Encontros



No dormitório feminino da Grifinória, Sophie se revolvia na cama, enroscando-se nos lençóis e murmurando freneticamente em seu sono, perturbado por um pesadelo.


- Annabella... você não é... essa não é você...


Imagens entrecortadas se sucediam umas às outras, a Marca Negra sobre o castelo, um lampejo verde, o rosto impassível de Snape, Draco Malfoy de varinha em punho, tremendo, alguém de cabelos ruivos caído no chão... e a mulher, com os olhos azuis e a varinha apontados para Sirius.


- Não... pai... não... por favor, você o conhece... você nos conhece... você é...


Houve mais um forte flash de luz, e então ela acordou, suando e ofegante, sentindo frio, apesar da temperatura agradável do dormitório, e com o coração batendo acelerado, tomado pela angústia.


Sophie”


Jael.” – respondeu a garota.


Sinto sua angústia, minha estrela, seu medo.” – disse o centauro, dentro da cabeça dela.


O que os céus lhe dizem sobre o futuro, Jael?” – perguntou Sophie.


Trevas. Medo. Morte.” – respondeu Jael, devagar.


Estou com medo.” – confessou Sophie.


Eu sei. Também estou.” – disse o centauro – “Tome cuidado, minha estrela, não posso perder você.”


Não irá.” – garantiu Sophie – “Cuide-se também, sim?”


Eu irei. Não se preocupe. Eu amo você, Sophie.”


Também amo você, Jael.” – respondeu a garota, antes deitar a cabeça no travesseiro para tentar voltar a dormir.


Ostentando escuras olheiras de cansaço, mas profundamente satisfeito com os resultados da noite anterior, Harry contou a Sophie, Rony e Hermione tudo o que acontecera na véspera. Fez isso durante a aula de Feitiços, pois Sophie não tomara café da manhã junto com eles, e ele queria conversar com todos de uma só vez. Sophie, que também estava com uma aparência bastante cansada, havia ido ao corujal tão logo terminou de se vestir e arrumar seu material, para enviar um bilhete para Sirius, pedindo que ele fosse ao seu encontro em Hogsmeade naquela tarde, quando pretendia falar a ele sobre a mulher de seus sonhos. Ela, Rony e Hermione ouviram impressionados o relato de Harry sobre como ele obtivera a lembrança de Slughorn, e ficaram completamente assombrados quando ele contou sobre as Horcruxes de Voldemort, e da promessa de Dumbledore de levá-lo junto, se encontrasse outra.


- Caramba! – exclamou Rony, quando Harry finalmente terminou de contar tudo – Você vai com Dumbledore... pra tentar destruir a coisa... caramba!


- Rony, olha o que você tá fazendo. – disse Hermione, tocando o braço do ruivo para chamar a atenção dele – É pra fazer chover, não nevar.


- Mione... – chamou Sophie, e quando a amiga olhou, apontou com a cabeça na direção da mesa ao lado; Lilá encarava Hermione como se pudesse desintegrá-la somente com um olhar. Hermione soltou rapidamente o braço de Rony.


A tarefa da aula era conjurar uma pequena nuvem de chuva, mas da nuvem conjurada pelo ruivo caíam pequenos flocos de neve, que Harry juntou com uma mão e soprou na direção das meninas.


- Ai, Harry! – exclamaram as duas, se esquivando.


- Peraí, Mione. – disse Rony, levando a mão ao cabelo dela, e tirando um floquinho de neve já meio derretido – Ficaram alguns aqui.


Hermione ficou estática enquanto ele tirava mais um floco de neve do cabelo dela, e então eles ouviram um mini-trovão. Os quatro olharam para a mesa ao lado, dividida por Parvati e Lilá, que tinha os olhos muito vermelhos, e uma expressão de fúria no rosto. A nuvem conjurada por ela começava a formar um pequeno furacão.


Rony abandonou o cabelo de Hermione, e virou-se mais na cadeira, de forma a ficar de costas para Lilá e Parvati.


- Nós terminamos ontem à noite. – disse ele, baixinho, a Harry – Quando ela me viu saindo do dormitório com a Hermione. Obviamente, ela não podia ver você e a Soph, então pensou que nós estávamos sozinhos lá em cima.


- Mas você não está ligando muito pra isso, está? – perguntou Harry.


- Não na verdade. – confessou Rony – Foi meio chato ouvir os gritos dela, mas, pelo menos eu não precisei terminar...


- Tsc, tsc... – fez Hermione, como quem repreende, embora parecesse na verdade estar achando um pouco de graça.


- Bem, parece que a noite passada foi ruim para os namoros em geral. – comentou Sophie – Gina e Dino também terminaram, Harry.


Harry a encarou por um instante, devido ao tom com que a garota dissera aquilo, mas recebeu em retorno apenas uma expressão absolutamente inocente. No entanto pareceu a ele ter visto Sophie e Hermione trocarem um rápido olhar. Ele apenas esperava que Sophie não pudesse sentir o turbilhão de emoções que tomara conta dele devido ao que ela dissera, e foi tentando parecer o mais indiferente que podia, que ele perguntou:


- Por quê?


Pareceu a ele ver um pequeno brilho no olhar de Sophie, quando ela olhou para Hermione, que foi quem respondeu:


- Ah, ela disse que estava cansada dos ataques de ciúme dele. – disse a garota – Eles já haviam brigado por causa disso várias vezes.


- Hmm... – fez Harry, e então viu o professor Flitwick vindo na direção deles – Oh, oh... Flitwick.


- Vamos, vamos, senhores. – disse Flitwick – Menos conversa e mais trabalho, todos vocês.- ordenou ele, encerrando a conversa dos quatro.


Após a aula de Feitiços, os quatro tiveram um de seus raros períodos livres em comum, e voltaram juntos para o salão comunal. Rony parecia decididamente descontraído com o fim de seu namoro com Lilá, e Hermione também parecia animada, embora nada dissesse quando lhe perguntavam o motivo do sorriso em seu rosto. Felizmente para Harry, Sophie estava demasiado concentrada em seus próprios pensamentos para prestar atenção nele, e, assim como os outros dois, não parecia notar que Harry travava uma batalha em seu íntimo.


“Gina terminou com Dino. Mas ela é irmã do Rony! Eu sou o melhor amigo dele... O que provavelmente torna tudo ainda pior...Talvez se eu falasse com ele primeiro...”


Ele mal viu o caminho por onde seguiam, e, ao passar pelo buraco do retrato, apenas registrou vagamente a rodinha de setimanistas que se aglomeravam perto da lareira, até que ouviu Hermione dizendo:


- Katie! Você voltou!


Harry se voltou imediatamente para o grupinho.era realmente Katie Bell, parecendo totalmente recuperada, cercada de amigos sorridentes.


- Oi, Hermione! – cumprimentou ela – Oi, Harry, Rony, Sophie.


- Como você está, Katie? – perguntou Sophie.


- Novinha em folha. – respondeu Katie, com um sorriso – Eu tive alta na segunda de manhã, passei dois dias em casa, e voltei pra cá há poucas horas. Eu soube do último jogo, Harry...


- É, bem, com você de volta podemos reorganizar o time, e se jogarmos realmente bem na próxima partida, ainda temos chance de vencer a Copa. Mas, Katie...


Harry simplesmente não conseguiu se impedir de fazer aquela pergunta. A visão de Katie chegara a fazê-lo esquecer por um momento de seu dilema sobre Gina. Ele falou um pouco mais baixo, enquanto os colegas de Katie começavam a juntar seu material para irem para a próxima aula.


- ... o tal objeto que entregaram para você... – disse Harry – você lembra o que era, ou quem o entregou para você?


- Não. – respondeu a garota, sacudindo a cabeça – Todo mundo quer saber isso, mas eu realmente não faço idéia. A última coisa de que me lembro é de ter entrado no banheiro feminino no Três Vassouras, e depois de acordar no St. Mungus. – disse ela, dando de ombros – Desculpe, Harry, mas eu tenho que ir. Tenho certeza que a McGonagall não vai perdoar um atraso, mesmo sendo meu primeiro dia de volta.


Ela então apanhou sua mochila e saiu no rastro dos colegas, deixando para trás os quatro amigos, todos bastante pensativos.


- Bem, então deve ter sido uma garota ou uma mulher quem entregou aquilo a Katie, se estava no banheiro feminino... – comentou Hermione.


- Ou alguém com a aparência de uma garota ou de uma mulher. – ponderou Harry – Não esqueça que tinha um caldeirão de poção Polissuco lá nas masmorras, e já sabemos que roubaram um pouco...


- Terra chamando Sophie. – disse Rony, agitando a mão diante dos olhos da garota – Ei, tá aí?


- Hã? – fez Sophie, piscando, confusa – Tava falando comigo?


- Onde é que você tava, Soph? – perguntou Harry.


- Em qualquer lugar, menos aqui. – disse Hermione, meio brincando, meio séria.


- Eu só me distraí um pouco. – mentiu Sophie, e logo voltou aos seus pensamentos. A visão de Katie fizera com que sua mente começasse a fazer diversas conexões. A descoberta de que Malfoy era de fato um Comensal, e a dúvida entre contar isso a Harry e os demais; a idéia de que alguém tão jovem pudesse ser o responsável pelos atentados contra Katie e a professora Sprout, a lembrança da sensação de medo que emanara dele quando ela o tocara...


Ela viu Misty na janela, e foi até lá recolher o pergaminho que ela havia trazido. Era a resposta de Sirius. Ele estaria à sua espera, no Três Vassouras, às duas da tarde. A garota respirou fundo, e guardou no bolso o pergaminho trazido pela coruja.


“Uma coisa por vez” – pensou ela – “Primeiro meu pai, e a tal mulher, Annabella. Depois eu penso no Malfoy.”


Mais tarde, depois do almoço, Sophie, com a ajuda de Hermione, que também iria mentir aos professores sobre uma suposta indisposição da morena, deixou o castelo, rumo a Hogsmeade. Ela encontrou com Sirius, no Três Vassouras, e agora os dois estavam sentados frente a frente, em uma das mesas do pub, com uma intocada caneca de cerveja amanteigada diante de cada um.


- E então, filha? – disse Sirius, quebrando o silêncio – Você pediu que eu viesse até aqui, porque tinha algo importante para me dizer.


- Sim, eu pedi. – confirmou a garota – Pai... há uma mulher na mansão Malfoy, além de Narcissa Malfoy.


- Como...? – começou Sirius, mas então não pôde conter um sorriso – Mas é claro que você sabe! Você sempre sabe tudo.


- Você já sabia? – perguntou Sophie, surpresa.


- Sim. – respondeu Sirius – Emmeline e Tonks foram até lá, mas não conseguiram identificá-la. – contou ele – Você tem alguma idéia de quem ela seja, Zoe?


- Não. – disse a garota, com visível desgosto – Mas... tem alguma coisa sobre ela, pai. – disse ela – Alguma coisa que se relaciona com você, e comigo.


- O quê? Como assim? – perguntou Sirius, sem entender.


- Ela está ligada a nós, de alguma forma. – respondeu Sophie – Eu venho sonhando com ela há meses, mas não consigo descobrir quem ela é. Também não sabia onde ela estava até ontem, quando consegui tirar essa informação do Malfoy.


- Tirar a informação dele? – ecoou Sirius – Como... como “tirar a informação” dele?


- Pai, eu... ah, isso não vem ao caso agora. – respondeu Sophie, meio nervosa – Mas eu consegui descobrir duas coisas. Primeiro, ela está na mansão, vigiando Narcissa Malfoy. – disse ela – Segundo, o nome dela. Annabella.


- Annabella... – repetiu Sirius, buscando na memória alguém com aquele nome.


- Pai, tem algo... algo sobre ela... – disse Sophie novamente – Por favor, pai, você precisa encontrá-la. – pediu ela, aflita – Eu não posso, mas você sim.


- Filha...


- Por favor, pai! – insistiu a garota – Eu... não sei explicar, mas ela está ligada a nós dois de alguma forma. Você precisa encontrá-la!


- Está bem, Zoe. – disse Sirius, por fim – Eu vou fazer isso. Vou pessoalmente checar a mansão.


- Obrigada.


- Sirius Black! – os dois se viraram na direção de onde viera a voz. Madame Rosmerta vinha caminhando  rumo a mesa, um sorriso enorme totalmente dirigido a Sirius – Não faz idéia do quanto eu fico feliz em vê-lo!


- Obrigado. – agradeceu Sirius – É bom estar aqui também.


- E essa mocinha... é a sua filha, então?


- Sim, é a minha menina. – confirmou Sirius, com um enorme sorriso – É a minha Zoe.


- É linda como o pai. – disse Madame Rosmerta, e Sophie a fitou, levemente espantada – Mais uma rodada de cerveja amanteigada, por conta da casa.


A mulher se afastou rumo ao balcão, para buscar as cervejas, e Sirius, que a observava se afastar, fitou Sophie, que mantinha o olhar fixo em Madame Rosmerta, e um leve sorriso no rosto.


- Nini... esse sorriso...


- Sabia que eu adoro quando me chama assim? – perguntou Sophie, agora sorrindo abertamente.


- Sua mãe e Lily a apelidaram assim.


- Eu gosto. – disse a garota – Me faz sentir mais ligada a ela.


- Vou chamar você sempre assim, então. – disse Sirius, sorrindo também – Mas você ainda não me disse o motivo do sorriso...


- Pai... você nunca... nunca pensou em ter outra pessoa? – perguntou a garota – Uma nova mulher?


- Não. – respondeu Sirius – Sua mãe foi a única mulher que eu quis. Ninguém mais conseguiu despertar o que ela despertou.


- Mas... você nunca se interessou... por ninguém? – perguntou Sophie, sem conseguir acreditar.


- Sua mãe foi meu único amor, e eu jurei amá-la para sempre. – respondeu o homem – Eu sei o que você está pensando. – disse ele, com um sorriso – Sim, meu corpo reage à presença de uma mulher atraente, mas a idéia de ter algo com alguém que não seja sua mãe é simplesmente inconcebível para mim.


Sophie abriu um sorriso para o pai, que lhe acariciou o rosto.


- Agora a única mulher da minha vida é você. – disse ele, e Sophie voltou a sorrir – Agora, acho que você deve voltar à escola. Nem devia estar aqui.


- Está bem. – concordou a garota – Pai?


- Eu irei pessoalmente verificar a mansão. – disse Sirius, antecipando o pedido dela – Agora vá.


- Está bem. – disse ela, novamente, e então rodeou a mesa para despedir-se dele – Até logo.


- Até.


As duas semanas seguintes foram marcadas pelos melhores treinos de Quadribol que a equipe da Grifinória realizara desde que Harry assumira como capitão. A equipe inteira estava contente em ter Katie de volta, e, com a formação original, na qual se acertavam tão bem entre si, todos estavam voando excepcionalmente bem. Gina não parecia nada abalada com o fim de seu namoro com Dino, que, além da namorada, também perdera o posto de artilheiro no time, com o retorno de Katie. Muito pelo contrário. A ruivinha andava risonha, e fazendo todos rirem, contando histórias e piadas, e imitando, ora Rony nas balizas, ora Harry, dando ordens ao time. Harry, rindo junto com os demais, ficava satisfeito em ter uma desculpa bastante inocente para olhar para Gina. Levara vários balaços durante os treinos, por estar com a atenção totalmente voltada para uma certa artilheira de cabelos vermelhos...


Em sua cabeça, a batalha feroz continuava a acontecer. Gina ou Rony? Às vezes ele achava que Rony, por ser seu amigo, não se importaria se ele convidasse Gina para sair, mas então lembrava da reação do ruivo, ao encontrar Gina aos beijos com Dino Thomas, e sua coragem ia toda por água abaixo. No entanto, ele não conseguia se impedir de falar com Gina, de rir com ela; por mais que a consciência pesasse, vivia pensando em maneiras de encontrá-la sozinha. Pensou em pedir a ajuda de Hermione ou Sophie, mas ao lembrar dos olhares e sorrisos que as duas trocavam a cada vez que o viam com a ruivinha, acabou por desistir dessa idéia também.


A única coisa capaz de afastar os pensamentos de Harry de seu dilema sobre chamar ou não Gina para sair, era a aproximação da partida contra Corvinal. Devido ao péssimo desempenho do time na última partida, somado à vitória esmagadora da Sonserina sobre a Lufa-Lufa, a equipe da Grifinória precisava vencer a partida com, no mínimo, trezentos pontos a mais do que a Corvinal para poder ganhar o campeonato. Harry tinha ainda um motivo extra para desejar a taça de Quadribol daquele ano. Em sua cabeça, por alguma razão que nem ele mesmo poderia explicar, o jogo estava intimamente ligado ao sucesso ou fracasso de seus planos em relação a Gina. Ele não podia deixar de pensar que, se ganhassem por mais de trezentos pontos, a euforia e uma gigantesca comemoração pós-jogo poderiam ter o condão de, ao mesmo tempo, dar uma amolecida em Rony, e ser a oportunidade perfeita para que ele se aproximasse da ruivinha como mais do que um simples amigo.


Poucos dias antes da partida contra Corvinal, Harry descia, sozinho, da torre para jantar. Rony estava outra vez com o estômago embrulhado, e decidira não participar da refeição; Hermione resolvera dar uma passada na sala da professora Vector, de Aritmancia, para consultá-la sobre um possível – e pouco provável – erro no último trabalho, entregue naquela tarde, e o garoto esperava encontrar Sophie, que havia ido à biblioteca devolver um livro, no Grande Salão. Mais por hábito do que por qualquer outra coisa, deu uma passada pelo corredor do sétimo andar, verificando o Mapa do Maroto, enquanto caminhava. Ele ainda não se esquecera de seu intento de descobrir o que Malfoy fazia na Sala Precisa e, eventualmente, além de consultar o Mapa do Maroto, e continuar a notar que em momentos o sonserino desaparecia do Mapa, o que significava que devia estar dentro da Sala, sempre que estava pelos arredores do corredor com a tapeçaria, fazia nova tentativa – sempre frustrada – de entrar ali.


Percorrendo o Mapa com o olhar, não conseguiu, em um primeiro momento, localizar Malfoy, e chgou a deduzir que ele estivesse dentro da Sala Precisa. Então, viu o pontinho do sonserino em um banheiro masculino, no andar de baixo, acompanhado, não de Crabbe ou Goyle, mas de uma das últimas pessoas que Harry jamais poderia imaginar um dia ver ali naquele momento. Junto com o de Malfoy, no banheiro masculino do andar de baixo, estava o pontinho que representava Sophie.


No andar de baixo, Sophie e Malfoy se encaravam, a tensão entre os dois era quase sólida, e nenhum deles havia dito ainda nenhuma palavra. Sophie nem mesmo sabia direito o que estava fazendo ali, no banheiro masculino, diante de Malfoy; mais uma vez fora guiada de alguma forma até o sonserino, e, ao encontrá-lo, não pôde deixar de sentir, ao mesmo tempo, profundo espanto e pena. Quando entrou, sem fazer barulho, no banheiro, o garoto estava de costas para a porta, a cabeça loura curvada, as mãos apoiadas nos dois lados da pia. Ele então inspirou fundo, engolindo em seco, e ergueu a cabeça, olhando para o espelho à sua frente, e encontrando no reflexo os olhos negros de Sophie. Ele girou nos calcanhares, e foi com grande choque que a garota percebeu que ele estava chorando. Ela podia sentir as ondas de dor, arrependimento e medo que emanavam dele. Medo dela, e do que poderia fazer, mas também, e principalmente, medo de algo muito maior, e mais aterrorizante.


- Me diga como ajudar você... – pediu ela, sem nem ao menos pensar no que dizia. Estava agindo por puro instinto.


- Você não pode me ajudar. – respondeu o sonserino – Você nem ao menos quer me ajudar.


- Eu...


- Vai embora, D’Argento. – disse Malfoy, mas não era uma ordem. Soou mais como um pedido, e por isso Sophie não fez o que ele dissera.


- Você não quer... não quer realmente ser...? – perguntou Sophie, a voz entrecortada. As emoções de Malfoy a afetavam de forma desconcertante e poderosa. Ela o viu levar a mão ao braço esquerdo antes de responder.


- Ele vai me matar... e à minha mãe, e meu pai... – disse o garoto, sem se importar em esconder o momento de fraqueza – Annabella está lá, o tempo todo, vigiando...


- Talvez... talvez haja algo... algo que possamos fazer...


- Não há. – disse Malfoy, em tom definitivo – Você não pode me ajudar. Ninguém pode. E se alguém souber, eu vou morrer...


A idéia de Malfoy ser morto perturbou a garota de forma muito intensa, deixando-a ainda mais confusa. Por que aquilo a afetava tanto? Seria somente por sua ligação com a tal mulher, Annabella, ou havia algo mais?


- Dumbledore pode tentar... pode proteger você, e sua mãe...


- É tarde demais... – disse o garoto, em tom derrotado.


- Não... – ela respirava fundo, sentindo o peito apertado e segurando-se o máximo que podia para não deixar escapar as lágrimas que ameaçavam surgir em seus olhos.


- Você se parece com ela. – disse Malfoy, de repente, fitando-a de uma forma que garota não conseguia definir – Com Annabella. Exceto pelos olhos. Mamãe acha que ela não é má. Que não é de fato um deles.


“Um deles, não um de nós.” – pensou Sophie.


- O que sabe sobre essa mulher, Annabella? – perguntou ela, tentando manter-se sob controle.


- Nada. – respondeu Malfoy – Ela foi mandada para minha casa. Vigia minha mãe, e é vigiada por ela. Está proibida de deixar a mansão, exceto para atender aos chamados do Lorde. – contou ele – Está sob as ordens dele... como eu.


Sophie ofegou. Era a primeira vez que ele dizia com todas as letras que estava obedecendo às ordens de Voldemort, e ela se surpreendeu por ele estar dizendo tudo aquilo a ela.


- Me deixe tentar ajudar você... – pediu ela mais uma vez. Ela sentia que precisava fazer aquilo, que precisava ajudá-lo de alguma forma.


- Me deixa em paz, D’Argento. – disse o garoto, meio ríspido – Você não pode me ajudar. E se contar isso pra alguém...


- Eu não vou contar. – disse Sophie, para surpresa de Malfoy e dela mesma.


- Vocês são idênticas. – disse Malfoy, com um sorriso leve e cansado; sem o desdém habitual, Sophie pensou, o sorriso dele era bonito – Ela poderia ser sua mãe. Talvez um dia você a veja, e então irá concordar comigo.


Sophie sentiu algo se mover dentro dela às palavras do sonserino, e não entendeu o porquê. Haveria ali algo que ela deveria ter percebido? Mas ela não teve tempo de pensar nisto. Malfoy respirou fundo mais uma vez, e limpou o rosto nas mangas das vestes. Em segundos, ele já havia se recomposto, no rosto, a típica expressão altiva e desdenhosa, e sem dizer mais nada, deixou o banheiro, no mesmo instante em que um segundanista da Grifinória entrava no local, dando de cara com Sophie.


- Ei, o que está fazendo aqui? Isso é um banheiro masculino! – reclamou ele, indignado.


Sophie olhou mais uma vez para o espelho, e para a pia onde Malfoy estivera, e então suspirou. Sem dizer palavra, encaminhou-se para a saída do banheiro, e só então encarou o segundanista.


- Eu não estou aqui. – disse ela, ao passar por ele, que ficou com o olhar desfocado por alguns instantes, voltando ao normal no momento em que a porta se fechava às suas costas.


- Estranho... – resmungou consigo mesmo, olhando ao redor de cenho franzido – Eu podia jurar ter ouvido uma voz de garota aqui dentro...


Após alguns instantes parado no meio do corredor, devido àquela improvável dupla, Harry enfiou o Mapa do Maroto no bolso, e seguiu rumo à escada. No entanto, enquanto andava, ou melhor, corria, até lá, sem prestar atenção no caminho, esbarrou – literalmente – em Romilda Vane, derrubando-a no chão, junto com os cadernos e livros que ela carregava.


- Ah, desculpe, Romilda... – pediu Harry, enquanto a ajudava a levantar-se – Você se machucou?


- Não... – disse Romilda, em tom afetado – Não se preocupe, eu estou bem, Harry... obrigada.


- Aqui. – disse Harry, juntando rapidamente os cadernos dela, e entregando-os à garota.


- Obrigada. – agradeceu ela, toda melosa – Você é... – ela começou, mas Harry já a ultrapassara, rumo à escada.


- Desculpe, eu estou com pressa!


Ele desceu as escadas de dois em dois degraus, e seguiu correndo pelo corredor rumo ao banheiro, quase atropelando um fantasma no meio do caminho. No entanto, ao alcançar o banheiro, encontrou-o vazio.


- Droga! – xingou, chutando o chão.


Tirou o Mapa do Maroto mais uma vez do bolso, e examinou-o. Malfoy estava no Grande Salão, à mesa da Sonserina, mas não havia qualquer sinal de Sophie em lugar algum.


- Onde é que ela se meteu?


Se Harry tivesse prestado um pouco mais de atenção, teria localizado Sophie, seguindo pelos jardins. Na verdade, a garota estava no túnel que levava ao porão da Dedosdemel, e no exato momento em que Harry fechou o Mapa, ela alcançava os limites da escola, e aparatava para o seu destino.

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