Apenas um sonho



Hermione se espreguiçou descansadamente; era sábado e, por mais que gostasse das aulas, estava aliviada por ter chegado o fim de semana. Aquele ano estava sendo particularmente exaustivo, por vários motivos, e um dia de descanso, ao menos, era bem-vindo. Lembrou-se de um dever de Aritmancia que precisava fazer, mas... sim, tinha que admitir para si mesma que não queria fazer deveres naquele dia. Bem, talvez Rony conseguisse convencê-la a não fazer e, então, ela não se sentiria tão culpada no final do dia, pois tecnicamente a culpa seria dele. Um sorriso levemente maroto preencheu seus lábios.

Ela se trocou, ao mesmo tempo em que conversava sobre bobagens com Lilá e Parvati, que também estavam substituindo os pijamas por roupas de fim de semana. Hermione, que não teve paciência de abaixar seus cabelos cheios, apenas prendeu-os em cima e saiu do quarto, pensando em qual lugar iria primeiro.

Provavelmente, Rony e Harry ainda estavam dormindo – eles não eram afeitos de acordar àquela hora num sábado se não tivessem treino de quadribol –, então, onde ela poderia ir? Quando passou pelo dormitório feminino do sexto ano, a garota sorriu pela idéia que teve.

Uma sextanista morena e alta atendeu à porta quando Hermione bateu três vezes, fazendo uma expressão de leve desagrado misturado à zombaria ao vê-la. Hermione percebeu que ela estava olhando exatamente o seu cabelo – por que aquela garota estúpida simplesmente não se preocupava com o cabelo dela, que, aliás, estava bastante embaraçado pela noite de sono? No entanto, ao invés de dizer em voz alta seus pensamentos, Hermione preferiu assumir seu tom mandão de monitora-chefe e perguntar, com o nariz empinado, se Gina estava ali dentro. A garota, que também arrebitou o nariz, apenas disse que Gina estava na cama dela e deu as costas a Hermione, que entrou e fechou a porta atrás de si.

Ela viu, pelo canto dos olhos, a mesma garota que lhe atendera rindo com uma amiga num canto. Hermione decidiu que não iria se aborrecer e apenas se dirigiu até a cama de Gina.

A cama da garota ficava próxima a uma das janelas do quarto, de modo que, estando ela deitada de lado, parecia observar com os olhos vidrados o céu – maravilhosamente azul, com poucas nuvens, sinal da primavera tão esperada. Hermione aproximou-se devagar, sentando com cuidado na ponta da cama. Gina, sentindo a cama afundar levemente, apenas girou os olhos de esguelha na direção de Hermione, para depois voltar a observar o céu. Seu rosto tinha um quê de tranqüilidade, nostalgia e melancolia.

- Ah... – ela suspirou mansamente. – É você, Mione...

- Decepcionada? – a garota brincou. – Quem você esperava?

- Ninguém...

Hermione achou aquela atitude muita estranha; geralmente Gina, como ela, estava bem disposta nas manhãs e não arreada na cama daquele jeito. Alguma coisa deveria ter acontecido. Hermione ouviu quando aquelas duas sextanistas risonhas saíram do quarto, deixando as duas garotas a sós. Era melhor assim.

- Você está bem, Gina?

Ela meneou a cabeça de um lado para outro, parecendo indecisa da resposta que deveria dar. Após um longo suspiro, virou-se lentamente na cama e sentou-se, posicionando as costas na cabeceira da cama. Seus olhos perscrutavam os de Hermione firmemente.

- Você já sentiu... que deveria estar contente com alguma coisa, mas ao invés disso... essa alegria não está completa, como se faltasse algo? Algo que a deixa... desanimada?

Hermione sorriu levemente ao imaginar o que Rony diria daquela pergunta sem pé nem cabeça; provavelmente algo como “Uma pessoa não pode sentir tudo isso ao mesmo tempo, explodiria” ou ainda “Você deveria escrever um livro sobre como entender as garotas, Hermione; ganharia tantos galeões que poderia encher Hogwarts com eles”.

- Aconteceu alguma coisa ontem, depois que eu e Rony fomos dormir?

A reação de Gina à pergunta tão incisiva de Hermione foi imediata: ela reclinou um pouco o corpo para trás, seus olhos se arregalaram e sua boca se entreabriu em espanto. Quando a surpresa finalmente deixou-a falar, sua voz saiu um pouco mais fraca e ansiosa do que o normal:

- Como... como você...?

- Ora, Gina... eu não sou cega... – e soltou uma risadinha. – E também sou uma garota, percebo coisas que outras pessoas deixariam passar despercebido... você entende...

Gina abaixou os olhos, ainda espantada, e subitamente fechou a boca, como se finalmente notasse que esta tinha se aberto tal era sua estupefação. Após alguns segundos, nos quais ela parecia estar procurando tempo para pensar no quê dizer, Gina desviou os olhos novamente para a janela e murmurou tão baixo, que Hermione teve que ler seus lábios:

- Ele me beijou...

Foi a vez de Hermione arregalar os olhos e abrir a boca em espanto; não, ela certamente não tinha escutado direito...

- Repete isso. – a garota pediu cautelosamente, apurando os ouvidos. – Eu quero ouvir novamente.

Gina suspirou profundamente e, então, fechou os olhos por alguns segundos, sorrindo de leve, como se a imagem que se formara em sua mente lhe agradasse; porém, quando abriu os olhos e encarou Hermione, sua expressão demonstrava que a realidade voltava a lhe atingir.

- Ontem... quando estávamos na sala comunal... Harry me beijou...Um sorriso enorme se formou instantaneamente nos lábios de Hermione e, de repente, ela não se cabia em si de contentamento; Harry e Gina tinham se beijado, aquela sim era uma notícia boa numa maré de tantos acontecimentos ruins!

- Eu não acredito, Gina, que coisa boa! – a garota exclamou animada, rindo sozinha de tanta alegria. – Isso é... isso é... é maravilhoso! Eu estou tão feliz por vocês, você não imagina o quanto eu... ah, Gina, me conte!

Um sorriso tímido se formou nos lábios da ruiva e foi aumentando sensivelmente enquanto ia contando sua história. Hermione mal podia acreditar que fosse verdade; o que Gina lhe contava certamente era o sonho de qualquer garota, e ela chegou a considerar seriamente uma conversa com Rony a respeito de ele cantar algo em seu ouvido também – apesar de Rony ser horrendamente desafinado. Além disso, ela não imaginava que ele pudesse ser tão romântico – nem ela era, para início de conversa. Mas, mesmo assim, Hermione tinha que admitir que aquela história deixava qualquer garota sonhando com algo parecido para si, mesmo que, como ela, não fosse muito afeita de histórias românticas “água com açúcar”.

- E então... foi isso... – Gina finalizou, aquele sorriso tímido ainda presente em seus lábios, como se ela estivesse dividida entre a alegria e uma certa melancolia. – Nós nos despedimos pouco depois... demorou algum tempo para que eu conseguisse dormir, estava em tal estado de torpor que... – ela soltou uma risadinha. – Fiquei imaginando como Harry estaria naquele momento, depois do que tinha acontecido... se ele também estava como eu...

O sorriso ainda não tinha sumido do rosto de Hermione quando ela voltou a falar:

- E ele disse que te amava? Ah, que bonitinho, Gina! Eu nunca pensei que o Harry pudesse ser tão sensível! Quem já o viu gritando com todo mundo nem consegue imaginar uma cena dessas, não é? – ela completou rindo, ao se lembrar das inúmeras vezes que Harry tinha ataques de fúria quando algo saía a seu controle.

Gina, no entanto, não parecia estar achando tanta graça assim. Ela suspirou novamente, fazendo um bico e uma careta dignos de Rony Weasley.

- Você acha mesmo tão bom assim, Mione?

- Como “se eu acho?” – Hermione perguntou espantada. – É maravilhoso, Gina, do quê você ainda está...

- Hermione... isso é só uma ilusão... – Gina desabafou com desânimo, meneando novamente a cabeça de um lado para outro. – Amanhã mesmo ele pode voltar a si, voltar a ser o mesmo Harry de antes e... – ela respirou fundo. – Esse Harry que disse que me ama não é real. Se o verdadeiro Harry estivesse aqui, ele nunca...

As palavras se perderam a caminho da boca de Gina e ela resolveu se calar. Hermione apenas permaneceu encarando-a, paralisada, até que sentisse uma súbita e incontrolável vontade de rir. Ao ver o ataque de riso da garota, Gina pareceu se ofender seriamente.

- Do quê você está rindo, Hermione? Você acha isso engraçado? Eu queria ver se fosse com você!

- Não, não, Gina, pelo amor de Deus, não se ofenda! – a garota disse engasgada pelo riso, sabendo que se irritaria tanto quanto Gina numa situação como aquela. – Você não entendeu, eu... – ela engoliu em seco, tentando se controlar; puxou, então, as mãos da amiga e alisou-as, num gesto de conforto e compreensão. – É que você... você não sabe o que eu sei... Você repetia tantas vezes que o Harry era um cego, que ele não notava as coisas... mas você acabou sendo como ele... É disso que eu estou rindo... Que ironia, não?

Visivelmente, Gina estava muito confusa; Hermione não a censurava, mas que era engraçado, isso era. A garota a encarava como se estivesse seriamente preocupava com a sanidade mental da amiga.

- O quê... O que você está dizendo, Mione?

Hermione esperou algum tempo até que se controlasse por completo, respirou fundo e encarou Gina profundamente, apesar do sorriso ainda estar presente e alegre em seus lábios.

- Bem, Gina... é que você foi a última a saber que Harry te amava. Você foi tão cega quanto ele. Todo mundo já tinha percebido!

A expressão de Gina mudou totalmente: agora era séria e, novamente, ofendida.

- Você não precisa me contar mentiras só por pena, Hermione. Por mais que você ou o Rony achem isso, eu não sou uma garotinha boba.

Hermione percebeu que ela ainda não tinha entendido o que ela estava tentando lhe explicar e, por causa disso, também assumiu um tom mais sério.

- É claro que eu sei disso, Gina, mas eu não estou zombando de você, muito menos mentindo. Pelo contrário, estou dizendo a mais pura verdade: Harry já te amava, muito antes de perder a memória.Foi como se Gina acabasse de aterrizar bruscamente no solo depois de um longo vôo de vassoura. Ela escancarou a boca, ainda observando vivamente Hermione, com uma expressão de confusão no rosto. Lentamente, ela recomeçou a falar, como se estivesse tentando entender uma difícil matéria de Transfiguração.

- Explique-se.

Hermione tomou fôlego antes de iniciar sua história.

- Bem, Gina... É claro que você se lembra que no ano passado o Harry se tornou muito fechado por motivos que... bem, você sabe. – a garota assentiu pacientemente. – O fato é que ele estava tão fechado, que não falava mais quase nada comigo e com Rony, de modo que eu passei a observá-lo melhor por causa disso, para tentar arrancar alguma coisa dele... Acho que fui a primeira a perceber...

- Hermione, pare de enrolar e chegue nos “finalmentes”. - Gina pediu ávida.

- Calma, eu preciso explicar tudo! – Hermione retrucou num tom contente, que fez Gina estreitar seus olhos para ela. – Como eu estava dizendo... eu comecei a observar Harry com mais atenção. E você e ele se aproximaram um pouco, não foi? Quer dizer, depois que eu e Rony...

- Nem tanto. – Gina respondeu seca. – Às vezes nós conversávamos, é verdade... e às vezes nós discutíamos como você e Rony eram dois completos babacas por brigarem tanto se gostavam um do outro.

Hermione fechou a cara – era sua vez de estreitar os olhos para Gina; a garota riu vitoriosamente.

- Agora pisei no seu calo, hein?

- Tá, tá, não é de mim e de Rony que estamos falando... – Hermione disse com impaciência. – O fato é que, de tanto que você estava empenhada em tirar Harry de sua cabeça, acabou não percebendo que ele estava começando a não conseguir mais tirar você da cabeça.

Gina ficou séria novamente.

- Isso é uma piada. – ela disse, apesar de não estar achando nada engraçada aquela conversa. – Harry nunca iria...

- E por que não? – Gina se calou. – Por que ele não poderia estar prestando atenção em você, Gina? Afinal, você é uma garota bonita, com uma conversa inteligente... além disso, você estava mais próxima e, o mais importante, Harry sabia que você já teve uma queda por ele no passado e, naquele momento, estava totalmente desencanada dele. Isso mexe com o ego de um garoto, sabia? Eu convivo com Harry e Rony desde que tinha onze anos... e já me dei conta de algumas coisas sobre eles... Antes de tudo, eles são meus amigos, e eu posso dizer que percebo quando eles estão diferentes... posso errar, mas naquela época eu tinha a certeza de que Harry estava te vendo com outros olhos...

- Podia ser só impressão sua, Mione. – Gina argumentou. – Você pode falhar, não é?

- É, mas dessa vez eu não falhei. – Hermione retrucou orgulhosa. – Porque eu o encostei na parede e o fiz contar tudinho.

Gina levou um choque; ela parecia estar seriamente abalada com aquela história.

- Como assim?

- Eu sabia que Harry não iria contar algo assim para Rony, afinal, você é a irmã dele e a situação seria meio... esquisita. Mesmo que Rony às vezes brincasse que você e Harry juntos não seria má idéia...

- É, eu sei... – Gina disse emburrada, cruzando os braços. – Rony tinha essa estúpida mania. Irritante.

- Sim, mas Harry não contaria nada a ele, eu sabia disso... então... eu era a única opção dele, mas ele não me contaria espontaneamente, o que me obrigava a dar um empurrãozinho.

- E o que você fez?

- Ora, eu só cheguei para ele e perguntei: “Você está gostando da Gina, não é?”. – Hermione riu. – Harry não sabe fingir quando alguém lhe questiona incisivamente a verdade... quer dizer, se ninguém desconfiar, ele pode até tentar enganar alguém, mas... quando alguém que ele gosta e considera joga a verdade na sua cara, ele não sabe mentir. É claro que ele é bastante cara de pau quando se trata de Snape, por exemplo, mas quando a pessoa é alguém que ele confia... Bem, ele se enrola todo e não olha para a pessoa quando fala... Chega a ser engraçado... Esse dia, então... ele até ficou um pouco bravo comigo por eu ter rido dele...

- Espera um pouco, Mione. – Gina pediu com cuidado. – Você está querendo me dizer que...

- Eu estou querendo lhe dizer, Gina, que Harry confirmou para mim que estava sentindo algo diferente por você. Algo a mais, entende? – ela piscou para a amiga. – E desde então eu tenho torcido para que vocês se resolvam, mas você, todo esse tempo, conseguiu ser tão cega quanto Harry anos atrás. Rony também notou tudo isso, apesar de nunca ter falado em voz alta o que acha – ele preferiu diminuir as piadinhas a respeito de vocês e olhar meio feio para o Harry, afinal, ele também notou que a coisa toda não era mais uma brincadeira.

- Quando foi isso? – Gina perguntou, ainda sem acreditar em tudo que ouvia. – Quando você teve essa conversa com Harry?

- No fim do ano passado, um pouco antes de voltarmos para as férias... – Hermione não conteve uma risadinha. – Harry até me disse que estava chateado por ter que ir se atolar na casa dos Dursleys de novo e não poder mais te ver nos corredores de Hogwarts por todo esse tempo...

- Ele disse isso mesmo? – Gina repetiu, ao mesmo tempo entusiasmada e esperançosa.

- Disse, claro que disse! Eu tenho cara de mentirosa, por acaso?

- Eu não acredito, Mione... – Gina tinha aberto um sorriso involuntário de orelha a orelha. – Isso não pode ser verdade, eu...

- É claro, Gina, que eu só não te contei nada porque Harry me implorou para que ficasse “de bico fechado” – nas palavras dele. Era um segredo meu e dele, eu não podia trair um amigo, não é? – Gina assentiu, compreendendo. – Além disso, você estava tão compenetrada em esquecer Harry, que eu cheguei mesmo a pensar que você tinha realmente o esquecido!

- Hermione, isso então quer dizer... quer dizer...

- Quer dizer que Harry já te amava, Gina; ele já te amava há muito tempo, bem antes de perder a memória. O que ele te disse, ontem à noite, foi verdadeiro. Esse sentimento só estava adormecido nele... Você não tem motivos para ficar chateada...

O sorriso que Gina tinha aberto era enorme e sincero; seus olhos brilhavam intensamente, como não faziam há muito tempo. Hermione imaginava o que ela estava sentindo – e sabia que era algo muito bom.




Sim, Gina tinha a plena noção de que estava sendo ridícula... completamente boba... estupidamente idiota. Mas, para falar a verdade, ela não estava se importando com nada disso. Ela estava rindo à toa, por qualquer coisa besta que dissessem ou que acontecesse, e esse sorriso bobo teimava em não sair de seu rosto. Ela não se lembrava de ter-se sentido tão bem em algum outro dia – bem, talvez com a exceção da noite anterior.

E o mais incrível de tudo – ela teve que admitir para si mesma – era que a única pessoa que a deixava ridícula, boba e idiota era ele, Harry... Tinha sido assim antes; estava sendo assim naquele momento.

Que ironia! Hermione tinha toda a razão – como sempre, diga-se de passagem -; realmente era uma grande ironia que, assim como Harry fizera por tanto tempo, Gina também não tivesse se dado conta de que uma pessoa, a seu lado, a amava. Ela tinha sido uma grande “Loony”, isso sim! Tão no mundo da lua quanto sua amiga “Di-Lua...”

Depois da história que Hermione tinha contado, Gina não pensou em fazer outra coisa que não fosse se arrumar – e de um jeito mais cuidadoso naquela manhã – para descer e tentar encontrar Harry. Ela queria vê-lo, precisava vê-lo. Tudo o que ela mais queria era olhar naqueles olhos verdes e vê-los por outro ângulo, um ângulo que ela nunca tinha experimentado antes: como se aqueles olhos a vissem como uma garota de verdade, como a garota que ele amava.

As duas desceram as escadas dos dormitórios femininos, esperando que os garotos estivessem as esperando (Gina muito ansiosa por isso), mas eles não estavam na sala comunal. Ao olhar o relógio, Hermione concluiu que eles deveriam ter-se cansado de esperar e ido tomar o café da manhã. Gina riu novamente quando a amiga resmungou que Rony tinha um buraco no estômago que o impedia de esperar mais que dez minutos para fazer uma refeição.

Neville, que vinha descendo do dormitório masculino, informou às meninas que Harry e Rony tinham saído um pouco mais cedo para tomarem café. Os três grifinórios, então, dirigiram-se ao Salão Principal juntos, conversando animadamente sobre amenidades, Gina rindo tanto de coisas tão bobas, que até Neville se surpreendeu.

- Você está tão alegre, Gina! – ele disse quando estavam no Hall de Entrada do castelo. – Aconteceu alguma coisa boa?

- Só “alegre”, Neville? – Hermione entrou na conversa. – Ela está radiante, daqui a pouco vai ficar com a boca doendo de tanto sorrir! – e piscou discretamente para Gina.

Ao entrarem no Salão Principal, Neville se despediu delas e caminhou até a mesa da Corvinal, à procura de uma pessoa que Gina sabia muito bem quem era. Hermione cruzou os braços, murmurando “Quem diria, não é?”, ao mesmo tempo em que observava Neville se juntando a Luna na mesa da Corvinal. Gina, porém, tinha os olhos fixos na mesa da Grifinória, sentindo um desconforto agradável no topo do estômago.

- E agora, Mione? – ela perguntou ansiosa. – O que eu faço?

- O que você faz? Você vai até aquela mesa e toma o seu café, oras! – a garota respondeu como se fosse a coisa mais óbvia do mundo. – Você está tão boba, Gina, que chega a ser engraçada!

- Ahhh, você está zombando de mim de novo, Mione! – ela retrucou num falso tom indignado, que fez Hermione revirar os olhos.

- E eu tenho razão!

Elas procuraram Harry e Rony na mesa; eles estavam sentados ao lado de Simas Finnigan e Dino Thomas, conversando animadamente. O clima naquele salão era descontraído, leve, como não estava há vários meses. Parecia que tudo estava um pouco mais contente naquele dia... ou poderia ser apenas os olhos de Gina.

Ela prestou mais atenção em Harry; ele parecia mais contente do que jamais esteve (ou ela estava vendo coisas?). Não, ele estava mesmo de muito bom humor; após um comentário que Rony tinha feito, ele jogou a cabeça para trás e riu gostosamente junto com Simas e Dino.

- Até parece que ele voltou, não é?

Gina, que estava absorta observando Harry, sobressaltou-se com o comentário repentino de Hermione; ela também olhava a mesa da Grifinória com atenção, seus olhos ligeiramente mais fundos ao fitar Harry.

- Do que você está falando, Hermione?

- De Harry... Até parece que ele está de volta... aquele Harry antigo, que achava que a vida era apenas uma sucessão de fascinantes aventuras... Eu até tinha me esquecido que existia esse Harry, escondido num cantinho dele...

Gina voltou a olhá-lo. Sim, ela se lembrava desse Harry também – um Harry que foi morrendo aos poucos devido às perdas que ia levando na vida, uma atrás da outra... Era bom vê-lo de volta.

Quando elas sentaram à mesa e cumprimentaram os garotos, a conversa parou instantaneamente, apesar de todos eles estarem segurando fortemente as risadas e seus sorrisos serem bastante culpados. Gina, que estava sentada um pouco distante de Harry, do lado contrário ao dele na mesa, apenas lançou um sorriso tímido para o garoto. Harry respondeu com um sorriso sincero e um olhar penetrante. Gina não poderia dizer direito o que aconteceu na conversa ao lado dela, porque estava tão preocupada em trocar olhares com Harry que quase derrubou o suco de abóbora; ele, por sua vez, deixou escapar o garfo bem na direção de Rony minutos depois.

- Por que vocês pararam de falar tão rápido quando nós chegamos? – Hermione perguntou, fitando Rony, a seu lado, com curiosidade. – O que nós não podemos saber?

Rony ficou um pouco sem jeito e riu sem graça. Simas e Dino zombaram dele e, após um olhar cúmplice, entregaram a verdade para a Hermione.

- Nós estávamos... apenas contando algumas piadinhas para descontrair o ambiente... – Simas explicou com uma risadinha maldosa.

- Piadinhas sujas, diga-se de passagem, e Rony sabia várias! – Dino completou rindo e depois bateu a mão na boca por fingimento, fitando Rony com os olhos arregalados. – Opa, cara, acho que não era para eu dizer isso, hein?

- Rony! – Hermione exclamou severamente.

O garoto ficou com as orelhas vermelhas, muito sem jeito, enquanto Dino e Simas riam de se acabar.

- É mentira deles, Mione!

- Ahan, sei, Rony Weasley! – a garota retrucou num tom de censura.

Harry e Gina riram apenas para disfarçar; eles estavam muito concentrados um no outro para ouvirem uma única frase da corriqueira discussão entre Rony e Hermione naquela manhã.

Não era um sonho. Gina agora via Harry com outros olhos. Ela o observava e se lembrava do que Hermione tinha lhe dito; Harry já a amava antes. Isso queria dizer que o que ele sentia agora era real. Maravilhosamente real. Gina mal podia acreditar que aquilo realmente estivesse acontecendo com ela. Era tão mágico que ela não conseguia parar de sorrir, apesar de ter a consciência de que estava sendo muito boba agindo dessa maneira.

Foi um café da manhã atípico, mas muito mais alegre do que de costume. Não havia aquele clima pesado de guerra no ar, as corujas pareciam trazer apenas boas notícias (o que, apesar de sua alegria, Gina sabia que era mentira; a diferença daquela manhã era que, quando Hermione recebeu o Profeta Diário, ela preferiu não abri-lo à mesa como sempre fazia) e as conversas tratavam apenas de assuntos agradáveis. Era uma falsa sensação de calmaria, Gina sabia, mas ela, ao menos naquele dia, queria imaginar que era apenas uma garota – sem problemas nem preocupações – e apreciar que o garoto que ela sempre fora apaixonada estava gostando dela da mesma maneira.

Quando eles finalmente terminaram a refeição, abarrotados pela deliciosa comida de Hogwarts, saíram juntos do Salão Principal. Rony e Hermione estavam de mãos dadas (eles já tinham parado de discutir). Gina notou que Harry olhou dos amigos para ela e, depois, para a mão da garota largada ao lado do corpo; ela riu para ele ao perceber sua intenção, mas meneou a cabeça indicando “não”. Ao menos naquele instante, não era sua intenção declarar a toda a escola que estava com o tão famoso Harry Potter.

- Ei, nós podemos ir lá fora, não é? – Rony sugeriu. – Aproveitar que hoje é sábado e não temos nada pra fazer...

- Nada pra fazer? – Hermione retrucou. – Eu tenho um dever de Aritmancia e você, Rony, aquele de Poções que ainda não terminou!

- Ahhh, mas eu posso fazer amanhã...

- Você já está adiando isso desde quinta-feira!

- Rony, Hermione! – Harry chamou, mas os dois não deram atenção. – RONY, HERMIONE! – ele gritou no ouvido dos dois para que eles percebessem. – Vocês podem ir fazer seus deveres, porque eu e a Gina vamos dar uma volta nos jardins, o.k.? – ele informou entusiasmado e, antes que alguém pudesse fazer ou dizer qualquer coisa, Harry já estava empurrando Gina pelos ombros e conduzindo-a para os jardins, enquanto um abobado Rony e uma sorridente Hermione os observavam lá de trás.

- Nós vamos? – Gina perguntou sem entender. – O que você está fazendo? O Rony...

- Ele vai saber logo, não é? – Harry disse, postando-se ao lado de Gina quando desciam para os jardins iluminados pelo sol da manhã clara que fazia.

- Você contou?

Harry provavelmente percebeu que Gina estava alarmada, pois não sorriu quando respondeu a pergunta.

- Não, eu não contei. Mas Hermione deve contar, não é?

- Isso é verdade... – Gina riu. – Aposto que está fazendo isso agora mesmo.

- É, e enquanto isso... – Harry retrucou animado, seus olhos brilhando marotamente ao observar Gina. – Nós podemos ir dar uma volta em algum lugar...

Gina franziu as sobrancelhas.

- E aonde você vai me levar?

- Ah, você vai ver... – ele respondeu com o sorriso ainda mais matreiro. – Você vai ver...




- Ei!

Luna se assustou tanto, que acabou largando seu exemplar do mês do Pasquim sobre o seu prato de ovos mexidos. Ela arregalou os olhos para ver, ao seu lado, Neville se acomodar.

- Você me assustou!

- Também, você estava no mundo da lua! – ele brincou, dando um selinho nela, sem se importar com os corvinais que os encaram e riram depois disso. – E não é assim que você faz comigo, também?

Ela bufou com dignidade.

- Acho que temos um invasor aqui na mesa, Sr. Longbottom... – ela disse num tom sonhador, retirando sua revista suja de ovos do prato (ela tinha sido seriamente avariada).

- Bem, você sempre invade a minha mesa, então resolvi inverter os papéis. – ele respondeu num tom brincalhão, apoderando-se de uma torrada com manteiga do prato dela.

- Você está de bom humor, hein?

- Tirei “excede expectativas” em Herbologia no trabalho sobre plantas venenosas.

- Isso é normal, suas notas sempre são boas em Herbologia... – Luna fez pouco caso, mas Neville tomou como um elogio e ficou ligeiramente encabulado, tanto que resolveu mudar de assunto.

- Eu encontrei a Gina mais cedo, ela parecia bem contente.

- Faz tempo que eu não converso direito com ela, não está dando tempo... – Luna lamentou vagamente. – Ela está com o Harry, não é?

Neville arregalou os olhos tanto quanto Luna fazia.

- Eles estão? – ele perguntou surpreso, virando-se no banco para ver a mesa da Grifinória. – Como você sabe?

Luna engoliu em seco; tinha falado demais de novo. Ultimamente tinha pegado esse mal costume de falar coisas demais na frente de Neville – e ele não podia desconfiar de certas coisas. Era como se ela ficasse tão descontraída na presença dele, que esquecia de algumas regras básicas, como manter a boca fechada sobre certos assuntos.

- Sei sabendo! – ela se desviou da conversa, observando atentamente o teto como se estivesse hipnotizada por ele.

Neville ficou em silêncio alguns instantes antes de dizer:

- Você é estranha, Luna... Parece que você capta as coisas no ar... Deve ser por isso que você é tão aérea...

Ela não respondeu; preferiu continuar “aérea” como ele dizia. Neville não imaginava o quão próximo da verdade estava quando disse que ela “captava as coisas no ar”; grosseiramente, um leigo diria que era exatamente isso que ela fazia. No entanto, ele não podia sequer desconfiar daquilo... Se descobrisse, seria mais uma pessoa a se afastar dela por não acreditar... E ela sentia que não queria que Neville se afastasse.




- E depois, nós temos aquele dever de Feitiços, você realmente precisa treinar o feitiço que o Prof. Flitwick explicou na aula passada! – Hermione enumerava nos dedos as tarefas, enquanto subia apressada os vários lances de escadas. – E não venha me dizer que não está, porque você fez o chapéu do Neville pegar fogo!

- Hermione, será que você pode parar por um segundo? – Rony perguntou um pouco mais atrás, correndo para segui-la. – Você não está dando tempo para que o ar chegue nos meus pulmões!

- E mais tarde, eu queria ir à biblioteca. Eu estou desconfiada de um certo livro de Poções que vi por lá semana passada, acho que pode ajudar naquele probleminha do Harry, mas até hoje eu ainda não consegui lê-lo como se deve! Estou com muitos livros emprestados, Madame Pince não permitiu que eu retirasse mais...

- Mione! – Rony exclamou esbaforido quando os dois chegaram ao retrato da Mulher Gorda, que os observou entediada. – Você pode me ouvir um pouco?

Hermione, que estava com a boca aberta, pronta para dizer mais alguma coisa, paralisou e cruzou os braços, encarando Rony negligentemente. Ele, por sua vez, aproveitou aquele silêncio momentâneo para recuperar o fôlego e imaginar como Hermione podia não perder o seu, já que ela conseguia falar toda aquela quantidade absurda de palavras sem parar para respirar. Após alguns instantes, Rony (com a barriga doendo), perguntou:

- Você sabe porque Harry e Gina estavam como dois patetas no café da manhã, não é? – ele encarou a garota, seu tom bastante incisivo, exigindo uma confirmação.

Hermione permaneceu em silêncio. Engraçado como ela não conseguia parar de falar cinco minutos antes e, naquele momento, permaneceu tão quieta, que era possível ouvir o som dos seus pensamentos se formando. Ela estava tentando conseguir tempo – Rony sabia muito bem. Mas ela não iria enganá-lo naquele dia, como fazia tantas vezes.

- E então, Mione? – ele pressionou. – Perdeu a língua?

- Ora, menina, responda logo ou diga a senha! – a Mulher Gorda exclamou aborrecida. – Até eu já estou cansada das discussões de vocês dois!

Rony se virou para o quadro indignado, pronto para dizer umas boas verdades para aquela pintura metida, mas Hermione foi mais rápida e disse a senha, entrando depressa na sala comunal, que estava vazia àquela hora. Rony seguiu a garota, que parecia ter achado muito providencial a interrupção da Mulher Gorda; ela se sentou numa das poltronas preferidas deles, próxima à lareira, e abriu o seu exemplar do Profeta Diário, que recebera há pouco no café da manhã.

- Você vai me ignorar, Hermione? - Rony insistiu. – Vai ficar aí lendo o jornal na cara dura?

- Eu não sei aonde você quer chegar com essa discussão, Rony, francamente... – ela respondeu por detrás da foto de Cornélio Fudge sendo acuado por um grupo furioso de duendes.

Rony bufou irritado. Ele sabia que tinha acontecido algo e não iria permitir que o passassem para trás. Ele não era estúpido! Sabia muito bem que Harry e Gina estavam se comportando naquela manhã como dois perfeitos idiotas, com sorrisinhos bobos idênticos! Para completar, Harry tinha chegado bem mais tarde do que o normal na sala comunal na noite anterior, o que endossava a teoria de Rony: todas aquelas pistas significavam apenas uma coisa, e Hermione hesitando em confirmá-la só estava tornando tudo pior.

Rony tirou a varinha do bolso da calça, mirou a lareira e exclamou Incendio, fazendo com que chamas avermelhadas crepitassem alegremente. Ele percebeu que Hermione o encarava intrigada por cima do jornal; ele, por sua vez, aproximou-se dela, batendo os pés e, num gesto rápido, antes que a garota pudesse reclamar de algo, puxou o jornal dos seus dedos distraídos e atirou-o às chamas.

- Rony, isso era o meu jornal!

- Eu sei.

- E você o jogou na lareira. Acesa!

- Eu sei!

- Eu paguei por ele, sabia?

- Eu te reembolso os cinco nuques depois. – e como Hermione continuou encarando-o brava, ele remendou aborrecido: - Eu tenho cinco nuques, Mione!

Ela ficou um pouco embaraçada depois disso; tanto ela, quanto Harry, ficavam sem jeito quando algo os conduzia ao assunto “dinheiro” com Rony.

- Eu não quis dizer isso... – ela respondeu emburrada, cruzando os braços e recostando-se à poltrona.

- Você vai me responder àquela pergunta agora? – ele aproveitou o momento para disparar o que queria.

Ela levantou os olhos para fitá-lo, lentamente, com um quê de hesitação.

- Só se você prometer que não vai se aborrecer.

- Eu prometo. – ele respondeu aborrecido.

- Eu falo sério!

- Eu também!

Hermione suspirou pacientemente.

- O.k., sente-se.

- Eu estou bem assim.

- Sente-se.

- Já falei que não quero!

- Mas eu falei para você se sentar!

- Eu não vou me sentar só porque você quer!

Hermione se levantou, pronta para continuar a gritar. Eles ouviram o retrato da Mulher Gorda girar novamente e, por ele, entrou Colin Creevey, que os cumprimentou alegremente e recebeu um olhar tão gelado dos dois monitores-chefes, que recuou assustado e praticamente saiu correndo pelo mesmo lugar que aparecera. Rony se virou para Hermione, que estava de braços cruzados novamente.

- Se não se sentar, eu subo para os dormitórios femininos e você não fala mais comigo hoje!

Apesar de preferir engolir essência de murtisco a obedecer Hermione naquele momento, Rony acabou se sentando numa das poltronas, de muita má vontade. Com um sorriso prepotente, Hermione acabou se sentando também.

- O.k., Rony, já que você quer tanto saber, eu lhe digo: Harry e Gina se beijaram.

Houve apenas um instante de silêncio, no qual Rony ainda estava processando as palavras. Quando ele finalmente acordou para a verdade, sua voz se espalhou pela Torre da Grifinória:

- O QUÊEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEE?!

Ele não sabia quando tinha se levantado, mas já estava de pé mais uma vez quando encarou completamente descontrolado uma Hermione desanimada.

- Eu sabia que isso ia acontecer... – a garota lamentou. – Por que você tem que agir desse jeito, Rony?

- COMO É QUE É? ELES SE BEIJARAM?

- E o que é que tem isso de mais, Rony? – Hermione disparou seriamente, ficando de pé também e postando as mãos na cintura. – Francamente, eu juro que não consigo entendê-lo! Rony, estamos falando do Harry! Eu sei que você é preocupado com a sua irmã, e não vou julgá-lo por isso, mas por que essa implicância agora? Ele é nosso amigo há tanto tempo, nós o conhecemos, sabemos que ele é um garoto legal e, o mais importante, ele gosta da Gina, e você sabe disso! E ela também gosta dele, qual é o problema disso?

Depois de tudo aquilo, Rony não sabia mais o que dizer. É claro que ela estava certa, já que ela não sabia de tudo. Como ele poderia explicar que o maior problema era justamente por causa de Harry? Ele sabia de tudo aquilo que Hermione tinha dito; sabia até que Harry estava gostando da sua irmã há algum tempo e, por mais que isso fosse estranho, afinal, eram seu melhor amigo e sua irmã, ele não veria problema algum nisso tudo se não fosse por... como ele poderia explicar isso para Hermione? Não, contar a verdade estava fora de cogitação; ele não queria fazer Hermione sofrer por aquilo, como tinha acontecido com ele mesmo quando descobriu e ainda acontecia agora. E não dava para explicar por que ele não queria que Harry e Gina tivessem um relacionamento se não contasse aquilo. É, estava num beco sem saída.

Extremamente desanimado, Rony se jogou num sofá a um canto, observando seus próprios tênis e invejando-os; os tênis deveriam ser felizes, sem preocupações... Bem, talvez os seus tênis tivessem a preocupação de que fossem rasgar a qualquer momento, de tão velhos que eram. Mas por que ele estava pensando em seus tênis, afinal? Seu pensamento retornou a Gina e Harry; ele sabia que eles deveriam estar felizes agora, e seria besteira dizer para si mesmo que não ficava contente com isso. Eles mereciam isso, mas era agora, e depois? Tudo ficaria mais difícil mais tarde e, o que estava acontecendo agora, só iria tornar ainda mais complicado o que ainda estava por vir. Valia a pena correr o risco?

Ele sentiu o assento do sofá afundar ligeiramente sob o peso de Hermione, que tinha acabado de se sentar ao seu lado. Ao se virar devagar para vê-la (a garota encarava a lareira aborrecida, como se quisesse, com seus próprios olhos, alimentar a chama que começava a se esgotar), Rony sentiu o seu estômago afundar mais um pouco. E se fosse com ele que estivesse acontecendo aquilo? E se ele estivesse no lugar de Harry e, por sua vez, Hermione estivesse no lugar de Gina? Valeria a pena correr o risco?

Valia a pena.

Mesmo que ele e Hermione sofressem mais tarde por isso?

Ele não precisava perguntar a si mesmo duas vezes. Valia a pena. Ele não conseguiria deixar de estar com Hermione, mesmo que depois... não importaria o que viesse depois, o presente era mais importante.

Foi só naquele instante que Rony finalmente entendeu. Ele não tinha nem o poder, muito menos o direito de intervir. E o que acontecesse depois... tinha que parar de pensar no depois; as coisas ficavam piores quando ele pensava no amanhã.

- Há algo que você esteja me escondendo, Rony? – ele ouviu a voz de Hermione, desanimada, porém pertinente.

Rony respirou um pouco mais depressa. Ela não podia estar desconfiada daquilo, era impossível! E ela também não podia saber. Era demais ele saber, imagine Hermione também!

- Vamos só esquecer isso, tá bom? – Rony pediu mansamente, tentando se desviar do assunto, ao mesmo tempo em que aproximava mais o seu corpo do de Hermione. Era incrível como simplesmente o calor que ela emanava era suficiente para acalmá-lo. – Foi só uma... bobagem minha... esquece.

Sorrateiramente, ele enlaçou o seu braço direito ao redor do pescoço dela, sentindo os cabelos fofos da garota em contato com sua pele. Ela virou o rosto lentamente para vê-lo, seus olhos se encontrando e seus rostos tão próximos, que seus narizes chegavam a se tocar. Ela parecia surpresa.

- Você está admitindo que errou?

Ele não gostava de dizer aquilo, mas se era para desviá-la daquele assunto, ele o faria.

- Sim, eu estou. – ele disse mordendo os lábios em seguida, temendo que eles se abrissem sozinhos e discordassem dela novamente, como estavam tão acostumados a fazer.

Ela sorriu de mansinho.

- Ora, mas isso é algo que vai entrar para a história.

- Pena que ninguém vá acreditar, porque você é a única testemunha. – ele respondeu marotamente, puxando-a mais para si com ajuda do braço que a enlaçava, envolvendo-a num beijo lento e carinhoso, que os fez esquecer de tudo que os afligia e de quem quer no mundo que não fosse um dos dois.




Ela sentia as mãos dele em contato com sua pele, cobrindo seus olhos fechados. Às vezes, ela os abria, tentando ver algo, mas Harry permanecia com os dedos muito bem fechados, impedindo sua visão. Ela riu. Aquilo estava ficando engraçado.

- Falta muito para chegarmos? – ela perguntou, sentindo que o rastro daquele riso permanecia em sua voz, apesar de ter algo de cansaço nela também; tinha certeza de que já tinham caminhado vários quilômetros (ou podia ser também apenas sua ansiedade em descobrir o que Harry estava aprontando).

- Só mais um pouco... – ele repetiu pela décima vez. – Que garota apressada você é, hein, Gina?

- Eu estou caminhando de olhos fechados há meia hora; você quer o quê?

- Ah, não foi tanto assim, vai?

- Foi sim.

- Eu estou te mostrando a língua por causa disso. – ele retrucou num tom brincalhão.

- Tanto faz, eu não estou vendo!

Eles caminharam mais um pouco. Gina sentia o ar fresco ao seu redor, o cheiro de árvores e também podia ouvir o som de pássaros, misturado ao “crec-crec” das folhas e gravetos que ela pisava enquanto caminhava. Ao longe, algo que parecia ser o barulho de água se movimentando. Onde será que estariam? Ela abriu os olhos novamente, mas tudo o que viu foram os dedos de Harry.

Uns cinco minutos depois, ela ouviu o barulho de um graveto ou seja lá o que fosse sendo quebrado; sentiu as mãos de Harry saírem bruscamente de seus olhos e ouviu o sonoro palavrão que ele soltou.

- Harry!

- Desculpe, eu tropecei num maldito galho! – ele reclamou; e quando ela estava se virando para ver o que tinha acontecido: - E não abra os olhos ainda!

- Isso já está ficando ridículo, Harry... Que tal se...?

- Não, já disse que não é para você abrir os olhos! – ele repetiu, dessa vez apenas puxando-a pela mão e conduzindo-a pelo caminho.

Gina teve uma enorme vontade de abrir uma única frestinha das pálpebras, mas resistiu à tentação; não queria estragar a surpresa que ele estava lhe preparando. No entanto, não podia deixar de ficar intrigada com aquilo; que lugar era aquele? Como Harry sabia chegar lá?

Não demorou muito mais para que obtivesse algumas respostas. Harry parou de andar e pediu para que ela subisse com cuidado uma espécie de elevação; o barulho de águas estava muito forte agora, e o ar se tornara mais fresco e úmido. Ela sorriu ao imaginar que lugar poderia ser aquele. Harry a segurou pelos ombros por alguns segundos, pedindo para que ela não se movesse bruscamente, e depois ela o sentiu se posicionar ao seu lado.

- O.k., Gina, pode abrir os olhos!

- Ah, finalmente, eu já estava pensando que...

Ela parou de falar assim que bateu os olhos naquela paisagem. Não havia o quê dizer. Aquele lugar era... maravilhoso, mágico! Ela mal podia acreditar que existisse algo assim escondido em Hogwarts!

Estavam no meio de uma pequena clareira; ao redor, as árvores excepcionalmente verdes e coloridas por suas flores de primavera mostravam sua exuberância. Os raios de sol penetravam sorrateiramente por entre suas folhas, produzindo desenhos de sombras e luzes no local. Gina tinha razão quanto ao barulho de águas; ele provinha de uma bela cachoeira de águas límpidas, que desaguava num lago que se localizava, precisamente, sob os pés dos garotos. Gina abaixou um pouco os olhos para enxergar os próprios pés, muito próximos da borda de uma pedra enorme; mais um passo e ela cairia no lago abaixo.

Harry enlaçou sua cintura com os braços quando percebeu que Gina estava olhando para baixo e vacilando por um motivo que ela não contava para ninguém; não que tivesse medo de alturas, era de outra coisa que estava mais abaixo... No entanto, não foi nada mal sentir os braços do garoto envolvendo sua cintura daquela maneira protetora e ao mesmo tempo carinhosa.

- Você gostou? – ele perguntou mansamente em seu ouvido, utilizando aquele mesmo timbre de voz da noite anterior, quando desafinara aquela canção para a garota.

- Não tem como não gostar! – Gina respondeu maravilhada, sorrindo de orelha a orelha. Ela virou ligeiramente o rosto para enxergar Harry e seus rostos ficaram deliciosamente próximos; era incrível como aquilo, naquele momento, apenas deixava Gina ainda mais feliz, ao invés do habitual embaraço que sentia tão perto dele. – Onde nós estamos?

- É o meu lugar secreto, você não acha que eu vou te dizer onde é, não? – ele respondeu com um jeito maroto.

- Mas... isso é na Floresta Proibida? – subitamente, ela se alarmou. – Harry, o nome dela não é “Proibida” por acaso, eu já lhe disse que...

- Não é na floresta que estamos. Mas eu não vou te contar a localização, já disse que é secreto! – ele riu. – Por que você acha que eu te trouxe aqui de olhos fechados?

Gina apenas o encarou por alguns instantes. O ar umedecia suas vestes ao redor.

- Como você descobriu esse lugar?

Houve uma pausa. Ele sorriu em seguida.

- É segredo também.

- Harry! Você tem andado por Hogwarts sozinho! É isso que você faz quando some?

Ele não respondeu com palavras; preferiu calá-la com um beijo. Gina esqueceu todas as suas perguntas quando ele fez isso; o que importava como tinha chegado ali? O que ela queria mesmo era continuar beijando-o... sempre e sempre...

Era uma sensação indescritível; estar ali, naquele lugar maravilhoso, ouvindo o som das águas caindo, sentindo o ar úmido envolver-lhes, e o melhor de tudo... estar envolvida nos braços de Harry, que apertava sua cintura e colava seu corpo no dela... estar beijando o garoto que ela amava, que sempre amou... Ninguém poderia sequer imaginar o que ela estava sentindo.

Quando eles se separaram, Gina bateu de leve no peitoral dele com o punho direito, rindo e encarando seus espetaculares olhos verdes:

- Você nunca vai deixar de ser um menino inconseqüente...

Ele deu uma risadinha travessa. Sem deixar de encará-la irresistivelmente, puxou-a pelas mãos um pouco para longe da beirada da pedra e, depois disso, voltou a ficar próximo da beirada, rindo.

- Essa água deve estar ótima, não é?

Gina sentiu um arrepio involuntário percorrer-lhe a espinha; ele não estava sugerindo o que ela pensava, estava?

- Harry... – ela repreendeu. – O que você quer fazer?

Os olhos dele cintilavam de uma maneira diferente por trás dos óculos.

- Não me diga que você ainda não notou?

Ele tirou os sapatos e atirou-os para trás de Gina; fez uma bolota com as meias e tentou acertar a garota, que se abaixou para não ser atingida, rindo e xingando-o ao mesmo tempo. Então, ele abriu um dos botões da camisa de linho branco que usava, mas parou subitamente, encarando Gina com respeito.

- Hm... eu não vou entrar na água de camisa. – ele disse um tanto sem jeito. – Você se importa se eu...

Ela entendeu a mensagem; sentiu-se um pouco mais quente no rosto por causa disso.

- Você prefere que eu vire de costas? – ela perguntou encabulada, apesar de estar torcendo para que ele respondesse que não era necessário. Gina, o que seus irmãos diriam de você se ouvissem esses pensamentos, garota?, ela pensou consigo mesma, reprimindo um sorriso.

- Claro que não! – Harry respondeu espontaneamente. – Se você quiser olhar... – ele insinuou, desabotoando a camisa com um sorriso muito safado.

- Harry, seu filho da mãe! – ela definitivamente estava vermelha agora; ele lia pensamentos, por acaso?

Ele riu e terminou de abrir os botões; a sua camisa estava aberta, largada sobre o corpo, revelando parte do peitoral dele. Apesar de indignada, Gina não foi suficientemente forte para reprimir o olhar de cima a baixo que deu no garoto, avaliando-o. E sorriu de leve...

Harry era mesmo bonito daquele jeito. O.k., ele já tinha sido bastante magrelo e desengonçado antes, mas agora... era diferente, ele estava mudado. Aqueles pés descalços sobre a pedra, a calça folgada, a camisa branca aberta... o rosto, com aqueles olhos tão verdes e um sorriso irresistível... os cabelos despenteados, com seus fios um para cada lado... dava-lhe um ar rebelde e travesso. Gina gostava disso.

- Você está me olhando... – Harry disse rindo, tirando a camisa e jogando-a no chão, para depois retirar também os óculos e colocá-los enrolados dentro do tecido.

- Eu não estava não! – ela respondeu com dignidade, cruzando os braços e fazendo bico de emburrada.

Ele riu de novo e, antes que Gina pudesse fazer ou dizer qualquer coisa, virou-se e deu um mergulho repentino no lago. Deixando escapar um grito de susto, a garota praticamente se jogou na beirada da pedra e olhou para baixo, tentando ver o que tinha acontecido. Harry era mesmo insano de mergulhar daquele jeito! E se fosse raso? E se ele batesse a cabeça em alguma pedra? Ah, não, Gina, isola, bater a cabeça não!

Ele não estava voltando. O coração de Gina parecia que ia saltar pela boca quando, depois do que pareceu demorar uma eternidade, Harry emergiu, girando a cabeça para todos os lados para obter ar, espalhando água com os cabelos.

- Quer me matar do coração, seu doido? – ela gritou enfezada, sua voz ecoando pela clareira, como se muitas Ginas estivessem recriminando Harry (e ele bem que merecia!).

A risada dele se espalhou pela clareira também.

- Ahhh, você ficou preocupada comigo, foi? – ele caçoou.

- É claro que eu me preocupo! – ela exclamou num átimo, mas remendou em seguida, furiosa. – Não que você mereça!

Ele nadou um pouco mais para trás, rindo para ela, como se estivesse se divertindo muito com toda a indignação da garota.

- E então, você vai ficar aí, parada, só me assistindo?

Ela sentiu o estômago despencar. Não, ela não queria aquilo... mas também queria estar com ele... Por quê, afinal, Harry tinha que ter aquela estúpida idéia de mergulhar? Se ele tivesse ficado quieto, ali, com ela, Gina não estaria nesse impasse!

- Vou, vou ficar aqui! – ela respondeu em desafio. – Eu não vou entrar nessa água gelada!

- Não está gelada... – ele retrucou, nadando para a direita. – E você vai me deixar aqui, sozinho? – agora para a esquerda. – Que sem graça!

Ela resmungou, cruzando os braços.

- É o que você merece por ter atentado contra a minha vida com aquele baita susto!

Houve uma pausa, na qual ela preferiu observar as águas da cachoeira caindo voluptuosamente.

- Você está com medo?

A voz de Harry chegou aos seus ouvidos, ecoando de lá de baixo. Gina sentiu novamente o arrepio na espinha.

- É claro que não! – ela retrucou com dignidade. – Eu só não quero entrar na água gelada!

- Você está com medo da água gelada, então! – ele respondeu. – Que grifinória fajuta!

- Não me desafie, Harry Potter!

- Medrosa...

- Medrosa é a vovózinha!

- Então entra na água!

- NÃO!

- Eu não vou sair daqui enquanto você não entrar... – ele reclamou, começando a nadar. Gina o observou por alguns instantes, antes de gritar:

- Vai ficar aí até amanhã então!

Por alguns minutos, ela apenas observou-o nadar. Até que ele nadava bem. Não era muito rápido, mas nadava bem o suficiente para não afundar, o que já era ótimo. Ela se lembrou por alguns fugazes instantes da segunda tarefa do Torneio Tribruxo, no qual ele adquiriu guelras para nadar no lago de Hogwarts. Gina sorriu após a lembrança.

- Você não vai vir mesmo? – ele perguntou mais tarde, chateado.

Ela hesitou por alguns instantes antes de contar a verdade a ele.

- Eu não sei nadar, Harry...

Ela suspirou com desânimo; não gostava de admitir aquilo. A história do trauma que ela tinha com água era bem antiga; quando pequena, os seus irmãos sempre visitavam um pequeno lago em Ottery St. Catchpole, próximo ao morro Stoatshead, e ela, por ser a caçula, ficava em casa. Ela odiava aquilo, mas tanto seus pais, quanto seus próprios irmãos, diziam que ela era muito criança para ir nadar. Criança, humpt! Que bobagem! Ela já tinha seis anos na época, era o suficiente, não?

Então, um dia, ela resolveu seguir os irmãos, escondida. Esperou todos se despirem (ela ficou de costas, encostada numa árvore) e, depois que eles entraram na água, Gina planejou dar um susto neles. Iria nadar e aparecer repentinamente, só para ver a cara de susto que eles iam fazer! Mas o que ela não tinha contado em seus planos era que o lago era muito fundo para ela e que, na sua afobação e inexperiência, ela acabou afundando e engolindo muita água, até ficar inconsciente.

Quando finalmente acordou, seus seis irmãos estavam sobre ela, desesperados. Depois de verificarem que ela estava mesmo inteira e brigarem muito pela besteira que tinha feito, eles contaram que tinha sido um “Deus nos acuda” quando a descobriram se afogando. Fora Gui que a tirara da água, rodeado por mais cinco Weasleys aflitos. Ao voltarem para casa, depois de muito tempo e broncas, nenhum deles contou nada para a mãe ou o pai deles, pois sabiam que Gina (e eles!) ficaria de castigo se os seus pais descobrissem. No entanto, apesar disso, Gina tinha ficado muito envergonhada. Depois de algum tempo, eles até chegaram a sugerir que poderiam ensiná-la a nadar, mas Gina recusou; aquela experiência tinha sido muito traumatizante para que fosse repetida.

E, agora, lá estava ela novamente. Queria estar com Harry, mas não entraria naquela água de jeito nenhum! E se afundasse? E se ela se afogasse? Não, não queria passar vergonha de novo. Harry continuava encarando-a lá de baixo e, novamente, um sorriso apareceu em seu rosto.

- Eu cuido de você, Gina! Não vou deixá-la se afogar, eu prometo!

O tom era leve e brincalhão, mas mesmo assim Gina gostou de ouvir aquele “eu cuido de você”. Mesmo assim, ela não entraria.

- Não, Harry, eu prefiro ficar aqui mesmo...

Ele soltou um muxoxo, mas não desistiu. Que garoto insistente!

- Eu te seguro quando você pular!

Gina suspirou com desânimo. A altura era grande.

- É fundo?

- Tem que ser, senão seria perigoso pular! – ele respondeu. – Ora, vamos, Gina, não há perigo!

- Eu não posso descer até aí?

- Seria uma volta enorme e sozinha você pode se perder! – ele insistiu. – Eu te seguro, Gina!

Ela ainda hesitou por alguns instantes, mas o olhar pidão que Harry lhe lançava a convenceu. A garota acabou se levantando, sob exclamações de aprovações de lá de baixo, e tirou os sapatos e as meias. Ela encarou a própria blusa e rezou para que ela não ficasse transparente na água, mas sendo azul escura, era pouco provável. Novamente, aquele antigo frio na espinha a acometeu quando Gina se posicionou na beirada da pedra.

- Tem certeza de que é seguro?

- Vá logo, Gina!

Ela respirou fundo, buscando forças e tentando de todas as formas espantar da cabeça a imagem antiga que se formara em sua cabeça daquele dia no lago próximo à Toca. E, antes que pensasse duas vezes, saltou, de olhos fechados e tapando o nariz.

Foi tão rápido, que ela nem teve tempo de gritar. Antes que se desse conta de que estava caindo, o ar arranhando-a no trajeto, já tinha alcançado a superfície da água; a primeira coisa que sentiu foi a temperatura fresca do líquido envolvendo seu corpo como um tapa, então, afundou bastante por causa da altura de queda – e essa era a explicação de porquê Harry tinha demorado tanto a subir. Ela olhou para cima, vendo aquela claridade parcial e oblíqua penetrando na água. Tentou subir, mas seu corpo parecia uma pesada âncora, que a puxava sempre mais para baixo.

Quando ela achou que estava perdida de vez, sentiu duas mãos segurarem-lhe a cintura e fazê-la emergir (o que pareceu demorar uma eternidade), até que alcançasse o topo. O ar invadiu seus pulmões, num sopro de vida, e ela se agarrou, trêmula, à primeira coisa que viu pela frente: Harry.

- Não me solta, não me solta! – implorou desesperada, todas aquelas imagens de quando tinha seis anos assolando sua mente.

- Calma, Gina, eu tô aqui... não vou te soltar...

- Não me solta, não me deixa afundar!

Ela enterrou o rosto no ombro dele, puxando seus cabelos com tanta força e desespero, que não sabia como Harry não tinha reclamado. Pelo contrário, ele a abraçou ainda mais forte, acariciando seus cabelos e dizendo-lhe palavras de conforto em seu ouvido, até que ela finalmente se acalmasse e conseguisse abrir os olhos, encarando-o, envergonhada:

- Você deve estar me achando uma boba...

Ele sorriu compreensivamente.

- Claro que não, todos nós temos medo de alguma coisa, não é?

Ela ficou em silêncio por alguns instantes, imaginando o que ele poderia temer.

- Sente a água... não é maravilhoso? – ele continuou. Ela sorriu de leve, voltando a encostar sua cabeça nos ombros dele, não mais de desespero, mas sim porque era um lugar muito confortável para se estar.

- Você não vai me soltar, né? – ela perguntou de novo, apesar de estar se sentindo maravilhosamente segura perto dele. O corpo de Harry, molhado, envolvia-a, bem como a água limpa e fresca, de uma maneira incrível e indescritível.

- Quem disse que eu quero isso? – ele respondeu. – Você não vai se soltar de mim tão fácil, Gina...

Ela estava relaxada, tranqüila... Harry era tão carinhoso... Ele a acalmava, abraçando-a daquela maneira, conduzindo-a lentamente pela água. Gina não saberia precisar quanto tempo permaneceu apenas daquele jeito, nos braços dele, até que retirou o rosto dos ombros de Harry e levou um agradável choque: Harry a carregava nos braços!

Gina não largou o pescoço dele; estava calma sim, mas só se ele estivesse com ela. Não queria nem pensar o que faria se ficasse solta naquelas águas.

- Eu e a água estamos te carregando... – ele murmurou. – Você gosta da sensação?

Ela assentiu, sorrindo para ele. Harry aproximou seu rosto do dela, lentamente, e sussurrou antes de beijá-la com amor novamente:

- Eu sou o cara mais sortudo por ter você, Gina...




- Eu não acredito que já é essa hora!

- Ah, ninguém vai notar que chegamos tarde! E são só sete e meia, Gina!

- Se você tivesse me deixado voltar de olhos abertos, Sr. Potter, teríamos chegado mais cedo!

- Não se preocupe, você não vai precisar ir àquele lugar sem mim, Srta. Weasley. Logo, não há necessidade de que você saiba o caminho.

- Isso é tão injusto! Você é um pentelho!

Eles acabaram ficando mais tempo do que deviam naquele lago de águas calmas. Quando se deram conta, já era quase noite, e tiveram que se apressar para vir embora antes que ficasse muito escuro. Harry insistiu para que Gina fechasse de novo os olhos na volta, o que ela achou desnecessário e muito irritante, mas acabou fazendo mesmo a contragosto. Ao chegarem ao castelo, mortos de fome, já passava das sete e o jantar já tinha sido servido; além disso, eles não poderiam aparecer no Salão Principal com as roupas úmidas daquele jeito. Gina levou Harry até a cozinha, onde Dobby, o elfo-doméstico, se desdobrou em gentilezas e entupiu-os de comida. Eles ainda tinham os bolsos cheios de bolinhos e bolachas quando subiram para a Torre da Grifinória, tentando não chamar atenção; podiam andar àquela hora no castelo, mas ia ser muito embaraçoso se alguém os visse úmidos e despenteados daquela maneira.

- Você acha que vai pegar mal se chegarmos assim na Grifinória? – Harry lembrou, puxando-a pela mão. Gina não tinha mesmo pensado nisso.

- Dane-se! – ela exclamou, jogando a prudência para o alto.

- É, dane-se mesmo! – ele concordou, no mesmo tom indignado dela. – Que saibam que eu estava com a melhor garota desse castelo e morram de inveja!

Gina riu, apesar de novamente sentir o rosto quente.

Quando eles estavam quase chegando no quadro da Mulher Gorda, uma voz feminina e conhecida os interceptou:

- Harry! Gina!

Era Hermione.

A amiga vinha correndo na direção deles até parar, esbaforida, e arfar:

- Pelo amor de Deus, até que enfim vocês dois apareceram!

Rony vinha logo atrás, mas não tinha tanta pressa como a garota. Gina reparou que ele estava um pouco desanimado. No entanto, seu olhar analisou a irmã e o amigo, parando nas mãos dadas dos dois; Gina teve a impressão de que Harry apertou ainda mais a mão dela enquanto Rony os encarava:

- Onde vocês foram, que estão molhados desse jeito? – ele perguntou.

- Nós... bem... erm... – Harry balbuciou.

- Não importa onde nós fomos, Rony! – Gina retrucou em desafio. – Que intrometido!

O irmão a encarou por alguns instantes, erguendo as sobrancelhas, mas depois se virou para Harry e mostrou um tímido sorriso.

- Vai ter que me contar depois onde é, Harry. Eu vou ter que levar Hermione nesse lugar também.

Harry abriu um sorriso sincero, desanuviando a tensão. Hermione, no entanto, parecia à beira de um ataque de nervos.

- Francamente, vocês três, não é hora para isso!

- O que aconteceu? – Gina perguntou intrigada com o descontrole da amiga.

- O que aconteceu? – Rony repetiu com desânimo. – Aconteceu que vocês perderam todos os acontecimentos da tarde!

- Que acontecimentos? – Harry inquiriu, tão confuso quanto Gina. Hermione suspirou profundamente, trocando um olhar cúmplice com Rony, que preferiu encarar o chão.

- É algo ruim, Hermione? – Gina disparou, temendo a resposta.

A garota respirou fundo antes de responder, encarando Harry e Gina com apenas metade de sua determinação habitual.

- Eu e Rony descobrimos um método de reverter a perda de memória do Harry. – ela disse de um fôlego só, como se fosse mais fácil falar logo tudo de uma vez. – Mas haverá um preço... e este será que Harry irá esquecer tudo que viveu enquanto estava sem memória.

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