Capítulo 4



Capítulo 4

Ele circundou a cintura dela - uma cintura admiravelmente fina - com as mãos, subiu-as pelas costelas, e massageou as costas. A onda de excitação não foi exatamente surpresa. Sem dúvida ele já sentira antes. Mas não esperara que fosse tão forte, não com ela.
Ainda assim, ele gostou e deslizou confortavelmente na onda. Como ela não protestou, de fato não mexeu um músculo, ele aninhou seu corpo no dela até sentir as curvas - não muitas - encostadas em si.
De repente queria realmente beijá-la, sentir o bom e sólido gosto daquela boca. Não apenas porque era feminino e por isso desejável, mas por ser de Hermione, e estar disposta em linhas firmes e quase desaprovadoras.
Gostava que o desaprovassem.
Mas quando começou a baixar a cabeça, ela ergueu o queixo, apenas o suficiente para deixá-lo desequilibrado.
- Uma experiência? Qual é a sua hipótese?
- Hein?
- Sua hipótese. - ela repetiu, aliviada por tê-lo interrompido. Já tivera tempo de sobra para firmar-se, decidiu. Tempo para preparar-se. - A teoria quanto ao resultado de sua experiência.
- Teoria, hein? - Ele continuou de olhos fixos na boca. Era um par de lábios fascinante mesmo, desde que não se apressasse a examiná-los de verdade. - Que tal prazer mútuo? É uma teoria boa o bastante para você, doutora?
- Claro. - Ela tomou o cuidado de não engolir em seco. Teria sido embaraçoso, e com certeza arruinado sua tentativa de transmitir indiferente sofisticação. - Por que não? Quer me beijar, menino. Vá em frente.
- Eu ia mesmo.
Mas ele se desviou da boca, apenas por um momento, e fechou os dentes de leve no queixo. Ela possuía o mais lindo queixo pontudo. Então tocou os lábios com os dele, apenas um sussurro. Sempre gostara de despertar o prazer, para si mesmo e a mulher envolvida. Mordiscou-os, testando a forma, a suavidade, e achou-os deliciosamente cheios, úmidos e receptivos.
Talvez por isso tenha parado de pensar o tempo suficiente para perder-se, afundar naquela boca macia e úmida. Para desenhá-la com a língua, provocá-la até os lábios se separarem e explorar.
Escuro e fundo era o gosto dela, mas estranhamente familiar. Ele perguntou-se como era possível isso, se a beijava pela primeira vez, mas tinha certeza, absoluta certeza, de que sentira aquele gosto antes. E o conhecimento despertava-lhe uma incrível excitação, um desejo desesperador.
Era tão minúscula. Músculos enxutos e retesados, costas esguias, seios pequenos e firmes cedendo eroticamente contra ele. E o sabor dela, um frio e úmido prado, uma tranqüila e sombria clareira no mato, agitou-lhe o sangue. Agitou-o tanto que passaram vários e estonteantes minutos até ele perceber que ela não se mexera. Não o tocava, nem deslizava os lábios sob os dele. Não emitira um único ruído.
A absoluta ausência de reação foi tão eficaz quanto um tapa. Ele recuou, o primeiro movimento trôpego até conseguir recuperar o controle de si mesmo. Com as sobrancelhas fortemente unidas, examinou a expressão passiva dela, o leve interesse nos olhos, o jeito divertido da deliciosa boca.
- Muito agradável. - ela disse, em um tom tão suave que ele quase rosnou. - Deu o melhor de si?
Ele ficou simplesmente ali a encará-la, aqueles lindos olhos cor de mar derretidos. Sabia lidar com a rejeição. A mulher tinha todo direito de rejeitar os avanços do homem. Mas não tolerava zombaria. E, maldita fosse, ele sabia que ela estava rindo em silêncio sob aquele exterior plácido.
Para evitar humilhar-se mais, agarrou-se com força ao controle. Sem isso, teria mais uma vez tomado-a nos braços e extravasado parte da quente e violenta paixão que ela conseguira incitar nele sem o menor esforço.
- Digamos apenas que, no campo das experiências, essa foi um fracasso. Eu tenho trabalho a fazer. - Demonstrando certa dignidade, ele indicou com a cabeça o telefone de parede. - Continue sua visita e dê a Luna um telefonema quando tiver terminado aqui.
- Obrigada. Até amanhã à noite no jantar.
Na porta, ele voltou-se e disparou-lhe um olhar furioso. Ela continuava ali parada, encostada na bancada. O bonito capacete de cabelos sequer fora despenteado.
- Você é uma mulher fria, Hermione.
- Assim me disseram. Obrigada pela bebida, menino da fazenda. E a experiência.
Assim que a porta bateu atrás dele, Hermione desabou sobre a bancada. Queria sentar-se, mas teve muito medo de que as pernas vergassem antes de conseguir atravessar o metro e meio de piso que a separava de uma cadeira.
Jamais imaginara que alguém, em qualquer lugar, soubesse beijar assim.
A cabeça ainda rodopiava. Agora que se achava a sós, apertou com a mão o coração aos saltos e deu várias e longas inspiradas profundas, que ecoaram na cozinha como as de um mergulhador chegando à superfície. Fora muito eficaz, imaginou. Sentia-se como se houvesse sido arrastada para um espaço profundo, escuro e abafado, e escapado apenas na hora H.
Claro que aquele homem era um perigo para a sociedade feminina. Nenhuma mulher estaria segura perto dele.
Ela ergueu a bebida e observou os cubos de gelo tilintarem musicalmente quando a levou, com as mãos tremulas, aos atacados lábios.
Mas conseguira se controlar, lembrou a si mesma. Mantivera-se indiferente e distante recitando desesperadamente o discurso de Henrique V no Dia de São Crispim. Só Deus sabia de onde viera isso, mas a impedira de choramingar como um filhote de cachorro faminto. Na verdade, começara a perder a concentração quando chegara ao verso "A lembrança do nosso pequeno exército, do nosso bando de irmãos" - mas então Harry parava de beijá-la.
Se ele tivesse continuado aquilo por mais dez segundos, ela jamais teria chegado ao fim do discurso, a não ser em miados incoerentes.
- Oh, droga. - conseguiu dizer então, e emborcou até a última gota do copo.
O chá gelado esfriou o calor na garganta, embora não no sangue. Esse tipo de paixão era uma experiência nova. Imaginou que Harry Potter iria dar urras em profana diversão se soubesse com que violência a afetara. Ela. A dra. Hermione Granger, gênio profissional, virgem perene.
Podia parabenizar-se por ter mantido a compostura, mantido pelo menos a aparência de compostura, enquanto o topo da cabeça rodopiava uns dez centímetros acima do crânio. Se ele houvesse tido até mesmo uma suspeita da ignorância dela em matéria de homens e mulheres, a mínima pista de sua deslumbrada reação a ele pessoalmente, iria com certeza aproveitar a vantagem.
Não apenas ela não conseguiria terminar nada durante a estada ali, mas tinha absoluta certeza de que iria embora com o coração contundido.
Sabia que mulheres mais experientes haviam sucumbido ao charme de Harry Potter. Esse tipo de química só podia resultar em ardentes explosões. A posição mais segura era se manter indiferente, aborrecê-lo se e quando fosse necessário, e jamais deixar que soubesse o quanto se sentia atraída.
Segura, pensou Hermione com um suspiro, e largou o copo vazio na pia. Tinha bons motivos para saber quão tediosa era a segurança às vezes. Mas viera a Antietam para provar alguma coisa a si mesma. Explorar as possibilidades e aumentar a reputação que conquistara.
Harry não fazia parte do plano.
Mas a casa fazia. Inspirou fundo mais uma vez e tentou acalmar os nervos abalados. Existia alguma coisa ali para ela, tinha certeza. Não conseguia sentir agora, quando o sistema nervoso soltava fagulhas como fios elétricos desencapados.
Precisava voltar, decidiu. Precisava voltar e assegurar-se de que teria tempo para explorar as possibilidades. O único modo de conseguir isso, decidiu, era no mesmo tempo encantar Harry e mantê-lo a uma distância segura.
O jantar na casa de Gina seria um bom começo.
Parecia a Hermione que se viam crianças em todos os lugares - bebês, as que mal haviam começado a andar, as mais velhas, todas ativas nos arrulhos, disputas e correrias. Brinquedos espalhavam-se por toda parte no tapete da sala de estar, onde Nate, de Gina, competia com a prima Layla pelo melhor e mais brilhante bloco de construção. Ela sabia quem era de quem agora. Layla, que já se equilibrava com o primo um pouco mais velho, era de Neville e Savannah, como o menino esguio, de cabelos escuros, Bryan.
Sabia que Neville era o mais velho dos irmãos Potter, um advogado que parecia muito à vontade com a gravata afrouxada.
A mulher dele talvez fosse a mais estonteante que Hermione já vira. Imensamente grávida, os bastos cabelos escuros enredados atrás em uma trança, olhos pretos sensuais e divertidos, Savannah parecia, na mente de Hermione, uma deusa da fertilidade bastante satisfeita.
Connor era quase da mesma idade que Bryan, tão louro quanto o primo moreno, e com a mesma lenta e tímida ternura de Luna nos olhos. Emma, uma fadinha dourada de seis anos, espremia-se na poltrona ao lado do padrasto. Hermione achou ao mesmo tempo amoroso e revelador ver o jeito descontraído com que Rony Potter enroscava um dos braços em volta da menina, enquanto segurava o bebe adormecido ns curva do outro.
Por mais selvagens e durões que fossem os irmãos Potter, Hermione jamais vira homens tão profundamente ligados à família.
- Então, que acha de Antietam até agora?
Draco transpôs habilmente cachorro, brinquedos e crianças e completou a taça de vinho de Hermione.
- Tenho uma opinião muito favorável. - ela respondeu, e disparou-lhe um sorriso rápido. - É encantadora, tranqüila e explodindo de história.
Ele arqueou uma sobrancelha.
- Assombrada?
- Ninguém parece duvidar disso. - Ela lançou um olhar divertido a Harry, que se instalara junto de Savannah para afagar-lhe a barriga. - Quase ninguém.
- Algumas pessoas bloqueiam a imaginação. - disse, descontraída, Savannah, e transferiu a mão de Harry para a esquerda, onde o bebe chutava forte.
- Alguns lugares nesta área têm lembranças muito fortes.
Era uma forma intrigante de descrever, pensou Hermione.
- Lembranças.
Savannah encolheu os ombros.
- Morte violenta, e infelicidade atroz deixam marcas profundas. Claro, isso não ê muito científico.
- Depende de em qual teoria você se apóia. - respondeu Hermione.
- Imagino que todos nós tivemos alguma experiência com os fantasmas, ou resíduos de energia, ou como prefira chamar. - começou Neville.
- Fale por si mesmo. - Harry emborcou a cerveja. - Eu não ando por aí falando com pessoas que não existem.
Neville apenas riu.
- Ele ainda fica fulo da vida com o assunto, por que quase o matei de susto quando éramos crianças passando a noite na velha Mansão Barlow.
Reconhecendo a expressão nos olhos de Harry, Rony decidiu entrar como apaziguador.
- Quase matou de susto todos nós. - explicou. - Fazendo ranger portas, arrastando correntes. Imagino que você esteja procurando alguma coisa um pouco mais sutil, Hermione.
- Bem, com certeza estou. - Surpreendeu-a e agradou-lhe quando Nate chegou andando com passos incertos e arrastou-se para seu colo. Não convivera com crianças tempo suficiente para saber se as atraía, ou se eram elas quem a atraíam. - Estou ansiosa para começar. - acrescentou, enquanto Nate brincava com o pingente de turmalina que ela usava.
- Jantar em cinco minutos. - anunciou Gina, o rosto belamente afogueado, entrando às pressas na cozinha. - Vamos recolher essas crianças. Draco?
- Jason dormiu. Eu já o levei para a cama.
- Eu vou pegar Layla. - Harry disparou um olhar malévolo a Savannah. - Neville vai levar no mínimo cinco minutos para levantar você do sofá.
- Neville, não deixe de dar um soco nele depois que comermos.
- Feito. - assegurou Neville à mulher, e levantou-se para ajudá-la a ficar de pé.
Como dita a regra, foi um ruidoso deslocamento assim como foi a refeição que se seguiu. A grande sala de jantar, com as altas janelas, abrigava-os a todos com muito conforto, a longa mesa de cerejeira generosa o bastante para acomodar as necessárias cadeiras altas.
A escolha de espaguete com molho de tomate, alho e ervas, travessas de antepasto e pão crocante, foi, pensou Hermione, inspirada. Havia o bastante para um exército, e as tropas escavaram com vontade.
Ela não estava habituada a refeições em família, leite derramado, conversas dispersas, discussões, nem à confusão geral e amistosa de tudo aquilo. Isso a levou a sentir-se mais uma vez como observadora, mas não tão infeliz. Uma nova experiência, pensou, a ser curtida, e também avaliada.
Achou estranhamente estimulante que, embora nem todos falassem sobre as mesmas coisas, em geral falavam ao mesmo tempo. Os dois pequenos em idade de andar manchavam com molho a si mesmo e suas bandejas. Mais de uma vez, durante a refeição ela sentiu o roçar quente de pêlo nas pernas, quando o cachorro procurava, esperançoso, migalhas ou macarrões caídos. Não conseguia acompanhar direito as conversas, que guinavam do beisebol à colheita de fins do verão, do início da dentição às fofocas da cidade, com vários temas desconectados no meio.
Estava deslumbrada.
Suas lembranças de jantares em família eram de atividades calmas, estruturadas. Introduzia-se e discutia-se um tópico de conversa tranqüilamente e a fundo durante uma refeição, e a refeição durava uma hora exata. Como uma aula, pensava agora Hermione. Uma vida bem organizada, bem preparada e bem ordenada, ao cabo da qual ela era dispensada com firmeza para ocupar-se de outros estudos.
À medida que a despreocupada confusão girava em volta, ela ia se sentindo miseravelmente infeliz com a lembrança.
- Tome.
- Como?
Distraída, ela girou a cabeça e encontrou um garfo cheio de massa nos lábios.
Automaticamente abriu a boca e aceitou-a.
- Essa foi fácil.
Harry enrolou outra garfada e estendeu-a.
- Tente mais uma vez.
- Sei comer sozinha, obrigada.
Lutando com o constrangimento, ela enconchou o espaguete.
- Mas não comia. - ele observou. - Estava ocupada demais olhando em volta, como se tivesse acabado de pousar em um planeta alienígena. - Pegou a garrafa de vinho e completou a taça dela antes que ela pudesse detê-lo. Ela nunca tomava mais que duas taças em uma noite. - É isso que parecem os Potter, do ponto de vista científico?
- Parecem interessantes. - ela respondeu friamente. - De qualquer ponto de vista. Qual a sensação de ser membro de uma família tão dinâmica como esta?
- Nunca pensei nisso.
- Todo mundo pensa na família, de onde vem, como se encaixa nela, ou não.
- E simplesmente do jeito que é.
Harry serviu-se de mais uma generosa porção da panela comunal.
- Mas, como o mais moço, você devia...
- Está me analisando, doutora? Não precisamos de um sofá e de cinqüenta minutos cravados?
- Só estou puxando conversa. - De algum modo, percebeu, ela perdera o ritmo. E vinha se saindo tão bem. Fez então um esforço para se estabilizar, tomou um vagaroso gole de vinho. - Por que não me fala do feno que vai ceifar?
Ele entortou a cabeça. Sabia quando uma mulher lhe puxava a corrente, e como puxá-la de volta.
- Vou pôr a ceifadora para fora amanhã. Você pode ir até lá e ver por si mesma. Talvez me dar uma mãozinha. Sempre preciso de um par de braços extras! Mesmo magricelas.
- Parece fascinante, mas vou estar ocupada. Meu equipamento chegou. - Ela girou o garfo e prendeu à perfeição a massa nos dentes. - Mais tarde, porém, quando eu me instalar em sua casa, com certeza vou encontrar tempo para ajudar você de vez em quando. De fato, não vejo a hora de observá-lo em seu ambiente natural.
- É mesmo? - Ele mudou de posição, virando-se para olhá-la. Roçou com a mão que apoiava no encosto da cadeira o ombro dela durante o movimento. E uma rápida e involuntária sacudida dela muito fez para suavizar seu ego, que continuava esfolado do encontro interior. Deliberadamente, aproximou-se mais, apenas um pouco mais perto. - Se é isso o que você quer, Hermione, por que não volta para casa comigo hoje à noite? Nós...
- Harry, pare de paquerar Hermione. - Gina balançou a cabeça ao baixar os olhos para a mesa. - Você está deixando-a sem graça.
- Eu não estava paquerando. Só tendo uma conversa. - Ele curvou os lábios e a covinha lampejou. - Não estávamos, Hermione?
- Mais ou menos.
- Harry não consegue manter os olhos, nem as mãos, longe das senhoras. - Pesada e lenta demais para fazer justiça à refeição, Savannah afastou o prato semi-comido. - As espertas não o levam a sério.
- Que bom que Hermione é uma das espertas. - interferiu Rony. - Eu confesso a vocês, é triste ver a maneira como algumas mulheres o cercam com mimos.
- É, isso me deixa deprimido mesmo. - Harry deu um sorriso malicioso. - Mal consigo ficar de cabeça erguida. Ainda na semana passada, Louisa Tully me trouxe uma torta de pêssego. Foi desmoralizante.
Draco bufou.
- O problema é que muitas delas ainda não entenderam que o caminho para o seu coração não é pelo estômago. É pela... Ai! - Ele retraiu-se, rindo quando Gina o chutou com força por baixo da mesa. - Mente. Eu ia dizer mente.
- Tenho certeza de que ia. - rebateu Gina recatada.
- Harry está sempre beijando alguém.
Bryan engoliu a última mordida da terceira porção, e usou o guardanapo em vez das costas da mão para limpar a boca, apenas por haver captado o olhar da mãe.
Divertindo-se agora, Hermione curvou-se para a frente e sorriu para o menino.
- É mesmo?
- Oh, é, sim. Na fazenda, no parque de beisebol, aqui mesmo na cidade, também. Alguns dão risadinhas. - Ele revirou os olhos. - Con e eu achamos nojento.
Harry sempre achara que fogo se combate com fogo, e virou-se para o sobrinho.
- Eu soube que Jenny Metz está gamada em você.
Bryan corou do queixo manchado de molho até as raízes dos cabelos.
- Não está nada.
Mas a humilhação e o medo de meninas bastaram para fechar-lhe firmemente a boca. Neville lançou ao enteado um olhar solidário e desviou a conversa para terreno mais seguro. De seu ponto privilegiado, Hermione viu Gina curvar-se e murmurar alguma coisa ao Bryan de ombros curvados que fez o menino sorrir.
O som de choro irritado atravessou o monitor da babá eletrônica de um dos bebês quase tão logo terminou a refeição. Após um acalorado debate, Hermione começou a lavar os pratos. Os bebês precisavam ser cuidados, como salientou. As crianças postas para dormir. Ela era a mais bem preparada para lavar pratos do que cumprir qualquer uma dessas responsabilidades. E com isso encerrou o assunto, era uma amiga ou uma convidada?
Enquanto trabalhava, ouvia as vozes na sala de estar e mais ruídos pelo outro monitor que ficava na cozinha. Alguns suaves, alguns profundos. Calmantes, pensou. Um tipo de rotina que desencavava raízes e aprimorava tradições. Ouvia Draco falando com Nate, enquanto o aprontava para deitar-se, e Gina murmurando com o bebê enquanto o amamentava.
Alguém - achou que era voz de Rony - dirigia calmamente as crianças para pegarem os brinquedos espalhados. Neville espichou a cabeça uma vez, desculpando-se por fugir ao dever da cozinha, e explicou que Savannah estava exausta.
Ela o afastou com um aceno de mão. Tinha certeza que, se outra pessoa tivesse de enfrentar uma confusão como aquela, as pilhas de panelas, frigideiras, pratos e copos, se amedrontaria na melhor das hipóteses e se entediaria na pior. Mas para ela era uma tarefa nova, e portanto divertida.
Harry entrou, os polegares enganchados nos bolsos.
- Parece que é melhor arregaçar as mangas.
- Não precisa entrar nisso. - Hermione solucionava o problema de encaixar tudo nas divisões da máquina de lavar pratos em uma equação geométrica. - Já dei um jeito.
- Todos os demais estão ocupados com crianças ou mulheres grávidas. Sou tudo que você tem. - Então enrolou mesmo as mangas. - Vai pôr os pratos aí, ou estudar o problema a noite toda?
- Estou criando um sistema. - Bastante satisfeita com o trabalho, Hermione começou a encher a máquina. - O que está fazendo?
- Vou lavar as panelas. - ele respondeu.
Ela parou e estreitou um pouco os olhos, enquanto recalculava.
- Isso seria mais simples.
Sentiu um cheirinho de limão do sabão que ele espremeu em água quente corrente. Mas quando se curvou, bateu com o traseiro na coxa dele e teve mais uma vez de endireitar-se.
- Espaço apertado em volta da pia. - ele disse, com um sorriso despreocupado.
Querendo neutralizar isso, ela apenas se transferiu para o outro lado da máquina de lavar pratos e trabalhou ali.
- Então, paquerar mulheres é vocação ou ocupação?
- É um prazer.
- Hum... Não é complicado, em uma cidade pequena, fazer malabarismos com as mulheres?
- Acho que seria, se a gente pensasse nelas como bolas de borracha em vez de pessoas.
Ela assentiu com a cabeça, arrumando meticulosamente os pratos. Seria, pensou, interessante e educacional aprofundar-se na mente de um mulherengo queridinho das mulheres.
- Vou reformular a pergunta. Não é complicado começar ou terminar uma relação em uma cidade pequena, onde as pessoas parecem saber tudo sobre a vida das outras?
- Não, se a gente faz direito. E mais um estudo, Hermione?
Ela mais uma vez se endireitou, combatendo um rubor, porque era exatamente isso.
- Sinto muito. Sério. É um péssimo hábito meu... dissecar as coisas. Diga apenas: "Dê um tempo, Hermione".
- Dê um tempo, Hermione.
Havia qualquer alfinetada na ordem, e ela apenas riu e voltou ao trabalho.
- E se eu apenas dissesse que acho que você tem uma família maravilhosa e interessante, e que adorei conhecer todos eles?
- Seria muito bom. Eu também gosto muito deles.
- Dá para ver. - Ela ergueu os olhos, lábios curvados. - E isso quase me faz achar que tem mais coisas em você que um rapaz da roça conquistador de mulheres. Gostei de observar todos vocês juntos, a interação, as conversas taquigráficas, os pequenos sinais.
Ele pôs uma panela no escorredor.
- Era o que você fazia quando eu a flagrei no jantar? Observações sobre os Potter em seu ambiente natural?
O sorriso dela se desfez um pouco.
- Não, na verdade, não. Estava pensando em uma coisa inteiramente diferente. - De repente inquieta, ela pegou um pano úmido e afastou-se para limpar o fogão. - Preciso mesmo conversar com você sobre os arranjos práticos para eu trabalhar na fazenda. Entendo que você tem uma rotina, e uma vida privada. Não pretendo atrapalhá-lo.
Mas vai, ele pensou. Desconfiara disso antes, mas aquele rápido vislumbre de tristeza nos olhos dela momentos atrás o confirmara. Ele não conseguia resistir a uma mulher com segredos e histórias tristes.
- Eu disse a Gina que você podia se instalar e trabalhar lá. Logo me comprometi com isso. - Ela encolheu os ombros.
- É muito importante para mim não me preocupar em demasia em incomodar você. - Quando tornou a encará-lo, ele tinha os olhos mais uma vez frios, com a expressão levemente zombeteira. - Vai ficar fora no campo a maior parte do tempo, não vai? Enfardando feno, ou seja lá o que for?
- Ou seja lá o que for.
Ao diabo se ela não estava usando a influência dele para conseguir o que queria, pensou Harry. As duas. Pois tinha certeza de que havia duas mulheres ali, e sentia uma crescente fascinação por cada uma delas.
Embora não houvesse terminado de lavar todas as panelas, pegou uma toalha e enxugou as mãos. Talvez fosse aquele esguio pescoço branco, imaginou. Implorava simplesmente para ser tocado, saboreado. Ou poderiam ser aqueles estranhos olhos dourados, que insinuavam todo tipo de emoções enganosas, mesmo quando brilhavam com confiança. Ou talvez apenas seu próprio ego, ainda eriçado pela resposta zombeteira que ela lhe dera de manhã.
Fosse o que fosse, sentiu-se impelido a testá-la, e talvez a si mesmo, mais uma vez.
Deslizou de mansinho para trás dela. Seguindo o impulso, baixou a cabeça e fechou os dentes delicadamente na sensível nuca. Ela sobressaltou-se colocou-se de pé, esbarrando nele com um tremor que pareceu fustigá-la da cabeça aos dedos dos pés. Tão surpreso quanto satisfeito, ele tomou-lhe os ombros firmemente nas mãos e virou-a de frente.
- Não tão fria desta vez. - murmurou, e esmagou-lhe a boca com um beijo de experiente habilidade e devastadora intensidade.
Ela não tivera tempo de preparar-se, pensar e defender-se. Ele simplesmente a destruiu com a boca. A cabeça de Hermione girava, os joelhos amoleciam, o sangue entrava em rápida fervura. Jamais na vida tantas sensações a golpearam de uma só vez. A tranqüila e quente exigência da boca tomando a sua, as mãos duras, confiantes, movendo-se sobre ela, o cheiro de limão, sabão e... homem.
Como não conseguia avaliar o que acontecia com a mente, deixou o corpo assumir o controle. Um fraco ruído de aceitação saiu-lhe ronronando da garganta. Ela não pôde detê-lo, nem o tremor ou o calor, nem a súbita e confusa necessidade de deixar tudo que era derreter-se nele. Um choque de prazer desencadeava outro, e outro, até não restar mais nada.
A primeira reação dele foi de arrogante deleite. Indiferente a ele? O diabo que era. Ela era quente, tremia, gemia. A mulher que ele beijara de manhã fora fria, divertida e zombeteira. Não esta. Esta era...
Deliciosamente quente. Ele poderia provar aquela boca eternamente, tão suave, tão macia, tão sedosa. Foi mais fundo, excitado por cada gemido e murmúrio. Ficou com a mente vazia de felicidade e prazer quando deslizou as mãos sob o suéter dela e encontrou apenas Hermione.
Ela estremeceu, a respiração presa na garganta ao senti-lo roçar as palmas ásperas nos pequenos e firmes seios. Com os polegares, ele varreu de leve os mamilos rígidos, sorveu os arquejos e absorveu os tremores dela.
Os braços que ela erguera para passar em volta do pescoço dele ficaram frouxos, caíram devagar para os lados, em um tipo de impotente rendição que o excitou insuportavelmente, mesmo enquanto o advertiam.
Ele soltou-se e recuou, apoiando as mãos no fogão em cada lado dela, e examinou seu rosto. Hermione tinha as faces afogueadas, os olhos fechados, a respiração saía rápida e áspera pelos lábios eroticamente inchados pelos dele.
Imaginou que ela devia ficar assim mesmo deitada no chão, com ele montando-a. A imagem levou-o a agarrar-se ao fogão até os dedos doerem.
Então, ela abriu os olhos, e ele viu que estavam cegos, drogados e um pouco receosos.
- Ora, ora, ora... - Ele disse isso em um tom leve, zombeteiro, tanto em defesa quanto em triunfo, com o estômago dando guinadas de necessidade. - Eu diria que obtivemos um resultado diferente desta vez.
Ofegante, ela não conseguia estabilizar a respiração, muito menos formar uma palavra. Apenas balançava a cabeça, enquanto o corpo continuava a sofrer rápidas e letais explosões.
- Não tem teorias desta vez, doutora? - Embora ele não soubesse por que estava irritado, sentia a raiva avolumar-se. Avolumar-se, depois cravar-se, vendo-a ali parecendo indefesa, atordoada, e cada vez mais apavorada. - Talvez a gente devesse tentar de novo.
- Não. - Ela expeliu a palavra. Achou que sua vida talvez dependesse da articulação dessa única sílaba. - Não. - repetiu. - Acho que você já deu seu recado.
Ele não sabia qual fora o recado - alguma coisa sobre diversão, um teste - mas com certeza não se aplicava agora. Agora a queria com uma ferocidade totalmente sem precedentes. Acreditava que o desejo era tão natural quanto a respiração, e não devia causar mais desconforto do que a fácil exalação de ar.
E, no entanto, doía-lhe uma dor feroz.
- Você... Deixe-me passar. - ela conseguiu dizer.
- Quando eu estiver pronto. Estou esperando sua hipótese, ou seria uma conclusão agora? Sou curioso, Hermione. Como você vai reagir na próxima vez que eu a beijar? E qual das duas Hermione eu vou encontrar quando a levar para a cama?
Ela não sabia, e não rinha certeza se podia dizer-lhe se soubesse. Foi salva do que seria uma ignóbil humilhação quando Draco cruzou a porta de vaivém da cozinha.
Ele parou, resumiu a situação em um olhar e armou uma carranca para o irmão.
- Em nome de Deus, Harry.
- Fora daqui.
- E a minha maldita casa. - disparou de volta Draco.
- Então a gente sai.
Ele agarrou o braço de Hermione e deu duas passadas largas, antes de o pânico dar a ela forças para soltar-se.
- Não.
Foi só o que ela disse ao passar pelos dois e sair da cozinha.
- Que há de errado com você? - exigiu saber Draco. - Você a imobilizou no maldito fogão. Ela estava branca como um lençol. Desde quando você se dá bem assustando mulheres?
- Eu não a assustei. - Mas ele percebeu bruscamente que assustara, e que por alguns momentos não se incomodara de tê-lo feito. Na verdade, sentira uma quente emoção por conseguir isso. Era novo para ele, e degradante. - Eu não tive a intenção. Escapou ao controle. - Frustrado, correu os dedos instáveis pelos cabelos. - Droga, eu perdi o controle.
- Talvez seja melhor você manter distância até conseguir se controlar.
- É, talvez seja.
Como já estava esperando uma briga, Draco juntou as sobrancelhas. E notou então que Harry estava quase tão pálido quanto Hermione antes de sair.
- Você está bem?
- Eu não sei. - Confuso, Harry balançou a cabeça. - Ela é a mulher mais fora do comum que já vi - resmungou. - Mais fora do comum...


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