeto ou animal ainda a fazia tremer.

Em determinado momento, Agatha viu uma amiga dentro da Dededosdemel, que a chamou. Preocupada, a senhora pediu para que Luíza desse uma volta no quarteirão enquanto ela distraía a velha amiga porque, segundo ela, a outra lhe encheria de perguntas e não custaria muito para que descobrisse que ela não era um aborto. E Agatha não poderia ignorá-la, porque isso causaria suspeitas.

Ainda que apreensiva por andar sozinha pelas ruas bruxas, Luíza reconheceu que a vilazinha era adorável, parecia que tinha saído de uma daquelas ilustrações de livros infantis. Quando ela era criança, sua mãe lhe deu um livro que tinha histórias como “Branca de Neve”, “Ciderella” e “A Carruagem dos Doze”. Ela passava horas lendo ou simplesmente olhando as figuras (as quais ela sabia de cor desde primeira vez que as vira). Hogsmeade lhe lembrava os desenhos que tanto a fascinavam naquela época.

Andava devagar, tendo o cuidado de não se afastar muito, dando tempo para que Agatha terminasse sua conversa, saísse da Dedosdemel e a alcançasse. Estava passando em frente do Três Vassouras quanto sentiu um calafrio intenso, como se um balde de água fria tivesse sido jogado sobre ela.

- Ser atravessada por um fantasma não é nada agradável, não é? – Uma mulher que estava varrendo a calçada comentou bem-humorada.

- Fantasma? Que fantasma? – Luíza estava tão surpresa que não conteve a pergunta. Tarde demais se deu conta que eram aqueles os “sintomas” de ser atravessada por um espírito, conforme tinha lido nos livros. Mas ela não pôde vê-lo. Será que estava encrencada?

- Você não viu Sir Pelegrin? – Perguntou, um homem de uniforme e com um chapéu em forma de bastonete, que estava sentado em uma das mesas do lado de fora do Três Vassouras, estreitando os olhos enquanto o fazia.

- Eu... eu...

- Ora, Mike, deixe a moça em paz! – A mulher pôs as mãos na cintura. – O que lhe interessa que a moça não tenha visto? Eu mesma quase não consigo distinguir o espetro de um fantasma na luz do dia. São muito transparentes, você sabe.

- Até abortos conseguem ver fantasmas, Madame Rosimerta. Só trouxas não os vêem. A maioria deles, pelo menos. E, se essa moça não o viu e nem o ouviu quando Sir Pelegrin lhe pediu desculpas por atravessá-la...

“Lá se foi minha desculpa perfeita”, pensou Luíza. Estava sem saída, e apavorada. “Eu não sou criativa, nem mesmo para inventar uma desculpa para salvar minha pele”.

- E então senhorita? – O auror perguntou com firmeza, ainda que parecesse estar mais com pena do que outra coisa. – Quem conhece do mundo bruxo para estar aqui?

Pensou em dizer o nome de Agatha, ou Ana, mas como haviam espalhado o boato que ela era um aborto, isso só iria prejudicá-las. Agatha havia lhe contado sobre a regra de que trouxas só tomariam conhecimento do mundo bruxo quando tivessem um parente bruxo próximo. O Ministério iria saber que elas haviam trazido uma trouxa para o único povoado bruxo da Inglaterra. E mais ainda: iriam tentar lançar um obliviate nela, descobrindo que isso não era possível.

- Mike, está assustando a garota... – Madame Rosimerta tentou repreendê-lo mais uma vez, saindo novamente a sua defesa.

- Tem algum parente bruxo ou não, senhorita? – O auror repetiu.

“Se pelo menos eu fosse irreverente como Ana, ou ousada como a Carol, ou segura como a Déb...”.

- Ela tem a mim. – Luíza ouviu uma voz grave atrás de si e um braço masculino circundar sua cintura. – Ou melhor, ainda não somos parentes, mas vamos ser mais do que isso, não é, querida? – Ela olhou para cima e se deparou com Zacharias Smith, sorridente e muito seguro de si, a fitá-la. Ficou tão desconcertada que perdeu a fala.

- Senhor Smith... – O auror até corrigiu a postura, erguendo as costas. – Quer dizer então que...

- Iríamos anunciar só daqui a alguns dias, mas... – Parou de sorrir quando voltou o olhar de Luíza para o homem. – Espero que não incomode mais minha noiva, Mike.

- Noiva? – Madame Rosimerta pareceu agradavelmente surpresa. – Viu? – Deu um cutucão no auror. – Se você tivesse dado tempo para a garota se recuperar, ela mesma teria lhe explicado. Eu já tinha ouvido falar que Agatha tinha hospedes em Smith House. Claro, a noiva do sobrinho dela!

“Noiva?”, ao contrário do que Madame Rosimerta achava, parecia que jamais iria se recuperar de tantos sustos sucessivos. “Noiva? DELE?”.

Luíza ainda pensava em um jeito recuperar o fôlego quando o flash de uma câmera fotográfica os cegou.

- Ora, ora! Mas se isso não vale uma manchete de primeira capa, eu entrego as minhas credenciais!

Os dois se viraram encontrando uma mulher de meia-idade, sorrindo de fora maliciosa, enquanto os encarava do alto de seus óculos de armação de tartaruga. Não pôde deixar de perceber como se parecia com uma joaninha.

- Rita Skeeter! – Zach disse entre os dentes, fuzilando-a com o olhar.

***
(1) Harry Potter e o Retorno das Trevas, da Sally Owens.
(2) Close To You, da Regina McGonagall.

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(N/A):

Oi... *Tímida*.
Gostaria, primeiramente, de pedir desculpas pela demora na postagem... (ih, comecei mal. Dizem que nunca se começa um discurso pedindo desculpas).

Mas, em resumo, é o mesmo de sempre: tempo curto, capítulo difícil, autora tendo crises de criatividade...

Mas, deu trabalho. Como podem ver, o capítulo está recheado de detalhes, e de quebra ainda o terminei com uma comédia romântica, hehehe. Não ia postar hoje, mas a Regina, que corrigiu o capítulo para mim (minha salvadora!), disse que estava tudo certo... Então... Lá vai. Hehehe. Sempre escapam uns errinhos, espero que nõa sejam muitos.

Tenho um monte de notas a fazer. Vamos a elas:

1. Importantíssimo. Nunca é demais lembrar que a minha fic e a da Sally agora estão em um “limbo onde tudo pode acontecer”. Traduzindo: vilões de uma fic podem ser bonzinhos na outra, ou alguém que eventualmente vier a morrer em uma pode estar vivo na outra... Enfim. Não considerem o que acontecer na minha fic vai ser também o futuro da trama da Sally, certo? São fics independentes, só que com personagens e alguns detalhes em comum. Por falar nisso, Sally, um beijão procê, miga!!!

2. A Abadia de Glastonbury realmente existe. (Ver fotos no Espaço MSN e no Multiply). Todas as histórias realmente existem – se é verdade que José de Arimatéia esteve lá, que ela e Avalon estavam perto uma da outra ou se são o mesmo lugar, se o rei Arthur foi enterrado lá... – isso vai de cada um acreditar ou não, hehehe.

3. - O Tor: Existe (Ver mapa da região de Somerset). O Trecho tirado do livro do Apocalipse foi per minha conta, mas a capela realmente foi dedicada à São Miguel. E realmente existem indícios de construções pagãs embaixo dela.

4. O Zodíaco de Glastonbury. Em 1935, Katherine Maltwood anunciou sua descoberta do Zodíaco. Era tinha sido contratada para traduzir um conto sobre as aventuras do Rei Arthur que supostamente teria sido escrita na Abadia de Glastobury (The High History of the Holy Grail). Procurando por evidências de que os lugares dessas aventuras tivessem na verdade sido inspiradas por lugares próximos à Abadia, Katherine procurou estudar os mapas e outros escritos da época.
De fato, ela percebeu que as aventuras dos Cavaleiros da Távora Redonda correspondia a lugares no Vale de Avalon. Mas, mais do que isso, Katherine sentia que havia um certo padrão nas linhas das estradas, vales, e cursos de rios. Um padrão que ela não sabia identificar o que era.
Sobrevoando a área, ela visualizou o que lhe parecia a cabeça de um touro. Aos poucos, os outros onze símbolos do zodíaco foram ficando claros no mapa (a região hoje está muito modificada, os símbolos inteiros só podem ser encontrados em mapas antigos). Doze símbolos, na ordem certa, e mais um “Décimo Terceiro Gigante” (os desenhos no relevo da região ficaram conhecidos como os “Gigantes de Glastonbury”, por causa de seus quilômetros de extenção) – cujo desenho é o de um cão. Ele fica na região de Langport, fora do círculo. “O Cão de Langport” tem sua cauda em um lugar conhecido como “Wag” (caulda). Coincidência ou não, os nomes e até mesmo canções centenárias do lugar já apontavam para a existência de um “cão” ali. Como essa: “The Girt Dog of Langport has burnt his long tail
And this is the night we go singing wassail”.
(Ver mapa no Espaço MSN ou no Multiply).
A descoberta do Zodíaco causou grande rebuliço. No entanto, dois pesquisadores independentes, com base em mapas mais antigos que os de Katherin, disseram ser impossível aquela formação ser intencional, e que alguns caminhos que faziam parte de certos símbolos inclusive haviam sido construídos depois, em datas diferentes, não existindo antes, portanto. (Dá até para entender olhando o mapa. A gente tem que se esforçar um bocado para ver os tais “gigantes”).
Os seguidores de Katherin e os entusiastas dos mistérios de Avalon continuam sustentando que a teoria dela está correta. Usei de licença poética aqui, e estou considerando que eles sejam reais. Hehehehe.

5. Aquela conversa de italianos é para ser misteriosa mesmo. Antes que alguém me pergunte: não, não esqueci de colocar o nome do “inglês”. Nosso ianque vai ficar incógnito por enquanto.

6. Ah! Antes que aconteça um mal entendido: eu não falo italiano. Por isso, ítalo-brasileiros, nem adianta escreverem mensagens nesta língua que eu não vou entender patavinas, ehehehe. Eu pesquisei antes de colocar aquelas frases lá em cima.

7. Temos uma comunidade nova no Orkut, e foi dedicada à “Batalha dos Dragões”. O Grayback quem fez (não, não é o lobisomem do mal. É um amigo nosso do Grimmauld Place, hehehe). O endereço é: http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=28056693

8. O endereço do meu Multiply, para ver alguns vídeos e fotos: http://belzinha1.multiply.com.
O do MSN: http://segredodosfundadores.spaces.live.com/default.aspx?_c02_owner=1.


Bem, é isso aí. Não vou poder fazer as respostas individuais para o pessoal, mas já deixo registrado o meu agradecimento especial à:


RAFAELA PORTO
ANA CAROLINA GUIMARÃES
CAHH (Menina, seus pedidos de atualização me animaram um monte!)
CHARLOTTE RAVENCLAW
ANNA VOIG G. MALFOY
ALESSANDRA AMORIN
SRTÁH MÍÍÍHH
LUÍSA LIMA
DÉBORA GOEBEL
REGINA MCGONAGALL
ANA CAROL MURTA
MOLLY
GINA W. POTTER
BERNARDO CARDOSO
KIKA
LUIZ BLACK
PAMELA BLACK
PRISCILA LOUREDO
MIMI POTTER
LIZE LUPIN

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