CAPÍTULO QUATORZE



CAPÍTULO QUATORZE

Gina ficou satisfeita com a forma com que conseguiu sincronizar os horários. Entrou na Central de Polícia às cinco para as dez e foi direto para a sala de interrogatório. Como evitou passar pela sua sala, conseguiu escapar das mensagens do comandante Lupin que exigiam a sua presença. Tinha a esperança de que, no momento em que fosse encará-lo, já tivesse alguma nova informação.
Paul Redford foi pontual e Gina teve que reconhecer isso de bom nele. Chegou tão elegante e sereno quanto estivera da primeira vez em que o vira.
- Tenente, eu espero que isto não leve muito tempo. O momento é muito inconveniente para mim.
- Então é melhor começarmos logo. Sente-se. - Ela fechou e trancou a porta atrás dela.
A sala de interrogatório não tinha uma atmosfera das melhores. E não era para ter mesmo. A mesa no centro era pequena, as cadeiras, duras, e as paredes não tinham enfeites. O espelho, obviamente, era transparente de fora para dentro, feito para intimidar. Gina ligou o gravador de imediato e recitou todos os dados necessários.
- Senhor Redford, saiba que o senhor tem todo o direito de trazer um advogado ou representante legal para este interrogatório.
- A senhorita vai ler todos os meus direitos legais, tenente?
- Se desejar, posso fazer isso. O senhor não foi acusado de nada, mas tem direito a aconselhamento quando responde a perguntas em um interrogatório formal. Deseja este aconselhamento agora?
- Não, no momento não. - Ele arrancou um fiapo de linha que ficara preso na manga do paletó. O brilho do ouro refulgiu em seu pulso, sob a forma de um bracelete. - Estou mais do que disposto a cooperar com esta investigação, como já provei vindo até aqui hoje.
- Gostaria de apresentar a sua declaração anterior para que o senhor tenha a oportunidade de acrescentar, retirar ou modificar qualquer das informações fornecidas. - e colocou um disco etiquetado e datado no computador. Com uma leve impaciência no olhar, Paul Redford ouviu toda a gravação. - O senhor quer manter todas as declarações sem modificá-las?
- Sim, elas são tão precisas quanto eu consigo me lembrar.
- Muito bem. - Gina tornou a guardar o disco e entrelaçou as mãos. - O senhor e a vítima eram parceiros sexuais.
- Exato.
- Este esquema não exigia exclusividade mútua.
- De modo algum. Nenhum dos dois desejava isto.
- Na noite do crime, o senhor e a vítima se envolveram com o uso de drogas ilegais?
- Não.
- O senhor, em algum outro momento, se envolveu com o uso de drogas ilegais em companhia da vítima?
Ele sorriu. Ao virar a cabeça para o lado, Gina reparou o reflexo de mais ouro, vindo de um cordão trabalhado muito elegante que Paul Redford usava em volta do pescoço.
- Não. - respondeu ele. - Eu não compartilhava o interesse de Cho por drogas.
- O senhor sabia a senha para desligar o sistema de segurança e entrar na casa da vítima em Nova York?
- A senha da porta de Cho? - Suas sobrancelhas se uniram. - Pode ser que sim. Provavelmente. - Pela primeira vez, ele pareceu desconfortável. Gina quase conseguia ver a sua mente avaliando a resposta e as conseqüências que ela traria. - Acredito que Cho tenha me informado a senha, em algum momento, para facilitar as coisas quando eu ia visitá-la. - Recompondo-se, pegou o notebook e digitou alguns dados. - Sim, eu a tenho aqui.
- O senhor usou esta senha para ter acesso à casa dela, na noite do assassinato?
- Não, um empregado eletrônico abriu a porta para mim. Não houve necessidade de utilizar a senha para entrar.
- Não, não houve necessidade. Antes do crime. O senhor tem conhecimento do fato de que a senha da porta também serve para armar e desarmar o sistema de segurança por vídeo?
- Acho que não estou entendendo o que quer dizer... - o ar de precaução apareceu novamente em seus olhos.
- Com a senha, a qual o senhor acaba de declarar que possuía, a câmera de segurança externa pode ser desativada. Esta câmera foi desativada por um período de aproximadamente uma hora depois do assassinato. Durante este espaço de tempo, senhor Redford, o senhor declarou que estava na academia de seu clube privado. Sozinho. Durante este tempo, alguém que conhecia a vítima, alguém que tinha a senha de sua casa e que estava familiarizado com as rotinas de segurança desativou o sistema, entrou na residência e, pelo que parece, retirou algum objeto dali.
- Eu não teria motivos para fazer nenhuma dessas coisas. Estava no clube, tenente. Registrei a minha entrada e a minha saída com o cartão eletrônico.
- Um membro do clube pode digitar o registro de entrada e de saída sem nem mesmo ter entrado. - Gina observou o rosto dele ficar rígido. - O senhor notou um enfeite, possivelmente uma caixinha chinesa trabalhada, uma antiguidade, da qual a vítima retirou uma substância e a ingeriu em seguida. Depois, declarou que a vítima trancou a caixinha na gaveta da penteadeira do quarto. Esse objeto não foi encontrado. O senhor tem certeza de que a caixinha realmente existia?
Havia gelo em seus olhos agora. Por baixo do gelo, no entanto, junto das bordas frias, Gina notou que havia algo mais. Não era pânico, ainda. Era cautela e preocupação.
- E então, o senhor tem certeza de que a caixa que descreveu realmente existia, senhor Redford?
- Eu a vi.
- E a chave?
- A chave? - Ele pegou uma jarra de água. Suas mãos continuavam firmes, notou Gina, mas sua mente trabalhava sem parar. - Cho guardava a chave pendurada em um cordão. Um cordão de ouro que estava sempre em seu pescoço.
- Nenhum cordão nem chave foram encontrados no corpo, no local do crime.
- Então, é de imaginar que o assassino o pegou; não lhe parece, tenente?
- Ela usava o cordão com a chave abertamente, à vista de todos?
- Não, ela... - Ele parou de falar, com os músculos do maxilar inferior contraindo-se sem parar. - Muito boa essa pergunta, tenente! Pelo que sei, ela usava o cordão por baixo das roupas, não o deixava à vista. Porém, como já declarei antes, eu não era o único a ser freqüentemente convidado a ver Cho sem roupa.
- Por que o senhor fazia pagamentos a ela?
- Como disse?
- Nos últimos dezoito meses, o senhor transferiu mais de trezentos mil dólares para diversas contas bancárias da vítima. Por quê?
Seus olhos ficaram sem expressão, mas Gina notou, pela primeira vez, medo por trás deles.
- Tenente, o que eu faço com o meu dinheiro certamente não é da conta de ninguém, é assunto meu.
- Não, não é. Pelo menos quando se trata de um assassinato. Ela o estava chantageando?
- Isso é um absurdo!
- Para mim, não. Ela tinha alguma coisa contra o senhor, algo perigoso, embaraçoso, algo que gostava de usar para ameaçá-lo. Mordiscava aos pouquinhos, exigindo do senhor o pagamento de pequenas quantias aqui e ali, algumas delas não tão pequenas. Imagino que ela era uma pessoa que gostava de ostentar este tipo de poder e adorava isso. Um homem pode muito bem ficar farto dessa situação. Ele pode começar a achar que só há um modo de acabar de vez com o problema. Na verdade, não era apenas o dinheiro, era, senhor Redford? Era o poder, o controle e a satisfação que ela tinha com isso e lhe esfregava na cara.
Sua respiração tornou-se ofegante e muito profunda, mas seu rosto permaneceu impassível.
- Eu diria, tenente, que a chantagem combinava bem com Cho. Só que ela não tinha nada contra mim, e eu jamais iria tolerar ameaças.
- E o que o senhor faria a respeito delas?
- Um homem com a minha posição pode se dar ao luxo de ignorar bastante coisa. No meu ramo de negócios, o sucesso é muito mais importante do que as fofocas.
- Então, por que o senhor fazia pagamentos a ela? Pelo sexo?
- Isso é um insulto!
- Não, eu imagino que um homem com a sua posição não precisaria pagar para fazer sexo. Mesmo assim, isso poderia acrescentar um sabor excitante à relação. O senhor já foi à Boate Baixaria, no East End?
- Eu não freqüento o East End e certamente não costumo ir a boates e sex clubs de segunda classe.
- Mas o senhor sabe do que eu estou falando. Esteve lá alguma vez em companhia de Cho?
- Não.
- E sozinho?
- Já disse que jamais estive lá.
- Onde o senhor estava na noite de 10 de junho, aproximadamente às duas da manhã?
- O que é isto agora?
- Pode verificar o seu paradeiro nessa data e nesse horário?
- Não sei onde eu estava. Não sou obrigado a responder a isso.
- Os pagamentos que o senhor fazia a Cho referiam-se a negócios ou eram presentes?
- Sim, não. - ele apertou os punhos embaixo da mesa. - Acho que vou exercer o direito de me consultar com um advogado.
- Claro. A escolha é sua. Fica registrado que vamos interromper o interrogatório neste momento para permitir ao entrevistado o exercício de seu direito de consultar um advogado. Por agora, interrompo a gravação. - Gina sorriu. - É melhor o senhor contar ao advogado tudo o que sabe. É melhor contar a alguém. E se o senhor não está envolvido nisto sozinho aconselho-o a pensar seriamente em livrar a sua cara. - e se afastou da mesa. - Há um tele-link público do lado de fora da sala.
- Eu tenho o meu próprio aparelho. - disse ele com rigidez. - Gostaria que a senhorita me encaminhasse a uma sala onde eu tenha privacidade para efetuar esta ligação.
- Sem problemas, Venha comigo.

Gina conseguiu evitar um encontro com Lupin transmitindo uma atualização por meios eletrônicos e permanecendo longe de sua sala. Encontrou-se com Hermione, e as duas foram para a rua.
- Você balançou Redford. Balançou de verdade.
- A idéia era essa.
- Foi o jeito com que você continuou atacando por ângulos diferentes. Tudo certinho desde o início, tudo previsível, e então, um golpe certeiro! Você o deixou encalacrado quando falou da boate.
- Ele vai conseguir retomar o equilíbrio. Ainda tenho o pagamento que ele fez para Jerry Fitzgerald para atirar em cima dele, mas ele vai estar mais preparado. Essa folga para procurar os advogados vai ajudá-lo.
- Vai, mas ele não vai mais tornar a subestimá-la. Você acha que ele é o culpado?
- Acho que pode ter sido sim. Ele a odiava. Se conseguirmos fazer uma ligação dele com as drogas... vamos ver. - Havia tantos ângulos para explorar, pensou gina, e o tempo estava correndo... correndo em direção à audiência de pré-julgamento de Luna. Se Gina não conseguisse alguma coisa sólida nos próximos dois dias... - Eu quero identificar aquele elemento desconhecido, Hermione. Quero saber quem é a fonte dele. Se conseguirmos achar a fonte, poderemos seguir por aí.
- É nesse instante que você vai deixar Malfoy entrar no caso? Vai ser um inquérito oficial.
- Ele deve ter contatos melhores do que nós. Vou compartilhar as descobertas com ele depois que a gente tiver conseguido identificar o elemento. - Seu tele-link tocou e ela franziu a testa. - Droga, droga, droga! Eu sei que é o Lupin. Dá para sentir. - Ela tirou toda a expressão do rosto e atendeu, com sobriedade: - Aqui é Weasley falando.
- Que diabos você anda fazendo?
- Senhor, estou seguindo uma pista. Estamos a caminho do laboratório.
- Deixei ordens para que você estivesse em minha sala às nove da manhã.
- Desculpe comandante, mas esta ordem não me foi transmitida. Eu não estive em minha sala. Se o senhor recebeu o relatório, poderá constatar que estive presa em um interrogatório no período da manhã. Neste momento, o entrevistado está procurando orientação com os advogados. Acredito que...
- Pare de me enrolar, tenente! Acabei de conversar com a doutora Minerva há poucos minutos.
A pele de Gina pareceu virar gelo, e ficou rígida.
- Sim, senhor.
- Estou desapontado com você, tenente. - ele falava devagar, seus olhos vinham da tela e olhavam fixamente para os dela - Pelo fato de você considerar a possibilidade de utilizar o tempo e a força de trabalho do departamento em um assunto como aquele. Não temos intenção nem desejo de investigar os fatos formalmente ou de promover qualquer sindicância sobre o incidente. Esta questão está encerrada, e deverá permanecer encerrada. Isto está bem compreendido, tenente?
As emoções se misturaram: alívio, culpa, gratidão.
- Senhor, eu... Sim, está compreendido.
- Muito bem, então. O vazamento de informações para o Canal 75 provocou grandes problemas por aqui.
- Sim, senhor. - Fale mais alguma coisa, ordenou a si mesma. Pense em Luna! - Tenho certeza de que deve ter provocado.
- Você conhece a política do departamento a respeito de vazamentos de notícias não autorizadas para a mídia.
- Conheço bem.
- E como vai a senhorita Tonks?
- A mim, pareceu que estava muito bem quando a vi no ar apresentando o programa, comandante.
Ele olhou de cara feia, mas havia um brilho em seu olhar.
- Fique esperta, Weasley. E esteja aqui em minha sala às dezoito horas. Temos que enfrentar uma porcaria de entrevista coletiva!
- Boa tática. - Hermione a congratulou. - E tudo o que você disse foi verdadeiro, exceto a parte em que falou que estávamos a caminho do laboratório.
- Eu não especifiquei qual era o laboratório...
- E aquele outro assunto trata de quê? Ele parecia bastante agitado por causa disso. Você está com mais algum lance rolando? Tem ligação com o caso?
- Não, não, é um assunto antigo. Um assunto que já morreu. - Sentindo-se grata por ter se livrado do problema, Gina passou com o carro quase deslizando pelo portão de entrada do Horizontes Futuros, o laboratório de pesquisas que era também uma empresa subsidiária das Indústrias Roarke. - Tenente Weasley, Departamento de Polícia de Nova York. - anunciou ela para a câmera.
- A senhorita está sendo aguardada, tenente. Por favor, siga até a área azul do estacionamento. Deixe o seu carro ali e pegue o veículo C em direção ao complexo Leste, setor 6, nível 1. A senhorita será recebida por um de nossos funcionários.
E foram, de fato, recebidas por uma andróide atraente, com cabelos negros e a pele branca como leite, olhos azul-claros e um crachá que a identificava como Anna-6. Sua voz era melodiosa como os sinos de uma igreja.
- Boa tarde, tenente. Espero que não tenha tido dificuldade para nos encontrar.
- Não, nenhuma.
- Muito bem. A doutora Engrave vai encontrá-las no solário. O ambiente lá é muito agradável. Sigam-me, por favor.
- Ela é um robô. - murmurou Hermione, espantada, olhando para Gina, e Anna-6 virou-se para trás e sorriu de forma maravilhosa.
- Sou um modelo novo, ainda estou em experiência. Existem apenas dez de nós neste estágio de desenvolvimento, e todas estão em uso aqui, neste complexo. Esperamos entrar no mercado dentro de seis meses. A pesquisa que foi feita para nossa criação foi muito extensa e, infelizmente, nosso custo ainda é proibitivo para a maioria dos clientes em potencial. Temos a esperança de que algumas grandes indústrias considerem que a despesa vale a pena, para podermos ter uma relação custo-benefício apropriada, a fim de sermos produzidas em massa.
- Harry já viu você? - perguntou Gina, fazendo a cabeça pender ligeiramente para o lado.
- Claro que já. Potter analisa pessoalmente todos os novos produtos. Ele se envolveu muito em busca do design mais apropriado para o modelo que eu represento.
- Aposto que sim.
- Por aqui, por favor. - Anna-6 continuou andando e virou em um corredor comprido e com teto arqueado, pintado em branco-hospital. - A doutora Engrave achou a sua amostra muito interessante. Tenho certeza de que vocês vão considerá-la de grande auxílio. - Parou diante de uma pequena tela na parede e digitou uma senha. - Anna-6 - anunciou - acompanhada pela tenente Weasley e sua auxiliar.
As placas da parede se abriram para o lado, exibindo uma grande sala cheia de plantas e uma adorável luz solar artificial. Havia um som de água correndo e um zumbido calmo de abelhas, ao longe.
- Vou deixá-las aqui e mais tarde volto para acompanhá-las até a saída. Por favor, peçam o que quiserem para beber. A doutora Engrave às vezes se esquece de oferecer...
- Vá sorrir em algum outro lugar, Anna. - a voz irritada parecia vir detrás de um grupo de samambaias. Anna-6 limitou-se a sorrir e os painéis deslizantes voltaram a se fechar. - Eu sei que os andróides têm o seu valor, mas, cá entre nós, eles me incomodam. Venham até aqui, no canteiro das espiréias.
Cautelosamente, Gina foi até onde estavam as samambaias e seguiu em frente. Adiante, ajoelhada sobre um generoso monte de terra preta, havia uma mulher. Seus cabelos grisalhos estavam presos em um coque malfeito e as mãos se apresentavam vermelhas e sujas. Seu macacão originalmente branco estava coberto por inúmeras marcas, listras e manchas escuras. Ela olhou para cima, e seu rosto fino e comum mostrou estar tão sujo quanto as roupas.
- Estou dando uma olhada nas minhocas, tentando criar uma nova linhagem. - e exibiu um punhado de terra, que se agitou, parecendo viva.
- Muito interessante! - exclamou Gina, e se sentiu decididamente aliviada quando a doutora Engrave voltou a enterrar o punhado de terra em movimento.
- Ora, então é você a policial de Potter... Sempre achei que ele ia escolher uma daquelas deusas gostosonas com pescoço magro e peitões. - e apertou os lábios enquanto avaliava Gina de cima a baixo. - Que bom que ele não fez isso. O problema com as deusas gostosonas é que elas precisam ser paparicadas o tempo todo. Prefiro sempre os espécimes híbridos, em qualquer situação.
A doutora Engrave limpou as mãos imundas nas roupas imundas. Quando se levantou, mostrou que tinha apenas um metro e meio de altura.
- Ficar remexendo na terra com as minhas minhocas é uma boa terapia. Se mais gente tentasse isso, não iria precisar de drogas para conseguir enfrentar o dia até o fim.
- Por falar em drogas...
- Sim, sim, venham por aqui. - e começou a andar em passo acelerado, para a seguir diminuir o ritmo e serpentear pelos caminhos entre os canteiros. - Isso aqui está precisando ser podado. Temos que colocar um pouco mais de nitrogênio. Elas têm sido pouco regadas também, e as raízes estão muito apertadas. - Parou ao lado de folhas verdes que pareciam lanças, parreiras com hastes encaracoladas e uma explosão de flores recém-abertas. - Chegamos ao ponto em que eles me pagam para trabalhar como jardineira. Um bom emprego para quem o consegue. Sabe o que é isto? - Gina olhou para uma flor roxa que tinha a forma de uma trombeta. Tinha certeza do que era, mas achou que podia ser alguma armadilha ou teste da especialista.
- É uma flor.
- Uma petúnia. Ora... As pessoas se esqueceram do charme das coisas tradicionais. - Parou ao lado de uma pia, lavou um pouco da sujeira que tinha nas mãos e deixou restos de terra por baixo das unhas curtas e maltratadas. - Todo mundo procura coisas exóticas hoje em dia. Flores grandes, melhores, diferentes. Um bom canteiro de petúnias vai lhe proporcionar muito prazer e exigir poucos cuidados. Você simplesmente as planta, não fica esperando que se transformem em algo que não são, e então pode aproveitar sua beleza. Elas são simples, não murcham se você olhar atravessado para elas. Um bom canteiro de petúnias significa muito. Vamos lá, então.
Ela subiu num banquinho que ficava em frente a uma mesa de trabalho entulhada com ferramentas de jardinagem, vasos, papéis, um AutoChef que piscava avisando que estava vazio e um sistema de computação muito sofisticado, dos mais modernos.
- Você me enviou um saco de pozinho muito interessante, por aquele seu amigo irlandês. Que, aliás, sabia o nome das petúnias.
- Neville é um homem de muitos talentos.
- Mandei um lindo arranjo de violetas para a mulher dele. - A doutora Engrave ligou o computador. - Eu já tinha feito uma análise da amostra que Potter me trouxe. Ele me pediu com todo o jeitinho para fazer o trabalho o mais depressa possível. Outro irlandês. Deus que os ajude! Eu gosto de trabalhar com toda a segurança, quero ter certeza do que faço quando pego uma substância como esta. Com a outra amostra, tive a oportunidade de trabalhar melhor.
- Então a senhora já está com os resultados da...
- Não me apresse, garota. Isso só funciona com irlandeses bonitões. Além do mais, eu não gosto de trabalhar para a polícia. - e deu um sorriso largo. - Eles não apreciam a arte que existe na ciência. Aposto que você nem mesmo se lembra da tabela periódica dos elementos, lembra?
- Escute doutora... - para alívio de Gina, a fórmula apareceu na tela. - Este computador é controlado?
- Sim, a segurança é por senha. Potter afirmou que é completamente seguro. E também não nasci ontem. Só nesse trabalho já saí do ovo há mais tempo do que você tem de vida. - e abanou a mão imunda para Gina, apontando para a tela com a outra. - Olhe, eu não preciso explicar os elementos básicos desta substância. Até uma criança conseguiria descobri-los; portanto, imagino que vocês já tenham identificado quase tudo.
- É o elemento desconhecido que está...
- Conheço meu trabalho, tenente. O seu probleminha está aqui. - e fez aparecer em destaque uma série de pontos na tela. - Vocês não conseguiram descobrir o que é isto a partir da fórmula porque eles a codificaram. O que temos aqui na tela é um amontoado de baboseiras. Aqui é que está a grande chave do enigma. - Esticando o braço, pegou uma pequena lâmina sobre a qual estava um pouco do pó. - Mesmo os seus técnicos mais graduados iam ter um bocado de dificuldade para descobrir isso aqui. Ele se parece com uma coisa, tem o cheiro de outra. E quando misturamos tudo junto e colocamos sob esta forma é a reação que faz a mistura se modificar. Você conhece alguma coisa sobre química?
- Preciso conhecer?
- Ah, se mais gente conhecesse...
- Doutora Engrave, eu quero conhecer tudo sobre assassinatos. A senhora me diz o que é isto e podemos continuar a partir desse ponto.
- Impaciência. Esse é outro dos problemas com as pessoas hoje em dia. - A doutora Engrave bufou e então pegou um potinho tampado. Dentro dele estavam algumas gotas de leite. - Já que você não vai ligar a mínima para o processo, não vou lhe explicar tudo o que eu fiz. Vamos abreviar, dizendo que preparei alguns testes, fiz um pouco de química básica e isolei a sua substância desconhecida.
- É isso aí?
- É, em forma de líquido. Aposto que o especialista do seu laboratório disse que isto era um tipo de valeriana, uma planta nativa do sudoeste americano.
- E...? - Gina olhou mais de perto.
- Chegou próximo, mas não ganhou a taça. É uma planta, sem dúvida, e um pouco de valeriana foi utilizado como enxerto para refinar a espécie. Isto aqui é néctar, a substância que seduz os pássaros e as abelhas e faz o mundo girar. Este néctar aqui não é de nenhuma espécie nativa.
- Nenhuma espécie nativa dos Estados Unidos?
- Nenhuma espécie nativa. Ponto final. - Esticando o outro braço, pegou um vegetal que havia sido plantado em um pote e o colocou sobre a mesa, com um baque solene. - Este aqui é o seu bebê.
- É lindo! - disse Hermione, inclinando-se em direção à luxuriante planta com flores de pontas irregulares cujas tonalidades variavam do branco-neve até o roxo bem forte. Ela cheirou, fechou os olhos e então respirou ainda mais fundo. - Nossa, é maravilhoso! É como se... - sua cabeça pareceu girar. - Puxa, é forte!
- Pode apostar que é forte mesmo. Já chega, senão você vai ficar doidona por uma hora. - e a doutora Engrave tirou a planta de perto dela.
- Hermione? - Gina pegou no braço da auxiliar e o sacudiu - Se liga! Sai dessa!
- É como tomar uma taça inteira de champanhe de um gole só. - e colocou a mão na testa. - É maravilhoso!
- Trata-se de um exemplar híbrido, experimental. - explicou a doutora Engrave. - Seu nome de código é Flor da Eternidade. Esta aqui tem quatorze meses de existência e nunca parou de dar flor. Esses espécimes foram criados em Éden, uma colônia espacial.
- Sente-se, Hermione. A substância que estamos procurando é o néctar desta flor?
- O néctar já é potente por si mesmo e provoca uma reação parecida com embriaguez em abelhas. Potencializa o mesmo tipo de reação em frutas maduras. Os pêssegos, por exemplo, ficam com uma concentração muito maior de suco. A não ser que a ingestão seja controlada, foi observado que as abelhas podem tomar uma overdose de tanto sugar o néctar. Elas não conseguem parar de sugar.
- Abelhas viciadas?
- Pode-se dizer que sim. Basicamente, elas não querem sugar o néctar das outras flores, por ficarem totalmente seduzidas por esta aqui. O seu laboratório não conseguiu descobrir a substância porque esta planta híbrida está na lista restrita dos produtos manufaturados nas colônias espaciais de horticultura, e isso a coloca sob a jurisdição da Alfândega Galáctica. A colônia está, atualmente, tentando amenizar este problema técnico com o néctar da planta, pois isto prejudica o seu potencial para exportação.
- Então a Flor da Eternidade é um espécime controlado?
- No momento, sim. Existem alguns usos medicinais para a planta e algumas outras utilidades, particularmente cosméticas. A ingestão do néctar pode resultar em maior luminosidade na pele, um aumento na sua elasticidade e, por conseguinte, promover uma aparência de juventude.
- Mas é venenoso. Quando usado por um período longo, pode destruir o sistema nervoso. O nosso laboratório confirmou isto.
- É, da mesma forma que o arsênico, mas as damas refinadas de antigamente o ingeriam em pequenas doses para tornar a pele mais clara e mais limpa. Beleza e juventude são questões desesperadamente importantes para algumas pessoas. - A doutora levantou os ombros magros em sinal de desdém. - Em combinação com outros elementos da fórmula, este néctar é um ativador. O resultado é um produto químico que cria dependência, mas promove aumento da energia, da força física, do impulso sexual e traz uma sensação de juventude e renovação. Para piorar, estes exemplares híbridos vão se proliferar mais rápido do que coelhos, se não houver controle, e podem ser produzidos a um custo baixo e em larga escala.
- E eles conseguiriam vingar aqui na Terra, nas condições naturais típicas do planeta?
- Certamente. A colônia em Éden produz vegetais, flores e plantas em geral que suportam as condições naturais do nosso planeta.
- Então, se alguém conseguir algumas mudas da planta, - refletiu Gina - tiver um laboratório e os outros produtos químicos...
- Esse alguém vai conseguir produzir uma droga ilegal com imenso apelo popular. Vale a pena. - disse a doutora Engrave, com um sorriso amargo. - Seja forte, linda, jovem e sexy. Não sei quem inventou esta fórmula, mas, seja quem for, era especialista em química, conhecia bem a natureza humana e compreendia a beleza que existe na lucratividade.
- Uma beleza fatal.
- Ah, claro, quatro a seis anos de uso constante vão derrubar o usuário. Seu sistema nervoso vai parar de funcionar. Durante esse período, no entanto, ele vai aproveitar a vida como nunca, e alguém vai encher os bolsos.
- Como é que a senhora sabe tanta coisa a respeito desta... como se chama, Flor da Eternidade... se o seu cultivo é restrito à colônia em Éden?
- Porque sou uma das mais importantes pesquisadoras em minha área, examino com atenção todos os relatórios e, por acaso, minha filha chefia o setor de apicultura em Éden. Um laboratório licenciado, como este aqui, ou um especialista em horticultura pode, com algumas limitações, importar um desses espécimes.
- A senhora está me dizendo que já existem algumas dessas plantas aqui em nosso planeta?
- A maioria delas é réplica ou são simulações inofensivas, geradas artificialmente. Outras poucas, porém, são o artigo genuíno. São regulamentadas, liberadas somente para uso interno e controlado. Bem, agora tenho que cuidar das minhas rosas. Leve o relatório e as duas amostras para os seus rapazes brilhantes na Central de Polícia. Mesmo que consigam juntar todas as pontas a partir desses dados, já mereciam ser enforcados por incompetência.

- Você está bem, Hermione? - Com cuidado, Gina mantinha a mão firme no braço de Hermione no momento em que ela abria a porta do carro.
- Estou legal, apenas me sentindo muito relaxada.
- Relaxada demais para dirigir. - notou Gina. - Eu ia pedir para você me dar uma carona até o florista, mas vamos mudar para o Plano B. A gente dá uma passada em algum lugar para você comer alguma coisa, a fim de contrabalançar a cheirada que deu naquela flor, e depois você leva as amostras e o relatório da doutora Engrave para o laboratório.
- Weasley, - Hermione recostou a cabeça no banco do carro - realmente me sinto maravilhosa.
- Você não vai me beijar, nem nada desse tipo, vai? - Desconfiada, Weasley deu uma olhada nela.
- Você não é o meu tipo. - Hermione lançou-lhe um olhar meio de lado. - De qualquer modo, eu não estou me sentindo particularmente sexy não. Estou só muito bem. Se tomar esse troço trouxer uma sensação tão gostosa quanto cheirar aquela flor, as pessoas vão ficar loucas para provar.
- É... Alguém já ficou louco o bastante para matar três pessoas.

Gina foi direto até a loja de flores. Tinha uns vinte minutos, no máximo, para ficar ali, pois ainda ia tentar localizar os outros suspeitos a fim de atormentá-los, voltar até a central para preparar o seu relatório e ainda participar da coletiva com a imprensa.
Avistou Harry, que fazia hora diante de uma vitrine com pequenas árvores floridas.
- Nosso consultor floral já está esperando por nós. - informou ele.
- Desculpe. - Ela se perguntou por que alguém ia querer árvores com menos de trinta centímetros de altura. Para Gina, aquilo era esquisito. - Eu me atrasei um pouco.
- Eu também acabei de chegar. A doutora Engrave ajudou em alguma coisa?
- Ajudou demais até. Ela é uma figura! - e o seguiu por baixo de uma estrutura em treliça de onde vinha um aroma de parreiras. - Dei uma olhada em Anna-6.
- Ah, os andróides da linha Anna! Acho que vão ser um sucesso.
- Especialmente entre os adolescentes.
Harry soltou uma risada e a empurrou pela porta, anunciando:
- Mark, esta é a minha noiva, Gina Weasley.
- Ah, sim. - Ele parecia um tio boa-praça quando a cumprimentou, e seu aperto de mão era forte como o de um pugilista em ação. - Vamos ver o que podemos fazer pela senhorita. Casamento é um assunto complicado, e a senhorita não me deu muito tempo.
- Ele não deu muito tempo para mim também. - replicou ela.
Mark riu e alisou o cabelo grisalho.
- Sentem-se, - pediu ele - relaxem e tomem um pouco de chá. Tenho um monte de coisas para lhes mostrar.
Gina não se incomodava de estar ali, pois gostava de flores. Só que não sabia que existiam tantas delas. Depois de cinco minutos, sua cabeça começou a transbordar de orquídeas, lírios, rosas e gardênias.
- Queremos algo simples. - decidiu Harry. - Bem tradicional, com flores naturais, sem imitações artificiais.
- Sim, é claro. Tenho uns hologramas que poderão lhes trazer algumas idéias. Como a cerimônia vai ser ao ar livre, eu poderia sugerir um caramanchão de glicínias. É bem tradicional e tem uma fragrância adorável, antiga.
Gina analisou os hologramas e tentou se imaginar em pé debaixo de um caramanchão com Harry, trocando votos e promessas. Seu estômago estremeceu.
- Que tal petúnias? - perguntou ela.
- Petúnias? - Mark piscou.
- Eu gosto de petúnias. Elas são simples e não fingem ser o que não são.
- Sim, certamente. São muito charmosas. Talvez acompanhadas de um arranjo de lírios. E para dar mais cor...
- Vocês trabalham com a Flor da Eternidade? - perguntou Gina, por impulso.
- Flores da Eternidade. - Os olhos de Mark ficaram mais brilhantes. - Este é um produto muito especial. São difíceis de importar, é claro, mas muito resistentes, e ficam espetaculares quando fazemos arranjos em cestas com elas. Tenho várias imitações e simulações da flor verdadeira.
- Não queremos imitações. - lembrou-lhe Gina.
- Infelizmente, elas só podem ser exportadas em quantidades muito pequenas, e apenas para floristas licenciados ou horticultores. E são só para uso interno, sempre dentro de lugares fechados. Como a sua cerimônia vai acontecer ao ar livre...
- O senhor vende muitas delas?
- Muito raramente, e só para especialistas em horticultura licenciados. Mas eu tenho algo aqui que é tão lindo quanto...
- O senhor tem registros dessas vendas? Poderia me conseguir o nome dos compradores? Sua loja está na internet e faz entregas em todo o planeta, não é?
- Naturalmente, mas...
- Preciso saber o nome de todas as pessoas que encomendaram Flores da Eternidade nos últimos dois anos.
Quando Mark lançou um olhar espantado para Harry, esse passou a língua sobre os dentes e explicou:
- Minha noiva é louca por jardinagem...
- Sim, entendo. Devo levar alguns minutos para acessar esses dados. A senhorita quer todos os nomes?
- Todas as pessoas que encomendaram Flores da Eternidade à Colônia Éden nos últimos dois anos. Pode começar com as encomendas que foram feitas daqui dos Estados Unidos.
- Se quiserem aguardar um pouco, vou ver o que posso fazer.
- Gostei da idéia do caramanchão. - anunciou Gina, levantando-se de um salto quando Mark saiu. - Você não?
Harry se levantou, colocou as mãos nos ombros dela e disse:
- Por que não deixa que eu resolva tudo sobre a decoração e as flores? Vou surpreender você.
- Vou ficar lhe devendo essa.
- Claro que vai. E pode começar a pagar, não se esquecendo de que vamos ao desfile de Leonardo na sexta-feira.
- Eu já sabia disso.
- E não se esquecendo também de fazer a requisição das três semanas de férias para a nossa lua-de-mel.
- Eu achei que a gente havia combinado duas semanas...
- Combinamos. Só que agora você está me devendo mais uma. Não quer me contar por que foi acometida por esta súbita fascinação por uma flor da colônia em Éden? Ou devo supor que você conseguiu identificar a substância desconhecida?
- É o néctar. Vai ajudar muito para a gente fazer a ligação entre os três homicídios. Se eu conseguir arrumar um pouco mais de tempo...
- Espero que seja isto o que a senhorita está procurando. - Mark voltou com uma folha de papel na mão. - Não foi tão difícil quanto eu imaginava. Não há muitas encomendas de Flores da Eternidade. A maioria dos importadores se satisfaz com simulações da planta. Parece que existem alguns problemas com o espécime verdadeiro.
- Obrigada. - Gina pegou a folha e deu uma olhada na lista, de cima a baixo. - Agora eu peguei você! - murmurou, e então se virou para Harry. - Tenho que ir. Compre muitas flores, toneladas de flores. Não se esqueça das petúnias. - e saiu correndo, pegando o comunicador. - Hermione!
- Mas... mas o buquê! O buquê da noiva! - Confuso, Mark se virou para Harry. - Ela acabou não escolhendo...
Harry a observou enquanto ela saía voando da loja.
- Eu sei do que ela gosta. - disse ele. - Às vezes, sei melhor até do que ela mesma...





Agradecimentos especiais:

Bianca: Concordo com você quanto ao Malfoy estar dando em cima da Hermione apenas para conseguir algumas informações, mas para isso ele não precisaria ser exatamente o assassino, ele poderia estar querendo passar a Gina para trás e acabar resolvendo o caso sozinho ganhando assim todos os louros para ele. Quanto ao livro que você me pediu, em primeiro lugar eu peço desculpas por ter demorado a responder o comentário, mas eu só tive tempo de baixar os comentários para responder ontem a noite e foi quando eu vi seu pedido, então primeiro peço desculpas pelo atraso... eu não tenho esse livro nem no pc e nem em livro mesmo, e agora tambem to afim de ler, vou dar uma procurada em alguns sites que eu sempre uso para baixar livros e assim que eu conseguir envio pra você. Só três stand com livros da Nora? Caramba. Beijos.

gilmara: que bom que gostou, eu tambem gosto de fics em estilo universo alternativo. Beijos.

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