CAPÍTULO DEZ





Gina já esperava pelo frio ar de desaprovação de Moody quando entrou em casa. Já estava acostumada. Não conseguiu explicar que tipo de perversão a percorreu por dentro quando se sentiu desapontada por ele não tê-la recebido na porta com nenhum comentário depreciativo.
Ela entrou na sala que ficava logo depois do saguão, ligou o sensor de pessoas e perguntou:
- Onde está Harry?

HARRY ESTÁ NO SALÃO DE GINÁSTICA, TENENTE. DESEJA FALAR COM ELE?

- Não. Pode desligar. - Ela ia até lá. Uma sessão de ginástica bem puxada. Talvez fosse disso que ela estivesse precisando para desanuviar a cabeça.
Desceu as escadas que ficavam por trás de um painel falso no corredor, foi para o andar de baixo e cortou caminho pela piscina, com seu fundo escuro e vegetação tropical.
Havia um outro mundo ali embaixo, pensou ela. Outro dos muitos mundos de Harry. A piscina luxuriante coberta por um teto capaz de simular um céu estrelado, o brilho do sol ou raios de luar, ao comando de um botão; uma hologramoteca, onde centenas de videogames podiam ser acessados para ajudar a passar uma noite monótona; um banho turco; um tanque de isolamento; um salão de tiro; um pequeno cinema e uma pequena sala de meditação, superior a qualquer das que eram encontradas nos spas mais caros, dentro e fora do planeta.
Brinquedos, refletiu ela, para os ricos. Harry os teria denominado ferramentas de subsistência, meios necessários para relaxamento em um mundo que se movia mais depressa a cada dia. Ele equilibrava o relaxamento com o trabalho melhor do que ela, a própria Gina admitia isso. De algum modo, ele encontrara a chave para usufruir o que possuía, ao mesmo tempo que protegia tudo e ainda ganhava mais.
Gina aprendera muitas coisas com Harry nos meses anteriores. Uma das lições mais importantes era que havia momentos em que ela precisava jogar para o lado todas as preocupações, responsabilidades e até mesmo a sede por respostas e ser apenas ela mesma.
Era isso que pensava naquele instante, ao entrar silenciosamente no salão de ginástica e digitar o código que fazia a porta se trancar atrás dela.
Harry não era homem de economizar nos equipamentos, nem era do tipo que busca o caminho mais fácil e paga para ter o corpo esculpido, os músculos tonificados e os órgãos energizados. Suor e esforço eram tão importantes para ele quanto o banco anti-gravitacional, a trilha aquática ou o centro de resistência. Por ser um homem que apreciava a tradição, o seu ginásio particular também estava cheio de pesos, halteres antiquados, pranchas inclinadas e um sistema de realidade virtual.
Naquele momento ele estava usando os pesos, e fazia levantamentos lentos, completos, enquanto observava um monitor que exibia um tipo de diagrama e falava com alguém através do tele-link preso em sua cabeça.
- A segurança é a maior prioridade do resort, Teasdale. Se está havendo uma falha, encontre-a. E conserte-a. - Franzindo a testa diante da tela, trocou suavemente os exercícios com pesos por outros com extensores. - Você simplesmente tem que melhorar isso. Se precisar estourar o orçamento, quero justificativas. Não, eu não disse desculpas, Teasdale. Justificativas. Transmita um relatório para o meu escritório até as nove horas, pelo horário da Terra. Desligando.
- Você é durão, Harry.
Ele se virou para olhar para ela, no instante em que a tela apagou, e sorriu.
- O mundo dos negócios é uma guerra, tenente.
- E, do jeito que você faz, é mortal. Se eu fosse o Teasdale, já estaria tremendo em minhas botas de gravidade artificial nesse exato momento.
- Essa é a idéia. - Pousando os pesos no chão, ele tirou o fone do ouvido e o colocou de lado. Ela o viu trocar para o aparelho de resistência, onde digitou um programa e começou a tonificar as pernas. De modo casual, Gina pegou um dos pesos e começou a trabalhar os tríceps, sem tirar os olhos dele.
A faixa preta amarrada em volta de sua testa lhe dava um ar guerreiro, pensou ela. A camiseta escura sem mangas e o short exibiam músculos muito atraentes e uma pele que brilhava com o suor. Olhando os músculos dele que se enrijeciam e o suor que brotava, ela sentiu desejo.
- Você me parece satisfeita consigo mesma, tenente.
- Na verdade, estou satisfeita com você. - Virando a cabeça para o lado, deixou que o olhar percorresse todo o corpo dele. - Você tem um tremendo corpo, Harry...
As suas sobrancelhas se levantaram ao vê-la ir para trás dele, a fim de testar os seus bíceps.
- Um sujeito bem durão. - completou ela.
Harry sorriu. Ela estava a fim, dava para notar. Ele só não estava bem certo sobre o que, exatamente, ela queria.
- Quer ver o quanto eu sou durão?
- Por quê? Pensa que eu tenho medo de você? - Com os olhos ainda sobre os dele, ela tirou o cinto com a arma e o resto do equipamento e o colocou sobre uma das barras. - Pode vir... - Indo até um tatame, ela curvou os dedos para dentro em posição de desafio. - Venha até aqui para tentar me derrubar!
Ainda reclinado sobre o aparelho, ele estudou o rosto dela. Havia algo mais em seus olhos, além de desafio, reparou ele. Se não estava enganado, era vontade de transar.
- Gina, estou todo suado...
- Covarde! - disse ela, com desdém.
- Deixe-me tomar uma chuveirada. - disse com a cara contraída - E depois...
- Covardão! Sabe, alguns homens ainda pensam que uma mulher não pode ser enfrentada na mão, fisicamente. Como eu sei que você está acima disso, só posso imaginar que está com medo de levar uma surra.
Foi o bastante.
- Fim do programa. - disse ele, enquanto se sentava, pegava uma toalha em uma pilha ao lado e enxugava o rosto. - Quer brigar? Vou dar um tempinho para você se aquecer.
O sangue dela já estava acelerado.
- Estou bem aquecida. Vamos lá, uma briga de punhos, estilo padrão.
- Sem socos de verdade. - disse ele ao pisar no tatame. Diante do olhar sarcástico dela, apertou os olhos. - Não quero bater em você.
- Claro. Como se você fosse capaz de passar pela minha... - Ele veio depressa, pegou-a desequilibrada e a jogou no chão, sentada sobre o traseiro.
- Golpe baixo... - reclamou ela entre dentes, enquanto se colocava em pé com um salto.
- Ah, agora temos regras. - disse ele. - Como na polícia.
Eles se agacharam e circundaram um ao outro. Ele gingou o corpo, fingindo atacá-la, e ela se agarrou nele. Por dez interessantes segundos eles ficaram agarrados um ao outro, as mãos dela escorregando sobre a pele suada dele. O gancho de perna que ele tentou dar teria funcionado se ela não tivesse previsto o movimento e se abaixado. Girando o corpo com rapidez e utilizando-o como alavanca, ela o atirou por cima dela.
- Agora estamos quites. - e se agachou novamente, enquanto ele se levantava e jogava os cabelos para trás.
- Certo, tenente. Vou parar de me segurar.
- Se segurar uma ova! Você estava...
Ele quase conseguiu pegá-la novamente, e certamente a teria derrubado se ela não tivesse percebido com segundos de antecedência que a tática dele era distraí-la com insultos. Ela escapou e se virou de frente para ele. Então, quando seus rostos estavam bem próximos e seus corpos colados, ela sacou da sua melhor arma.
Deixando a mão escorregar para a região entre as pernas dele, agarrou-lhe os testículos, com delicadeza. Ele piscou uma vez, surpreso e deliciado.
- Ora, então nós podemos... - murmurou ele, abaixando os lábios para perto dos dela, antes que ela mudasse a posição da mão.
Não teve tempo nem para praguejar quando ela o fez voar. Aterrissando com um baque surdo, ele viu que ela já estava em cima dele, com um joelho apertando-lhe o ponto entre as pernas e grudando-lhe os ombros contra o chão, com a força de suas mãos.
- Você está derrubado, meu chapa! Perdeu!
- Isso é que é golpe baixo.
- Não seja um mau perdedor...
- É difícil argumentar com uma mulher quando ela está com o joelho em cima do meu ego.
- Ótimo. Agora as coisas vão ter que ser do meu jeito.
- É mesmo?
- Com certeza! Eu venci! - Abaixando a cabeça, ela começou a tirar a camiseta dele. - Coopere comigo e eu prometo que não vou machucá-lo. Hã-hã... - Quando ele tentou abraçá-la, ela agarrou-lhe as mãos e as colocou de volta sobre o tatame. - Sou eu que mando aqui. Não me obrigue a usar as algemas.
- Humm... Que ameaça interessante! Por que você não... - suas palavras pararam na garganta quando sentiu que a boca de Gina mergulhava sobre a dele, com força e calor. Por instinto, suas mãos se flexionaram sob as dela, querendo tocá-la, querendo tomá-la nos braços. Mas compreendeu que ela queria alguma coisa a mais, algo além. Então, resolveu deixá-la procurar.
- Vou pegar você - e mordeu o lábio inferior dele, provocando-lhe um arrepio de desejo que o atingiu junto da virilha - e fazer o que bem quiser...
A cabeça dele já estava rodando, e a respiração ofegante.
- Seja gentil comigo. - ele conseguiu falar, e sentiu o calor se misturar com o desejo quando ela riu.
- Vá sonhando!
Ela parecia insaciável, com as mãos rápidas, desejosas e impacientes, e os lábios agitados. Ele conseguiu sentir o ar selvagem de desejo que vibrava e emanava dela até atingi-lo e fazê-lo brilhar com uma espécie de energia arrojada que parecia alimentar a si mesma. Se ela queria ter o controle da situação, ele lhe daria isso. Ou, pelo menos, foi o que pensou. Em algum momento, porém, durante o furioso ataque que ela lançou contra seus instintos, ele simplesmente não teve mais escolha.
Ela arrastou os dentes por todo o corpo dele e foi descendo, até que os músculos que ele havia tonificado há pouco começaram a tremer, indefesos. Sua vista se embaçou quando ela o tomou na boca e começou a trabalhar com muita força e rapidez, até o ponto em que ele teve que lutar contra todos os seus instintos para não explodir.
- Não se segure! - Ela mordeu-lhe a coxa e foi voltando até o peito, que arfava, enquanto a mão substituía a boca. - Quero fazer você gozar! - sugando a língua dele com a boca, ela deu uma leve mordida e a liberou. - Agora!
Ela viu os seus olhos ficarem opacos por um segundo, antes de sentir o orgasmo que trepidava por dentro dele. A risada dela saiu trêmula de poder, enquanto atacava o ouvido dele, sussurrando:
- Venci novamente.
- Nossa! Puxa vida! - ele conseguiu, quase sem forças, colocar os braços em volta dela. Sentia-se fraco como um bebê e muito sem graça pela total perda de controle, deliciosamente tonto. - Não sei se devo me desculpar ou agradecer...
- Guarde o fôlego. Ainda não terminei com você.
Ele quase riu, mas ela já estava mordiscando em volta de seu queixo, começando a enviar novos sinais de excitação ao seu corpo arrasado.
- Querida, - disse ele - você vai ter que me dar um tempinho...
- Não tenho que lhe dar coisa alguma. - Ela parecia bêbada de prazer, energizada pelo próprio poder. - Você vai ter que agüentar.
Sentando-se sobre ele com as pernas abertas, ela arrancou a blusa por cima da cabeça. Olhando para ele, ela passou as mãos pelo próprio corpo, por cima dos seios e para baixo novamente. Ele sentiu a saliva se acumular na boca. Sorrindo, ela segurou as mãos dele e as levantou, até tocá-la. Com um suspiro, deixou que os seus olhos se fechassem.
O seu toque sobre o corpo dela já era familiar e ao mesmo tempo lhe parecia sempre novo. Sempre excitante. Seus dedos brincavam sobre ela, apertando-lhe os mamilos até eles ficarem quentes o bastante, a ponto de provocar dor, para a seguir puxá-los até senti-la se apertar em volta dele, em resposta.
Agradando aos dois, ela se lançou para trás, enquanto ele elevava ligeiramente o corpo para cobrir-lhe a boca com os seus lábios. Ela agarrou a cabeça dele e se deixou embeber pelas sensações: o arranhar dos dentes dele sobre a sua pele sensível, que ia do terno ao brutal; o apertar e liberar constantes dos dedos dele em volta dos seus quadris, o escorregar oleoso de carne contra carne e o cheiro quente e maduro de suor e sexo. E, quando ele forçou a boca de volta contra a dela, o gosto explosivo do desejo incontrolável.
Ele soltou um som que parecia um grunhido e uma maldição quando ela se soltou dele. Levantando-se depressa, ela adorou o fato de estar com as pernas bambas e o corpo saciado. Ela não precisava dizer que jamais tinha sido daquele jeito com ninguém, a não ser com ele. Isso ele já sabia. Da mesma forma que descobrira que ele se encontrara mais com ela, de alguma forma, do que com qualquer outra pessoa.
Levantada, acima dele, ela já não tentava mais controlar a respiração nem sentia mais os choques dos arrepios que a atravessavam. Tirou os sapatos, acabou de despir as calças e as deixou caídas no chão.
O suor a inundava enquanto os olhos dele a cobriam de cima a baixo e subiam de novo até alcançar-lhe os olhos. Ela jamais se importara muito com o próprio corpo. Era o corpo de uma policial, tinha que ser forte, resistente e flexível. Com Harry ela descobrira também o quanto eram maravilhosos estes aspectos do corpo de uma mulher. Tremendo um pouco, ela plantou um joelho em cada lado do corpo dele e então se inclinou para a frente para se deixar perder no doce abandono do prazer do boca a boca.
- Continuo no comando. - murmurou ela ao se levantar de novo.
Com os olhos flamejando ao se encontrar com os dela, ele sorriu, dizendo:
- Pode me torturar!
Ela se agachou sobre ele e tomou-o por inteiro dentro dela, de forma lenta e torturante. E quando ele estava bem lá no fundo, quando ela sentiu o corpo enrijecer e se jogou para trás, deixou escapar um suspiro trêmulo no instante em que o primeiro orgasmo glorioso a fez estremecer. Ávida, ela se inclinou para a frente de novo, agarrou as mãos dele entre as dela e começou a cavalgar.
Explosões começaram a acontecer dentro de sua cabeça e de seu sangue. Por trás de seus olhos fechados, inúmeras cores dançavam e não havia mais nada dentro dela, a não ser Harry e uma necessidade desesperada de um pouco mais dele... cada vez mais dele. Um clímax se sucedeu a outro, atingindo-a antes que ela conseguisse relaxar novamente. A dor que a triturava por dentro acalmou-se mais uma vez, e então aumentou de novo, até que, por fim, seu corpo se largou, completamente mole, por cima do dele. Ela enterrou o rosto junto da garganta de Harry e ficou esperando a sanidade voltar.
- Gina?
- Hein?
- Agora é minha vez.
Ela piscou uma vez, ainda zonza, no momento em que ele a virava de costas e continuava sobre ela. Gina levou um segundo para compreender que ele ainda estava duro como pedra dentro dela.
- Eu achei que você já... que nós...
- Você já... - murmurou ele. E reparou um prazer renovado e inesperado brilhar no rosto dela quando ele começou a se mover lá dentro. - Agora você é que vai ter que agüentar!
Ela começou a rir, mas acabou dando um gemido.
- Vamos nos matar se continuarmos nesse ritmo. - avisou ela.
- Eu corro o risco. Não, não feche os olhos. Olhe para mim.
Ele ficou observando aqueles olhos vitrificados enquanto acelerava o ritmo, e ouviu o grito abafado que ela soltou no momento em que ele bombeou mais fundo, cada vez mais fundo, dentro dela.
Então, os dois começaram a corcovear e mergulhar um no outro, as mãos dela querendo se agarrar a qualquer coisa enquanto os quadris dele investiam sobre ela com ímpeto cada vez maior. Os olhos dela ficaram arregalados e foscos. Ele cobriu a sua boca com a dele, de modo implacável, e engoliu o seu grito.

Estavam enrodilhados um ao outro, como dois lutadores de boxe caídos no ringue, ouvindo a contagem do juiz e lutando para conseguir um pouco de ar. Ele escorregara ligeiramente para baixo, ainda sobre o corpo dela, e descobriu que, embora os seios dela estivessem ao alcance dos seus lábios, ele já não tinha energia para se aproveitar disso.
- Não estou sentindo os meus dedos dos pés, - reparou ela - nem os das mãos. Acho que desloquei alguma coisa...
Ocorreu a Harry que, provavelmente, era o peso dele que estava impedindo a circulação do sangue e do ar dela. Fazendo um esforço, ele inverteu as posições deles.
- Está melhor agora?
- Acho que sim... - ela inspirou profundamente, engolindo um pouco de ar.
- Eu machuquei você?
- Hã?...
Ele deu um pequeno beijo em sua testa e analisou o seu sorriso, tolo e sem expressão.
- Deixe pra lá. - encerrou ele. - Você já acabou comigo por agora?
- No momento, sim.
- Graças a Deus. - Ele se deixou cair de costas e se concentrou em respirar um pouco.
- Nossa, estamos arrasados!
- Nada como uma rodada de sexo suado e pegajoso para fazer a gente lembrar que é humano. Vamos.
- Vamos aonde?
- Querida, - ele pousou um beijo em seu ombro molhado - você precisa de um chuveiro.
- Vou ficar aqui só mais um pouquinho, dormindo pelos próximos dois dias. - Ela se encolheu e bocejou. - Pode ir na frente.
Ele balançou a cabeça. Reunindo todas as forças, empurrou-a para o lado e se levantou. Depois de respirar fundo, ele se abaixou e a colocou sobre os ombros.
- Ah, isso mesmo. Aproveite-se de uma mulher morta.
- Peso morto, isso sim. - resmungou ele, e atravessou todo o salão de ginástica até o vestiário. Agarrando-a com mais firmeza, ele pisou no chão ladrilhado dos chuveiros. Com um sorriso cruel, ele se virou, para que o rosto dela ficasse de frente para os jatos que iam se entrecruzar com força, e disse: - Dezessete graus, pressão máxima.
- Dezess... - foi tudo o que ela teve tempo de dizer. O resto da palavra ficou perdida em meio a gritos e maldições que ecoaram pelos ladrilhos brilhantes.
Ela já não era mais um peso morto e sim uma mulher que se sacudia, molhada e desesperada. Ele a segurou firme, morrendo de rir quando ela explodiu em xingamentos dirigidos a ele.
- Trinta e três graus! - gritou ela. - Trinta e três graus, cacete. Agora!
Quando o jato de água esquentou, ela conseguiu respirar de novo e avisou:
- Vou matar você, Harry! Assim que eu derreter!
- Isso é bom para você. - Ele a colocou em pé com todo o cuidado e entregou-lhe o sabonete. - Vá se arrumar, tenente. Estou morrendo de fome.
Ela também estava.
- Vou deixar para matar você mais tarde, então. - decidiu ela. - Depois que eu comer.

Em menos de uma hora, ela já acabara de tomar banho, estava satisfeita, vestida e atacava um filé com cinco centímetros de altura.
- Sabe Harry, estou me casando com você só por causa do sexo e da comida.
- É claro. - Ele provou o vinho tinto e olhou enquanto ela atacava a comida.
- E porque você tem um rosto lindo. - e beliscou uma batata palito.
- É o que todas dizem. - e simplesmente sorriu, sem se abalar. Aqueles não eram os motivos reais, mas uma boa sessão de sexo, boa comida e um rosto lindo certamente conseguiam amenizar as coisas. Ela sorriu para ele e perguntou:
- Como é que a Luna está?
Ele estava esperando que ela perguntasse, mas sabia que, antes de fazê-lo, ela precisava colocar algumas coisas para fora.
- Luna está bem. - respondeu. - Ela e Leonardo estão tendo uma espécie de reencontro na suíte dela, esta noite. Você vai poder conversar com eles de manhã.
Gina olhou para o prato enquanto cortava mais um pedaço do filé.
- O que acha de Leonardo?
- Acho que ele está desesperadamente apaixonado pela nossa Luna, de forma quase patética. E, já que eu tenho experiência com este tipo de emoção, desenvolvi uma certa afinidade com a situação dele.
- Não temos como confirmar os movimentos dele na noite do crime. - Gina pegou o vinho. - Leonardo tinha motivos, tinha os meios e, muito provavelmente, a oportunidade. Não existem provas físicas que o liguem ao crime, mas o assassinato ocorreu no apartamento dele, e a arma usada pertencia a ele.
- Então você o imagina matando Cho e depois montando todo o cenário para que Luna levasse a culpa?
- Não. - ela pousou o vinho de novo. - Seria mais fácil se eu conseguisse imaginar. - Gina bateu com as pontas dos dedos na mesa e então pegou novamente o cálice. - Você conhece Jerry Fitzgerald?
- Sim, já estive com ela. - e esperou um segundo. - Não, nunca dormimos juntos.
- Eu não perguntei.
- Falei só para ganhar tempo.
Ela encolheu os ombros, tomou outro gole e disse:
- Minhas impressões a respeito dela são de que ela é esperta, ambiciosa, inteligente e durona.
- Suas impressões, geralmente, são acertadas. Eu não discuto com elas.
- Não conheço muito a respeito do mundo da moda, mas andei fazendo umas pesquisas. No nível de Jerry Fitzgerald, as apostas são bem altas. Rola dinheiro, prestígio, mídia. Ser a estrela de um desfile tão badalado quanto o de Leonardo vale muita coisa, com cobertura completa da imprensa. E ela vai entrar no lugar de Cho, com a morte dela.
- Se os modelos dele agradarem ao mercado, vai valer uma grana preta ser a estrela principal da coleção. - concordou Harry. - Mesmo assim, é pura especulação.
- Ela está envolvida com Justin Young, e admitiu que Cho estava tentando reconquistá-lo.
- Não consigo imaginar Jerry Fitzgerald sentindo uma fúria assassina por causa de um homem. - considerou Harry.
- Era mais fácil ela sentir isso por um figurinista. - admitiu Gina. - Só que ainda tem mais.
Em rápidas palavras, ela contou a Harry a respeito da conexão entre os dados de Boomer, sua morte e a nova droga encontrada no sangue de Cho.
- Não conseguimos achar a caixa onde ela guardava a substância. Alguém mais a queria e sabia onde encontrar.
- Jerry já se declarou publicamente contra as drogas ilegais. Claro que pode ser apenas da boca para fora, - acrescentou Harry - e aqui você está lidando com tráfico, não com uso recreativo.
- É a minha teoria. Uma nova mistura como essa, que vicia depressa e é muito forte, tem potencial para gerar muitos lucros. O fato de que eventualmente possa ser letal não vai impedir a sua distribuição ou o uso.
Gina empurrou o filé para o lado sem acabar de comê-lo, um gesto que fez Harry franzir as sobrancelhas. Quando ela não comia, é porque estava preocupada.
- Parece-me que você tem uma pista que pode agarrar com unhas e dentes. Uma pista que vai passar muito longe de Luna.
- É... - inquieta, ela se levantou. - Uma pista que não aponta para mais ninguém. Jerry e Justin servem de álibi um para o outro. Os discos de segurança confirmam que eles estavam em casa na hora do crime. A não ser que um deles ou os dois saibam adulterar os vídeos. Redford não tem álibi ou, melhor, tem um que é cheio de furos, mas não temos como acusá-lo de nada. Ainda.
Pareceu a Harry que ela gostaria de ter como acusá-lo.
- Quais foram as suas impressões a respeito dele, Gina?
- Insensível, sem pena de ninguém, egoísta.
- Você não gostou dele.
- Não, não gostei. Foi escorregadio, arrogante, estava certo de poder lidar com uma policial qualquer sem gastar muitas das suas células cinzentas. E forneceu informações demais, sem a gente pedir, da mesma forma que Jerry e Justin. Não confio em ninguém que me entrega as informações todas com tanta facilidade.
O jeito que a cabeça de uma policial funcionava não deixava de surpreendê-lo, refletiu Harry, e ele perguntou:
- Você confiaria mais se tivesse sido obrigada a arrancar as informações dele?
- Claro. - Essa era uma das regras básicas para ela. - Ele estava doido para me contar que Cho usava drogas. Jerry Fitzgerald também. Todos três ficaram quase felizes em me dizer que não gostavam dela.
- Acho que você não considera a possibilidade de que eles estivessem apenas sendo honestos.
- Quando as pessoas são assim tão abertas, especialmente diante da polícia, normalmente há outra camada por baixo. Vou ter de cavar um pouco mais a respeito deles. - Ela deu uma volta e tornou a se sentar. - Ainda tem o policial da Divisão de Drogas Ilegais, com quem eu estou batendo de frente.
- Malfoy.
- É... Ele queria ficar com o caso. Pareceu encarar bem o fato de não ter conseguido me apunhalar, mas o jogo não vai ser limpo com ele não. Ele quer ser promovido.
- E você não quer?
- Somente quando eu merecer. - e lançou um olhar frio para Harry.
- E, claro, enquanto isso você vai jogar totalmente limpo com Malfoy, alegremente.
- Ah, não enche, Harry! - Ela abriu um sorriso. - O caso é que eu preciso ligar a morte de Boomer com a de Cho, sem deixar furo. Tenho que descobrir quem é a pessoa ou as pessoas que serviam de ligação entre os dois, que conheciam os dois. Até conseguir isso, Luna vai se arriscar a encarar um julgamento por assassinato.
- Pelo jeito, você tem dois caminhos a seguir.
- Que são...?
- O caminho brilhante da alta-costura ou o caminho poeirento das ruas. - Ele pegou um cigarro e o acendeu. - Onde foi mesmo que você falou que Cho esteve antes de voltar para a Terra?
- Estação Starlight.
- Tenho alguns negócios lá.
- Que surpresa! - disse ela seca.
- Vou fazer algumas perguntas. As pessoas que freqüentam o círculo onde Cho trabalhava não reagem muito bem a distintivos.
- Se eu não conseguir as respostas certas, vou ter que acabar indo até lá pessoalmente.
- E há algum problema nisso? - algo no tom de voz dela chamou a atenção dele.
- Não, não, problema algum.
- Gina.
- É que eu jamais estive fora do planeta. - e tornou a se levantar da mesa.
- Nunca como? - confuso, ele olhou para ela. - Nunca mesmo?
- Não é todo mundo que pode ficar saracoteando por aí, entrando e saindo de órbita cada vez que lhe dá na telha. Aqui embaixo já há bastante coisa para manter a maioria das pessoas ocupada.
- Não há do que ter medo. - explicou ele, entendendo-a perfeitamente. - Viajar pelo espaço é mais seguro do que dirigir na cidade.
- Conversa fiada! - disse ela, entre dentes. - Eu não disse que tinha medo. Se tiver que fazer isso, eu faço. Simplesmente, preferia que não. Quanto mais perto eu ficar de casa, mais depressa vou livrar Luna dessa confusão.
- Hã-hã... - Interessante, pensou ele, descobrir que a sua destemida tenente tinha uma fobia. - Por que não vemos o que eu posso descobrir para você?
- Você é civil.
- Uma investigação extra-oficial, é claro.
- Certo. - Ela olhou de volta para ele, sentiu compreensão, apesar do seu ar divertido, e suspirou. - Não acredito que você conheça um especialista em flora extra-planetária e que esteja disponível, já que você quer ajudar.
- Para falar a verdade... - Harry pegou o vinho novamente e sorriu.



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