Capítulo 7



Capítulo 7

- E aí nós jogamos sinuca. - Hermione ocupava-se ajeitando uma de suas câmeras na cozinha de Harry, sob o olhar de Gina. - Ele é mesmo muito bom. Acabamos fechando a casa.
Gina esperou um instante e puxou a orelha como para limpá-la.
- Vocês jogaram... na taberna do Duff.
- Ã-hã. Íamos apenas disputar um jogo, depois uma melhor de três, três de cinco, e assim por diante. Foi muito divertido. Mas eu não podia deixar todos aqueles sujeitos me pagarem cerveja. Eu ia dar de cara no chão.
- Homens pagando bebida para você.
-Sim, estavam empenhados, mas não bebo muito. - se tornou para trás para examinar a posição da câmara - Harry aceitou muito bem. Há muita gente que se zanga quando perde.
- Como diz? - perguntou Gina com incredulidade - Ganhou no Harry ao bilhar? Está falando do Harry Potter que eu conheço?
- Sete partidas de dez, acredito. Sabe como funciona esta cafeteira?
Gina pensou que não podia deixá-la só sem que se metesse em alguma confusão.
- Não sabe preparar um café e, entretanto, ganha do Harry ao bilhar. A única pessoa que conheço capaz de ganhar do Harry é Draco, e não conheço ninguém que ganhe do Draco.
- Estou segura de que eu ganharia do Draco. - disse Hermione com um sorriso de satisfação - Sou uma jogadora nata. Disse-o Charlie Dodd.
- Charlie Dodd? - Gina riu enquanto punha o café - Esteve com o Charlie Dodd e essa gente no botequim do Duff, jogando bilhar? Como lhes ocorreu ir ali?
- Fomos celebrar o nascimento de Miranda. O caso é que como eu ganhei a aposta Harry tem que me ajudar com meu projeto, embora não lhe faz nenhuma graça. Bloqueia-se com tudo o que tenha que ver com o sobrenatural.
- Posso te fazer uma pergunta?
- Sim, claro.
- O que teria perdido se tivesse ganho ele?
- Me teria ido dar uma volta com ele em sua caminhonete.
Gina derramou a água que estava metendo na cafeteira.
- Por Deus, Hermione! O que te passou? - Com um sorriso nos lábios, Hermione olhou pela janela com olhos sonhadores.
- Acredito que eu teria gostado.
- Não o duvido. - suspirou e começou a limpar a água derramada - Não é que queira me colocar em sua vida, mas Harry... toma muito à ligeira às mulheres, e não tende a manter relações sérias.
Hermione deixou de sonhar e voltou para a realidade.
- Já sei. Não se preocupe por mim. Cresci entre algodões, mas não sou estúpida. - se inclinou para olhar ao bebê, que dormia no carrinho - Acredito que estou levando muito bem o do Harry. É possível que tenha uma aventura com ele.
- É possível que tenha uma aventura com ele. - repetiu Gina lentamente. - Acredito que isto sim que é uma experiência paranormal.
- Espero que me dê todos os detalhes. - Gina se passou uma mão pela cara e se disse que devia ser racional. Mas a que sempre se comportou com absoluta racionalidade era Hermione.
- Diz que é possível que tenha uma aventura com o Harry. Harry Potter, meu cunhado.
- Exatamente. - incapaz de conter-se, passou um dedo pela bochecha do Jason - Ainda me estou pensando isso, mas é muito atrativo, e estou segura de que é um amante considerado. Se for ter uma aventura, será melhor que busque a alguém que eu goste e por quem sente respeito e certo afeto, não está de acordo?
- Bom, sim, em linhas gerais o entendo, mas...
Hermione se endireitou e sorriu.
- E se em cima é muito bom na cama, melhor que melhor. É obvio, uma cara e um corpo perfeitos não o são tudo, mas são uma boa bonificação. Estou convencida de que a atração física está diretamente relacionada com o rendimento na cama.
O café começou a sair antes de que Gina encontrasse as palavras adequadas.
- Fazer o amor com um homem não é um experimento, nem um projeto científico.
- Em certo modo sim que o é. Deixa de preocupar-se por mim, mamãe. Já cresci.
Riu e se aproximou de Gina para sujeitá-la pelos ombros, mas não encontrava a forma de explicar-lhe, nem sequer a ela, no que consistia sentir-se como se sentia. Livre, atrativa e capaz de enfrentar-se a qualquer situação.
- Sim, certamente que cresceste.
- Quero explorar distintas possibilidades. Fiz o que me pediam, o que esperavam que fizesse, durante muito tempo. Durante toda minha vida. Agora preciso fazer o que eu queira. - suspirou e olhou a seu redor - E isso é tudo. Por que crê que me deu de estudar os fenômenos paranormais? Um estudante de primeiro de psicologia poderia imaginar-lhe toda minha vida foi muito anormal, e de uma vez tediosamente normal. Eu era anormal.
- Isso não é certo. - protestou Gina com uma veemência que fez sorrir a sua amiga.
- Sempre me defendeste, inclusive contra mim mesma. Mas é certo. Não é normal que uma menina de sete anos estude álgebra, nem que seja capaz de discutir com historiadores sobre as ramificações políticas da guerra da Crimea, em francês. Nem sequer sei qual é a conduta normal em uma menina de sete anos, salvo em teoria, porque nunca tive sete anos.
Antes de que Gina pudesse falar, Hermione sacudiu a cabeça e seguiu falando.
- Empurraram-me a fazer muitas coisas quando era muito pequena. Não imagina o que é passar todo o ano estudando, um ano atrás de outro. Até quando estava em casa tinha professores particulares, projetos e trabalhos, e antes de que me desse conta toda minha vida estava centrada no estudo. - levantou as mãos e as deixou cair - Saca um título, saca outro, e depois vete sozinha a casa.
- Não sabia que fosse tão infeliz. - murmurou Gina.
- Não fui feliz em toda minha vida. - fechou os olhos - Meu Deus, que patético soa isso. Suponho que não é de tudo justo. Desfrutei que muitas vantagens. Formação, dinheiro, respeito, oportunidades... Mas as vantagens também podem apanhar às pessoas, igual às desvantagens. Parece ridículo que me queixe por ser uma privilegiada, mas é assim. Mas, por fim, estou fazendo algo. - respirou profundamente, triunfante - Estou fazendo algo que ninguém espera de mim, algo que dará a meus estirados colegas uma oportunidade maravilhosa para fofocar. E algo que me fascina.
- Parece-me muito bem. - disse enquanto abria os armários em busca de taças - Acredito que é maravilhoso que tenha decidido tomar um tempo livre para te dedicar ao que você gosta, e que tenha interesse por algo que quase todo mundo considera fora do normal.
Hermione aceitou a taça de café.
- Mas?
- Mas não pode considerar Harry um passatempo, como o assunto dos fantasmas. É o homem mais encantador do mundo, mas poderia te fazer danifico.
Hermione meditou sobre isso enquanto bebia.
- É uma possibilidade. Mas até isso poderia considerá-lo uma experiência. Nunca me aproximei de um homem o suficiente para que me fizesse mal.
Aproximou-se da janela para olhar a paisagem. Podia vê-lo nos campos, com o trator. Tal e como o tinha imaginado. Recordou que não era um trator o que estava utilizando, a não ser uma empacotadora. Estava preparando o feno.
- Eu adoro olhá-lo. - murmurou.
- Nenhum deles é desagradável à vista. - comentou Gina, unindo-se a ela junto à janela - E nenhum deles é fácil de esquecer. - lhe pôs uma mão no ombro - Tenha muito cuidado.
Mas Hermione tinha a impressão de que já tinha passado muito tempo estando cuidadosa.
Nem sequer sabia cozinhar. Harry não tinha conhecido nunca a uma pessoa que fora incapaz de fazer algo mais que esquentar uma lata de sopa. E inclusive aquilo era para a Hermione um projeto de proporções incomensuráveis.

Não lhe importava que estivesse ali. Convenceu-se disso. Gostava de sua companhia, e estava convencido de que ao final conseguiria levar-lhe à cama, mas não gostava de nada os motivos pelos que se mudou a sua casa.
Sua equipe estava por toda parte. Na cozinha, no salão e na habitação de hóspedes. Não podia caminhar por sua própria casa sem encontrar-se diante de uma câmara.
Incomodava-lhe a idéia de que uma mulher tão inteligente estivesse verdadeiramente convencida de que podia gravar em vídeo os fantasmas.
Mesmo assim, a situação tinha certas vantagens. Quando ele cozinhava, ela se emprestava a esfregar os pratos. E gostava de voltar para casa depois de trabalhar na granja e encontrar-lhe na mesa da cozinha, tomando notas no ordenador portátil.
Hermione afirmava que se sentia mais a gosto na cozinha, apesar de que não era capaz de distinguir uma chaleira de uma escumadeira, de modo que passava ali a maior parte do tempo.
Harry tinha conseguido acontecer gracioso a primeira noite, embora era certo que demorou bastante em dormir pensando que Hermione estava ao outro lado do corredor. E se à manhã seguinte estava frio e mal-humorado, já lhe havia passado todo quando terminou de ordenhar e foi à cozinha a preparar o café da manhã.
Quando ela baixou a tomar o café da manhã. Apesar de que não tinha comido muito; em opinião do Harry, apenas o imprescindível para manter-se com vida. Mas bebeu um café com ele, compartilharam o periódico da manha e esteve lhe fazendo perguntas. Aquela mulher estava cheia de perguntas.
Mesmo assim, resultou-lhe agradável ter companhia na primeira comida do dia. Alguém que tinha bom aspecto, que cheirava bem e que tinha muitas coisas que dizer. O problema era que quando saiu a trabalhar não deixava de pensar no aspecto da Hermione, em seu aroma e em suas palavras.
Não recordava que nenhuma outra mulher tivesse monopolizado seu pensamento durante tanto tempo, nem com tanta intensidade. Aquilo era algo que poderia preocupá-lo, se o permitia.
Mas Harry Potter não gostava de preocupar-se. E não estava acostumado a pensar em uma mulher que não parecia lhe emprestar a mesma atenção.
Era simplesmente uma questão de adaptação, ou ao menos gostava de pensar que se tratava daquilo. Agora estava convidada em sua casa, e não podia aproveitar-se de uma convidada. Por isso queria que se voltasse a partir quanto antes; para seguir avançando.
E se não pensava muito em quão bonita estava enquanto esmurrava o teclado, com os pequenos óculos redondos e os olhos concentrados, com seus pés largos e magros cruzados pelos tornozelos, não sofria muito.
Mas lhe resultava impossível não pensar nisso. Quando deixou cair uma caçarola pela terceira vez, Hermione se baixou os óculos e o olhou por cima delas.
- Não quero que tenha a impressão de que tem que cozinhar para mim.
- Se não o fizer eu, não o fará ninguém. - murmurou.
- Sei usar o telefone. Posso pedir comida preparada para que nos tragam isso.
Harry se voltou para olhá-la, divertido.
- Não está em Nova Iorque, carinho. Aqui não há serviço de comida a domicílio.
- OH.
Deixou escapar um suspiro e se tirou os óculos. Harry irradiava tensão. Decidiu que era o homem mais cheio de vida que tinha conhecido.
E naquele momento, parecia terrivelmente tenso. Provavelmente teria algum problema com o gado. Levantou-se para aproximar-se e lhe massagear os ombros.
- Tiveste um dia muito duro. Deve ser exaustivo trabalhar assim no campo, durante horas e horas, e ainda por cima ocupar do gado.
- Resulta mais fácil quando dorme bem. - disse entre dentes.
As mãos ossudas da Hermione só conseguiam lhe esticar mais os músculos que já lhe doíam.
- Tem todos os músculos em tensão. Por que não se sinta? Abrirei uma lata, ou prepararei um sanduíche, ou algo assim.
- Não gosta de um sanduíche.
- É tudo o que posso fazer. - Harry se voltou.
- O que gosto é de você.
O coração da Hermione deu um tombo, mas conseguiu sossegá-lo.
- Sim, acredito que isso já o deixamos claro. - não tremeu visivelmente - Também deixamos claro que vim aqui a trabalhar.
- Já sei tudo o que deixamos claro. - seus olhos verdes tormentosos a brocaram - Mas não tem por que eu gostar.
- Certamente que não. Te ocorreu pensar que está zangado porque não reajo da forma a que está acostumado a que reajam as mulheres?
- Não estamos falando das mulheres. Estamos falando de ti. De ti e de mim, aqui e agora.
- Estamos falando de sexo. - respondeu Hermione, apertando ligeiramente seus braços antes de apartar-se - E me estou pensando isso.
- Lhe está pensando isso? Como quem se pensa se for comer carne ou pescado? Ninguém tem o sangue tão frio.
- É o mais razoável. Será melhor que o aceite.
Voltou para a mesa e se sentou.
- Que o aceite. - repetiu Harry - Quer que aceite que vais estudar o tema de te deitar ou não comigo e que já me comunicará isso quando chegar a uma conclusão.
- Será o primeiro em lhe inteirar-se. - disse com tranqüilidade enquanto ficava os óculos.
Harry combateu seu mau humor. Era uma batalha muito dura de ganhar para um Potter. Decidiu que quão único entendia Hermione eram os raciocínios frios. Pois bem; daria-lhe raciocínios frios, e esperava que se engasgasse com eles.
- Sabe? Agora que o penso, é possível que seja muito fria para meu gosto, e certamente está cheia de ossos. Eu gosto das mulheres mais suaves e cálidas.
Hermione sentiu que lhe esticava a mandíbula, mas se obrigou a relaxá-la.
- Bom intento, granjeiro. Falta de interesse, insulto e provocação. Estou segura de que funciona em uma percentagem muita elevada de ocasiões. - se esforçou por sorrir - Mas comigo vais ter que procurar táticas um pouco mais avançadas.
- Neste momento iriam melhor as coisas sem ti.
Dado que desde sua posição não parecia avançar muito, saiu da cozinha. Quão único tinha que decidir era com qual de seus irmãos brigar.
Hermione deixou escapar uma larga respiração e se tirou os óculos para passá-las mãos pela cara. Pensou que tinha estado a ponto de ceder. Mas não podia prever que a fúria logo que controlada, o desejo selvagem e a arrogância absoluta e inata lhe resultariam tão excitantes e atrativos.
Tinha-lhe faltado muito pouco para cair em seus braços. Quando Harry se voltou para tomá-la pelos ombros, poderia ter deixado de lado todas suas dúvidas. Mas...
Não teria tido maneira de controlar a situação, com o Harry daquele humor. Haveria a possuído. E por bem que lhe soasse em teoria, dava-lhe medo levá-lo a prática.
Harry não podia suspeitar que ela estava só esperando a tranqüilizar-se e a assegurar-se de que ele estava tranqüilo. Sabia que, quando Harry estivesse tranqüilo e divertido, seria um amante delicioso e considerado. Mas se estava alterado, se mostraria impaciente.
De modo que os dois esperariam a que chegasse o momento adequado.
Reclinou-se na cadeira, com os olhos fechados. Agora que tinha desaparecido o redemoinho que parecia acompanhar sempre ao Harry, tudo estava em calma. Jogava um pouco de menos o bulício, embora agradecia o silêncio. Resultava-lhe muito fácil tranqüilizar-se naquela habitação, naquela casa. Inclusive os rangidos da madeira de noite lhe resultavam relaxantes.
Como o aroma de fumaça de madeira e um guisado de carne, a essência da canela e a maçã, o crepitar do fogo dentro da cozinha. Aquelas coisas, a fim de contas, eram as que constituíam um lar.
Ficou congelada, com os olhos ainda fechados, e o corpo em tensão como um arame. Não havia nada no fogo, de modo que não podia cheirar a comida. Não havia fogo, de modo que não podia ouvi-lo.
Abriu os olhos lentamente. Durante um momento, a habitação pareceu oscilar, e lhe nublou a visão. Uma cozinha de ferro, com o fogo aceso. Bolos esfriando-se no batente da janela, e o sol entrando através dos cristais.
Piscou e tudo desapareceu, substituído pelos azulejos, a madeira e o ruído da geladeira. Mas os aromas permaneciam, fortes e claros. Como um eco, acreditou ouvir o pranto de um menino.
- Muito bem. - se disse tremente - Era o que queria, não? Pois já o tem.
Levantou-se rapidamente e correu ao salão. Sua equipe estava entre os cômodos sofás, as cadeiras de balanço e as estantes cheias de livros. Não se tinha registrado nenhuma descida da temperatura, mas a energia bulia. Não necessitava um medidor; podia-o sentir. A eletricidade percorria toda sua pele, lhe arrepiando o cabelo da nuca.
Não estava sozinha.
O bebê estava chorando. Com uma mão na boca, olhou a gravadora. Perguntou-se se ouviria o pranto quando reproduzira a cinta. Vamos, uma das comporta se fechou em silêncio. Ouviu o som do berço sobre a madeira, e o pranto cessou.
Estavam embalando ao menino, pensou encantada. Sua mãe tinha ido tranqüilizá-lo. Era o que sentia em toda aquela energia. Um amor profundo. A casa estava viva com ele.
As lágrimas escorregaram por suas bochechas enquanto a envolvia a calidez da situação.
Quando voltou o silêncio, quando esteve sozinha de novo, foi ao ordenador e escreveu atentamente todos os detalhes.
Depois tirou uma garrafa de vinho da geladeira para celebrar seu êxito.
Harry voltou ao redor das doze da noite, e Hermione estava no mesmo lugar em que a tinha deixado. Já se tinha tranqüilizado o bastante. A ninguém gostava de muito brigar, mas Rony tinha conseguido alegrá-lo a apóie de rir dele.
Dava-lhe medo que voltasse seu mau humor ao ver de novo a Hermione, sentada à mesa da cozinha, sorrindo, diante do ordenador.
- É que não deixa alguma vez de trabalhar?
- Sou muito obsessiva. - disse com precaução - Olá.
- Olá. - franziu o cenho ao ver o rubor e o sorriso em seu rosto - O que estiveste fazendo?
- Nada. Estive jogando com os fantasmas. São uns fantasmas amistosos, muito mais agradáveis que os dos Barlow.
Harry se aproximou dela. Tinha uma garrafa de vinho quase vazia na mesa, e uma taça ao meio beber. Voltou a contemplar sua cara e riu.
- Está colocada, doutora Granger.
- Quer dizer que estou bêbada? Em tal caso, vejo-me obrigada a coincidir com seu diagnóstico. Estou muito, muito bêbada. - levantou a taça e conseguiu beber sem derramar o vinho na camisa - Não sei como ocorreu. Provavelmente porque não parei que beber.
Ao Harry adorava vê-la assim, sentada na cadeira, com os olhos brilhantes e resplandecentes. Seu sorriso, em troca, era bastante estúpida. Resultava satisfatório comprovar que também podia ser estúpida em algo.
- Sim, suponho que é uma explicação razoável. - lhe pôs um dedo debaixo do queixo para evitar que lhe inclinasse a cabeça - Comeste algo?
- Não. Não sei cozinhar. - lhe fez tanta graça que começou a rir - Olá.
- Sim, olá.
Resultava-lhe impossível estar zangado com ela naquele momento. Tinha um aspecto muito doce, e estava incrivelmente bêbada. Tirou-lhe os óculos e as deixou a um lado.
- Vou levar-te acima. - continuou.
- Não me vais beijar?
Levantou-se da cadeira e caiu ao chão.
Harry amaldiçoou, divertido, e se agachou para ajudá-la a levantar-se. Talvez estivesse bêbada, mas estava de muito bom humor. Aferrou-se a ele e lhe deu um beijo que fez que lhe saíssem os olhos das órbitas.
- Sabe muito bem. - disse Hermione, sujeitando-o pelo pescoço com mais força - Baixa aqui comigo, vale? E volta a me beijar. Quando me beija me dá voltas a cabeça, e o coração me pulsa muito depressa. Quer sentir os batimentos do coração de meu coração? - tomou sua mão e a levou a seio esquerdo - O nota?
Em efeito, Harry podia notá-lo perfeitamente. Parecia um torvelinho, e tinha que esforçar-se para comportar-se com decência.
- Deixa-o. Não está em condições, carinho.
- Sinto-me muito bem. Não quer me sentir? - A maldição do Harry não foi tão divertida como a anterior. Levantou-a do chão, sem poder evitar os alegres beijos com que Hermione cobria sua cara e seu pescoço.
- Deixa-o já, Hermione. - disse desesperado – Comporte-se.
- Não me dá a vontade. Sempre tive que observar meu comportamento. Estou farta. Deixa que te tire isto. - com mais entusiasmo que destreza, começou a lhe desabotoar a camisa - Eu adoro o aspecto que tem sem camiseta, com todos esses músculos. Quero tocá-los.
Agora Harry amaldiçoava amargamente enquanto a tirava da cozinha.
- Vais pagar por isso, asseguro-lhe isso. A ressaca será o menor de seus castigos.
Hermione riu, esperneando e passando as mãos por seu cabelo comprido e denso. Não pesava quase nada, mas os músculos dos braços do Harry começaram a tremer. Lhe dobravam os joelhos.
Esteve a ponto de gritar quando Hermione lhe mordeu a orelha.
- Eu adoro esta casa. Eu adoro você. Eu adoro tudo. Podemos tomar vinho na cama?
- Não, e será melhor que...
Cometeu o engano de olhá-la, e a boca da Hermione se pegou à sua. Não pôde evitar reagir ao beijo. O calor o percorria, atormentando-o e tentando-o. Com um comprido suspiro desesperado, sentou-se na escada e se perdeu em seus maravilhosos lábios.
- Hermione. – rogou - Me está voltando louco.
- Eu gosto de voltar louca às pessoas. Assim a posso arrumar depois, porque sou psiquiatra. - riu apoiando-se contra ele e passou os dedos por debaixo da camiseta que tinha deixado à vista - Segue me beijando, já sabe, como o faz quando posso sentir seus dentes com a língua. Eu adoro quando faz isso.
- OH, Meu deus.
Harry se levantou e a levou a habitação de hóspedes, resistindo a seus avanços. Tinha intenção de deixá-la na cama e sair dali tão depressa como pudesse.
Mas Hermione atirou dele e o arrastou a grande cama, em cima dela.
- Isto está muito bem. - suspirou, arqueando-se sob seu corpo - Eu gosto muito.
Harry gemeu impotente. O que ficava de mente se derreteu quando Hermione levou as mãos a seu traseiro e apertou.
- Não vou fazer isto.
Ofegava pelo esforço que tinha que fazer para evitar lhe rasgar a roupa.
- Claro que sim. Assim que lhe tiremos essas calças.
Deteve a mão da Hermione quando a levou a braguilha de seu jeans. Olhou sua cara, sorridente e sedutora, e com um esforço sobre-humano, recordou-se que o jogo tinha certas regras.
- Deixa de fazer tolices imediatamente.
Sujeitou-a pelas bonecas sem muita consideração e a apanhou contra a cama. O único problema era que aquela postura fazia que seus corpos se apertassem mais, e Hermione não se estava quieta.
- Por favor, Hermione! Tira-me isso mãos de cima!
Hermione sorriu, experimentando ausente as sensações que atravessavam seu torpor etílico quando Harry lhe roçava os quadris.
- Prometo-te que não te farei mal. – riu - Tem um aspecto muito feroz. Vêem e me beije.
- Deveria te estrangular.
Mas a beijou, tanto pela frustração como pela necessidade. O beijo foi selvagem e apaixonado. Quando conseguiu apartar-se, os olhos dela pesados e vidrados, mas os lábios tentadores curvados.
- Maaais!
Ele arqueou o corpo, a cabeça martelando.
- Você vai lembrar quando eu fizer amor com você, Hermione. - disse tenso. - Vai estar morta de sóbria, e lembrar cada instante. E antes de eu acabar, não vai saber nem o seu nome.
- Tudo. - ela murmurou concordando, e fechou os olhos pesados. - Tudo bem.
Deu um enorme bocejo e dormiu.
Ele ficou ainda vários minutos ali deitado, lutando para recuperar o fôlego, para recuperar a força. Sentia o subir e descer constante dos seios esmagados sob seu peito, os ângulos lisos do corpo dela, as mãos moles que ainda aprisionava.
- Você não vai me odiar pela manhã, meu bem. - murmurou ao erguer-se. - Mas talvez eu a odeie.
Pensando melhor, jogou uma colcha em cima dela e deixou-a inteiramente vestida, até os sapatos, para curtir a bebedeira.
Ele mesmo não dormiu de forma alguma. Como fizera toda a vida, Harry levantou-se primeiro que o sol. Mas nessa manhã não saiu assobiando. Não fez mais do que ir carrancudo ao quarto de Hermione antes de descer e sair para iniciar a rotina matinal.
Se os dois estudantes que o auxiliavam nas manhãs dos dias úteis notaram que o patrão não parecia ele mesmo, tiveram o juízo de não fazer comentários. As vacas foram ordenhadas e cuidadas, alimentaram-se os porcos, recolheram-se os ovos. Havia fardos de feno para abrir e espalhar.
Os cachorros dançavam em volta, como de hábito, mas após pouco tempo pareceram sentir que as coisas não andavam exatamente como deviam. Por isso recolheram-se e foram deitar-se sob a varanda.
O sol já ia alto quando Harry voltou a entrar em casa para fazer a faxina e iniciar o desjejum. O trabalho físico ajudara a dissipar a maior parte do mau humor. O senso de ridículo cuidava do resto. Ali estava ele, um homem adulto, disse a si mesmo, com fama de seduzir as damas. E mais frustrado do que se fosse um inexperiente adolescente dando o primeiro passo hesitante em território feminino.
Era risível, se se olhasse de curta distância. A visão da fria, sarcástica e inteligente dra. Granger caindo de bêbada sem dúvida valia o preço de um ingresso.
Ele pensou nisso enquanto fritava bacon. E homem algum ia queixar-se muito por ver-se nos braços de uma mulher bonita. Por mais frustrante que houvesse sido.
Claro, um outro tipo de homem se haveria aproveitado da situação. Um outro tipo de homem a teria deixado despi-lo e feito o mesmo com ela. Um outro tipo de homem haveria afundado direto naquele corpinho quente, e...
Como vinha se atormentando, ele inspirou várias e longas vezes, para firmar-se. Tinha uma sorte dos diabos por não ser um outro tipo de homem. Na verdade, em sua opinião, ela lhe devia essa. Muito.
Isso o deixou muito mais feliz quando serviu uma xícara de café para si mesmo.
Mas também, ela ia sofrer bastante. Depois que os cheiros do desjejum, o gosto da cafeína e a simples beleza da manhã fizeram o seu serviço, ele decidiu que até podia sentir um pouco de pena dela.
Hermione devia acordar com uma tremenda ressaca e um bocado de brancos na mente. Ele ia gostar de preencher esses brancos e vê-la retorcer-se de vexame. Equilibraria a balança. O bastante, pensou, para sentir piedade. Daria a ela umas aspirinas, junto com o remédio dos Potter para a manhã seguinte.
E se desse umas boas risadas às custas dela, bem, eram merecidas.
Pobrezinha, pensou, enquanto mexia os ovos com movimentos rápidos. Ela provavelmente ia dormir até o meio-dia, acordar, arrancar as cobertas da cabeça dolorida e rezar por uma morte rápida e misericordiosa.
Somando tudo, era uma troca justa pela noite infeliz que ele passara.
Ele ficou muito surpreso ao desligar o bico de gás debaixo da frigideira, pegar um prato e vê-la parada na entrada da cozinha.
Ergueu as sobrancelhas ao examiná-la. Decididamente pálida, pensou, os olhos pesados, ainda de roupão. Cabelos molhados, o que significava que na certa tentara afogar-se no chuveiro.
Ele deu um sorriso, um pouco perverso.
- Como está se sentindo, doutora?
Com cuidado, ela pigarreou.
- Ótima. - Olhou a mesa. A prova do crime continuava ali. A garrafa de vinho, a taça ainda contendo o que ela não conseguira engolir. Ia ter de enfrentar. - Acho que me entusiasmei além da conta.
- Pode-se dizer que sim. - À espera dos minutos seguintes, ele fechou a porta da cômoda talvez com um pouco de mais força que o necessário. Ela não piscou com a batida, e isso o decepcionou. - Por aqui a gente diria que você ficou bêbada feito um gambá.
Desta vez ela piscou.
- Não sou de beber muito, em geral. Fui tola, ainda mais de estômago vazio. Quero me desculpar, e agradecer a você por me botar na cama.
O sorriso dele desaparecia depressa. Ela parecia demasiado composta para o seu gosto.
- Como está a cabeça?
- A cabeça. Oh... - Ela sorriu, aliviada por ele ter a preocupação de perguntar. - Ótima. Eu não tenho ressaca. Devo ter um bom metabolismo.
Ele ficou simplesmente olhando. Será que não havia justiça no mundo?
- Não tem ressaca?
- Não, mas gostaria de um café. - Encaminhou-se para o bule. Sem tropeçar, notou Harry, à medida que aumentava o seu ressentimento. Não estreitava os olhos para evitar a claridade. Nem mesmo um silencioso e penoso gemido.
- Você quase bebeu uma garrafa de vinho, e se sente ótima?
- Huum... Faminta. - Ela tornou a sorrir-lhe, servindo-se café. - Realmente fui uma idiota ontem à noite, e você, muito compreensivo.
- É. - Ele perdia rápido o apetite. - Eu fui ótimo.
Ele sem dúvida fora, ela pensou, e merecia uma explicação junto com as desculpas.
- Você sabe, eu vi aquela abertura e... - A expressão no rosto dele avisou-lhe que deixasse os detalhes para depois. - Você está zangado comigo. E está certo. Eu fui horrível. - Ela pôs a mão no braço dele. - Totalmente descontrolada. E você tão contido e carinhoso.
- Carinhoso. - Ele cuspiu a palavra. - Você se lembra do que aconteceu?
- Mas claro. - Meio surpresa por ele pensar que esqueceria, ela recostou-se no balcão e bebericou o café. - Eu meti... bem, acho que a melhor maneira de descrever é que meti as patas em cima de você todo. Não é meu estilo habitual. Estou muito agradecida por você ter entendido que era o vinho quem falava por mim. Eu não o culparia por me deixar esparramada no chão aqui. - Porque achava mais graça do que vergonha, ela sorriu com os olhos por cima da xícara de café. - Devo ter dado um trabalhão. Não imagino que uma mulher ridiculamente bêbada seja tentadora, mas você foi muito decente, muito paciente.
Não teve sequer a cortesia de sentir-se humilhada, ele pensou. Pior ainda! Muito pior, tinha a desfaçatez de fazer dele uma espécie de santo.
- Você foi irritante.
- Eu sei. - E ela riu, cortando o último fio de controle dele. - Ainda assim, foi uma experiência. Eu nunca fiquei tão bêbada, e não creio que queira ficar de novo. Tive sorte de fazer isso sozinha, e que coubesse a você cuidar de mim. Posso pegar uma fatia desse bacon?
Ele disse a si mesmo que estava calmo, escutando o firme, embora irregular, pulsar do sangue na cabeça. Por isso falou calmo e baixo.
- Está sóbria agora, Hermione?
- Como um magistrado. - Ela mordiscou uma fatia de bacon. - E vou continuar assim por muito tempo.
Ele balançou a cabeça devagar, os olhos nos dela.
- Cabeça clara, todas as faculdades em ordem? - Ela ia responder, mas alguma coisa no tom dele tocou um sino de alarme. Olhou-o com cuidado. O brilho sombrio e perigoso nos olhos de Harry a fez recuar um passo.
- Harry...
Ele puxou-a e mandou pelos ares a caneca de café que ela ainda segurava.
- Então estava me tentando. - E esmagando a boca cheia de fúria e frustração contra a dela, perguntou: - Fui carinhoso? - girou-a até fazê-la dar com as costas na geladeira. - Compreensivo? Paciente? - Com palavras entrecortadas, continuou atacar-lhe a boca.
- Sim. Não. - ela hesitou.
Como podia pensar, com todo o sangue chocalhando na cabeça?
- Você quase me matou, diabos. - Ele ergueu o queixo dela e lançou jatos de perverso fogo em cada célula de seu corpo. - Sabe o quanto eu queria você? Captou a mensagem?
E deu-lhe a mensagem, uma mensagem muito clara de lábios impacientes, mãos rudes e prontas, um corpo cheio de tensão e fumegante de calor. Ela lutou para respirar, para ficar de pé, enquanto o que lhe restava da mente virava patê.
Derretia-se contra ele de novo, como cera mole e fragrante. Ele sentia o sangue bombeado em resposta aos ruídos baixos e sensuais que ela emitia. Ruídos ávidos de impotência que transformavam a frustrada luxúria em desesperada necessidade.
- E isso aí. - murmurou, e tomou-a nos braços. Com um sobressalto de pânico, ela empurrou-lhe a mão no peito.
- Espere.
- O diabo que eu vou esperar. - Ele faiscou os olhos para ela, quase a rasgando. - É melhor dizer não, alto e claro, e depressa, Hermione. Diga que não me quer, que não quer isto. E tenha muita certeza de que fala sério.
Sob a palma da mão, ela sentia a batida do coração dele, e a mão tremia. Achou que fosse medo, mas não era. Oh, não, medo, não: anseio.
- Eu não posso. - Ela soltou um jato de respiração. - Não estaria falando sério.
O triunfo lhe caiu bem.
- Eu sei.


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