chapter 3



Eu e Vítor estávamos no meu quarto, ele deitado na minha cama me observando arrumar dois malões com roupas, sapatos e outras coisas.


- Você deve ser a única pessoa que leva dois malões para Hogwarts. – Vítor disse. – Pra que mesmo que você precisa de um malão apenas de sapatos e com quatro botas?


- Eu gosto de botas. – Expliquei.


- E os outros seis sapatos? – Vítor insistiu.


- Você pode cumprir sua função de me ajudar a lembrar se estou levando tudo que preciso. – Falei. – Apenas faça isso.


- Eu estou fazendo. – Ele retrucou. – Estou te mostrando que você não precisa leva mais que dois pares de botas.


- É só me ajudar a lembrar se falta algo, não se sobra algo. – Falei nervosa.


Eu estava muito nervosa. Ser a garota nova aos quinze anos era aterrorizante e também uma forma de começar tudo de novo.


- Você fez uma lista. – Ele balançou o pedaço de papel. – Porque é que eu preciso conferi-la?


- Porque eu confio em você. – Falei e Vítor parou de discutir comigo.


Eu olhava a vista da minha janela enquanto ele conferia se tudo estava dentro da mala. Eu amava a vista, amava o fato de, da minha janela eu ver o gramado verde do campo de Quadribol dos Krum e de que o ano todo ele estaria verde. Amava saber que se eu gritasse um pouco alto, Vítor me escutaria e, voaria em sua vassoura de seu quarto até o meu. Era isso que eu sentia falta todos os anos quando arrumava meu malão, independente do destino.


- Escova de dentes. – Ele disse interrompendo meu pensamento.


- Sabia! – Eu falei.


Fui até o banheiro e peguei minha escova.


- Como você consegue pegar tanta maquiagem e esquecer a sua escova de dentes mesmo com essa lista? – Vítor me perguntou.


- Não faço a mínima idéia. – Eu ri.


Tudo certo, Vítor me ajudou a descer os malões, me despedi de minha avó e entrei no carro do senhor Krum. Vítor iria passar alguns dias em Londres comigo, nos hospedaríamos em algum local no famoso Beco Diagonal, compraríamos o que faltava para minha ida para Hogwarts.


- Todos prontos? – Senhor Krum perguntou.


- Todos. – Vítor respondeu. – Pode dar partida.


O Senhor Krum deu partida, mas não saímos do lugar, mas, daí uma hora estávamos em Londres, dentro de um carro diferente do que nós havíamos entrado. Eu adorava mágica.


- Adoro viajar assim. – Falei para Vítor.


- Quem não gosta. – Vítor falou.


Vítor desceu do carro, apertou a mão de seu pai e abraçou sua mãe. Eu fiz o mesmo e, ouso dizer que meu aperto de mão e meu abraço duraram mais tempo. Depois da despedida eu segui Vítor até a entrada do Beco Diagonal. Ele deu umas batidinhas em alguns tijolos de um muro que se abriu, permitindo nossa entrada.


Era engraçado como as pessoas olhavam para Vítor como se ele fosse algo inexplicável. Ou talvez engraçado era o fato de que eu olhava para ele e viu Vítor, meu melhor amigo, meu vizinho, quem me ensinou a jogar Quadribol e que fazia bolo para mim no meu aniversário. E, além de tudo isso, Vitor era a pessoa ideal para me ajudar a comprar todas as coisas que eu precisava comprar para esse ano letivo, e, após deixar as coisas no hotel, nós fomos comprá-las.


Uma hora depois, já no quarto do hotel, se é que se pode chamá-lo assim, eu lia meu livro deitada enquanto Vítor cochilava ao meu lado.


Eu achava que precisava dormir também, mas definitivamente não tinha sono, algo que estava acontecendo durante os últimos dias. Eu dormia pouco e, mesmo tendo todo o tempo do mundo para dormir no final das férias eu passava a maior parte do tempo acordada.


Vítor começou a roncar.


- Você está roncando. – Eu dei um cutucão.


- Desculpe. – Vítor disse acordando. – Dormi por muito tempo?


- Apenas meia hora. – Falei. – Pode dormir mais, nós não temos nada o que fazer aqui mesmo...


- É verdade. – Vítor disse. – Preciso aproveitar meu tempo de férias descansando bem. Quando os treinos começarem...


- Eu precisava disso, mas eu simplesmente não consigo... – Falei. – E minha tia é contra eu usar alguma poção para conseguir dormir...


- Apenas feche os olhos e pense em coisas boas que você vai conseguir dormir. – Vítor conversava comigo de olhos fechados, provavelmente desejando que eu me calasse. – Pelo menos tente.


- Defina coisas boas.


Percebi que ele estava tentando pensar em uma coisa boa para eu pensar.


- Esqueça. – Falei. – Você é um rapaz com muita testosterona no organismo, o que você considera bom eu provavelmente considero pervertido.


- Eu não estava pensando nisso. – Ele me disse rindo.


- Deixa para lá... – Eu lhe falei, convencida de que a última frase dele era mentira.


Eu me deitei ao lado dele e fechei os olhos.


- Eu não consigo. – Falei após quinze minutos de tentativa.


- Tente mais. – Vitor insistiu, ainda de olhos fechados.


Eu tentei fechar os olhos e dormir, mas era impossível. Era como se, todo e qualquer barulhinho feito dentro daquele quarto entrasse na minha cabeça e ficasse dez vezes maior.


De cinco em cinco minutos eu olhava para o relógio e me revirava na cama.


- Desculpe, Vítor. – Falei. – Mas é impossível.


Percebendo que Vítor nem havia me escutado, levantei-me da cama, peguei uma calça jeans, uma camisa de Vítor (que eu havia furtado dele), fui até o banheiro e me troquei. Calcei um par de botas, fiz um coque bagunçado no meu cabelo rebelde, peguei minha bolsa e decidi ir atrás de alguma coisa para comer.


Assim que eu abri a porta, Heathcliff saiu correndo e eu, o perdi de vista. Não que esse fosse o fim do mundo, mas, para uma pessoa mal humorada como eu, que estava algumas noites sem dormir bem, aquilo era completamente irritante.


- Heathcliff! – Saí gritando pelos corredores. – Eu se fosse você, apareceria agora!


É claro que, chamar não adiantou. Heathcliff, assim como sua dona, era completamente independente e temperamental. Depois de meia hora eu desisti e fui em busca de comida.


Caminhei em busca de um lugar que poderia me fornecer a única coisa que eu realmente queria: Café e bolinhos. Assim que achei, sentei-me na primeira mesa vazia que vi.


- Café e bolinhos de chocolate. – Falei para o garçom antes que ele pudesse me perguntar qual era meu pedido.


Procurei dentro da minha bolsa um livro, qualquer livro, para que eu pudesse me desligar de tudo. No dia do meu aniversário, além de sapatos e maquiagem, eu havia comprado alguns livros trouxas e, entre eles um de contos de Edgar Allan Poe. Eu sei, grande mudança para quem estava lendo “Razão e Sensibilidade”, mas eu não andava muito fã de romance. Além disso, mistério e morte conseguiam prender minha atenção mais que qualquer romance. Pudera, eu conhecia mistério e morte muito mais que o romance.


Eu estava imersa na minha leitura quando uma briga de gatos me interrompeu.


- Será possível... – Eu disse procurando a fonte do barulho. – Heathcliff!  - Gritei assim que reconheci aquela plumagem cinza.


Corri em direção ao meu gato, que brigava com outro gato. Tentei tirá-lo da briga e só levei arranhadas.


- Você devia tomar cuidado com o seu gato. – Uma garota de cabelos castanhos me disse de forma irritante.


Supus que o gato com quem Heathcliff estava brigando era dela.


- Desculpe. Eu nem vou discutir, a culpa provavelmente foi de Heathcliff. – Na verdade eu estava com preguiça de começar uma discussão que eu não ganharia nada com.


- Eu se fosse você discutia. – Um garoto ruivo falou. – O gato da Hermione é...


- Cale a boca, Ron. – A garota disse.


- Desculpe de novo. – Eu já ia saindo quando me dei conta que aquela poderia ser A Hermione. – Espere. – Falei. – Como você chama?


- Hermione. – Ela falou. – Hermione Granger.


Eu ri e ela, obviamente não entendeu.


- Quem é você? – Um terceiro garoto perguntou.


- Oh, ninguém. – Falei. – Eu só achei que te conhecia de algum lugar... Tenho que ir, tchau.


Eu finalmente ia saindo quando avistei Vítor. E ele, pelo sorriso bobo, havia visto ela.


- Droga. – Falei.


Era isso que eu temia. Caminhei em direção à ele em uma tentativa de ele não ir até Hermione Granger.


- Aquela é Hermione. – Ele me disse.


- Nós não vamos lá. – Falei. – Heathcliff estava brigando com o gato dela.


- Por quê? – Ele me perguntou.


 - Porque ele é Heathcliff. – Falei julgando essa ser a resposta que ele estava procurando. – Agora vamos.


- Não porque ele estava brigando, porque nós não vamos lá? – Ele me perguntou.


Fiquei algum tempo calada.


- Eu estou envergonhada pelo que Heathcliff fez. – Menti.


- Você não está nada. – Ele sabia que eu estava mentindo. – Agora vamos lá.


Vítor pegou na minha mão e caminhamos em direção à mesa em que ela e os dois amigos dela estavam sentados.


- Boa tarde. – Vítor disse.


- Vítor. – Hermione se levantou.


Ela estava surpresa em vê-lo. Posso até dizer que feliz, mas obviamente não tanto quanto ele estava.


- Olá Harry, Ronald. – Ele cumprimentou os amigos dela.


- Olá Vítor. – O terceiro garoto, de cabelos bagunçados é óculos o cumprimentou de maneira simpática.


- Olá. – O garoto ruivo disse, aparentemente não gostando muito da presença de Vítor.


Todos os três ficaram olhando para mim, esperando que Vítor me apresentasse, mas ele estava muito ocupado olhando para Hermione e isso estava começando a me incomodar.


- Você está ridículo. – Eu disse para ele em alemão, para que os outros não entendessem.


- Não me chame de ridículo. – Vítor me respondeu em alemão.


- Então não seja ridículo e converse direito.  – Falei, ainda em alemão.


- Desculpe por isso. – Vítor parou de falar comigo e se dirigiu aos outros. – Esta é Charlotte...


- Chuck. – Eu o corrigi.


- Chuck Hayes. – Ele falou contrariado. – Ela é uma amiga. Esses são Hermione Granger, Harry Potter e Ronald Weasley.


- Porque vocês não se sentam com a gente? – Hermione sugeriu.


- Claro. – Vítor disse.


Eu então pedi para o garçom transferir meu pedido para aquela mesa e me sentei ao lado de Vítor.


Eu já ia pegar meu livro de volta na minha bolsa quando Vítor me olhou.


- Você não vai ler, ou vai? – Ele me perguntou.


- Eu queria. – Falei. – Eu vim para cá com esse intuito.


- Não é muito educado. – Ele falou.


- Eu não me importo. – Falei.


- Chuck... – Ele insistiu.


Revirei os olhos e coloquei o livro novamente na bolsa.


Ninguém dizia nada.


- Então... – Hermione disse finalmente. – Não sabia que você estava aqui em Londres.


- Eu estou de passagem. – Vítor disse. – Vim fazer companhia para Chuck e ajudá-la. Ela nunca tinha vindo ao Beco Diagonal e nós achamos melhor alguém vir com ela.


- Você é como minha babá. – Eu falei. –Que másculo.


Vitor me olhou e eu entendi o que ele quis dizer: Cale a boca. O garoto ruivo riu, mas ao olhar de Hermione se controlou.


- O que? – Perguntei como se não tivesse entendido. – Eu tenho quinze anos, porque é que eu preciso de uma babá? E porque é que essa babá tem que ser você? Eu sou muito mais responsável que você...


- Eu não sou sua babá. – Ele me disse. – E lembra do penúltimo Natal?


- Não vamos revirar o passado, certo Vitor? E no momento você está agindo como um professor de etiqueta. – Falei irritada.


- Charlotte. – Ele me disse tentando manter-se calmo.


- Não me chame de Charlotte. – Retruquei nervosa. – Merlin, quinze anos de convívio e você ocasionalmente ainda insiste...


Ele ficou calado e me olhando. Aquilo significava que ele estava bravo comigo.


- Desculpe. – Pedi aos “amigos” de Vitor. – Eu não tenho dormido bem e isso me deixa mal humorada.


- Mais mal humorada. – Vitor acrescentou.


- É. – Falei e respirei fundo. – Mais mal humorada.


- Tudo bem. – O garoto ruivo disse. – Mas então, vocês vieram aqui para?


Meu café finalmente chegou.


- Comprar meu material. – Eu disse antes de dar um gole no café. – E outras coisas... Hogwarts aparentemente é bem diferente de Durmstrang.


- Você vai para Hogwarts? – Hermione perguntou curiosa.


Balancei a cabeça afirmativamente.


- Nunca fiquei sabendo de ninguém que fosse transferido para Hogwarts. – Ela disse.


- Não estava escrito em “Hogwarts, uma História”? – Ronald disse.


Harry Potter riu do comentário do amigo, mas Hermione o ignorou.


- Minha tia vai dar aula lá. – Falei. – Daí...


- Oh. – Hermione exclamou. – Você é sobrinha de Katherina Hayes?


- Eles me dizem que sou. – Respondi.


- Você vai entrar em que ano? – Harry Potter perguntou.


- Eu acabei de fazer quinze anos. – Falei. – Mas Durmstrang e Hogwarts não são iguais em anos escolares, então não sei...


- Provavelmente quinto ano. – Hermione disse.


- São quantos anos em Hogwarts? – Perguntei.


- Sete. – Ela falou. – Nós entramos com onze.


- Quantos anos são em Durmstrang? – Ronald perguntou.


- Nove. – Falei. – Mas lá as turmas são por semestre e provavelmente a nossa carga horária é maior. – Expliquei. – Os últimos anos são apenas para nós nos aperfeiçoarmos nas carreiras que queremos seguir, que eles chamam de “Formação e Aprimoramento em Carreiras Mágicas”.


- Nossa, mas um ano e você iria para a F.A.C.M.? – Vitor disse. – Você está ficando velha.


- Eu, né? – Falei. – Você tem um emprego. Tem noção do quão adulto isso te faz?


- Quadribol não é emprego. – Ele me disse. – Não só.


Eles engataram uma conversa, finalmente. Eu, é claro, não participei dela.


Assim que terminei o meu café senti uma vontade de sair de lá, um mal estar profundo.


- Vítor, eu posso ir? – Perguntei.


- Porque, aconteceu alguma coisa? – Ele me perguntou sem entender.


- Eu só... Não sei... – Eu tirei um pouco de dinheiro e entreguei a ele. – Pague meu café, ok?


- Certo. – Vitor me respondeu.


- Foi um prazer conhecer vocês. – Menti e eles mentiram de volta.


Peguei Heathcliff no colo já e estava caminhando em direção ao hotel quando percebi uma movimentação. As pessoas cochichavam e caminhavam rapidamente. Foi quando eu percebi Kathy a uma distância não muito grande de mim.


- Kathy? – Eu falei. – Kathy! – Gritei chamando-a.


Kathy me procurou na multidão e assim que me achou caminhou até mim.


- Onde você está indo? – Ela perguntou nervosa. – Onde está Vítor?


- Eu estou indo para o hotel. – Falei. – Vítor está comendo algo, por quê?


- Volte para perto dele agora. – Ela me disse firmemente.


- Por quê? – Perguntei.


- Agora, Charlotte. – Ela me disse e então lançou um feitiço na direção do hotel. – Agora! Corra!


Então um grande número de feitiços começaram a ser lançados. Avistei Vitor e eu corri desesperadamente em sua direção.


- Eu estava te procurando. – Ele disse. – O que é que está acontecendo?


- Kathy me mandou correr. – Falei e, ao som de outro estrondo eu disse: - Corra!


Eu e Vítor corremos na direção oposta aos barulhos, mas eles começaram a ficar mais próximo de nós. Eu então avistei Hermione sob uma mesa.


 - Espere! – Eu disse a Vitor e corri em direão à garota.


Puxei-a pelo braço.


- O que está acontecendo? – Ela me perguntou atordoada.


- Sem tempo para explicação.  – Falei. – Corra.


Corremos então, nós três sem destino. Eu tentei ficar atenta em Vitor e Hermione para não perdê-los de vista.


Em certo momento da nossa fuga, Hermione puxou Vítor para dentro de uma porta e ele, por sua vez me puxou. 

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