Capítulo Dois



Os homens que lutavam contra eles, lutavam como verdadeiros enviados do demônio.

Isso não era uma mentira. Era possível ver muitos de seus homens espalhados no chão, reclamando de dor. Alguns estavam até mortos.

Mesmo sendo noite e ambos os lados estavam usando para descanso, era possível ver um dos homens estava com a armadura quebrada e coberta de sangue. Seu rosto estava machucado e sujo; sujo, assim como seus cabelos muito vermelhos. Ao lado dele estava um rapaz de vinte anos, colocando a cabeça do homem sobre um pedaço de pano; pano que fazia parte das próprias vestimentas do rapaz.

- Não vamos resistir. – o ruivo disse entre gemidos de dor. – Onde estão as enfermeiras?

- Ainda não chegaram. – respondeu o rapaz. Tinha o cenho franzido – Mas vão chegar até amanhã, enviaram uma carta garantindo isso.

Um homem com seus aparente trinta anos apareceram ao lado da dupla; Segurava uma arma.

- Nenhum sinal de que vão tentar uma invasão hoje, senhor. – o homem se dirigia ao rapaz. Este assentiu silenciosamente.

- Temos que ficar atentos. Os que estão bem, ninguém saiu de sua posição?

- Não senhor. Estão todos atentos ao que pode acontecer.

- Bom. – disse o rapaz. – E o comandante?

O homem negou com a cabeça.

- Não vai sobreviver. Já está alucinado e sangra por todos os lados. – balançou a cabeça. – Não vamos resistir por muito tempo. Deveríamos voltar e pedir ajuda.

Aquilo pareceu uma ofensa ao rapaz.

- Não. – seu tom foi duro e ele franziu mais uma vez o cenho. – Não vamos dar a eles o gosto de saber que estão vencendo. Não vamos perder. Não vamos fugir.

O ruivo tossiu sangue. O rapaz o encarou.

- Poderemos mandar os feridos de volta caso as enfermeiras não cheguem logo.

- Deveríamos ter feito como meu irmão – o ruivo sussurrou. Parecia exausto e machucado demais para falar normalmente. – Ele está em expedições... Não está arriscando o pescoço inutilmente como aqui...

- Não estamos arriscando o pescoço inutilmente. – o rapaz o repreendeu. – Estamos defendendo o que é nosso. E protegendo nosso rei.

O homem encarou o rapaz. Ele podia ser o mais novo naquela batalha, mas com certeza era o mais corajoso e sério. O rapaz sempre tinha a postura séria, e nem mesmo quando descansava ele sorria. Seu semblante era rígido e ele não se distraia.

Ele lutava com garra no campo de batalha, pensou. Parecia não se importar quando iria morrer, ou quantas pessoas iriam matar. Parecia que naquele momento, aquela era a única coisa que importava. O homem pensou que o rapaz poderia substituir o comandante sem nenhum problema.

- Mas poderíamos estar bem, se estivéssemos nas expedições. – o ruivo gemeu de dor. – Ronald foi esperto pela primeira vez, afinal.

- Ele tem que se confrontar com piratas e se arriscar a afundar no mar. – o rapaz disse. – Pode adquirir doenças no meio do caminho e morrer. E ninguém jamais acharia seu corpo. Pare de ter medo de seu destino, homem.

- Meu filho está nas expedições. – o homem comentou. – Neville Longbotton. Ele está com a sua idade hoje, Potter.

O rapaz não entendeu porque o homem estava dizendo aquilo, e limitou-se a responder com o silêncio.

- Poderíamos estar nos aventurando no mar. – o ruivo respondeu, antes de remexer-se e sangrar ainda mais. – É melhor do que este tormento, enquanto espero a morte aparecer...

- Você não vai morrer. – desta vez, o rapaz foi enfático. – Você não vai largar seu sonho. – o ruivo pareceu devanear, como se nem ele próprio lembrasse o que queria. – Você vai realizar seu desejo de voltar para sua casa. Inteiro.

Ele assentiu, parecendo se lembrar.

- Sim. Sinto falta de casa. – ele sussurrou. O homem sentia pena do ruivo. Não era tão novo quanto Potter, mas não merecia morrer naquela batalha, tampouco. – Sinto falta daqueles jardins, onde costumava brincar com meu irmão.

Em poucos minutos, ele começou a devanear, dizendo seus feitos quando criança como se estivessem acontecendo no presente momento.

- Ele não vai resistir. – o homem falou. Harry inspirou profundamente antes de franzir o cenho.

- Sim, ele vai. Ele é forte.

O rapaz parecia tão nervoso que o homem achou melhor não contrariar.

- Ginny anda pela casa como se fosse à miniatura de uma princesa. – os olhos do ruivo brilharam de ternura a menção do nome feminino. – Tão doce, tão meiga... Obediente... Ginny é uma menina tão pura...

O homem encarou do ruivo para o rapaz.

- Quem diabos é Ginny?

Ele percebeu o semblante de Harry ficar mais nebuloso que antes. A resposta saiu áspera:

- A irmã caçula dele.

- Mamãe não sabe o que faz, muitas vezes. Ginny é tão novinha para se casar... Ela não entenderia, ela não supriria as vontades...

Harry pareceu extremamente aborrecido agora. Cauteloso, o homem perguntou:

- A menina casou-se?

- Tem um contrato, mas ainda não está casada. Está noiva.

O homem não conseguia entender por que o rapaz estava tão exasperado. Decidiu fazer mais uma pergunta, em meio às palavras “Ela é tão criança, tão ingênua...” do ruivo, para o rapaz.

- Com quantos anos ela estava quando existiu esse contrato?

- Com seis anos, mas só foi realmente autenticado quando ela tinha doze anos.

- Ela era uma menininha, ainda.

Harry não respondeu. Sentia uma vontade esmagadora de enfiar um pano na boca de Carlinhos, para que ele parasse de falar de Ginny. Toda vez que escutava aquele nome, seu mau humor era duas vezes maior que o normal.

- Escutei Ginny conversando com Dorothy, depois que soube. – Carlinhos gemeu de dor e levou a mão ao abdômen. – Ela estava desolada quando soube que ia se casar, ainda tão jovem.

- O homem a quem ela está predestinada é tão horrível assim?

Harry sentiu vontade de ordenar que o homem saísse dali, mas não tinha autoridade para tal.

- Suponho que sim. – limitou-se a responder.

- É uma loucura, casar a menina tão nova... Doze anos. – o homem balançou a cabeça. Carlinhos pareceu se recuperar momentaneamente de seu devaneio.

- Quem tem doze anos?

- Estava enlouquecendo, Weasley. – Harry resmungou.

- Estava falando de sua irmã. - o homem respondeu. Carlinho fez uma careta. Harry não sabia dizer se era um sorriso ou se expressava dor.

- Ginny... – ele sorriu tolamente.

- Estava dizendo que ela iria se casar. – o homem era nem um pouco educado em expressar sua curiosidade. E, para a infelicidade de Harry, Carlinhos assentiu.

- Ela iria casar-se assim que seu noivo completasse dezoito anos. Quando isso acontecesse – ele gemeu de dor. – ela teria dezesseis.

O pai de Neville Longbotton parecia surpreso.

- Pensei que o noivo fosse velho, já. Então quer dizer que era apenas um rapaz, também?

Carlinhos ergueu uma sobrancelha.

- É um acordo entre minha família e a do noivo, para fortalecer ambos os burgos, enriquecer ambas as famílias ainda mais e unificar os laços, já que as duas famílias são bem amigas.

- Hum... E que família é a do noivo?

Carlinhos sorriu ao ver Harry o fuzilar com um olhar. Ele adorava irritá-lo mesmo sendo um grande amigo seu. Harry tinha os nervos muito à flor da pele.

- Você está do lado do noivo, Frank.

Frank arregalou os olhos ao encarar Harry.

- Maldição! Todo esse tempo eu pensando que você não tinha nenhum pensamento positivo, caso sobreviva a esta batalha... E na verdade está noivo de uma jovem! Por que não disse?

- Você não perguntou. – replicou o rapaz. Mas Frank percebeu: Harry parecia muito desgostoso com aquela idéia de casamento.

- Vou tentar descansar, para aliviar a dor. – Carlinhos anunciou. Em menos de um minuto, ele dormia profundamente, embora com dificuldade.

Harry então se levantou e caminhou até onde os atiradores em perfeito estado estavam posicionados. Colocou-se ao lado de um e checou-se se estava tudo em silêncio. Ao parecer satisfeito quando o homem lhe informou que estava tudo bem, ele pareceu relaxar e disse que os homens poderiam fazer o mesmo.

Mas seu cenho franziu no exato minuto em que Frank apareceu, com um sorriso maldoso na face.

- Jonathan, imaginaria você se eu dissesse que o rapaz ao seu lado é um noivo?

Jonathan pareceu intrigado.

- Você diz Harry? Harry Potter?

Para a infelicidade dele, outros homens aproximaram-se, interessados na conversa.

- O próprio. O que diz não se importar em morrer em batalha, o homem rancoroso, está prometido.

Jonathan balançou a cabeça.

- Pobre moça.

O cenho de Harry franziu-se e ele bufou. Um homem louro de rosto pontudo aproximou-se dele.

- E como é a noiva, Potter?

Ele deu de ombros.

- Não sei. A ultima vez que a vi tinha doze anos. Mimada e infantil como todas as outras. Imagino que hoje esteja igual a todas as mulheres de sua família...

- Huh. E como seria?

Harry inspirou profundamente, tentando manter a calma. A imagem que formara de sua noiva invadiu sua cabeça, e ele murmurou desgostoso.

- Provavelmente não consiga passar por uma janela, caso tente fugir um dia.

Os homens gargalharam. Harry bufou.

- É engraçado porque não são vocês que um dia vão ter que se deitar com uma mulher dessas. – Frank deu uma palmadinha no ombro do rapaz.

- Talvez, quando você a encontre, você até comece a gostar de mulheres... Oh... Robustas.

- É um belo termo que você arruma para esconder a palavra porca, Longbotton. – o loiro comentou divertido.

Jonathan sorriu para o colega. – Agora entendo porque você não se importaria em morrer em campo. Não consigo me imaginar deitado na mesma cama que uma mulher em forma de pêra.

Harry franziu o cenho para aquele comentário. Frank o encarou.

- Você não pode tentar anular o acordo?

- Talvez até possa. Mas não vou.

Os homens o encaram descrente. Harry bufou.

- Existe uma assinatura minha naquele papel, e assim como minha família, não sou de quebrar palavras. E também, ambas as famílias vão ganhar uma gorda quantidade de ouro por esse casamento.

O loiro fez uma careta de nojo.

- Você é corajoso. Eu não faria uma porca ficar de joelhos para mim, por dinheiro, por maior quantidade que fosse. É uma cena nojenta.

O rapaz sentiu o sangue latejar. Ele não entendeu por que, mas não aceitou que Malfoy falasse daquela forma de sua noiva. Ele podia, mas Malfoy não.

Entrementes, não disse nada. Se tentasse abrir a boca para falar, Harry esfolaria Malfoy vivo.

Os homens continuaram a especular sobre sua noiva, até que o assunto cansasse. Harry pareceu inteiramente agradecido por isso, porque assim ele não precisaria ficar escutando o nome de Ginny por mais um minuto.

Lembrava-se dela, quando tinha doze anos. Não era gorda, mas sua atitude o irritava profundamente. Ela estava arrumada como se fosse para um baile, e Harry pode jurar que ela havia pestanejado para ele quando desceu as escadas.

E era uma mimada, Harry lembrou-se. E tolamente submissa aos pais. Enquanto ele quase destruíra a casa recusando-se a casar, Ginny apenas assentiu com a cabeça baixa, em silêncio.

E ele duvidava que ela tivesse mudado isso porque, se tivesse, ele com certeza teria visto a fúria da garota ao saber que ficaria trancada dentro da própria casa até que ele retornasse da guerra. Mas ao contrario, pareceu ter aceitado a ordem dos pais.

E claro, que nos dias atuais ela deveria estar tão insuportável e gorda quanto à mãe, ele pensou e bufou.

Podiam dizer o que quisessem, mas Molly Weasley era desprezível e falsa, assim como a maior parte das mulheres Weasley. Até mesmo seu pai concordava com isso, e afirmava que não podia acreditar como um homem tão bom como Arthur poderia ter sido predestinado para uma excêntrica como ela.

Inspirou profundamente e amarrou a cara. Não podia sentir pena de Arthur, afinal, ele também estaria no mesmo barco, em breve.

Mas Harry não tinha a mínima noção do quanto estava equivocado sobre sua noiva.

Continua...

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